quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Guiné 63/74 – P5334: Homenagem ao Amadu Bailo Djaló (Magalhães Ribeiro)


1. O Amadu Bailo Djaló foi, como todos bem sabemos, um dos mais dinâmicos operacionais e louvados COMANDOS guineenses ao serviço do Exército Português no CTIG, e, além de tudo o mais, é um excelente Camarada e Amigo nosso.

Sabendo que o Amadu, quase a completar sete décadas de existência, não tem atravessado os melhores momentos do seu estado de saúde, queria, aqui neste poste, prestar-lhe mais uma justa e merecida homenagem, em meu nome pessoal e de todos quantos se me quiserem unir neste que pretende ser apenas um gesto singelo de camaradagem e amizade.

São cada vez mais as instituições e os Camaradas que se vão juntando aos gritos, aqui e ali (em jornais, revistas e entrevistas), contra a tremenda injustiça e ostracização que ao longo destes últimos 35 anos, tem vindo a ser praticada pelos sucessivos governos pós-25A74, em relação a estes Homens, ex-Militares de Portugal, que juraram bandeira tal como nós e vestiram com orgulho a mesma farda e cumpriram fielmente o mesmo RDM.

Não paremos com os nossos gritos de revolta e mau estar, que terá que dar, mais dia menos dia, os seus frutos.

2. Para melhor e mais correcta informação sobre o estado de saúde do Amadu Bailo Djaló, recorri ao auxílio de um dos seus melhores Amigos na actualidade, o nosso Camarada Virgínio Briote, que não se fez rogado e me respondeu de imediato, e a quem deixo aqui registado o meu mais elevado agradecimento.

Caro Eduardo,

Obrigado pela tua mensagem.

O Amadu Bailo Djaló, depois de cerca de um mês nos cuidados intensivos do HM (onde foi tratado exemplarmente), regressou a casa armado com outra G-3, uma máquina portátil, ultra-moderna, que lhe fornece oxigénio e, em vez das 7,62, dispara relatórios em papel. Apesar das limitações o Amadu mantém o humor e o desejo de regressar à Guiné, à sua Bafatá, onde quer ficar junto dos pais e avós.

Falamos todos os dias. Primeiro porque quero acompanhá-lo e ver como segue as directivas da equipa médica. E segundo porque o estou a incentivar (e ele tem correspondido) a escrever as memórias do pós-25 de Abril: os contactos com os comandantes do PAIGC, as reuniões entre os comandos guineenses e os quadros europeus, as populações a mudarem de campo (antes muito amigas deles, depois a denunciá-los), a primeira vez em que foi preso e libertado logo a seguir, os tempos indefinidos, o não ter que fazer, a fome em casa, as armas ainda nas mãos deles, a manifestação em Bissau, frente à embaixada de Portugal (o embaixador a pedir ao PAIGC que os dispersasse), a chegada do comandante Umaru Djaló, num carro blindado, de arma na mão... É este o trabalho que o Amadu está a fazer e que eu vou passando para português corrente.

Não sabemos, eu e ele, se algum dia as memórias vão ser publicadas. Depois de concluído o trabalho começaram a surgir problemas de vária ordem. E a falta de dinheiro é um deles, a Associação de Comandos está com dificuldades em arranjar um editor, o Amadu Djaló é um nome desconhecido e a obra só fala de guerra vista pelos olhos e pela memória dele.

Mantemos um desejo: não deixar esquecer os Camaradas Guineenses, COMANDOS ou outros, que durante os anos da guerra, abriram colunas como condutores de viaturas (muitas vezes só com os sacos de areia como companhia) ou foram os primeiros homens das colunas apeadas. E que depois da guerra, feitas as pazes, foi o que se sabe.

Por aqui me fico.
Um abraço
vbriote

10 de Junho 2009 > Forte do Bom Sucesso > Belém > Lisboa > Memorial aos Combatentes da Guerra do Ultramar > Virgínio Briote, Amadu Bailo Djaló e Magalhães Ribeiro

3. É assim que eu vejo a situação dos nativos que serviram, combateram e morreram nas NT, ao nosso lado:

A mais alta de todas as traições

Muitos africanos foram os nossos melhores amigos
Tinham orgulho em envergar uma farda portuguesa
Na instrução eram afincados, cumpridores, e...
No combate davam tudo... até a vida... com nobreza!

1
Após a revolução dos cravos
Reinava no país a anarquia
Assaltavam-se as Instituições
O povo em “partidos” se dividia
2
Gente a falar do que não sabia
Ou que não sabia do que falava
Que ora dizia uma coisa
E passados minutos... negava
3
No meio de todas as convulsões
O poder político era “restaurado”
Os governos tomavam decisões
Aos repelões... uns p’ra cada lado
4
E assim, no meio deste “arraial”
Foi assinado, se bem me lembro
O acordo p’ra descolonização
Nesse ano, em 9 de Setembro
5
Só para se ter uma leve ideia
Do resultado deste “processo”
Olhe-se para o drama de Timor
O grotesco de um insucesso
6
Mas se Timor é a “cara” da moeda
A “coroa” anda envergonhada
Vamos virá-la e falar nela
Iluminar uma traição abafada
7
Uma ignóbil e cobarde traição
A história qu’aqui se vai contar
Parte do povo ignora... naturalmente
Outra sabe... mas prefere não falar
8
Assim, começando pelo princípio
Na “nossa” África colonial
Os africanos eram baptizados, e…
Registados... em nome de Portugal
8
Portugueses para todos os efeitos
Eram convertidos ao burgo cristão
Eram detidos, julgados e punidos
Por leis e juízes da nossa Nação
9
Pois era, muitos desses africanos
Nas nossas escolas estudavam
Dignos de respeito e estima, e…
No nosso meio trabalhavam
10
Eram tratados com igualdade
E cumpriam serviço militar
Prestavam juramento de bandeira
Juravam, também, a Pátria honrar
11
Na tropa ostentavam com orgulho
As mesmas insígnias e fardas
Tornavam-se aprumados, vaidosos
Seguravam firmes as espingardas
12
Combatiam fiéis ao nosso lado
Ao nosso lado feridos tombaram
Alguns estropiados p´ra sempre
Outros... a vida sacrificaram
13
Em Angola, Moçambique e Guiné
Foram louvados e condecorados
Foram graduados do Exército
E, como Heróis foram saudados
14
Logo após a descolonização
Estes “negros” foram abandonados
Portugal deixou de os considerar “seus”
Os “deles” acusavam: “- São renegados!”
15
Votados ao desprezo e à humilhação
Fria e cruelmente torturados
Apátridas ao “seu” novo “Partido”
Foram sumariamente executados!
16
Odiados por um simples facto
Que nunca lhes foi perdoado
Gostarem e lutarem pelos “tugas”
Seu único e último... pecado
17
Perante a velada indiferença
Dos políticos e das Nações
É tempo da História julgar
A MAIS ALTA DE TODAS AS TRAIÇÕES
*
Haverá porventura… gesto humano mais divinal…
Q’um homem possa fazer para outro auxiliar…
Que disponibilizar o seu mais supremo bem... a vida?
Jamais deixemos a sua memória alguém desonrar!

4. Recordo que no poste P4934, já o Virgínio Briote apresentou um curto, mas elucidativo currículo do Amadu Bailo Djaló, de que destaco estes significativos parágrafos:

“Recenseado pelo concelho de Bafatá, sob o nº 21 em 1962, foi alistado em 04Jan62, como voluntário, no Centro de Instrução Militar. Depois da recruta em Bolama, seguiu-se o CICA/BAC, em Bissau, depois Bedanda na 4ª CCaç, a 1ª CCaç em Farim, regressou à CCS/QG, depois os Comandos de 1964 a 1966, a CCS/QG outra vez, Bafatá no BCav 757, conhecido pelo “Sete de Espadas”, e daquele transitou sucessivamente para os BCac1877, BCav1905 e BCac2856 (todos sediados em Bafatá) e, em meados de Jul69, foi transferido para a 15ªCCmds, seguindo-se então a 1ªCCmds da Guiné, o BCmds da Guiné, a CCaç21 com base em Bambadinca, o 25 de Abril.

Foi promovido a 1º Cabo em 01Jan66 e louvado pelas actuações em operações no ano de 1966. Novamente louvado em 1967, em OS do BCaç1877, de 30Set67, pelo seu comportamento em acções de combate durante o ano de 1967 (07Jan-24Set67). Transferido para a 15ªCCmds em 01Jan70, foi graduado em furriel em 06Fev70, transitando em 13Fev do mesmo ano para a 1ªCCmds da Guiné.

Graduado em 2º Sargento em 07Nov71, foi louvado pelas acções em que participou durante o ano de 1972. Condecorado com a Medalha de Cruz de Guerra de 3ª Classe em 1973 (embora o seu nome não conste nos 8 tomos do 5º volume da “Resenha...”).

Em 28Jun73 foi graduado em alferes e novamente louvado pela actuação nas operações durante o ano de 1973.

Passou à disponibilidade em 01Jan75, devido à independência do território da Guiné.”

Magalhães Ribeiro
Fur Mil Op Esp/RANGER CCS/BCAÇ 4612/74

Foto: © Jorge Canhão (2009). Direitos reservados.
Emblema: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

(*) Vd. no poste P4934, a menção do VB ao Amadu Bailo Djaló:

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5333: As Nossas Mães (3): Poema dedicado às mães de todos os que não voltaram (José Teixeira)




1. Mensagem de hoje, dia 23 de Novembro de 2009, do nosso camarada José Teixeira*, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70, com um poema dedicado às mães de todos os que não voltaram:






A Virgem, o Menino e Santa Ana, por Leonardo da Vinci, 1510, Museu do Louvre, Paris, França . (Foto: © Wikipédia Enciclopédia livre (2009). Direitos reservados)


Às mães de todos os que não voltaram



Filho.
A mãe está aqui.
Não me podes ver.
Nem eu te posso ver a ti.
Sabes filho, quão grande era a minha dor.
Por não poder abraçar-te,
Transmitir-te tanto amor
Que ficou cá dentro do coração
Abafado.
Esmagado.
Sofrido.
Numa profunda e imensa solidão,
Desde que me disseram,
Que meu filho tinha morrido.
Não.
Não podia ser.
Tu que tinhas uma fome tão grande de viver!
Agora.
Voltaste.
Embrulhado num grito.
Tremendo grito.
Mãe.
Eu não queria morrer,
Porque não queira que ficasses a sofrer.
Filho.
Estou aqui há tanto tempo.
Tanto tempo,
Sem sequer o que de ti ficou
Pudesse ver.
Filho.
Eu estou aqui.
Resisti.
Tanto tempo à espera de ti.
Agora.
Tudo acabou, meu rapaz,
Já podes ficar no eterno repouso.
Em paz.
José Teixeira
1º Cabo Enf da CCAÇ 2381

___________

Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

Guiné 63/74 - P5332: Álbum fotográfico de Vitor Raposeiro (Bambadinca, 1970/71) (1): Em dia de anos do Tony Levezinho, lembrando o nosso Novembro negro (CCAÇ 12, 1969/71)


 Bambadinca >  Zona Leste > Sector L1   Meados de 1970 >  Furriéis Milicianos das CCAÇ 12, unidade africana de intervenção adida à CCS do BART 2917 (1970/72) >  "Sr. Jaquim, Sr. Humberto, Sr. Tê Roda, Sr. Tony,  reconhecem estes putos com vinte e poucos anos?", pergunta o Humberto Reis... O Joaquim Fernandes é o primeiro a contar da direita, seguido do Humberto Reis, do T. Roda (que já nos deu sinais de vida mas que ainda não pertence ao nosso blogue, com muita pena minha...) e, por fim, o Tony Levezinho (que por sinal faz hoje 62 aninhos)...

Foto: © Vitor Raposeiro (2009). Direitos reservados.




Lisboa > Centro Comercial  Colombo > FNAC > 28 de Junho de 20009 > O Tony e a Alice  à conversa, no dia do lançamento do disco dos Melech Mechaya... Ele está a perguntar à Alice quando é que a gente (eu e ela) os vão visitar a eles (Tony e Isabel) a Sagres, onde são os faroleiros da lua... A Alice deve-lhe ter respondido: - Isso, eu bem queria... mas só quando ele se reformar do blogue...





Lisboa > Centro Comercial  Colombo > FNAC > 28 de Junho de 20009  > O Tony, e em segundo plano a Isabel  à conversa com uma amiga nossa, a Ana, de Alfragide. Retirados do buliço de Lisboa, o Tony e a Isabel vêm cá só por causa dos filhos, do neto e dos amigos... De tempos a tempos.



Lisboa > Centro Comercial  Colombo > FNAC > 28 de Junho de 20009  > O Tony e a Isabel estavam entre os nossos amigos que quiseram assistir à exibição promocional do disco dos Melech Mechaya onde toca João Graça (violino)
Fotos (e legendas): © Luís Graça (2009). Direitos reservados.


Nunca esqueço esta data, o 24 de Novembro [de 1970], antes de mais por razões de amizade que ficaram para o resto da vida, e depois por razões circunstanciais:

(i) a 22 de Novembro de 1970, é o início da Op Mar Verde, os nossos vizinhos de Fá Mandinga, a 1ª CCmds Africanos, comandada por João Bacar Jaló, integra a força sob o comando de Alpoím Calvão que invade a Guiné-Conacri; todo o T0 da Guiné está em alerta;

(ii) a 24 o Tony fazia anos (23), e além disso era just married, um homem acabadinho de casar - nas férias - com a Isabel, menina prendada que fazia ballet e ginástica, 17 aninhos, um encanto, ams que ele teve o bom senso de não trazer para a Guiné, e muito menos para a buliçosa Bambadinca; o acontecimento é celebrado pelos amigos com libações de caixão à cova;

(iii) a 25 de Novembro, mandam-nos a toque de caixa, apanhar o ar fresco do Geba e da Foz do Corubal, lá para os lados da Ponta do Inglês, sempore de má memória;

(iv) no dia seguinte, 26, de manhã cedo, apanhámos a mais violenta das emboscadas de que havia memória no Sector L1: 6 mortos, à roquetada, 9 feridos graves...

(v) foi o nosso Novembro negro, com 18 meses de Guiné (*)... Mas isso foi há muito, faz parte hoje dos "nossos pesadelos climatizados"... Ao Tony, que é um discretíssimo membro do nosso blogue, mas o mais afável dos amigos, e à Isabel, sempre querida, aí vão os votos de que passem um belo dia, em Lisboa, na companhia da família mais próxima... Tony, mais logo telefono-te... de Bambadinca! (LG)



 Guiné > Zona  Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Xime >  Cais do Xime, na margem esquerda  Rio Gebam  >  Meados de 1970 > Reconhecem-no ? O nosso Alfero, quando ele quis passar-se para a Marinha... (Em segundo plano, uma LDM). Já agora, rcorde-se que ele também faz aninhos em Novembro, este ano longe, bem longe das bajudas de Fá Mandinga e de Bissaque (**)

Foto: © Vitor Raposeiro (2009). Direitos reservados.

1. Mensagem de Vitor Raposeiro, com data de 15 de Novembro:

Caro companheiro:


Por mero acaso encontrei o vosso blogue acerca da história do pessoal da tropa que passou por Bambadinca em 1970/71.Ora acontece que eu estive em Bambadinca como fur mil. radiotelegrafista do STM [ - Serviço de Telecomunicações Militares] durante esse período e sou possuidor de um vasto arquivo fotográfico desse período e de quem aí viveu (Fur Mil  Levezinho e companhia)!

O meu problema é a memória que me falta para me lembrar dos nomes, de quem conheci, pois eu num processo de autodefesa varri completamente da memória esse período que eu considero que foi muito triste para muita gente.

Posto isto, lembrei-me que talvez lhe enviando as fotografias que eu encontrar, alguém se reconheça nelas o que seria interessante para a história daquele período da nossa vida comum. Aqui fica a minha ideia esperando que seja do vosso agrado.

saudações

Ex-Fur Mil STM Vitor Raposeiro



Bambadinca >  Zona Leste > Sector L1 >  Bambadinca > CCS do BART 29171 (1970/72)  > Em primeiro plano, de máquina na mão, o Vitor Raposeiro, cara que recordo mas que seria incapaz de associar ao seu nome...



Rio Geba, abaixo a caminho de Bissau > c. 1970/71 >  O Vitor Raposeiro, em primeiro plano, e por detrás dele parece-me ser o 1º Cabo At Inf José Marques Alves, de alcunha o Afredo (pertencia ao 2º Gr Comb, da CCAÇ 12, o mesmo do Tony Levezinho e do Humberto Reis; o Alves mora em Gondomar)...


2. Comentário de Luís Graça (ex-Fur Mil Ap Armas Pesadas Inf, CCAÇ 12, Bambadinca, Julho de 1969/Março de 1971):

Meu caro Vitor:

Como eu costumo dizer, sem qualquer ponta de exagero nem de vaidade, o mundo é pequeno e o nosso blogue é... grande. É para isso que, de resto,  cá estamos: para reconhecer e sermos reconhecidos, para procurar e ajudar a encontrar velhos camaradas ... Ainda bem que nos topaste, por que vai ser o início de um belo reencontro... Mas, para isso, tens que me dizer onde vives, mandar-me o teu nº de telefone (para a gente tirar dúvidas e matar saudades),  contar o que estavas a fazer exactamente em Bambadinca (ao serviço da CCS do BART 2917 ? por conta e risco ? O que é que faziam, afinal, os homens do STM, que paravam uns meses por aqui e por acolá ?)... E, já agora, quando chegaste e quando partiste...

Convivemos ainda uns bons meses, lembro-me da tua cara, espero não me enganar...Há muita malta que passou por lá, no teu/nosso tempo, e que vais gostar de recordar, uns mais velhos (como a malta da companhia africana, a CCAÇ 12, a que pertenci eu - o Henriques -, o Humberto Reis, o Levezinho, o Roda, o Joaquim Fernandes, o Piça, o 1º Cabo Cripto Gabriel Gonçalves ...

Para já, convido-te a ingressar na nossa Tabanca Grande: o regulamento do hotel está afixado aí na coluna do lado esquerdo do nosso blogue.  As regras são simples. Podes fazer tudo o que te der na real gana. De preferência, partilha connosco as memórias (mesmo fragmetadas) desse tempo. Se tiveres segredos de Estado a revelar, melhor ainda...

Além de uma foto tua, tipo passe, antiga,  e outra actual, tens de contar a história do bandido, isto, é uma história do teu tempo de Bambadinca, quinze, vinte linhas...É a jóia de entrada no nosso clube... Quanto às fotos que enviaste através do Humberto Reis, vou continuar a publicá-las, tendo criado um álbum só para ti... (O que não é para todos, como podes verificar!).... Vê se me mandas também as datas (pelo menos o mês e o ano), em que foram obtidas as imagens...

Hoje faz anos o Levezinho, o Tony Levezinho, dele pelo que vejo estás bem recordado: era um dos nossos queridos amigos de Bambadinca... Vivia comigo e o  Humberto Reis no mesmo quarto...

Até à próxima, um Alfa Bravo. Luís

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 24 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1315: Fazer anos no mato: os azares do meu amigo Tony Levezinho (Luís Graça)

(**) Vd. poste de 6 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5221: Parabéns a você (38): O nosso Alfero, Jorge Cabral (Cabral só há um, o de Fá e mais nenhum)(Editores)

Guiné 63/74 - P5331: Antropologia (15): Um dos maiores tesouros artíticos da Guiné: os Sônôs (Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Novembro de 2009:

Malta,
Tivéssemos sabido, e não regressávamos da Guiné sem sônôs! Éramos hoje gente rica, os museus pagam um balúrdio por esta arte magnífica.
Oxalá que os que restam na Guiné-Bissau estejam em bom recato.

Um abraço do Mário


Um dos maiores tesouros artísticos da Guiné: Os sônôs
Por Beja Santos

A Guiné despertou muito tarde para o conhecimento de um dos seus maiores tesouros e aí a influência de Avelino Teixeira da Mota foi determinante. Numa entrevista concedida na Emissora da Guiné, em Abril de 1960, o distinto historiador, cartógrafo e etnógrafo explicou como tudo começara. Em 1956, um agricultor pajadinca entregara na administração do Gabu uma série de objecto de ferro e bronze que havia encontrado perto da tabanca Mandinga de Sumacunda (regulado de Tumaná). Eram objectos constituídos por hastes de ferro de cerca de 1.20 metros de altura, com vários braços laterais terminando em esculturas de bronze, geralmente pequenas cabeças humanas, havendo no topo da haste uma escultura maior, também de bronze, representando seres humanos e diferentes animais. Eram inegavelmente símbolos de realeza de antigos régulos, objectos de culto animista, e não seria de excluir de muçulmanos recentemente convertidos.

Começadas as investigações, o historiador rapidamente apurou que os sônôs existiram em todas as áreas em que viveram Soninqués, Beafadas e Pajadincas. A investigação do Teixeira da Mota teve tal densidade, que até eu estive envolvido em pesquisas locais. Conforme referi nos meus livros, em 1969, Teixeira da Mota enviou-me um aerograma a pedir esclarecimento sobre a existência de sônôs na região de Bambadinca. Nada encontrei, foi essa a triste informação que lhe transmiti.

Perderam-se possivelmente quase todos os sônôs, o Museu da Guiné estava apetrechado com diferentes doações, as guerras civis, ao que parece, fizeram desaparecer parte fundamental deste património valiosíssimo. De tudo quanto se estudou na África Ocidental, só se sabe que os sônôs têm semelhanças profundas com esculturas da Serra Leoa, mas continua na bruma a origem desta arte original.

Seria bom que as autoridades culturais da Guiné-Bissau procurassem um inventário do que existe no seu país, em Portugal e no mundo. Quem os colecciona certamente que troca informação. E não há museu que não se orgulhe de mostrar estas preciosidades. Aqui fica a imagem de dois sônôs descobertos por Teixeira da Mota e foram publicados no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. Se algum dos tertulianos possui um sônô, é bom que saiba que tem um tesouro à sua guarda.


__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5326: Notas de leitura (35): A Geração do Fim, memórias de um Curso de Infantaria de 1954 (Beja Santos)

Vd. último poste da série de 9 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4312: Antropologia (14): Dança dos bijagós, uma redacção escolar, de 1958, do menino Abreu (António Graça de Abreu)

Guiné 63/74 - P5330: Efemérides (38): Funeral das ossadas do 1º Cabo Gabriel Telo (Magalhães Ribeiro)

1. Com a devida vénia e todos os nossos melhores e mais respeitosos cumprimentos e agradecimentos, publicamos neste poste da autoria do jornalista Alberto Pita, inseridos no Jornal da Madeira, dos dias 22 e 23 de Novembro de 2009, duas excelentes e elucidativas reportagens referentes à chegada das ossadas à Madeira e ao funeral do 1º Cabo Gabriel Telo, falecido em combate em Guidage em 25 de Maio de 1973:





Jornal da Madeira / 1ª Página / 2009-11-22

Ossadas de Gabriel Telo são levadas hoje para o Paul do Mar

Emoção na chegada de Telo



«Filho, a mãe está aqui!». Foi com estas palavras que Flora Telo recebeu ontem as ossadas do filho, o primeiro cabo Gabriel Telo, na Capela do Monumento ao Combatente, na Mata da Nazaré.


Apoiada pelas duas filhas, Maria João e Gabriela, Flora Telo caminhou vagarosamente em direcção à pequena urna. Não estava a mais de dois metros de distância, mas o esforço foi grande para esta mulher, ainda a recuperar da operação aos joelhos.


Pousou as mãos sobre a urna como quem afaga um bebé e, com os olhos molhados, beijou-a. «Filho, a mãe está aqui», disse uma e outra vez, por entre os soluços do choro.


Dentro e fora da sala do Monumento ao Combatente o silêncio era total. Por entre dezenas de pessoas presentes na homenagem, apenas as palavras de Flora se ouviam. «A mãe está aqui.» A emoção era forte.


O reencontro acontecia. Trinta e seis anos depois.


Não era só Flora Telo que tinha os olhos vermelhos e cheios de lágrimas. As filhas também não conseguiam conter os sentimentos.


«Sinto uma grande emoção por ficar próxima dos restos mortais do meu irmão. Sei que ele já estará no céu, mas aqui o que desejávamos era fazer-lhe um funeral digno. E é o que estamos preparando», disse Gabriela Telo, irmã do antigo soldado, dois anos mais nova, e o elemento da família com quem as entidades militares contactaram ao longo do processo de transladação.


Gabriela confessou ontem que durante os três anos em que aguardou pela chegada do irmão teve momentos de desespero e chegou até a perguntar aos militares responsáveis se «estavam a brincar com os sentimentos das pessoas». Explicavam-lhe que o processo era complexo e moroso e apelavam à paciência da família. A ansiedade foi sendo controlada. «Até que hoje chegou o dia. É uma grande satisfação», diz, por entre lágrimas.


Maria João, irmã mais nova, sentia ontem um misto de emoções. Estava alegre pela chegada das ossadas, mas triste por esse momento trazer de novo toda a dor.


Gabriel Telo sucumbiu em 25 de Maio de 1973, na sequência da explosão de um engenho detonado pelo inimigo, em Guidaje, na Província da Guiné, durante a Guerra do Ultramar.


O primeiro cabo Telo pertenceu a um grupo de onze soldados que morreram na guerra e que foram enterrados na mesma zona, apesar de terem sucumbido em momentos diferentes. Entre eles estavam três pára-quedistas. E, a bem da verdade, foi por causa dos três elementos desta força especial que as ossadas do cabo Telo, natural do Paul do Mar, chegaram agora à Madeira.


Os pára-quedistas têm o lema de que “Ninguém fica para trás” e, durante mais de trinta anos, não desistiram até que trouxessem os três «únicos» que não tinham regressado a Portugal. Agora, finalmente, chegaram.


Numa acção de solidariedade, a União dos Pára-quedistas estendeu a mão e trouxe os outros militares que estavam juntos aos pára-quedistas. Mas só os que as respectivas famílias quiseram. Algumas optaram por não voltar a abrir a dor da perda de um ente querido. Uma delas foi a família de Câmara de Lobos, do soldado João Nunes Ferreira.


A chegada dos restos mortais de Gabriel Telo representa o encerramento de um capítulo com mais de três décadas e que nos últimos três anos obrigou a um enorme esforço logístico, com o início do processo no terreno. O sucesso desta operação decorre da ajuda de várias instituições, com particular mérito para a União dos Pára-quedistas, que foi quem desencadeou todo este processo.


A ligação à Madeira foi feita, sobretudo, com a organização do Monumento ao Combatente, liderada pelo coronel Morna Nascimento.


Ontem, na homenagem feita ao cabo Telo, Morna Nascimento dizia que agora é chegado o tempo de alertar o país para a obrigação de o Governo da República custear as transladações dos portugueses que morreram na guerra e por lá ficaram.


Alberto Pita


Jornal da Madeira / 1ª Página / 2009-11-23

«Agora ele está na sua terra»

Funeral do cabo Telo realizou-se na presença de centenas de pessoas


A Centenas de pessoas juntaram-se ontem na igreja do Paul do Mar para a última despedida ao primeiro cabo Gabriel Telo, morto em combate há 36 anos, na Guiné Bissau.


A cerimónia fúnebre encerra um processo de um grupo de soldados, dos quais faziam parte dois madeirenses - o cabo Telo e o soldado João Nunes Ferreira. O processo de exumação dos cadáveres e trasladação para Portugal demorou cerca de três anos. A União dos Pará-quedistas foi quem desencadeou este resgate - estavam três elementos desta força especial entre os 11 cadáveres - que agora chega ao fim com este funeral, o último dos corpos que foram retirados de Guidaje, na Guiné Bissau.


«Fechámos, de facto, um ciclo cujo objectivo era trazer os corpos que tinham sido inumados naquele cemitério de campanha, na Guiné», explicou o presidente da União de Pára-quedistas, o general Avelar de Sousa, que ontem marcou presença na cerimónia. Várias entidades associaram-se, aliás, a esta última homenagem ao soldado, falecido a 25 de Maio de 1973 (e não 1963 como erradamente escrevemos ontem). Miguel Mendonça, presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, colocou de manhã uma coroa de flores junto à urna do militar, quando ainda se encontrava no Monumento ao Combatente Madeirense no Ultramar. Um pouco mais tarde, já no Paul do Mar, freguesia de ontem o cabo era natural, estiveram presentes no funeral Monteiro Diniz, Representante da República para a Madeira, Brazão de Castro, secretário regional dos Recursos Humanos, Manuel Baeta, presidente da Câmara Municipal da Calheta, entre outras individualidades.


O processo de exumação e trasladação das ossadas do cabo Telo abriu na família uma ferida que há décadas tentavam sarar. A mãe, Flora Telo, nunca deixou, porém, que a memória do filho fosse esquecida. Por isso, durante os últimos 36 anos repetia insistentemente histórias sobre Gabriel, realçando as qualidades deste jovem, que foi sacristão na igreja que, anos antes, chegou a ajudar a erguer. O mesmo templo que ontem acolheu a cerimónia da sua despedida.


Ontem, a comoção impedia Flora Telo de dizer o que representava para si aquele momento.


No dia anterior, porém, confessou ao Jornal da Madeira ainda sentir «uma saudade grande do meu filho». E com o olhar em direcção ao céu apelou para que Gabriel Telo pedisse por todos os que «mais necessitam».


«Era um filho bom, querido, que desde pequenino» ajudou na igreja, recordava-se.


A vinda dos restos mortais abriu na família feridas do passado, mas, apesar dos momentos de dor e ansiedade, ninguém se arrepende da decisão.


Ontem, Gabriela Telo, irmã dois anos mais nova, dizia sentir uma «satisfação» por agora Gabriel estar «mais perto» da família.


Maria João, a mais nova das irmãs, disse sentir «uma mistura de emoções impossíveis de descrever».


Ainda assim, referiu que naquele preciso momento, à saída do cemitério, sentia «uma alegria, porque ele está na sua terra. Estes últimos dias foram de saudade, de revolta, mas agora, que ele já está aqui no nosso cemitério, na terra dele, agora é um alívio».


Com o funeral do cabo Telo «fechámos, de facto, um ciclo cujo objectivo era trazer os corpos que tinham sido inumados naquele cemitério de campanha, na Guiné», disse o presidente da União de Pára-quedistas, o general Avelar de Sousa, que ontem marcou presença na cerimónia de despedida do militar madeirense, falecido há 36 anos na Guiné Bissau.


Ainda faltam buscar 1.400 portugueses


Continuam cerca de 1.400 militares portugueses enterrados em África. São soldados que sucumbiram em combate mas que o Estado português não custeia o seu regresso ao país.


Os militares pressionam as autoridades mas o resultado tem sido nulo.


Para esse processo, a União Portuguesa de Pára-quedistas está disponível para contribuir com a experiência adquirida no processo de exumação, identificação e trasladação dos cadáveres de Guidaje, na Guiné Bissau.


«A União dos Pára-quedistas está disponível para prestar auxílio através de tudo aquilo que aprendemos», referiu presidente desta associação, o general Avelar de Sousa.


O presidente da  Comissão Organizadora do Monumento ao Combatente Madeirense no Ultramar, Morna Nascimento, também diz que é tempo do Estado cumprir a «sua obrigação».


É tempo de «chamar à responsabilidade o Governo português para a obrigação que tem de fazer regressar à metrópole - seja à  Madeira, aos Açores ou ao continente - as ossadas que ainda lá estão dos combatentes que foram num dever pátrio e por conta do Estado para o Ultramar. Não se aceita que eles fiquem lá abandonados e que as famílias é que tenham de pagar o seu regresso. É uma obrigação do Estado, é uma obrigação da Nação e uma obrigação de Portugal trazê-los de regresso ao chão da sua Pátria», defendeu Morna Nascimento, sublinhando que morreram em combate ou por doença 8.402 portugueses África. O coronel não sabe, contudo, quantos destes eram madeirenses.


Alberto Pita


Reportagens e Fotos: © Jornal da Madeira (2009). Direitos reservados.
___________


Nota de M.R.:


Vd. último poste desta série em: