Em 1 de dezembro de 1973, uma família inteira, mandinga, de 7 pessoas, vizinha do nosso "menino do Xime", o agora eng silv José Carlos Mussá Biai (há muito a viver e a trabalhar em Portugal), morreu na explosão de uma granada de arma pesada, na tabanca do Xime (***)... (Nâo se sabe se foi de foguetão 122 mm, morteiro, canhão s/r, do IN ou de obus, das NT).
A pergunta continua a ser legítima: ataque ou flagelação IN com foguetões de 122 mm e outras outras pesadas ? Ou "fogo amigo" da nossa artilharia, na resposta ao IN ? ...
Infelizmente já não está entre nós o Sucena Rodrigues (1951-2018), ex-fur mil da CCAÇ 12, que estava no Xime nessa noite de 1 de dezembro de 1973. Num poste que ele aqui publicou (**), parece deduzir-se que estaria mais inclinado para a hipótese de ter sido "fogo amigo", neste caso provoado pelo obus de Gampará, do outro lado do rio Corubal...
Em vida, nunca chegámos a esclarecer as suas suspeitas, nem mesmo em conversa "off record".
Em princípio as duas fotos que publicamos acima vêm descartar a essa possibilidade, a de ter sido "fogo amigo", uma granada de um obus 14, disparada do outro lado do rio Corubal, ...A unidade de quadrícula do Xime era então a CCAÇ 12. (Em março de 1973, a CART 3494, que estva no Xime, fora transferida para Mansambo.)
Só o obus 14 tinha alcance para atingir o Xime, a partir de Gampará (c. 15 quilómetros de distância em linha reta, no máxino)... Ora em 1972/74, ao tempo da CCAÇ 4142/72 (Os "Herdeiros de Gampará"), que havia em Ganjauará na era o obus 10.5 e não o obus 14, como se comprova por estas fotos e outras fontes.
O Xime só tinha o obus 10,5 cm (que não chegava à Foz do Corubal e à Ponta do Inglês, no tempo em que fui operacional da CCAÇ 12, 1969/71)...O Xime sempre foi guarnedido até ao fim da guerra pelo 20º Pel Art (10,5cm). E Ganjauará, ao tempo da CCAÇ 4142/72, era guarnecida pelo 29º Pel Art (10,5cm).
É verdade, e como reconhece a história do BART 3873, o setor L1 parecia estar calmo no finalo de 1973. Por outro lado, antigos guerrilheiros do PAIGC com quem falei em março de 2008, no Cantanhez e em Bissau, e que tinham estado, por volta de 1972, na região compreendida pelo triângulo Bambadinca - Xime - Xitole (frente Xitole, segundo o dispostivo do PAIGC), disseram-me que terá havido, possivelmente no 1º trimestre de 1973, após o assassinato de Amílcar Cabral, deslocação de forças para reforçar a frente sul ou a frente norte, por ocasião da batalha dos 3G (Guidaje., Guileje e Gadamael)...
_________
Sobre o ataque ao Xime [em 1/12/1973], com fogo inimigo ou amigo (??), cada um terá a sua opinião. Tenho a minha, mas não vou aqui divulgar, por achar que não virá resolver coisa nenhuma. Poderá, isso sim, eventualmente trazer outros problemas.
Só quero dar algum esclarecimento: (i) as vítimas não foram 7 mas sim 6, e não foram todas civis; (ii) morreram: 1 militar da companhia [a CCAÇ 12,] (era o pai da família), 2 mulheres (ambas mães da família, como sabes praticava-se a poligamia), 2 crianças em idade escolar e 1 criança recém nascida ( com 8 dias de vida).
Este esclarecimento não terá grande importância perante o resto, serve apenas para acrescentar mais algum rigor. (...)
(...) Comentário do editor:
Segundo a página oficial da Liga dos Combatentes, em 1/12/1973, no TO da Guiné, e por motivo de combate, morreu apenas um elemento das NT, o soldado Sumbate Man. Consultanda a preciosíssima Lista dos Mortos do Utramar, nascidos na Guiné, do portal Ultramar Terraweb (de novembro de 2006, e atualizada em janeiro de 2015), constata-se que o Sumbate Man era soldado milícia, natural de Nova Uaque, concelho de Mansoa, nº 268/73, pertencente ao Pel Mil 365, adiddo à 2ª C/ BCAÇ 4612, subunidade que estava em Jugudul (1972/74)...
Não pode, em princípio, ser o militar da CCAÇ 12, referido pelo Sucena Rodrigues.(..:)
António, está feito o esclarecimento, obrigado. Infelizmente, a CÇAÇ 12 não tem história de unidade, relativamente ao período que vai de março de 1971 até à sua extinção, em agosto de 1974... A única que conheço foi a que eu pessoalmente escrevi e que vai de maio de 1969 a março de 1971...
Relativamente à "tua versão" sobre o fogo amigo / fogo inimigo que matou um camarada nosso e a sua família inteira (!), eu gostava de conhecê-la um dia, mesmo que seja em "off record"... Não farei uso dela, em público, fica entre nós... Entendo que o assunto é delicado. De resto, e de acordo com a política do blogue, também não estamos aqui para julgar e muito menos incriminar ninguém.(...)
PS - Talvez alguém saiba dizer o nome do militar da CCAÇ 12 que morreu, cruelmente, com toda a sua família, na tabanca do Xime, no dia 1/12/1973. (...)
(...) 20 FASCÍCULO
DEZEMBRO 1973 (...)
(...) Sub-Sector do Xime (CCAÇ 12)
Em 01 pelas 22,15 horas, grupo não estimado flagelou o Xime E durante 25 minutos. Caracterizou-se por uma das suas maiores flagelações sofridas, tendo possivelmente os atacantes empregado todas as armas pesadas da zona, incluindo foguetões 122 mm. Dois desses foguetões atingiram uma morança da tabanca, morança que ficou totalmente destruída e com os seus 07 residentes (civis) mortos.
A reacção das NT foi imediata: 20º Pel Art (10,5cm), Pel Mort 4575/72 e apoio do 27º Pel Art (14 cm) aquartelado em Mansambo. NF sem consequências.
(***) Último poste da série > 8 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25618: Casos: a verdade sobre... (43): sim, a situação político-militar agravou-se em 1973/74, no CTIG, mas o PAIGC não fez a declaração unilateral de independència... em Madina do Boé: um erro toponímico sistemático que a nossa historiografia militar anda a replicar há meio século...
5 comentários:
Sousa de Castro (by email)
Data - sábado, 6/07/2024, 12:19
Assunto - "Fogo amigo"
Boas,
Acerca do assunto em epígrafe, devo dizer que através de um contacto telefónico, em 2019, com um furriel da artilharia do Xime (20º Pel Art) e que me diz que o fogo que vitimou 7 civis não foi provocado pelo PAIGC, mas pela artilharia de Gampará a pedido do Xime para bater a zona.
Segundo ele, deve ter havido erro nas coordenadas fornecidas ou mal marcadas. Assim depreende-se que os 7 mortos civis na tabanca foram provocados pela nossa tropa.
Como é óbvio não menciono o nome da pessoa em questão. Agora também não interessa nada. Devo dizer que era normal pedirmos apoio de fogo a Gampará e vice-versa.
Sousa de Castro
Obrigado, Sousa de Castro, por essa informação... Mas a minha questão mantem-se de pé:
Tinha o obus 10.5 (29º Pel Art, Ganjauará / Gampará) alcance para atingir a tabanca do Xime (15 km em linha reta) ? Na história do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74), diz-se que foi Mansambo (onde estava o Sousa de Castro) que deu apoio de artilharia ao Xime, nessa ocasião (1/12/1973). Em Mansambo estava o 27º Pel Art (obus 14): a distância Mansambo-Xime era também de cerca de 15 km.
Domingos Robalo (by email)
9 de julho de 2024 14:54
Olá amigo Luís Graça, olá camaradas. Considerando-me no grupo dos “ilustres artilheiros” (!), não sei comentar o caso mencionado por ter terminado a minha comissão no CTIG em maio de 1971.
Da leitura fica dito que afinal não teria sido o “ fogo amigo” mas sim o “fogo IN” a infringir essas mortes de civis. Infelizmente ocorrem sempre efeitos colaterais nefastos em qualquer TO.
No entanto, posso afirmar que durante o período da minha comissão houve um caso em que “fogo amigo” tirou a vida a 3 civis numa Tabanca. Este caso envolveu um furriel e um tenente coronel, ambos da minha unidade. O “fogo amigo” ocorreu durante uma “regulação de tiro de artilharia”. O auto que se seguiu teve os seus trâmites no sentido de se apurar a quem imputar a responsabilidade, se ao furriel ou ao tenente coronel. O erro poderia ter sido de qualquer um deles. O auto ainda decorria à data da minha desmobilização, nunca tendo sabido o resultado final da inquirição. Coisas da nossa guerra que cairão no esquecimento.
Abraço a todos, com votos de saúde e bem estar. Saudações artilheiras.
Domingos, obrigado. Estamos aqui agora, 50 anos depois, no conforto das nossas casas, a discutir coisas que alguns considerarão do domínio do "sexo dos anjos"...
Não penso, todavia, que seja "conversa da treta", afinal obriga-nos a "rebobinar o filme das nossas memórias" e, também, a "refrescar conhecimentos": por exemplo, qual era na prática, nas condições de terreno e clima da Guiné, o alcance máximo dos nossos obuses, nomeadamente o 10,5 e 0 14 ?...
Essa questão é relevante no caso em apreço (Xime, "fogo amigo", 1/12/1973)...
Não estamos a julgar, nem muito menos a incriminar ninguém. De resto, essa é uma das nossas regras de ouro...
Um abração, Luis
António José Pereira da Costa
9 jul 2024 18:03
Olá, Camaradas
Creio que este erro por "fogo amigo" não era muito possível.
Não estou a ver um erro tão grosseiro de alguém que faz tiro de Gã-Pará sobre o Xime ou até vice-versa.
Um Ab.
António Costa
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