sábado, 31 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6813: Tabanca Grande (234): Tina Kramer, 27 anos, etnóloga, da Universidade de Frankfurt, Alemanha

1. Mensagem de hoje, da Tina Kramer (*)

Assunto: foto e descrição

Olá,  Luís,

Tudo bem?

Mando-te uma foto minha e uma pequena descrição minha:

Nasci no dia 31 de Outubro em 1982 numa vila no leste da Alemanha. Depois da escola,estudei Estudos Africanos e Estudos da Cultura em Leipzig. Trabalhei em Malawi e fiz pesquisas no Togo.  Quando terminei o meu Mestrado,  ensinei e trabalhei num projecto de arquivamento (fotos de antigas missões alemãs na África). Ao mesmo tempo eu fiz pedidos para projectos em várias universidades.

Escolhi estudar mais a África Lusofóna, porque estes países ainda são pouco conhecidos no meio científico na Alemanha. Tive sorte e depois de algum tempo os membros dum projecto da universidade de Frankfurt (Instituto de Etnologia)  gostaram da minha ideia.

Portanto mudei-me para Frankfurt e agora estou aqui para fazer pesquisas. Estudo as memórias da Guerra Colonial/Guerra de Libertação na Guiné-Bissau, do povo em Portugal e na Guiné-Bissau hoje em dia. Significa que quero saber quais são as formas de memória e através de que meios as pessoas   recordam  a Guerra.

O que me interessa particularmente são as ligações e as interdependências entre os tratamentos do passado entre a Guiné-Bissau e Portugal. Por isso gostava falar sobretudo com alguns participantes da guerra, artistas, jornalistas que estavam ou estão em contacto com Guiné-Bissau.

Em Frankfurt o meu orientador é o etnólogo Mamadou Diawara, mas eu ficaria  se aqui o Jorge Cabral puder ajudar-me como "padrinho" uma ou outra vez.

Um abraço da
Tina

2. Comentário de L.G.:

Tina, entendo o teu mail como uma resposta ao meu convite para ingressares na nossa Tabanca Grande (**). O interesse é mútuo, teu e nosso. Aqui tens um fonte de documentação notável, ao alcance de um clique... Tens por outro a boa vontade de centenas de amigos e camaradas da Guiné, portugueses, guineenses e outros, que poderão colaborar contigo como membros do blogue, interessados em ajudar a produzir e a reproduzir  a(s) memória(s) da guerra da Guiné, 1963/74, que opôs o PAIGC às autoridades coloniais portuguesas, e que conduziram à independência da Guiné-Bissau, hoje país lusófono, nossos irmão, da CPLP - Comunidade de Países de Língua Portuguesa. Fica bem. Dá notícias. Escreve um pouco mais sobre o teu plano de trabalho de campo.

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Notas de L.G.:

(*)  Vd. postes de:

26 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6791: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (2): Tina Kramer, etnóloga, Universidade de Frankfurt, em trabalho de campo, em Lisboa


 22 de Julho de 2010  >  Guiné 63/74 - P6774: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (1): Pedido de colaboração da doutoranda alemã Tina Kramer 

(**) Vd. último poste da série > 26 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6786: Tabanca Grande (233): João Crisóstomo, ex-Alf Mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole, Missirá, 1965/66), e grande português da diáspora

Guiné 63/74 - P6812: Ser solidário (83): A partir de hoje, aqui em Amindara estamos a viver como os brancos (José Teixeira)

A partir de hoje, aqui em Amindara estamos a viver como os brancos…

Foi com este linda e saborosa frase que o Chefe da Tabanca de Amindara anunciou aos seus familiares em Bissau que Amindara já tinha água fresquinha e boa, ali a 18 metros de profundidade e não a cerca de três quilómetros, enquanto as mulheres e as crianças em delírio cantavam e dançavam.

Esta atitude espontânea e sincera do Chefe de Tabanca de Amindara, demonstra bem como aquela gente se contenta com pouco para se sentir feliz. Um "pouco" que é imenso. Apenas uma torneira de água fresca e potável para toda a Tabanca.

Agora já não é preciso ir buscá-la a quilómetros de distância, à bolanha ou a uma lagoa na floresta sem a mínima garantia de salubridade.

Agora as crianças da escolinha local já podem beber água a qualquer hora do dia.

O seu sonho de décadas realizou-se graças a solidariedade dos antigos combatentes portugueses, seus familiares e amigos.

Foi dia di ronco, garandi ronco para Amindara que se vai repetir em breve na tabanca de Medjo, porque a solidariedade não tem fronteiras.

Agora só falta colocar o depósito para garantir que a água não falte, mesmo nos dias de chuva

Já arrancamos em Medjo.

Os poceiros (especialistas da AD em abrir poços) já lá estão a trabalhar. Dentro de alguns dias os habitantes de Medjo terão água potável junto à porta de casa.

Como ainda não dinheiro para o equipamento terão de puxar a água a balde.

O dinheiro conseguido ainda está longe de responder às necessidades para cobrir as despesas com a abertura do novo poço em Medjo, mas... eu acredito.

José Teixeira

Os poceiros e a obra acabada

A Alegria das mulheres
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Notas de CV:

Vd. http://www.adbissau.org/adbissau/noticias/2010.07.30.1.pdf no site da AD

Vd. poste de 27 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6796: Ser solidário (82): Arrancou da melhor maneira a campanha de fundos para se abrir um poço em Medjo (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P6811: Notas de leitura (139): Contos Mandingas, de Manuel Belchior (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 29 de Julho de 2010:

Queridos amigos,
Estou quase a fazer uma pausa, regresso às lides aí por 10 de Agosto.
O cabaz de leituras não pára de crescer, é uma permanente tentação. Mas não posso desleixar-me mais o livro que tenho em mãos, praticamente suspenso há dois meses por afazeres profissionais.

Um abraço do
Mário



Contos Mandingas: voltar a um clássico de Manuel Belchior

por Beja Santos

Manuel Belchior foi um prestigiado funcionário colonial, tem uma vastíssima bibliografia onde Moçambique e a Guiné ocupam lugar de relevo. Em 1971 editou os seus “Contos Mandingas” (Portucalense Editora), que mereciam, tal o valor histórico-cultural e a beleza narrativa neles contidos, uma justa reedição.

O investigador justifica o seu trabalho depois de ter permanecido largos meses, entre 1967 e 1968, na região de Bafatá e Gabu, trabalhando com fulas e mandingas num inquérito etnológico. Ao fazer o inventário do material recolhido, descobriu, muito agradado, que recolhera quase uma cinquentena de contos e fábulas. O conjunto de generalidades sobre o povo mandinga ainda hoje se lê com deslumbramento. Não querendo abstrair o número de mudanças operadas nos últimos 40 anos, continua a ter a maior utilidade o que Manuel Belchior escreve sobre a distribuição dos mandingas no território da Guiné-Bissau, as suas origens, o tipo de povoamento, a sua organização familiar, social e política, a religião, a visão do trabalho, as actividades económicas e os divertimentos.

Dito resumidamente, até aos anos 70 do século passado, os núcleos principais da população mandinga distribuíam-se pelas regiões do Gabu, por Gussará, Ganadu e Badora (Bafatá) e região do Oio (Farim e BIssorã). Os mandingas pertencem ao grande ramo dos negros sudaneses, aparecem historicamente relacionados com os povos mandés, com o império de Ghana e mais tarde o império Mali. Tornaram-se na etnia preponderante até ao século XIX, quando foram derrotados pelos Fulas. Em termos de organização social, a generalidade da população dedica-se à agricultura, mas já que ter em conta os artífices (como os ferreiros, os ourives, os tintureiros e os sapateiros) os cantores e músicos e os comerciantes.

Os contos e fábulas recolhidos são um repositório impressionante da amálgama e do sincretismo cultural dos mandingas: a influência do Corão e do animismo; a influência da literatura árabe e da narrativa oral africana; a exemplaridade de justiça muçulmana, o rigor a que se deve sujeitar o comportamento do soberano justo; o prémio da fidelidade do amor; a importância do Irã, a divindade protectora dos povos animistas; a história dos clãs; o castigo da inveja e da infidelidade, entre outras manifestações.

O fabulário mandinga tem atraído muitos investigadores, nele se cruza um vasto património de narrativas morais que acabam por aparecer na generalidade das narrativas de toda as etnias. O estudo que Benjamim Pinto Bull fez às fábulas crioulas decorre deste complexo interétnico: envolve lobos que comem cabras, lebres ladinas que conversam com jagudis e crocodilos; serpentes que esperam a hora de vingança; lobos que conversam com hipopótamos, mas há também morcegos, leoas, macacos e personagens como os curandeiros.

Enfim, contos e lendas onde encontramos toda a trama da história, da língua, da educação, dos conceitos de direito e justiça deste povo. A problemática religiosa, insiste-se, tem bastante complexidade. Não só o mandinga islamizou povos pelo poder da espada como se mantém intransigente na recusa em abandonar as práticas de fundo animista (caso da circuncisão).

Quem puder, não se furte ao esplendor desta literatura que ajuda a dissipar o preconceito de que estes povos não possuem um elevado recorte literário.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 30 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6808: Notas de leitura (138): Os Tempos de Guerra De Abrantes à Guiné, de Manuel Batista Traquina (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6810: Parabéns a você (135): Para o Manuel Reis, com miminhos de todo o pessoal da Tabanca Grande, incluindo os que fugiram... da canícula (Miguel e Giselda Pessoa, Luís Graça, Vasco da Gama)


"Aquele que conhece o inimigo e se conhece a si mesmo sairá vitorioso de cem batalhas; aquele que se conhece a si mesmo mas não ao inimigo, por cada vitória conquistada conhecerá uma derrota; aquele que não se conhece a si mesmo nem ao inimigo será derrotado em todas as batalhas" (In: Sun Tsu,  A Arte da Guerra, Séc. VI a.C.)



1. Mensagem do Luís Graça, editor:


Manuel Reis, querido camarada e amigo:

Esta é a pior altura do ano para um tabanqueiro fazer anos, porque a debandada, na Tabanca Grande, é geral... Meteu tudo licença de verão, ou melhor os amigos e camaradas da Guiné terão debandado face à iminência do ataque do General Verão ... Eu próprio parti hoje para férias, para fugir da canícula de Lisboa... Mas tinha o compromisso, assumido logo no princípio do mês, de editar este poste, em tua honra...

Eu escolhi o dia para ir de férias, tu não escolheste o dia nem a hora nem os progenitores nem a terra, para nasceres... Mas ainda bem que nasceste cá nesta santa terrinha e te puseram o nome de Manuel... A minha obrigação é, pois, a de dar-te os parabéns por este dia, para que se repita por muitos anos, em paz e liberdade, e com saúde, muita saúde. Em meu nome e em nome de todos nós, tabanqueiros desta Tabanca Grande, reunidos à volta do poilão onde todos os dias vamos reconstituíndo, peça a peça, letra a letra, byte a byte, pixel a pixel, o puzzle da(s) nossa(s) memória(s)... Como eu costumo (re)lembrar, agora o único inimigo que temos o tempo, ou a falta dele...

Mas vamos às prendas... Tens aqui mais dois miminhos: uma lembrança do Miguel, em nome dele e da Giselda, que ele teve também o cuidado de nos mandar com a devida antecedência, antes de ir para o seu retiro de Sesimbra... E, mais em cima da hora, acabadinha de chegar à Lourinhã por estafeta especial, uma mensagem do almirante de Buarcos, o teu/nosso grande amigo e camarada Vasco da Gama...

Julgo que ele, o Vasco, disse, com aquela frontalidade e sinceridade que lhe conhecemos, tudo aquilo - o essencial - que te queríamos dizer. Ele tem, sobre mim, a grande vantagem de te conhecer de longa data, e de poder usar o privilégio da amizade e da antiguidade. Ele não, contrariamente a mim, uma amigo da 24ª hora...
Eu vou-te conhecendo dos nossos encontros virtuais e reais, ainda pouco mas já o suficiente para poder dizer, em público, no terreiro da Tabanca Grande, jurando a todos os irãs, que tem vindo a aumentar o meu apreço e consideração pelo camarada que estava em Guileje no dia 22 de Maio de 1973... e que tem orgulho em ter sido um Pirata de Guileje.

Manuel: Espero poder-te encontrar em breve quando vieres (se puderes vir, como eu espero) a São do Martinho do Porto entregar à AD - Acção para o Desenvolvimento, na pessoa do seu director executivo, Pepito, em férias, a pequena contribuição, em dinheiro, ofertada pelo Grupo de Amigos da Capela de Guileje, numa campanha que aceitaste liderar, dando a cara e disponibilizando o nº da tua conta bancária...

Um chicoração apertado do Luís Graça.

Infogravura: Miguel Pessoa (2010). Direitos reservados


2.  Mensagem do Vasco da Gama:
Antes de Camarada, Amigo, que continuo a ser depois de ter sido Camarada, Manuel Reis, quero neste dia do teu aniversário, registar a minha patente de camarada e amigo, antes, durante e no pós 25 de Abril.

Eu, que por tantas vezes discordo da tua opinião sobre assuntos tão díspares, que tu retrucas com a mesma moeda e por vezes com maior vivacidade;

Eu, que contigo converso ao telefone durante horas (sem exagero), acerca de tantos assuntos;
Eu, que admiro a tua frontalidade na defesa dos teus pontos de vista, quando outros, por motivos que não descortino, se "encolhem";

Eu, Vasco, quero no dia de hoje dar-te um abraço de parabéns bem apertado, de amigo, e desejar que as nossas conversas/discussões, continuem até ficarmos como os Marretas, por todo o sempre, aqui, onde a sombra do poilão se vai encurtando cada vez mais, ou noutro qualquer lugar, onde nos sintamos melhor.

Obrigado Manuel Reis

Até sempre,

Vasco A.R. da Gama

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6809: Controvérsias (100): O que é que o País pode dar aos ex-combatentes? (José Brás)

1. Mensagem do dia 29 de Julho de 2010 de José Brás*, ex-Fur Mil, CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68:

Que belo texto o do camarada Pereira da Costa

Camarada Pereira da Costa
Bem, camarada... depois disto** o que poderei eu dizer sem correr o risco de me apoucar a mim, sem pedalada de entendimento e de expressão para te acompanhar na discorrência e na agilidade com que pensas e dizes, e de te apoucar a ti próprio por, banalizando-me no discurso, banalizar também o teu.

À fala episódica de António Barreto, confesso que nem liguei muito, no hábito que estou (estamos todos?) do paleio sem outro fim que o... paleio.
Sei que posso ser injusto nisso como injusto já fui em tantas coisas e nem por isso me suicidei nem de mim fugi, nem dos injustiçados ocasionais. Mas vou em frente e siga a dança, aguentando dores e prazeres.

É o teu texto que me preocupa. Quer dizer, preocupa porque me dá que pensar, que moer a castanhola e tomar parte por consciência ou apenas pelo instinto.
E que diabo, para que necessito eu de chatear-me a pensar e a tomar parte em coisas que marcam ainda (ou sempre marcarão), se daqui a um bocado dá o Sporting (são agora 18h45), logo à noite posso ver o "quem quer ser milionário", ou imaginar-me a ganhar o euromilhões (não jogo)?

Perguntar não ofende, dizemos todos quando perguntamos coisas que talvez não sejam de responder. E tu perguntas. Perguntas, primeiro, "o que se entende por ex-combatentes?".
Eu não sei responder a isso, tu não estarias à espera que o fosse e, provavelmente nem acreditas que haja alguém capaz de te dar uma resposta que não seja de circunstância, uma resposta de cimento, dura, angular e firme, justa e idealmente completa.

Posso dizer algumas coisas. Posso.

Por exemplo! Eu, José Brás, gajo nascido nas desgraças das vinhas da Estremadura, vítima desde cedo das trapaças de comerciantes de meia tigela, ladrões do suor e do sangue de outros, eu que toda a gente sabe ter já uma dessas ideologias que me venderam manhãs que cantam e homem novo, quando daqui parti para a Guiné, eu que nessa esperança admirava os que na África pegavam em armas para nos combater, alegadamente na senda de uma libertação qualquer, saí daqui já combatente porque nem me passava pela cabeça deixar de cumprir uma obrigação que os meus vizinhos de Alenquer, do Porto e de Faro tinham de gramar.

E tinha uma consciência de Nação que se sobrepunha à tal simpatia pelo inimigo. Nessa consciência, bem ou mal assumida, não cabia a fuga que me propunham antes do Niassa. Nessa consciência não cabia deixar de combater quem nos combatia, ainda que a ideia de matar me fosse um facto de horror. Nessa consciência não cabia abandonar um companheiro fosse onde fosse e custasse o que custasse.

Libertamo-nos todos os dias de alguma prisão e todos os dias construímos novas. Daí que a ideia de liberdade seja o que é no concreto, concretizado o sonho de a atingir.

De volta, vivo e inteiro mas com marcas, o facto de ser ex-combatente não me perturbou o re-engajamento no combate da "guerra de cá", nem ninguém no seio das organizações onde me alistei me questionaram uma vez fosse.

Por vezes, eu próprio me ponho em dúvida, indagando-me se o que aceitei do modo que digo, daqui partindo para um combate que rejeitava, obedecia a um desígnio qualquer, elevado pela ideia pátria e de nação, ou apenas porque sempre assim fui, também noutras coisas da vida, aceitando pegar os toiros mais difíceis, realizar o maior esforço e o maior quinhão de trabalho.
É que isto pode não ter em si qualquer virtude, antes ser uma manifestação qualquer de egoísmo ainda que posto de avesso, uma galhardia marialva, um defeito qualquer de personalidade.

Recusei a fuga cá e lá, embora me fosse prometido que melhor seria a minha vidinha na Suécia do que o caminhar nas picadas da Guiné.
Mas nunca tive em pouca conta aqueles que lutaram contra a guerra porque lutavam contra o regime que decidira a guerra em vez da conversa.
Em pouca conta sempre tive os que fugiram, pura e simplesmente, por vezes apesar de concordarem com regime.

Porém falar de mim, aqui, só vale na medida em que o eu que sou, não é mais do que o eu que sou nos outros e que os outros, cada um que teve que embarcar de má ou de boa vontade, são em mim.

Somos um povo, diz-se, e diz-se porque temos uma cultura, um conjunto de valores assumidos como bons e maus que divergem do colectivo para o individual com diferenças de um para outro, é certo, mas ligeiras diferenças.
Temos uma história. E temos histórias dentro dessa história, nem todas bem contadas, evidentemente, mas assumidas assim e por isso tornadas património.

Bem sei que muitos desses valores são universais, ou quase, e por isso nos aproximando de outros povos e de outros deuses, como o desejo de felicidade individual, dito assim sem esmiuçar caminhos.
E esses irmãos que daqui saíram para guerrear, navegaram e espingardaram justamente em nome desse património colectivo que é Portugal, concordando ou não com a partida e com o fogo das armas no lugar da paz da palavra.
Somos todos, portanto, ex-combatentes, sem termos que espremer muito o texto na busca de funduras maiores na alma de cada um.

Outra pergunta que colocas é o de saber "o que é que os ex-combatentes querem, devem querer ou será justo que o País lhes dê?", naturalmente porque ouves e lês, que é quase a mesma coisa, ouves e lês sobre protestos contra governantes e governos por falta de consideração por quem assumiu sacrifícios, correu o risco supremo da própria vida, passou por fomes e sedes, viu morrer amigos, e agora se vêm quase escondidos, como se o tal país que somos, o tal povo que somos porque éramos e não podemos ter deixado de ser, parece que se envergonha deles.

É justa a pergunta porque, verdadeiramente, ou descemos ao conhecimento de caso a caso, o que é difícil e inconclusivo, ou olhamos a floresta e nela nada vemos de diferente do que é dado a outros que não malharam com os costados em África naquela ocasião e naquele propósito.

Voltámos, na aldeia os vizinhos fizeram festa, integrámo-nos aos poucos na chamada normalidade, tivemos empregos, construímos famílias, fizemos filhos que cresceram e nem sabem do pai que foi à guerra, envelhecemos em pobreza ou abundância como acontece a todos os outros, queixamo-nos de reumático como os outros, temos manias que podem ser ou não trazidas da guerra.

Acredito que há muita gente que esteve na guerra e que sofre, uns por restos de memórias e de pancadas físicas, outros por coisas comezinhas do dia a dia.
Casos que conheço, faltas de braços, de pernas e de outras coisas, o País paga-lhes o que pode pagar, pouco, como sabemos mas não diferente dos que se inutilizaram na fábrica ou no campo.

Homenagens? Quem as quer fora do quadro das individuais ou quase, que são prestadas pelos mais próximos, a Câmara Municipal, a Junta de Freguesia, o clube do bairro.
Ou aquelas que nos prestamos nós entre iguais, entre nós, no convívio, na conversa, nas memórias, no amor que afirmamos por aquela gente sofredora, ainda que saibamos que nem todo o amor é puro.

Uma questão que perpassa quase apenas como sugestão mas sempre bem presente no teu belíssimo escrito é a da liberdade que se perdia e se ganhava.

O PAIGC lutava pela liberdade do seu povo.
Lutava?

Acho que sim, nos poemas que circulavam na cabeça de Amílcar Cabral.

E nós perguntamos legitimamente e sem o mínimo cheiro de colonialismo se a têm ou, sejamos ousados, se a teriam mesmo que com Amílcar vivo.

E a liberdade porque lutava eu e tu, provavelmente, e muitos portugueses, cada um à sua maneira, onde está?

E que liberdade esperamos nós como povo no caminho global das lutas pelo poder do capital financeiro?

Como diz o poeta "caminhante, não há caminho, andando se faz-se o caminho", ou então que "não interessa chegar, interessa é o caminhar".

Dizes tu que Álvaro Barreto é um brilhante estudioso da realidade social portuguesa e não serei eu a negar-te razão.
Contudo, também não deixarei de dizer-te que lhe conheço algumas... ia a dizer sacanices, mas talvez seja exagerado, preferindo dizer então, algumas parvoíces.
E depois há o dito popular "de boas intenções está o inferno cheio".

Envio este texto acabado de escrever e, por isso, provavelmente com erros e palavras erradas. Mas acho que deve marchar mesmo assim, porque fruto do verbo desencadeado no teu.

Abraços
José Brás
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 25 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6785: Lugares de Passagem, a minha próxima ficção (José Brás)

(**) Vd. poste de 29 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6805: Controvérsias (99): O que é que o País pode dar aos ex-combatentes? (António J. Pereira da Costa)

Guiné 63/74 - P6808: Notas de leitura (138): Os Tempos de Guerra De Abrantes à Guiné, de Manuel Batista Traquina (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 28 de Julho de 2010:

Queridos amigos,
O Manuel Traquina prima por ser despretensioso, presta no seu livro uma justa homenagem aos condutores e mecânicos.
Confesso que estava a ler e dei conta da tremenda injustiça que foi não ter dado o justo relevo aos condutores e mecânicos que tanto me ajudaram no Cuor e na região de Bambadinca.
O que seriamos nós sem aquelas máquinas a rugir pela picada fora?

Um abraço do
Mário


Memórias de um tempo de guerra, algures entre Bula e Buba

Beja Santos

Chama-se Manuel Batista Traquina, faz parte da nossa agremiação e vazou em livro as suas memórias e considerações colaterais sobre a guerra que experimentou entre 1968 e 1970. O produto final toca pela simplicidade e desafectação: “Os Tempo de Guerra, De Abrantes à Guiné”, por Manuel Batista Traquina, Edição Palha de Abrantes, 2009.

No essencial, temos aqui o registo da CCaç 2382. O seu comandante, Carlos Nery Sousa Gomes de Araújo sente orgulho em recordar no prefácio um comentário de Carlos Fabião quando este assumiu o comando o COP4, assim se referindo à CCaç 2382: “A melhor companhia do Sul da Guiné”. Foi uma companhia afortunada, só dois dos que tinham embarcado em Maio de 1968 é que morreram.

Manuel Traquina era o responsável pela manutenção do parque de viaturas. Mas o seu registo tem um espectro muito amplo: reúne as suas reminiscências desde que assentou praça nas Caldas da Rainha, a sua passagem pela Escola Prática de Serviço e Material, depois Elvas, mais adiante Beirolas, e depois Abrantes, já com a CCaç 2382; o prato substância, claro está, serão os acontecimentos que ele viveu no teatro de operações, sobretudo de Bula a Buba.

Escreveu em jornais a sua experiência, tece considerações sobre a legitimidade da guerra, não esqueceu as viagens do fim-de-semana (sempre com a gasolina partilhada pelos companheiros de viagem), vai observando a composição social e não foge aos comentários. Por exemplo, em Beirolas, no Depósito Geral de Material de Guerra: “Neste aquartelamento depressa me apercebi que ali se encontravam filhos de gente importante, bastante influentes para que os filhos ali passassem o serviço militar, sem o risco e o inconveniente da guerra colonial. Havia mesmo aqueles que entravam e saíam trajando civilmente e que à porta do quartel deixavam estacionados Ferraris e outros carros idênticos, que deixavam transparecer a vida abastada dos seus proprietários”.

Dentro das suas memórias, insere os documentos da história da unidade, não se coíbe do seu mister de cronista. Em 1 de Maio de 1968 embarcam no Niassa. As memórias ganham a partir daqui mais vivacidade: as referências ao infortunado Ramiro Duarte; a evocação da companhia como uma família de 160 pessoas; o colorido e a lufa-lufa de Bissau; um apanhado sobre a guerra da Guiné; a morte do Flora da Silva, um manjaco corajoso, cuja vida se perdeu perto de Bula; a descrição da Mampatá; o ataque a Contabane em 22 de Junho, que reduziu a tabanca a cinzas; as vicissitudes do furriel Pinho, o zelador das Transmissões; vicissitudes das colunas entre Buba e Aldeia Formosa; o sapateiro de Nhala, que não se sabe muito bem se era ou não agente duplo; história de “Os Maiorais”, como era conhecida a CCaç 2381; lembranças de crianças, como aquele pequeno Mamadu, que resolveu ir à caça das rolas com a Mauser e surpreendeu os guerrilheiros que se preparavam para um ataque a Mampatá; a vida operacional em Buba.

Buba está no coração das suas memórias, histórias de lavadeiras, quezílias entre militares, brincadeiras de mau gosto, a chegada do correio, os jogos de futebol, as letras de fado adaptadas às circunstâncias da guerra, as dores dos sinistrados, a nova estrada entre Buba e a Aldeia Formosa que se revelou não servir para nada, as pescarias no rio Grande de Buba, a homenagem aos condutores e aos mecânicos.

Manuel Traquina procura associar o leitor à compreensão do território: os rios, a existência de prisioneiros de guerra, como se chegou ao desenho do distintivo da CCaç 2382, a acção de Spínola, por exemplo. Mas também os condimentos do quotidiano: como tomar duche com a água escassa ou a cerveja pluriusos (bebida cujas garrafas eram utilizadas como aparelhos de alarme, as garrafas batiam no arame farpado e anunciavam aos sentinelas a presença do inimigo).

É um caderno de alguém que se comprazeu a ser útil, a fazer amizades e que ainda hoje se orgulha do dever cumprido. Escreve sem rancores, junta serenamente as suas notas de observação, confunde-se com a crónica dos acontecimentos da CCaç 2382. Não arma em herói nem em vítima. É um testemunho que os historiadores não poderão ignorar. Até pela sinceridade.
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Notas de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6802: Notas de leitura (137): Invenção e Construção da Guiné-Bissau, de António Duarte Silva (3) (Mário Beja Santos)

Vd. poste de 30 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4441: Bibliografia de uma guerra (48) "Os Tempos de Guerra - De Abrantes à Guiné", de autoria de Manuel Batista Traquina

Guiné 63/74 - P6807: Memórias de um Combatente da Liberdade da Pátria, Carlos Domingos Gomes, Cadogo Pai (1): Encarregado de uma empresa francesa, em Bissau e depois Bolama (1946-1951)









Conheci Carlos Domingos Gomes (nickname, Cadogo, Cadogo Pai ou Cadogo Velho), há mais de dois anos, em Bissau, no decurso do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008).

Estava ainda no poder o ‘Nino’ Veira. Era presidente do PAIGC Carlos Gomes Júnior (também conhecido na sua terra como Cadogo Júnior, ou apenas Cadogo), e que chegou a ser considerado como delfim do próprio ‘Nino’ Vieira até ao conflito de 1998.

Dez meses depois do Simpósio, o filho de Carlos Domingos Gomes, no final desse ano, seria indigitado para o cargo de Primeiro-Ministro, lugar que ainda hoje ocupa.

Carlos Gomes Júnior nasceu em Bolama em 1949. É filho de Carlos Domingos Gomes e de Maria Augusta. Sabemos que, antes de entrar na política, e chegar a dirigente máximo do PAIGC, o actual primeiro ministro foi um empresário e gestor de sucesso. Não participou na luta armada como combatente.

O Cadogo Pai, em contrapartida, reclama-se da condição de Combatente da Liberdade da Pátria, sem todavia nunca ter pertencido ao PAIGC, e muito menos combatido na guerrilha. Considera-se um nacionalista, embora tenha colaborado com o poder colonial, como autarca, o que lhe trouxe alguns alguns amargos de boca nos primeiros tempos, após a independência. Era amigo de Aristides Pereira. Em contrapartida, teve problemas com Luís Cabral que “tentou impedir a minha candidatura às primeiras eleições legislativas realizadas em Bissau, após a Independência” (1ª Parte, p. 2).

Hoje dou início à publicação da história de vida de Carlos Domingos Gomes, Cadogo Pai, a partir de um texto autobiográfico, policopiado, de que ele me ofereceu uma cópia em Bissau. Conheci-o por acaso, na sala de conferências do hotel onde estava a realizar-se o Simpósio. Na mesma altura conheci o Joseph Turpin (*), sobrinho do Élisee Turpin, esse sim um histórico do PAIGC (**).

Prometi, ao Cadogo Pai, publicar-lhe no nosso blogue as suas memórias, pelo menos alguns excertos ou um versão adaptada. Cumpro essa promessa ao fim de dois anos... Em Bissau, ele ofereceu-me um exemplar autografado. Deu-me inclusive o seu número de telefone de Bissau, onde reside. Daqui vão, para ele, os meus votos de boa saúde e longa vida.

O documento, de 26 páginas, tem por título: Memória de Carlos Domingos Gomes, Combatente da Liberdade da Pátria: Registos da História da Mobilização e Luta da Libertação Nacional. Recordar Guiledje, Simposium Internacional, Bissau, 1 a 7 de Março de 2008.

O texto está dividido em duas partes, com numeração autónoma: 1ª parte (9 pp.): Memórias de Carlos Domingos Gomes, Cadogo Pai, Galardoado com a Medalha de Combatente da Liberdade da Pátria: Registos da História da Luta de Libertação Nacional. Guiledje, Simpósium Internacional, Bissau, 1 a 7 de Março de 2008; a II parte (17 pp): Simpósium Internacional, História da Mobilização da Luta da Libertação Nacional: Memórias de Carlos Domingos Gomes, Cadogo Pai.

Cada uma das partes está estruturada por parágrafos, numerados de 1 a 23 (1ª Parte, pp. 1-9) e de 1 38 (2ª Parte, pp. 1-17). O autor assina o documento, no final como “Administrador” e como “Membro do Conselho de Estado” (sic). Não parece haver uma clara separação temática ou uma sequência lógica e cronológica entre as duas partes.

Devo acrescentar que ele não fazia parte dos oradores do Simpósio Internacional de Guiledje. Estava lá, ao que julgo, apenas como participante ou convidado.

Este evento terá sido um bom pretexto para o autor escrever, eventualmente retocar e sobretudo divulgar as suas memórias, quer como cidadão quer como empresário, balizadas entre os anos de 1946 e 1974:

“1. O evento [, o Simpósio,] galvaniza todo o meu pensamento, para tentar arrumar elementos da minha vida política, participativa, na luta pelo desmantelamento do sistema colonial em África” (Parte I, p. 1).

Em 1946, aos 17 anos (nasceu portanto em 1929), o autor era “paquete de escritório da família Barbosa, junto do Grande Hotel”. Ganhava 120 escudos de salário mensal. Essa família Barbosa incluía Antoninho Barbosa e César Barbosa, tios do Caló Capé.

Achando que não era lugar de (ou com) futuro, candidatou-se a (e ganhou) o lugar de auxiliar de escriturário numa firma francesa, SCOA – Sociedade Comercial do Oeste Africano (proprietária do edifício onde está hoje a Pensão Berta), com várias lojas pela Guiné (Bissau, Bolama, Bissorã…).

Estamos em Agosto de 1946. A escrituração das receitas da loja era feita em francês, língua que ele não dominava, mas iria contar com a ajuda (inesperada) do empregado que fora substituir, nada menos que o José Costa, colega de escola, entretanto transferido para Bissorã. Ele próprio, Cadogo,  será transferido, meses depois, a 24 de Dezembro de 1946, para Bolama. Em Bissau ganhava 250 escudos. Em Bolama, passou a ganhar 300, “quantia exígua para tomar conta da minha vida” (1ª Parte, p. 3).

Fica em Bolama três anos. Em 26 de Dezembro de 1949 é convidado “para vir ocupar o posto de chefia da loja nº 2 em Bissau”, enquanto o José Costa, regressado de Bissorã, chefia a loja nº 1. Tinha 20 anos, “ainda era menor”, só fazendo os 21 em Maio de 1950. É em Bolama que nasce o seu filho, hoje 1º ministro, em 19 de Dezembro de 1949 (conforme consta da biografia oficiosa de Carlos Gomes, no sítio do PAIGC).

Volta a Bolama, em Março de 1951, como chefe operacional da mesma empresa, a Sociedade Comercial Oeste Africana (onde trabalhou como contabilista, de 1942 a 1956, Elisée Turpin, um dos fundadores do PAIGC).

“Foi em Bolama que conheci o camarada Aristides Pereira, muito reservado. Fizemo-nos amigos. Em quase todas as tardes , entre um greupo de amigos, encon trávamo-nos na marginal” (1ª Parte, p. 4). Além de Artistides Pereira, são citados os nomes de Alcebíades Tolentino, Barcelos de Lima, Adelino Gomes e Afredo Fortes. Falava-se de tudo, “mas sobre a política africana nada”

A seguir, o autor conta-nos como foi “parar à política”, isto é, como se tornou um nacionalista, próximo do PAIGC…

“Com a posição do importante posto de emprego, encarregado da operação da SCOA, casa comercial importante na concorrência, fui empurrado muito novo para a política e manutenção [sic]de uma personalidade rija em luta com os encarregados da Gouveia, Ultramarina, Pinto Grande, Ernesto Gonçalves de Carvalho, etc., Europeus. Cabo Verdiano era o falecido Carolino Barbosa” (1ª Parte, p. 4). O “nacionalismo” de Cadogo Pai remontaria a esta época (reconhecido pelo próprio Aristides Pereira, no seu livro, a p. 79).

Terá sido através do Elisée Turpin, seu colega em Bissau, que lhe chegavam a Bolama as notícias das primeiras “movimentações”, de “cariz político”, que surgiam em Bissau. “Pode fazer-se ideia de como foi fácil a minha mobilização em confrontação com as empresas europeias que tentavam espezinhar-me e discriminar-me no importantre posto do meu emprego”. Ou seja, europeus [, leia-se: portugueses,] e caboverdianos  possivelmente não viam com bons olhos que um filho da Guiné fosse encarregado numa empresa francesa…

(Continua)

[ Revisão / fixação  de texto/ excertos / digitalizações / título: L.G.]

________________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 27 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3246: Simpósio Internacional de Guileje: Joseph Turpin, um histórico do PAIGC, saúda António Lobato, ex-prisioneiro (Luís Graça)

(**) Vd. poste de 12 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXV: Antologia (24): Elisée Turpin, co-fundador do PAIGC (Élisée Turpin)

Guiné 63/74 - P6806: Parabéns a você (134): Francisco Palma da CCAV 2748 e Júlio Abreu do BCAÇ 506 e Grupo de Comandos Os Centuriões (Editores)

1. Hoje, dia 30 de Julho de 2010, fazem anos os nossos camaradas:
 

Francisco Palma, Soldado Condutor Auto da CCAV 2748/BCAV 2922 e
Júlio Abreu do BCAÇ 506 e Grupo de Comandos "Os Centuriões".

A estes nossos camaradas a Tertúlia vem por este meio desejar um dia de aniversário cheio de alegria e uma vida longa, com saúde, junto dos seus familiares e amigos.

__________

Notas de CV:

Vd. poste de 30 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4758: Parabéns a você (15): Francisco Palma da CCAV 2748 e Júlio Abreu do BCAÇ 506 e Companhia de Comandos do CTIG (Editores)

Vd. último poste da série de 17 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6755: Parabéns a você (133): Dia 17 de Julho de 2009 - Álvaro Basto, ex-Fur Mil Enf da CART 3492 (Editores)

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6805: Controvérsias (99): O que é que o País pode dar aos ex-combatentes? (António J. Pereira da Costa)

1. Mensagem de António José Pereira da Costa*, Coronel Art na reserva, na efectividade de serviço, que foi comandante da CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/74, com data de 29 de Julho de 2010:

Sobre o discurso do António Barreto

Camaradas
Reporto-me ainda aos Poste do Martins de Matos** sobre o discurso do António Barreto e começo com uma frase que questiona muita coisa, embora não pareça.

... “Sim! Porque deve haver uma ligação qualquer nesta balhana toda! Qual, é que eu gostaria de saber; (...) e explicar porque é que a guerra começou lá e não aqui, ou começou lá sem começar aqui, ou o catano". (in. José Brás, Vindimas no Capim, Pág. 186).

Parece-me que, agora, é fundamental que se responda a duas questões: uma, equacionada pelo discurso do António Barreto e que se pode sintetizar do seguinte modo: o que se entende por ex-combatentes? Outra questão será: o que é que os ex-combatentes querem, devem querer ou será justo que o País lhes dê?

Reparem que não perguntei: o que é que o País pode dar aos ex-combatentes?
Parece-me, também, que se fala muito, por vezes, atingindo altos níveis de demagogia, mas como é habitual, cá com os portugueses, “ficamo-nos um bocado nas covas” e depois ladramos nos corredores. É um pouco o “Espírito Zé Povinho”... Mas isso é com os sociólogos e antropólogos.
Enquanto cidadãos está na altura de tomarmos posições.

Li várias vezes o discurso e achei-o mal conseguido, no mínimo. Dá-me a impressão de que o António Barrento foi adiando a feitura do discurso até à véspera e depois teve que o escrever na madrugada do dia 10, com ideias, mas a cair de sono. De um intelectual que tem vindo, de há uns anos a esta parte, a afirmar-se e a ganhar prestígio com as suas análises ao viver português, eu esperava muito melhor. Está confuso e nem sequer consegue fazer o que parece ser o seu objectivo: a apologia da valentia "em valor absoluto”, (matematicamente falando). Será que pretendia demonstrar que, em qualquer dos campos em confronto – “o bom”(?) ou o “mau”(?) - se pode ser valente? Será que uma decisão qualquer, mesmo resultante da indecisão, pode conduzir à valentia e a uma actuação válida de Homem e Cidadão?

Creio que pretendia louvar a coragem e valentia como qualidades dos homens que tiveram de decidir, num dado momento histórico e com os dados que tinham (ou julgavam ter) na mão, os tais homens que estavam “à esquina errada da História”. É um processo de decisão que tem de ser rápido, porque o tempo (parece que) urge em certos momentos históricos e não há tempo para pedir mais elementos para se poder decidir melhor. E se decidiram desta e não daquela maneira, foi porque a isso foram obrigados. A História dá muitos exemplos desta situação.
Isto para dizer que o discurso não será, nem a apologia de "todos" (independentemente das suas opções), o que até poderá ter o seu quê de justo, nem um louvor e reconhecimento incondicional aos ex-combatentes que muitos quiseram ver nele.

Já houve, no blog, a voz de uma Tertuliana – não sei se viúva se madrinha de guerra de um de nós – a quem o discurso não agradou. Terá razão, pois parece que estamos a estender demasiado o conceito. É que, se calhar, só serão ex-combatentes os que foram à África ou à Índia, em consequência da política do governo da época (desde finais dos anos 50 até 1974 do Séc. passado).
Sobre este tema – “somos todos valentes” (e, se calhar, até somos) – remeto para o Poste 4801 do Vítor Junqueira que equaciona o conceito de ex-combatente em sentido amplo ao afirmar que:

E, no entanto, quero abraçar:

Os compelidos, faltosos e refractários que, à força ou depois de pensarem melhor, lá acabaram a fazer a queda na máscara ao meu lado;
Aqueles que espalhados pelo Mundo, obtiveram junto dos consulados as suas Licenças Militares definitivas, podendo dar continuidade às respectivas actividades profissionais, e remeter para a Pátria, as paletes de francos, marcos, dólares etc., (...)
Abraço também os que por alergia ao teatro de operações, preferiram servir o país de outra forma, como por exemplo, integrarem a frota bacalhoeira (sabiam?);
E, quanto aos desertores, porque tiveram a coragem de arriscar a prisão ou uma vida inteira no exílio, obedecendo a respeitáveis e nobres ideais, ou partiram por amor à pele, atitude que não se revestindo de uma nobreza por aí além, é igualmente compreensível, envolvo-os também no meu amplexo, mas sem direito a aplauso
”.

E continua dizendo que:

Por outro lado, não são meus camaradas:
Aqueles que vestindo a nossa farda, eram objectivamente combatentes do IN, a quem forneciam informações e até segredos de que tinham conhecimento, por força das funções que desempenhavam;
Os que tendo integrado as FA de Portugal e jurado fidelidade à sua bandeira, saltaram para o outro lado da paliçada, oferecendo-se para colaborar activamente em planos que visavam a liquidação física de ex-companheiros de armas, incluindo os amigos;
Todos quantos encapotadamente, tal qual laboriosas toupeiras, se colocaram ao serviço de ideologias, objectivos e interesses de potências estrangeiras e pela escrita, pela palavra ou pela acção conspiraram, visando o desprestígio e aniquilação do exército fascista, nós!
Esses não são meus camaradas.
Mas, notem bem, o facto de não serem meus (nossos) camaradas, não me dá o direito de os julgar sob qualquer prisma e ainda menos de os condenar, cabendo esse desígnio a outras instâncias, entre elas a História, que amparada pelo Tempo há-de apreciar de forma asséptica e distanciada os Homens e os factos do último quartel do séc. XX português
.”

Chamo a atenção para este último parágrafo, que considero importantíssimo e que, em meu entender, se aproxima muito da ideia do discurso do António Barreto.

Por mim penso que, mesmo (todos) estes últimos que o Junqueira não considera seus camaradas, fizeram uma opção e combateram contra algo de que discordavam. Há quem diga que isso deve ser tido em boa conta. O desertor que se passa para o inimigo opta e o espião também. O articulista que, do exílio, por não o poder fazer no interior do seu país, escreve, criticando a acção do “seu” governo, ou desenvolve acções, a nível diplomático e político, junto das instâncias internacionais opta por algo em que acredita ou, pelo menos combate o que acha mal. A História está cheia de casos destes e, muitas vezes, os “traidores” acabam por ter razão e a sua acção ser reconhecida, pelos seus concidadãos. Às vezes é uma questão de momento histórico...

Remeto agora para um Poste meu, subordinado ao tema: “Quem somos nós?”.
Aí procurei caracterizar, na generalidade, quem éramos antes da partida, recorrendo a frases simples e correntes naquele tempo, mas que traduzem indiscutivelmente, “um certo espírito”. Quem nunca disse ou ouviu dizer:

– “Se os outros foram e voltaram, eu também poderei ir e voltar”.
– “E até pode ser que não seja bem assim. Pode ser que o sítio não seja mau e que o tempo passe depressa. No fundo, são só dois anos”.
– “Tenho fé de que comigo vai ser diferente”.

Quem não se recorda de que à chegada ao TO, (...) uns revoltavam-se, outros aceitavam a sua sorte, como algo que não podia ser modificado. Decidiam resistir (embora não se soubesse bem o isso fosse) enquanto pudessem e como pudessem mas, (...) aquilo era outra terra e – porque não dizê-lo? – outro país.

Estava iniciada a prova que tínhamos de vencer, a nossa experiência traumática.

E se realmente não fosse assim como nos tinham dito? E se o país fosse só um, gerido às cegas e prepotentemente, por uma administração central e repartido por várias parcelas no mundo, cada uma diferente, com diferentes gentes, com diferentes anseios? Cada terra com uma História diferente e com um povo ansiando por uma separação política, que tinha como libertadora. Libertação de quê ou de quem e com que resultados, depois se veria... Não faltam precedentes na História Universal: EUA, Brasil e América Latina, para falarmos apenas dos casos tidos como arrumados pela História, já há muito tempo, na altura em que começávamos a nossa aventura.

Reparem na pertinência da questão levantada pelo José Brás. Se calhar a guerra deveria ter começado aqui e não lá... E porque é que não começou cá? E se tivesse começado cá? Na História não há “ses” e o caminho dos homens, marcado pelo tempo, não pára, com bons ou maus resultados.

Peço também que meditem sobre mais estas questões relativamente às populações que encontrávamos de um e do outro lado:

O que queriam? De que lado estavam e porquê? Se recusavam a protecção e a ligação ao inimigo, preferindo o nosso apoio (...), tendo nascido e sempre vivido ali, quais seriam as razões para tal?

E a experiência traumática continuava, pois o tempo escorria no calendário, com as operações (...) as tarefas monótonas de cada dia, as saudades e as notícias ou a falta delas (...) a vivência em espaços pequenos, quase concentracionários, e, acima de tudo, a falta de resposta a uma questão simples: que faço eu aqui?
Era melhor nem pormos esta questão, de tal modo ela era complicada.

Volto a perguntar:

Mas afinal quem éramos? Cidadãos-patriotas? Soldados-heróis? Acomodados à espera que o tempo passasse e jogando na lotaria do “não há-de ser nada! E se for que seja menina para vir para a tropa”, como então se dizia?

Se regressarmos ao passado, havemos de encontrar muitos momentos em que, essencialmente, fomos “paus para toda a colher” e muito mais a que a vida impiedosamente nos obrigava. Sem podermos alterar (...) a situação (...) ficávamos, entregues ao fluir do tempo. Sabíamos que a sua contagem decrescente corria a nosso favor e, até lá, havíamos de nos aguentar...

E, já na nossa terra, continuámos a nossa experiência. Agora, na vivência de simples cidadãos, passámos a alegria breve do regresso, a inserção no mundo do trabalho e a constituição de família (...), sofremos a incapacidade de transmitir, mesmo aos que nos são muito próximos, o que tínhamos passado e (...), a bem da nossa saúde mental, decidimos esquecer o sucedido. (...) agora era necessário viver e desfrutar da luta diária da vida, no fundo a razão pela qual os Homens vivem.

A vida foi correndo (...). Ficámos velhos. E os velhos têm necessidade de recordar, contemplando a vida, para se sentirem gente.
Demos a nossa contribuição, modesta como é sempre é a dos homens do povo feitos soldados.
Dentro em breve ninguém nos recordará. E nem pelo facto de termos sido muitos seremos mais recordados. Sabemos que “os povos têm má memória” e que a cultura e o conhecimento de quem fomos ou somos, como povo, é, cada vez menos, uma prioridade na formação e educação dos nossos jovens, logo do nosso Povo.

E aqui pergunto: Para que serviu o que fizemos? E se tudo não passou de um equívoco? E se o que fizemos não serviu para nada?
Talvez tenha servido para pouco, quase nada ou mesmo nada. Se calhar não passou de um esforço inútil, ao qual fomos coagidos, sem hipótese de fuga. Custa, mas poderemos ter que o admitir, mais tarde ou mais cedo.
Ainda uma pergunta mais dura e inquietante: E se nunca tivéssemos combatido em defesa da Pátria? E se a Pátria fosse outra coisa que não aquilo?
Admito que, na Índia, perante a invasão de uma potência estrangeira, as coisas tenham sido diferentes, mas em África, combatíamos contra portugueses que o não queriam ser e que hoje celebram a sua Libertação e reivindicam para si o título de “Combatentes da Liberdade”. Quem se liberta, liberta-se de alguém ou de alguma coisa. Já se viram no papel de repressores? Sim, quem combate contra “Combatentes da Liberdade” ou é tirano ou é repressor. Ou não será?

Ainda por cima, os velhos não cortam as auto-estradas, não chamam fascista ao Presidente, não fazem gigantescas manifestações, não justificam tempo de antena nas televisões. Entre uma telenovela daquelas de enredo mais retorcido do que um saca-rolhas e um tempo de antena para “os velhotes da tropa” as TV nem hesitam... Estamos agora, cada vez mais, condenados ao esquecimento que o tempo sempre traz, mas, enquanto pudermos, temos de lutar contra isso. Será mais uma tarefa da nossa cidadania. Toca-nos procurar passar aos vindouros uma mensagem. E, se o futuro alguma vez perguntar, a nossa resposta será, com a maior clareza sim ou não, mas, desta vez, com a convicção que só a experiência dá.

Apesar de tudo, devemos sentir-nos orgulhosos. Passámos por uma prova que, esperemos, não se repetirá. E quem sabe? (...) Não temos hoje nada para provar a ninguém nem podemos aceitar que nos censurem por aquilo que fizemos ou não fizemos.
Mais ainda, volto a recordar que fizemos uma guerra pobre, que era pobre a nossa logística e os meios operacionais escassos, como se lembram. Faltava muitas vezes o essencial. (...) Os meios do inimigo (...) não cessaram de evoluir ao longo do conflito. As guerras ou se perdem ou se ganham. E nós perdemos. Perdemo-la, sim. E depois? Alguém esperava ganhá-la? Ninguém. Nem os que a aprovavam(?), naquele tempo, nem os que hoje, por preconceito, saudosismo ou desonestidade intelectual, afirmam que a poderíamos e deveríamos ter ganho.

Somos hoje Portugueses, com cerca de 60 anos (normalmente mais), com uma experiência traumática, de dois anos, vivida com cerca de 20, mas com reflexos (alguns bastante dramáticos) para toda a vida. Estamos ricos com uma mensagem a transmitir!
Foi isso que pretendi demonstrar.

Chegados a este ponto, creio que deveremos precisar o conceito de “ex-combatente”. Neste aspecto e correndo o risco de estabelecer um crivo demasiado estreito, direi que ex-combatentes são os que foram e estiveram na Índia ou em África. Todos os outros que o Junqueira referiu e alguns que poderiam ser acrescentados poderão ser considerados noutras categorias e ter outras designações diferentes: resistentes, anti-fascistas, pacifistas, coerentes com as suas convicções, defensores dos direitos humanos, etc. Não ponho em causa o respectivo mérito, a validade da sua actuação nem proponho epítetos. Mas não são ex-combatentes.
E o que é querem hoje os ex-combatentes? Resumindo, diria que querem um reconhecimento da sua acção. Querem um agradecimento dos seus compatriotas.

Esta questão deve ser muito bem equacionada e deverá ter como ponto de partida o facto de que o ex-combatente, ou lutou pela sua Pátria, ou foi forçado a combater por qualquer coisa que lhe disseram que era válido e que ele aceitou como tal. Quer num caso, quer noutro, passou, nos primeiros anos da sua vida adulta, por uma prova que não voltou nem voltará a repetir-se e que só ele sabe o que lhe custou. Se defendeu a sua Pátria é credor de uma forma de reconhecimento. Se se sacrificou por algo que hoje já não se sabe bem o que foi, dever-lhe-á ser reconhecido o sacrifício e outorgada uma recompensa.

Procuremos agora definir que recompensa, que retribuição será essa.

Antes do mais convém ter em conta que o reconhecimento dos ex-combatentes deverá ser sempre feito pelo povo a que pertencem. É suposto que tenham prestado um serviço ao País e um povo deve reconhecer os que o serviram ou aqueles que passaram por uma prova em seu nome. Será a forma mais justa de homenagem. Porém, só se pode homenagear o que se conhece e aprecia e, como sabemos, somos cada vez menos conhecidos e cada vez mais considerados como “os velhotes da tropa”. É cada vez maior o fosso entre “os novos” e nós “os velhos”.

O reconhecimento ou qualquer forma de homenagem resultará, em grande parte, da acção de quem lidera o País, o que não tem sido uma constante. A primeira geração de democratas dá a impressão de não ter sabido lidar connosco. A segunda, já distanciada, poderá ter ouvido falar vagamente de nós... A terceira geração...

Temos de começar a pensar que, se não formos nós a estimular e definir o que queremos em termos de reconhecimento público, ninguém no-lo dará. Não jogamos futebol, por isso nunca poderemos ter junto de nós uma grande multidão a ovacionar-nos. A bandeira nacional acena mais facilmente perante um penalty marcado com a cabeça do que perante um velho que sofreu aquilo que descrevi. Se o nosso povo, cada vez menos, sabe que existimos só se lhe for explicado quem fomos e o que fizemos poderá, alguma vez, testemunhar-nos o seu apreço. Está nas nossas mãos criar uma cerimónia anual(?) em local significativo, simples, à qual possamos estar presentes, com a necessária sobriedade, evitando aquele folclore dos dolmans camuflados sobre as calças de ganga ou as “condecorações” e distintivos diversos semeados pelas t-shirts. Teremos de admitir a possibilidade de “descentralizarmos” a evocação. Somos velhos e alguns, como sabem, começam a aparecer nos convívios transportados pelos filhos e até pelos netos. Sem diluirmos demasiado a nossa presença teremos de ter esta condicionante incontornável em conta. Depois da evocação/cerimónia (o nome tem de ser definido, adoptado e respeitado) poderemos conviver. É para isso que somos homens e cidadãos solidários, mas devemos evitar aproximar demasiado as duas coisas. Os “críticos” estarão sempre à espera de um deslize para as suas críticas...

Teremos de provocar e marcar que o nosso comprometimento e o reconhecimento que queremos é o dos outros cidadãos e não o deste ou daquele dirigente. O nosso comprometimento, como dizia o Vítor Junqueira, é com a Bandeira e, se calhar, é perante essa e só essa que deveremos desfilar. Alguns de nós, sabe Deus com que dificuldade... Era bom que fôssemos aplaudidos por quem assistisse ou fosse a passar, no momento. E se, todos juntos, cantássemos, berrássemos ou chorássemos (ao sentir de cada um) o Hino? Ou se um clarim nos desse os toques que nunca esqueceremos, no meio de um silêncio “de abrir ouvidos”? Esperemos que, se tal alguma vez acontecer, os nossos compatriotas automobilistas não se lembrem de pedir passagem a quem parou... Por mim discordo que se desfile perante homens...

Será bom que isto venha a acontecer, mas acontecerá durante quanto tempo? À medida que formos desaparecendo a nossa visibilidade vai dependendo, cada vez mais, da devoção e da dedicação de outros e, por fim, apenas da sensibilidade e boa educação de alguns, poucos, como é fácil de calcular.

E, mais ainda: será suficiente esta “consagração” anual? Será justo que se fique por aqui?

Sei que há camaradas que entendem que não, mas as opiniões dividem-se quando é necessário explicitar o que falta. Fica o desafio para que surjam propostas.

Foi-nos concedida uma pensão simbólica (dizem uns). Ridícula (dizem outros). Será que deveríamos receber dinheiro? Quanto? Todos por igual? Só os mais pobres? Qual o método de cálculo? Quais os seus fundamentos? A duração das comissões não deverá servir de base ao cálculo. Poderá parecer uma fasquia demasiado baixa, mas, por mim, creio que ir e ter estado era o justo. O risco variou ao longo da guerra, no mesmo lugar, e de lugar para lugar; a pressão do inimigo não foi constante em cada posição que ocupávamos e mesmo o sacrifício determinado pelas condições logísticas que lhe eram inerentes variou, ao longo do tempo. Vai haver, certamente, camaradas que acham mal que se peça dinheiro. Mas, tanto quanto julgo saber, esta é mais uma forma de recompensa e que tem a vantagem de ser mensurável e claramente poder ser avaliada a justiça com que for feita. Não creio que pedir dinheiro como recompensa de serviços prestados ao País seja pecado. Claro que há crise. E somos muitos. Por isso, mais vale desistir da ideia(?). Mas eu não me recordo de ter vivido em algum momento que não fosse de crise...

Levantei esta questão, sabendo que corro o risco de me atacarem e de me censurarem por falar de uma recompensa, em “vil metal”. Fica a ideia, que vale o que vale, como mais uma solução para o problema. Só quero lembrar, contudo, que estamos a falar de um grupo de cidadãos que passou por um sacrifício “em defesa da Pátria” ou em nome de valores que lhe apresentaram como um imperativo de cidadania.

Mas há outras soluções que me parecem mais correctas.

Acho que há momentos e situações da vida em que o apoio do Estado se deverá materializar. Estamos a falar de cidadãos com quase ou bastante mais de 60 anos. Lembro, só por exemplo, os nossos camaradas que, após o regresso se incapacitaram para o trabalho e foram reformados por invalidez. Não será possível adicionar à sua reforma os 4 anos (o dobro do tempo legal de uma comissão) à reforma que tenha que receber. Não é a mesma coisa ser-se reformado, por invalidez, com 16 ou 20 anos de trabalho! Embora haja certas taxas e emolumentos que os reformados e idosos (>65 anos) não pagam ou pagam com desconto, porque não estabelecer um conjunto de bens e serviços de carácter social que os ex-combatentes não pagassem. Terá de ser algo de palpável, claro e imediato. E, acima de tudo, que não se mascare com burocracia e lentidão de procedimentos a concessão de algo que se prometa. As regalias – chamem-lhe o que quiserem – ou se dão ou não se dão. Talvez um cartão de ex-combatente, emitido com rapidez e eficácia por entidade responsável. Depois, vem o mais difícil: encontrar as vantagens que o cartão teria.

Vai longo o paleio e, por isso vou ficar-me por aqui. Procurei definir o conceito de ex-combatente e propor formas de homenagem/reconhecimento para os que, por dever de cidadania ou de serviço à Pátria são credores de algo.

Um Alfa Bravo do
António Costa
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 18 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6614: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (3): Gente de Cacoca e outros

(**) Vd. postes de:

10 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6574: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (1) (Inácio Silva / Joaquim Mexia Alves)

12 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6582: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (2) (Amaro Samúdio / Felismina Costa)

13 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6591: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (3): O dia do ex-combatente devia ser comemorado noutra data (Ana Duarte)

20 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6618: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (4): No separar é que está o ganhar (António Martins de Matos)

9 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6705: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (5): Não há nada a fazer! (António Martins de Matos)

13 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6725: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (6): É tempo de dizer BASTA! (António Martins de Matos)

Vd. último poste da série de 24 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6781: Controvérsias (98): Quem não se sente... não é filho de boa gente (Carlos Nery)

Guiné 63/74 - P6804: Blogpoesia (77): Saudades daquele tempo, ou Quisera eu... (4) (Manuel Maia)

QUISERA EU... (4)

Quisera eu prolongar minha experiência,
poder lá retomar velha vivência,
um mês que fosse a respirar seu ar...
Mirar bolanha/vida tão intensa,
e vislumbrar lá longe a mata densa,
que acobertava o IN p´ra atacar...


Queimado por comandos,se renova,
telhado das moranças, palha nova,
desesperança ali não faz escola...
A cada punição realizada,
renovam intenção consolidada,
e outra operação se desenrola...


Espreitar Cafal, mirar seu laranjal,
rever local da absurda e surreal
vivência feita lar, em covas nuas...
Mostrar ao "grande herói", tão afamado,
anota Bruno, AB, que o "tal farpado",
apenas protegia as costas suas...


Lá longe no bem-bom da vida calma,
da cama limpa, "um aconchego d`alma",
Bissau do luxo e ar condicionado...
"Negreiro a quem os homens corajosos,
comandos africanos, mui briosos,
garantem o seu dólmen medalhado...


Que um pingo de vergonha `inda lhe sobre,
p`ra ter na vida um gesto, digno, nobre,
de retratar-se ìnda antes de morrer...
P´ra instituição à qual está agregado
a honra e dignidade são legado,
que o berço desenvolve e faz crescer...


Quisera sentar junto ao Cumbidjã,
no cais improvisado, p`la manhã,
que a pescaria cedo "é de bom tom"...
Sentir peixe picar, algo emotivo,
sem medo de ali estar, é positivo,
relaxa, acalma a alma, é um sonho bom...


Tomar, sob a caleira a chuva fria,
p´ra eliminar coceira, que arrelia,
foi prática antilíquen, Deus me acuda...
Banhar, sem enxugar, corpo dorido,
melhor seria o mar, é bem sabido,
à falta de melhor, a chuva ajuda...


Quisera ter de um Deus toda a sageza,
p`ra recriar um Éden de beleza,
que ali me inspiraria p`ra fazer...
Viçosos seus mangueiros e arrozais,
frondosos cajueiros, palmeirais,
bajudas, corpos lindos de morrer...


Manuel Maia*
__________

Notas de CV:

(*) Manuel Maia  foi Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74.  

Vd. último poste da série de 19 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6763: Blogpoesia (76): Saudades daquele tempo, ou Quisera eu... (3) (Manuel Maia)

Guiné 63/74 - P6803: Contraponto (Alberto Branquinho) (13): Cambança com Caronte, ou A última viagem do soldado


CONTRAPONTO (13)

CAMBANÇA COM CARONTE
OU A ÚLTIMA VIAGEM DO SOLDADO


No meio de toda aquela confusão – tiroteio, gritos, bazucadas, roquetadas… – ouviu um grande estouro. Depois foi o silêncio.

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Agora navegava. O rio era escuro, fundo, espesso. A canoa avançava, a impulsos do remador. O remo à ré. Água sempre escura. Céu não havia. Uma luz ténue a afastar-se, longe.

A canoa penetrava no escuro, aos solavancos. O homem, deitado, adivinhava o vulto do remador, os oscilar das vestes, o capuz que lhe cobria o rosto, os braços que repetiam os gestos.

Havia um grito agudo e angustiante, que não sabia se estava dentro da cabeça ou se o ouvia ao longe.

Não havia tempo. Ou o tempo não estava ali.
Por entre o grito, ouvia vozes graves, profundas. Ora próximas, ora distantes. Talvez, também, murmúrios de quem reza.

Assim ficou. A canoa suspensa sobre a água. Vozes. E o grito. Vozes, vozes. Perto. Perto. Durante muito tempo.

Sentiu que abria os olhos. Por entre um manto vermelho, para além tudo era branco.

Porquê? Porquê? – perguntou-se. Sentiu uma grande angústia. Fechou os olhos.

A cabeça batia com força. Por dentro. E o grito aumentava, aumentava. Ouviu berrar. Chamar alguém. O remador empurrava-lhe o peito, ao ritmo de quem rema. Tentou gritar. Não conseguiu. O grito ficou encalhado na garganta.
Depois tudo foi ficando escuro, escuro e quedo. E acabou.
NUNCA MAIS.

Alberto Branquinho*
__________

Notas de CV:

(*) Alberto Branquinho foi Alf Mil de Op Esp da CART 1689, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69

Vd. último poste da série de 23 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6778: Contraponto (Alberto Branquinho) (12): Duas visões do Almirante Américo Thomaz

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6802: Notas de leitura (137): Invenção e Construção da Guiné-Bissau, de António Duarte Silva (3) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Julho de 2010:

Queridos Amigos,
É um livro importantíssimo.
Por isso mesmo vamos completá-lo com a recensão do livro anterior do António Duarte Silva.

Um abraço do
Mário




As Constituições Bissau-guineenses:
Caminho lundjo inda de ianda


por Beja Santos

O livro “Invenção e Construção da Guiné-Bissau”, de António Duarte Silva (Edições Almedina, 2010) propicia ao leitor interessado um grande manancial de informações sobre a história da província da Guiné, sobretudo desde o século XIX até à Independência, procura chaves explicativas sobre o fenómeno nacionalista e apresenta a via da libertação nacional, nomeadamente a doutrina do PAIGC. Este último ponto merecerá um amplo comentário quando se fizer a recensão de outra obra de António Duarte Silva A Independência da Guiné-Bissau e a Descolonização Portuguesa (Afrontamento, 1997). A última matéria que importa agora abordar prende-se ao estado das constituições bissau-guineenses, como se segue.

A Constituição do Boé foi aprovada em 24 de Setembro de 1973, em Lugajol, junto de Béli. Foi essencialmente redigida por Amílcar Cabral. Divide-se em cinco partes: fundamenta a declaração da independência; proclama o estado da Guiné-Bissau; enuncia os princípios fundamentais da nova República; precisa que a Guiné-Bissau corresponde ao território que no passado era a Guiné portuguesa; apela a todos os estados independentes para reconhecerem a República da Guiné-Bissau. Aprovada a Constituição, a assembleia constituinte designou os titulares do Conselho de Estado e do Conselho dos Comissários de Estado e aprovou a lei relativa à transição dos ordenamentos jurídicos. A Constituição foi imediatamente saudada pela grande maioria dos estados africanos, asiáticos, árabes e do bloco comunista. Em dois de Novembro, a Assembleia-Geral da ONU, numa resolução inédita aprovada por 93 votos a favor, 30 abstenções e 7 votos contra felicitou o novo estado soberano. Esta Constituição tem traços originais: aparece como resultado de uma libertação nacional; assume o estatuto de um Estado-Nação, combinando vários modelos; define o Estado como uma República soberana e democrática e proclamou o princípio da unidade Guiné-Cabo Verde. Consagra o princípio da hegemonia do PAIGC e o princípio da democracia nacional revolucionária, com francas parecenças com o constitucionalismo soviético. Em Outubro de 1974, o PAIGC instalou-se em Bissau onde a Assembleia Nacional Popular (ANP) passou a reunir a 1.ª Legislatura; a 2.ª Legislatura decorreu de 1977 a 1980. Em Maio de 1979, Luís Cabral anunciou a revisão constitucional. Um dos países mais pobres do mundo defrontava-se com gravíssimos problemas: perversão do poder; desaparecimento da participação popular; fracasso da política económica e do desenvolvimento rural; desmobilização radical do PAIGC; concentração do poder em meia dúzia de pessoas, etc. Em 10 de Novembro de 1980, a ANP aprovou o texto da nova Constituição centrada no reforço da unidade interna e da construção da unidade Guiné-Cabo Verde, era uma Constituição-irmã da de Cabo Verde. Terá sido esta a última gota que fez transbordar o copo de água. A 14 de Novembro Nino Vieira capitaneia o golpe de estado que afasta os cabo-verdianos e prepara a separação entre a Guiné-Bissau e Cabo Verde.

Este golpe militar apresentou-se como um “Movimento Reajustador”, uma segunda libertação dos guineenses. Era liderado por um Conselho da Revolução, órgão predominantemente militar. Este “Movimento Reajustador” comprovou que o centro do poder não residia essencialmente no PAIGC mas no seu braço armado, as FARP. O regime político continuou a ser de partido único, retomou-se o discurso tribalista e os muçulmanos voltaram a ganhar influência. Deu-se o I Congresso Extraordinário do PAIGC, expulsaram-se Aristides Pereira, Luís Cabral e outros dirigentes cabo-verdianos e recomendou-se uma revisão constitucional.

A Constituição aprovada em Maio de 1984 tem a sua principal fonte na frustrada Constituição de 1980 com pequenas alterações. Foi muito influenciada pela Constituição do Boé, pela Constituição Cubana de 1976, pelo trabalho dos constitucionalistas da RDA e pela Constituição portuguesa. O executivo por ela preconizado não correspondia a um executivo no sentido ocidental, antes se assemelhando aos órgãos superiores administrativos de tipo soviético. Tratava-se claramente de um constitucionalismo pendendo para um regime presidencialista, autoritário e de partido único. A insatisfação acentuou-se com novas tentativas de golpe de estado que vai culminar, em Julho de 1986 com o fuzilamento de importantes dirigentes como Paulo Correia e Viriato Pã.

Dos anos 80 para os anos 90, a Guiné-Bissau negoceia com o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, liberalizando a economia e depois o sistema político. Surgem leis de revisão constitucional em 1991, suprime-se o sistema de partido único e abrem-se as portas ao pluripartidarismo, adoptando-se os princípios da democracia representativa e do estado de direito. No plano formal, a Guiné-Bissau abria-se aos direitos fundamentais e à economia de mercado. Com estas leis de revisão, e dado o carácter da transição proposta pela revisão de 1993, pode falar-se de Constituição de 1993, com alterações substanciais: a Guiné-Bissau como república soberana, democrática e unitária. Com o reconhecimento do princípio do Estado de direito e a adopção da democracia representativa. O Presidente da República torna-se a chefe do sistema de governo enquanto a ANP se define como o supremo órgão legislativo e de fiscalização política.

O resto, é história por de mais conhecida. Eleições presidenciais em 1994, e Nino Vieira derrota Koumba Yala. Temos depois imensas andanças no governo. Mais adiante regista-se uma rebelião militar, depois a fuga de Nino e novas eleições. O autor fala na segunda vigência da Constituição de 1993, na Carta de Transição Política de 2004 e na terceira vigência da Constituição de 1993 e no aparecimento no Estado paralelo. Resultado: o caminho a percorrer é ainda longo.
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Nota de CV:

Vd. postes de:

25 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6782: Notas de leitura (134): Invenção e Construção da Guiné-Bissau, de António Duarte Silva (1) (Mário Beja Santos)
e
27 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6793: Notas de leitura (136): Invenção e Construção da Guiné-Bissau, de António Duarte Silva (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6801: O Nosso Livro de Visitas (96): António Inverno, ex-Alf Mil Cav Op Esp, S. Domingos, 1973, amante da "bela" Kalash



1. Foto e mensagem, de hoje,  do nosso leitor António Inverno:


 António Inverno, Alferes miliciano de operações especiais, num afluente do rio Cacheu, em S. Domingos,  1973, eu e a minha inseparável Kalash.

António Inverno
Sumol + Compal
Fábrica de Almeirim
Técnico de service desk local
Estrada Nacional nº 1182080-023 Almeirim

Tel: 243 5944654 Fax: 243 594650

http://www.sumolcompal.pt

2. Comentário de L.G.:

É lacónico este nosso camarada (*). Não nos diz, por exemplo, a que unidade ou subunidade pertenceu e por onde andou... Através do blogue do nosso querido co-editor Eduardo MR, ficamos a saber que o António Inverno pertenceu ao 2º curso de Op Esp de 1972, esteve na Guiné entre 72 e 74, e gostaria de publicar aí uma fotografia,  no blogue Coisas do MR. "Estou aí a vêr fotos de gajos do meu curso, como o Casimiro e o Martins"...

Vejo, pela foto, que o António pertencia à arma de cavalaria, além de ser "ranger"... Fica convidado a ingressar no nosso blogue e a explicar as razões do seu amor pela "bela" Kalash... pondo os c... à "fiel" G3, um tema já aqui polemizado  (**).

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Notas de L.G.:

(*) Último poste desta série > 7 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6794: O Nosso Livro de Visitas (96): Quem se lembra do Dr. Noronha (de Bafatá), Toscano de Almeida, madeireiro, do Dias Saboeiro, figuras que povoam a minha infância ? (Maria Augusta Antunes, que cresceu no Xitole, na década de 1950)

(**) Vd. poste de

17 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2445: Em louvor da G3, no duelo com a AK47 (Mário Dias)

Sobre a Kalash, vd. os seguintes postes publicados no nosso blogue, I Série:

17 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XX: "Foi você que pediu uma kalash?" (David Guimarães)

Vd. também o descritor AK47