Pesquisar neste blogue

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21646: Casos: a verdade sobre... (19): A recusa dos militares guineenses da CCAÇ 12 em irem render a CART 3494 no Xime, em março de 1973, obrigando a uma intervenção do gen Spínola (António Duarte / Valdemar Queiroz / Luís Graça / Jorge Araújo)


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) > Um coluna logística ao Xitole... O pessoal fazendo uma paragem na famosa  Ponte dos Fulas, destacamento do Xitole.

A Ponte dos Fulas (sobre o Rio Pulom, afluente do Rio Corubal) era uma espécie de guarda avançada do Xitole (na altura, a unidade de quadrícula, do Setor L1, mais a sul, era a sede da CART 2716, em 1970/72).

Perspetiva: norte-sul, quando se vem de Bambadinca e Mansambo para Xitole e Saltinho. A ponte, em madeira, de construção ainda relativamente recente e em bom estado, era vital para as ligações de Bambadinca e Mansambo com o Xitole, o Saltinho e Galomaro... A ponte era defendida por um 1 Gr Comb do Xitole, em permanência, dia e noite... Na foto sãos visíveis, em segundo plano à esquerda, o fortim; em terceiro plano, ao fundo, à direita, as demais instalações do destacamento.

Foto: © Arlindo Teixeira Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Contuboel > 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > > O Valdemar Queiroz, com os recrutas Cherno, Sori e Umarau (que irão depois para a CCAÇ 2590 / CCAÇ 12). Estes mancebos aparentavam ter 16 ou menos anos de idade (!). Eram do recrutamento local.

Foto: © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentários sobre a alegada insubordinação da CCAÇ 12, em março de 1973 (*):

(i) António Duarte [ex-fur mil da CART 3493, a companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972-1974; foi transferido para a CCAC 12 (em novembro de 1972, e onde esteve em rendição individual até março de 1974; tem 52 referências no nosso blogue]: 

Boa tarde Camaradas

Sou o António Duarte, que foi furriel atirador na Ccaç12 ente janeiro e dezembro de 1973.

Sei da recusa da companhia em seguir para o Xime, para substituir a CART 3494. Por azar em março de 73, estava eu em Portugal a gozar as minhas segundas férias e, como tal, deixei a CCAÇ 12 em Bambadinca e encontrei-a já instalada no Xime. 

Daquilo que me contaram, nomeadamente o Jioão Candeias da Silva e o António Manuel Sucena Rodrigues, a companhia recusou em seguir para o Xime, alegando transtornos na vida familiar. Não nos podemos esquecer que as praças eram, na esmagadora maioria, muçulmanos, com filhos e alguns com mais de uma mulher.

Por outro lado,  a segurança de Bambadinca nada tinha de semelhante com a do Xime.

Segundo parece a companhia formou e o comandante do batalhão [, BART 3893,]explicou o que se pretendia e levou com uma recusa. Parece que os graduados se demarcaram da situação.

Entretanto acabou por chegar o General Spínola que lhes deu a "volta", ameaçando que o chão fula, nestas circunstâncias de recusa, iria ser defendido por uma unidade de outra etnia, suponho balanta. Este facto seria uma vergonha para toda a comunidade fula da CCAÇ 12.

De qualquer forma o Candeias da Silva poderá dar mais detalhes. Infelizmente,  e por já nos ter deixado, o Sucena Rodrigues não pode ajudar.

Um abraço para todos e, se me permitem um mais apertado, para o Luís Graça
António Duarte.

13 de dezembro de 2020 às 13:53 (**)
 
(ii) Valdemar Queiroz [ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70; tem cerca de 120 referências no nosso blogue, e é um activo e incansável comentador]:

E interessante a recusa da CCAL 12 mudar de Bambadinca para Xime, alegando transtornos na vida familiar.

No caso da minha CART 11, também de soldados fulas, muçulmanos, com mulheres e filhos, como Companhia de Intervenção com o Comando em Nova Lamego, os quatro Pelotões estavam constantemente a mudar de local de permanência,  fazendo reforço a outras Companhia,  por exemplo,  em Canquelifá, Piche, Pirada, Paunca... E  quando se previa maior tempo de permanência fora da base lá seguiam com os soldados as mulheres, filhos e bagagens, para depois regressarem novamente a Nova Lamego.

Inclusive, depois de mais de um ano em Nova Lamego, toda a CART 11 mudou em definitivo para Paunca e não houve nenhum problema quanto a transtornos na vida familiar.

A vida no Xime era diferente de Bambadinca, mas em Piche, Canquelifá, Pirada ou Paunca também o era, e de que maneira, em relação a Nova Lamego.

Coisas da puta da guerra.

Abracelos
Valdemar Queiroz

13 de dezembro de 2020 às 14:59

(iii) Tabanca Grande Luís Graça:

Obrigado, António, pelo tua pronta e esclarecedora resposta. É certo que não estavas lá, em Bambadinca, em março de 1973, mas ouviste o testemunho dos teus camaradas. 

Só podia ser essa a razão da recusa: as praças guineenses da CCAÇ 12 tinham as suas razões pessoais, familiares e étnicas para não irem, de bom grado, para o Xime…

Não podia ser por medo: em quatro anos de guerra (duas comissões para a malta metropolitana…) eles já tinham dado sobejas provas de coragem, dedicação, lealdade, apego ao seu chão, e até de portuguesismo… 

Quem andou, como eu, com eles no mato, durante ano e meio, no tempo das chuvas e no tempo seco, no mato, em tabancas, em colunas, em destacamentos, etc., do princípio ao fim, sem o mais pequeno problema disciplinar ou humano, sabe do que fala…

E estou a falar da primeira geração, a da CCAÇ 2590/CCAÇ 12, ou seja, do período que vai de junho de 1969 a março de 1971. Éramos, como sabes, 6 dezenas de graduados e especialistas, oriundos da então “Metrópole”, a que se juntaram, em Contuboel, no CIM, mais 100 recrutas do recrutamento local, fulas e futa-fulas (sem esquecer 2 mandingas; depois começpu a vir, em rendição individual, um ou outro de fora do chão fula, como o Vitor Sampaio, que era mancanha, de Bissau, e um grande “reguila”). 

Sim, porque o sangue, começou a correr cedo, e para alguns a guerra depressa acabou… Lembro-me do batismo de fogo, em finais de julho de 1969, em Madina Xaquili, ainda em farda nº 3…

O Valdemar Queiroz, um dos instrutores mais queridos das nossas praças, sabe do que eu falo: deu-lhes a recruta e foi com eles ao juramento de bandeira, em Bissau, na presença de Spínola… E ele sabe bem como a parte deles eram crianças, com 16 anos ou menos...

Claro que o exército não era (nem é)  uma democracia… E não havia o hábito de perguntar à malta o que é que queriam para o jantar e muito menos que “resort” turístico preferia… 

Os batalhões de Bambadinca (BCAÇ 2852, BART 2917, BART 3873 e, no fim, BCAÇ 4616/73) usavam e usavam das unidades africanas (,milícias, Pel Caç Nat, companhias de caçadores, etc.). Estavam alia à mão, “eram da terra”, eram "pau para a toda a obra"…Até para "abrir valas" !... Resquícios do tempo do "trabalho forçado" ?!

Será que o comando do BART 3873 não olhou para aqueles homens, com quatro anos de guerra (!), e lhes perguntou a opinião ?

Percebo por que é que ninguém queria ir para o Xime (a começar pelos graduados e especialistas “metropolitanos” que, em Bambadinca, estavam no bem-bom, pelo menos em termos hoteleiros…). 

Os guineenses estavam, desde meados de 1969, a viver, com as suas famílias, na tabanca de Bambadinca (e, se calhar alguns, em Bambadincazinho, não posso jurar)… O Xime era o desterro, para mais a tabanca era exígua, as instalações militares ainda piores, e a população local era mandinga, com parentes no mato…. 

E, a propósito, gostava de saber como é que as duas comunidades passaram a coexistir… Talvez o nosso amigo José Carlos Mussá Biai, o "meino do Xime", hoje o senhor engemheiro, ainda tenha  recordações dos vizinhos fulas da CCAÇ 12... 

 Como se sabe, o Xime era o pior aquartelamento do Sector L1 e "embrulhava" com frequência no meu tempo… E, depois, do Xime até ao Corubal era a “terra de ninguém”, palco de frequentes e sangrentos episódios de guerra: bombardeamentos aéreos, barragens de artilharia, e da Marinha, emboscadas, golpes de mão, minas e armadilhas, operações de maior ou menor duração, muitas vezes tendo por guias prisioneiros do PAIGC…Não é por acaso que o Xime tem mais de 400 referências no nosso blogue, contra 200 do Xitole, 340 de Mansambo, 630 de Bambadinca…

Fico-me por aqui. Mas gostaria também de saber a “versão” dos nossos camaradas da CART 3494, como o Jorge Araújo, que muito provavelmente nem se deram conta do “drama” da malta da CCAÇ 12… 

De qualquer modo, “tudo está bem quando acaba em bem”… O Caco Baldé (, alcunha do gen Spínola, entre carimhosa e sarcástica),  geriu o conflito, utilizando a velha técnica dos cabos de guerra coloniais, ou seja, dividir para reinar… Claro que a caixinha de Pandora dos ódios étnicos teria que vir ao de cima, depois da independência… 

O que vai ficar para história é que Spínola criou expetativas demasiados altas para os fulas e outras etnias como os manjacos... O caso dos fulas foi paradigmático: morreram pelo seu "chão" e pela "pátria portuguesa", e  quando os portugueses se foram embora, a única coisa que tinham nos bolsos era o patacão pago até ao fim do ano de 1974... Foram miseravelmente tratados como simples mercenários.. Foarm sempre soldados de 2ª classe, que aprenderam a falar português durante a tropa e a guerra, e que nunca tiveram tempo de frequentar,  entre 1969 e 1974, os Postes Escolares Militares e tirar o exame da 4ª classe...Nunca ninguém se preocupou com a promoção escolar, profssional, social e cívica destes valorosos combatantes fulas a quem alguns de nós deve a vida. 

E a gente sabe, por fontes cruzadas, como Bambadinca (, em mandinga, “a cova do lagarto”) foi um altar de martírio para os nossos camaradas guineenses, fulas, que, infelizmente para eles,  acreditaram na nossa palavra e na "palavra de honra" dos novos senhores da guerra, o PAIGC...

José Carlos Suleimane Baldé (, meu camarada da CCAÇ 12 que seria capaz de dar a vida por mim ou pelo António Fernando Marques) e o António Baldé (da CCAÇ 11, pai da infeliz Alicinha, que eu e a Alice quisemos trazer para Portugal, e meu vizinho de Alfragide, hoje apicultor na sua terra) contaram-me coisas, atrozes, que se fizeram em Bambadinca, depois da independência, contra os "colaboracionistas", os "cães do colonialismo", que nos envergonham a todos e não honram a memória de Amílcar Cabral nem dos demais "mártires da liberdade da Pátria"... 

PS1 - O António Baldé, 1º cabo, natural de Contuboel,  esteve no CIM de Bolama (1966/69), np Pel Caç Nat 57 (São João, 1969/70) e na CART 11 (Paunca e Sinchã Queuto, 1970/71): é membro da Tabanca Grande, nº 610].

O ex-1º cabo José Carlos Suleimane Baldé, felizmente ainda vivo, espero, a morar em Amedalai, Xime, é  o único camarada guineense da CCAÇ 12, a integrar a Tabanca Grande, além do Umaru Baldé, este a título póstumo.

 PS2 - António e Valdemar, convenhamos que o tema é pouco natalício... Mas, infelizmente, o nosso blogue não é compaginável com as conveniências do calendário litúrgico... E as nossas conversas são como as cerejas...

Mas já agora: o João Candeias, que estava lá (, enquanto tu, António,  estavas no gozo da tua merecida licença de férias), diz que o Spínola apareceu acompanhado de "quadros africanos"... Seria o régulo de Badora, tenente de 2ª linha ? Ou figuras prestigiadas militares como o ten graduado 'comando' Jamanca que já estava a comandar a CCAÇ 21, se não erro ? O que é que tu sabes sobre isso ?

13 de dezembro de 2020 às 18:07 

(iv) Jorge Alves Araújo, ex-fur mil op esp/ranger, CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), nosso coeditor; tem 275 referências no nosso blogue]:

Camaradas,

Ao ler a presente narrativa notei que o camarada Luís Graça refere o meu nome,  pedindo-me que acrescente algo mais relacionado com a "recusa da CCAÇ 12 em render no Xime a minha CART 3494", no longínquo mês de Março de 1973.

Com efeito, não tenho memória de ter tido conhecimento de qualquer situação anormal relacionada com o tema em análise. E a justificação é a seguinte:

- A exemplo do ocorrido com o camarada António Duarte, eu também não participei na sobreposição entre as duas Unidades, uma vez que, como veio a ficar gravado na cronologia da H.U., a minha última missão no Xime acabou por ser a «Operação Guarida 18», realizada em 3 de Fevereiro de 1973, na região de Ponta Varela.

Nesta Operação conjunta, onde estiveram envolvidos seis Gr Comb (três da CART 3494 e três da CCAÇ 12), acabei por ter um "encontro imediato" com o IN (ver P13839). Concluída a missão, e após o regresso ao Aquartelamento do Xime, preparei-me para seguir para Bissau a fim de voar para Lisboa, de férias, onde cheguei dois dias depois.

Ao regressar ao Xime, em meados de Março de 73, para cumprir o restante tempo da comissão, foi com espanto que constatei que a minha CART 3494 tinha sido transferida para Mansambo, substituindo a (irmã) CART 3493, ocorrência que, segundo julgo saber, teve lugar na primeira quinzena desse mês.

Sobre este assunto, é o que posso afirmar.

Saúde para todo o auditório e um forte abraço... com distanciamento.

13 de dezembro de 2020 às 23:49
___________


(**) Último poste da série > 13 de dezembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21641: Casos: a verdade sobre... (18): Os "momentos dramáticos" vividos pela CCAÇ 12, em março de 1973, obrigada a render no Xime a CART 3494 [António Lalande Jorge, ex-fur mil mecânico auto, CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, março de 1972 / abril de 1974)]

Guiné 61/74 - P21645 Parabéns a você (1907): Francisco Santos, ex-1.º Cabo Condutor Radiotelegrafista da CCAÇ 557 (Guiné, 1963/65) e Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494 (Guiné, 1971/74)


____________

Nota do editor

Último poste da série de 14 de Dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21642: Parabéns a você (1906): José Vargues, ex-1.º Cabo Escriturário do BART 733 (Guiné, 1964/66)

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21644: Notas de leitura (1329): "Madrinhas de guerra, A correspondência dos soldados portugueses durante a Guerra do Ultramar", de Marta Martins Silva, prefácio de Carlos de Matos Gomes; Edições Desassossego, 2020 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Dezembro de 2020:

Queridos amigos, 

A jornalista Marta Martins Silva está de parabéns, dá-nos de forma tocante a missão das madrinhas de guerra, tanto na I Guerra Mundial como nos teatros de guerra em África, nos tempos da luta de libertação das colónias. É uma obra que qualquer combatente pode e deve mostrar aos filhos e netos, seguramente alheios a este fenómeno de mulheres completamente esquecidas e que tiveram um papel exemplar no suporte moral de inúmeros militares. 

Já sabíamos muito sobre a história dos aerogramas e do Movimento Nacional Feminino, mas a autora, que recorre a uma investigação cuidada e apela ao testemunho lembra-nos fenómenos ímpares como o de Maria Estefânia Anacoreta que gravava as vozes das mães, mulheres e noivas e que se deslocava a África até encontrar os fiéis destinatários. Recolhe uma dimensão triunfal deste tumulto de aerogramas e outra epistolografia, quando tudo acaba no altar ou na conservatória. E com sinceridade diz a autora: 

"Cada vez que segurei no aerograma ou numa carta trocada entre um soldado e uma madrinha de guerra foi-me inevitável pensar na viagem que aqueles pedaços de papel tinham feito até chegar às minhas mãos, tantas décadas depois de terem sido lidos pela primeira vez pelos seus destinatários. Senti-me a espreitar, pelo buraco de uma pesada fechadura, a história daquelas pessoas que tinha à minha frente - e com a maior generosidade me permitiram fazê-lo - mas também a história de um país. "

Um abraço do
Mário



Madrinhas de guerra, a correspondência que ajudava a suprir a solidão

Mário Beja Santos

"Madrinhas de guerra, A correspondência dos soldados portugueses durante a Guerra do Ultramar", de Marta Martins Silva, prefácio de Carlos de Matos Gomes, Edições Desassossego, 2020, é um livro surpreendente, pela inovação da pesquisa, pela abrangência do tratamento da temática, pelas questões sociológicas que ousa levantar. 

E Carlos de Matos Gomes abre as hostilidades com um magnífico prefácio: 

“É uma obra sobre as estratégias pessoais dos jovens portugueses feitos soldados para preservarem a corrente que os liga à origem, para resistirem às várias mortes, a física e a emocional. As madrinhas de guerra constituíram uma das amarras que permitiram ao mobilizado continuar a fazer parte da sua comunidade, enquanto ser social (…) 

A correspondência trocada entre os militares portugueses e as suas madrinhas de guerra revela que aquela não era uma guerra que pudesse ser ganha por aqueles soldados. As primeiras cartas falam do cumprimento de um dever, de um tributo a pagar, mas, logo de seguida, do regresso, do vazio da missão que cumprem. Não se vislumbra nenhum sentimento de orgulho por estarem os militares mobilizados a contribuir para uma vitória ou para uma grande causa. As cartas manifestam, isso sim, preocupações com a sobrevivência, com o desejo que o tempo passe sem deixar grandes marcas (…) 

Da leitura das cartas subentendemos que a guerra também foi o pretexto para procurar uma companhia, um destino, um futuro. Umas vezes o resultado foi feliz, noutras nem tanto. Em muitos casos, os correspondentes e as madrinhas perderam o rasto um dos outros. Quando as promessas trocadas nos aerogramas não se concretizavam na chegada dos militares à metrópole, muitas madrinhas e muitos dos mobilizados acabaram por queimá-los e a outras recordações da guerra, como um adeus ao passado. Marta Martins Silva reconstrói com emoção parte dele”.

A primeira surpresa que a autora nos proporciona é falar-nos de um livro de um pioneiro da arqueologia, Coronel Afonso do Paço que escreveu o livro "Cartas às madrinhas de guerra", com data de 1929, e nos fala da guerra das trincheiras. E temos a história de um grupo de mulheres que incentivou esta forma de comunicação, os extratos que a autora nos oferece dão conta da evolução do estado de espírito do combatente Afonso do Paço, basta o extrato de uma carta de fevereiro de 1918:

“Se a madrinha soubesse o quanto nós sofremos nesta vida de trincheira!? Se pudesse imaginá-lo!? Diria que era uma vida inteira votada à dor e ao sofrimento, porque só de dor e sofrimento é feita a nossa vida na trincha. Sofre-se de metralha que nos corta as carnes em paroxismo de dor. Sofre-se de gases que nos queimam o corpo, que secam as goelas, fazem espirrar como cabritos ou chorar como Madalenas. Sofre-se de frio, os pés na lama, a roupa pegada ao corpo, as articulações emperradas de reumatismo. Sofre-se de piolhos que nos roem a pele. Sofre-se na terra de ninguém rastejando sobre a lama ou cadáveres em putrefação”.

E daqui partimos para os aerogramas, em Jumbembém Manuel Sousa vai contando o seu fadário, e vem logo a propósito conhecer a popularidade do chamado bate estradas, grátis para um militar, a preço insignificante para as famílias, envolveu o Movimento Nacional Feminino (MNF), o serviço postal militar, a TAP, os transportes marítimos. 

A dirigente do MNF, Cecília Supico Pinto, define a competência da madrinha: escreve ao afilhado pelo menos todas as semanas, procura ser sempre agradável, versando os assuntos que mais possam interessá-lo, escreve para o distrair. Porque, como nos recordou Carlos Matos Gomes, quem partiu para aqueles teatros de guerra a tudo quer resistir quando sentiu que quebrava uma ligação ao que lhe era matricial à sua terra, à sua família, à sua comunidade, aos seus projetos de vida. 

E a autora desenvolve habilmente a origem e o sucesso deste meio de comunicação, dá-nos o essencial do que foi o papel do MNF, como se chegava à madrinha de guerra, muitas vezes era graças às revistas mais populares da época, caso da Crónica Feminina, talvez o maior sucesso de todos os tempos em Portugal de uma revista de entretenimento. Um meio que permitiu enredos, aproximações que levaram à descoberta do amor ou que respeitaram à mera formalidade da ajuda que era pedida para distrair um militar. 

E temos uma correspondência que permite conhecer o perfil de quem escreve, como vive, do que gosta, como ocupa o tempo, como trabalha. O militar responde, começa então respeitoso e vai-se desprendendo, pergunta se há namorado na costa, pede fotografia, umas vezes é comedido a descrever os horrores da guerra, outras vezes não tanto, trabalha na padaria, na manutenção de viaturas ou na secretaria, e não quer dar parte de fraco. 

Essa riqueza epistolar é-nos dada pela autora através de uma transcrição muito bem escolhida que intitula “Amor em tempo de guerra”, no fundo o triunfo dos aerogramas, tudo vai acabar bem, no altar ou na conservatória, com o copo-de-água possível.

O primeiro contato é sempre tocante, caso de Mário Silva para a menina Rosa Maria: 

“Menina, você dizia-me que gostava de saber de onde eu era, pois eu sou de aí de perto, tão perto que pertenço à mesma freguesia. Sou natural de Vilarinho mas já vivo fora da terra natal há 10 anos, estando os últimos anos como padeiro em Lisboa. Menina, quando me escrever, não se importava de me mandar dizer se é natural de Cacia e ao mesmo tempo agradecia que me trates por tu. Se por acaso a menina não se importasse podíamos escrever como madrinha e afilhado? Agradeço uma vez mais a atenção dispensada". 

Nem todos os casamentos irão ocorrer pouco depois da chegada do jovem, a autora deixa-nos para o fim um amor de longa espera entre Maria do Céu Cadima e Fernando Paredes. A Maria do Céu nunca deu ao Fernando qualquer sinal de que queria ser mais do que a sua madrinha de guerra, nunca se ultrapassava a linha da amizade, o Fernando queria mais. A vida trocou-lhes as voltas, Fernando casou com Maria Olinda, sem nunca deixar de pensar na sua Céu. A mulher de Fernando adoeceu e morrer em 2010, pouco depois Fernando também adoeceu com linfoma nos ossos, chegou a ir viver para um lar, onde contava a sua antiga história de amor, os moradores, comovidos, encorajaram-no a encontrar-se com a amada. E como no romance de Gabriel García Márquez, "O Amor nos Tempos de Cólera", cinquenta anos depois, Fernando plantou-se à porta da Céu, ela disse que não mas aceitou reatar a amizade. O resto merece ser transcrito: 

“Casaram a 13 de maio de 2015 pelo civil e a 1 de agosto passaram a morar os dois em Alfarelos, a terra do noivo. O casamento pela igreja fez-se a 7 de novembro, na Igreja de S. Martinho, em Montemor-O-Velho, a terra da noiva. A cerimónia teve guarda de honra dos Bombeiros Voluntários. Mas a felicidade que tardou a chegar para o casal não ficou durante muito tempo e por isso Céu não pôde ajudar Fernando a contar esta história, a história de um amor que venceu passado 50 anos com uma guerra pelo meio e muitas adversidades. ‘Só estivemos juntos um ano e meio, a Céu teve uma pneumonia e como tinha as defesas em baixo não resistiu a uma bactéria hospitalar. Foi um golpe duro depois de tanto lutarmos por este amor’, conta Fernando comovido. Céu, a fininha de voz doce que lhe disse naquele primeiro baile que não sabia dançar, morreu no dia 8 de janeiro de 2016. ‘Céu, eu nunca te vou esquecer’

E com este ponto culminante finda um itinerário que é mar ignoto para as novas gerações, tudo parece inacreditável ter havido mulheres que escreviam a um desconhecido, por sugestão do Movimento Nacional Feminino, dando alento e por vezes lugar a declarações apaixonadas, algumas que chegaram ao altar.

É uma dádiva maravilhosa, a de Marta Martins Silva, pôr estas mulheres esquecidas em cena pela voz das próprias, acabaram por ser protagonistas de uma guerra que seguramente nada lhes dizia, cumpriram o seu dever e até por vezes encontraram amor para toda a vida.

____________

Nota do editor

Último poste da série de 7 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21619: Notas de leitura (1328): “Socialismo na Guiné-Bissau: problemas e contradições no PAIGC desde a independência”, na Revista Internacional de Estudos Africanos, N.º 1, Janeiro-Junho 1984 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P21643: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (7): É Natal, é Natal, apesar dos confinamentos (António Marreiros, natural de Sagres, a viver há 48 anos no Canadá, ex-alf mil, CCaç 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 3 (Bigene e Guidage, 1972/74), membro n.º 822 da Tabanca Grande


Guiné > Região de Gabu > Buruntuma > 1972 > Igreja local (*)  > Natal > O presépio de barro seco ao sol e pintado com o que havia disponível de cores


Guiné > Bissau > 1973 > 
Uma montra na baixa de Bissau, com decoração natalícia... e provavelmente com animação, a avaliar pelo número de crianças especadas no passeio...

Fotos (e legendas): © António Marreiros (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Mensagem de António Marreiros, natural de Sagres, a viver há 48 anos no Canadá, ex-alf mil, CCaç 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 3 (Bigene e Guidage, 1972/74) , membro nº 822 da Tabanca Grande (**):

Data - 12/12/2020, 17:58
Assunto - Mensagem de Natal


 
Amigos:

Hoje recebi esta mensagem natalícia do Carlos Pereira um camarada e amigo dos tempos de Bigene que acho apropriado partilhar com vocês. Oxalá possam abrir este link:
 
Linda Mensagem De Natal, de Audete de Fazio

Entretanto, num álbum encontrei estas duas fotos :

(i) O presépio de barro seco ao sol e pintado com o que havia disponível de cores...Igreja de Buruntuma,  1972;

(ii)  Uma montra em Bissau numa ida à cidade (em 73, quando estava em  Bigene?), de avioneta, em serviço, talvez levantar o dinheiro para pagar a tropa em Bigene...

Lembro-me, nessa ocasião, de visitar um amigo que tinha namorada com família abastada... Lembro-me  do excesso de presentes que as crianças, que ali estavam,  nem apreciaram...

Ah!, como a memória vai ficando enevoada mas de repente uma imagem toma realidade!


É Natal, É Natal ...apesar dos confinamentos! (***)
Felicidade e cuidem-se

António Marreiros
Victoria, Canada
__________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 4 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16049: Na festa dos 12 anos, "manga de tempo", do nosso blogue (8): A bonita e original capelinha de Buruntuma, de estética modernista (José Mota Tavares, ex-alferes mil capelão, CCS/BCAÇ 1856, Nova Lamego, 1965/67)

(**) Vd. poste de 9 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21626: Tabanca Grande (506): António Marreiros, natural de Sagres, a viver há 48 anos no Canadá, ex-alf mil em rendição individual, CCaç 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 3 (Bigene e Guidage, 1972/74): senta-se à sombra do nosso poilão no lugar nº 822

Guiné 61/74 - P21642: Parabéns a você (1906): José Vargues, ex-1.º Cabo Escriturário do BART 733 (Guiné, 1964/66)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 12 de Dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21634: Parabéns a você (1905): Francisco Palma, ex-Soldado CAR da CCAV 2748 (Guiné, 1970/72) e Luís Dias, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 3491 (Guiné, 1971/74)

domingo, 13 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21641: Casos: a verdade sobre... (18): Os "momentos dramáticos" vividos pela CCAÇ 12, em março de 1973, obrigada a render no Xime a CART 3494 [António Lalande Jorge, ex-fur mil mecânico auto, CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, março de 1972 / abril de 1974)]



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Espectacular vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca (vd. mapa da região)

Do lado esquerdo da imagem, para oeste, era:

(i)  a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste);

(ii) vê-se ainda uma nesga do heliporto (2) e o campo de futebol (3);

(iii) a CCAÇ 12 começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento roubado (sic) à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole;

(iv) de acordo com a fotografia, em frente, pode ver-se o conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão (5) e as instalações de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9).;

(v) apesar do "apartheid" (leia-se: segregação socioespacial) que vigorava, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum e uma gestão comum  (19);

(vi) do lado direito, ao fundo, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá: o  aquartelamento de Bambadinca situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste), uma vista fantástica; são visíveis as valas de protecção (22), abertas ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24);

(vii)  a luz eléctrica era produzida por gerador como em todo o território, de Bissau a Cacine; junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o abrigo da metralhadora pesada Browning (25); em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses 14);

(viii) a  caserna das praças da CCS / BCAÇ 2852  (11) ficava do lado oeste, junto ao campo de futebol (3):

(ix) o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler ficava instalado, salvo erro,  no edifício (12), que ficava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U;

(x) mais à direita, situava-se a capela (13) (que também de casa mortuária) e a secretaria da CCAÇ 12 (14);

(xi) por detrás ficava o refeitório das praças; em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17).

(xii) do lado leste do aquartelamento, tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais (18), a escola primária antiga (19) e depósito da água (de que se vê apenas uma nesga);

(xiii) ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto, e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do alf mil Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12, já falecido).

Esta reconstituição foi feita pelo Humberto Reis, completada por mim (editor LG) e pelo ex-1º cabo cripto GG (Gabriel Gonçalves).

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue LUís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  Comentário, com data de 4/8/2016,  de António Lalande Jorge, ex-fur mil mecânico auto, CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, março de 1972 / abril de 1974),  ao poste P8302, de 20/5/2011 (*), 

Meus caros camaradas. 

Sou mais um dos que "felizmente" tive o prazer de conviver na Guiné com uma prole de rapaziada que ainda hoje considero mais do que amigos, como se fôssemos da mesma família.

Sou um dos que viveu momentos muito felizes nessa Companhia (com letra  grande) que foi a CCAÇ 12, mas que também viveu momentos "dramáticos", na última geração desta tão amada CCAÇ 12, quando tivemos que emigrar para o Xime e por lá permanecermos, até quando não sei,  porque eu pessoalmente, num gesto premonitório,  resolvi pagar a minha viagem para a Metrópole pela TAP no dia 20 de Abril de 1974 (é verdade,  5 dias antes do dito 25 de Abril).

Pois se não fosse assim,  só regressaria passados mais uns meses e, não é por nada. mas creio que, pelo que tenho falado com alguns camaradas,  não houve ninguém que tivesse estado na CCAÇ 12 tanto tempo seguido, como eu, que estive nesta Companhia durante 24 meses.

Cheguei como "periquito" a Bambadinca,  em Março de 1972,  em rendição individual como todos os camaradas que passaram pela CCAÇ 12, então comandada pelo célebre Capitão Bordal
o [Cap QEO Humberto Trigo de Bordalo Xavier] e regressei como disse em Abril de 1974 quando era comandante o Capitão José António Campos Simão [hoje médico, cirurgião ortopedista reformado, tendo passado entre outros pelo Hospital de Évora]. 

Conheci portanto duas gerações desta Companhia [, a 2ª , de 1971/73, e 3ª, de 1973/74] e estive aproximadamente um ano com cada uma delas.

Nunca escrevi nada no blogue porque nunca fui "expert" em computadores e é para mim muito difícil dominar estas tecnologias.No entanto sempre acompanhei, lendo todos os comentários que por aqui foram passando.

Resolvi escrever agora porque achei muito triste não se ter ainda comentado a infeliz partida do nosso camarada Victor Alves, que foi vagomestre da CCAÇ 12 e um dos grandes impulsionadores dos convívios que vimos efectuando há 43 anos consecutivos e que muita saudade nos deixa...Paz à sua alma.(**)

Ainda não me identifiquei mas penso que alguns camaradas já me poderão ter reconhecido.

Sou o António Lalande Jorge (conhecido como Furriel Jorge) e, como disse,  fui Furriel Mil Mecânico Auto na CCAÇ 12 durante o período atrás citado [, marco de 1972 / abril de 1974],.

Também tenho algumas histórias curiosas que poderei divulgar num momento de inspiração.

Já agora não sei se será o local mais apropriado para estar a fazer este comentário mas peço desculpa pela minha ignorância.

António Lalande

4 de agosto de 2016 às 23:49 


2. Comentário de LG:

Meu caro camarada Jorge, lamentavelmente só dei conta, há dias, e por mero acaso,  do teu comentário de agosto de 2016 (*). Fiquei a saber:

(i)  da morte, com um atraso de 4 anos e meio, do nosso camarada da  CCAÇ 12, Victor Alves (1949-2016). que eu ainda conheci em fevereiro de 1971, vinha render o fur mil SAM Jaime Soares Santos; mais tarde, encontrámo-nos por aqui, no blogue e nalguns convívios da CCAÇ 12 (*); 

(ii) que estavas em março de 1973, em Bambadinca, quando a "nossa" CCAÇ 12 se recusou a ir para o Xime, em substituição da CART 3494 (transferida para Mansambo); qualificas esse momento justamente como "dramático", mas não dás mais informação detalhada, sobre o que se passou, antes, durante e depois;

(iii) em poste anteriormente publicado, o João Candeias da Silva, do teu tempo, tal como o António Duarte e o saudoso Sucena Rodrigues, diz-nos que foi "transferido da CCaç 12 para Bolama (...) , como consequência de uma recusa da 12 avançar para o Xime para substituir a companhia que lá estava [, CART 3494 / BART 3873 ], e com a qual fizemos algumas operações conjuntas de que destaco duas em Fevereiro desse ano onde tivemos dois contactos com o IN [, ao tempo do cap mil inf José António de Campos Simão]". (...)

Jorge, foi pena não teres deixado um contacto na altura (endereço de email, telemóvel ou telefone...). Nem sequer sei onde vives. Gostaria muito de saber mais coisas sobre a "nossa" CCAÇ 12 do teu tempo. E, naturalmente, conhecer-te, em carne e osso, se houver oportunidade para tal.

Ficas, desde  já, convidado, tal como o João Candeias da Silva, para te juntares à nossa Tabanca Grande, onde, em 822 membros, vivos e mortos,  temos bastante malta que passou pelo Sector L1 (Bambadinca) ao longo da guerra, entre 1961 e 1974. E temos vários camaradas da CCAÇ 12, entre eles o António Duarte... 

Da primeira geração, a dos "pais-fundadores" temos vários: eu próprio, e outros furriéis, como por exemplo, o Humberto Reis, o António Levezinho, o António Branquinho (já falecido), o António F. Marques, o Arçindo T. Roda, o Joaquim Fernandes, o José Luís Sousa (, que vive no Funchal), o  José Fernando Gonçalves Almeida (transmissões),  o João Carreiro Martins (enfermeiro),  o 2º sargento José Manuel Rosado Piça (vive em Évora, e espero que esteja bem de saúde)... 

Temos, no blogue, cerca de 30 postes com a história da unidade (junho de 1969/fevereiro de 1971).

Dá notícias. E até lá, Festas, Boas e Quentes! Cuida-te, cuidemo-nos... LG

____________

Notas do editor:



(***) Último poste da série > 12 de dezembro de 2020 > 
Guiné 61/74 - P21637: Casos: a verdade sobre... (17): A alegada "insubordinação" da CCAÇ 12, em março de 1973, recusando-se a render no Xime a CART 3494 [João Candeias Silva, ex-fur mil at inf, CCAV 3404 (Cabuca, 1972), CCAÇ 12 (Bambadinca, 1973) e CIM Bolama, 1973/74]

Guiné 61/74 - P21640: Blogpoesia (710): "O fim da linha", "O ócio" e "Ofensas merecidas", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. A habitual colaboração semanal do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) com estes belíssimos poemas, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante esta semana:


O fim da linha

Não será o fim do mundo.
Apenas que o comboio chegou ao fim.
É esse seu fadário.
Feito caneco de nora a regar as nossas vidas.
Nos leva a todo lado, todo ufano.
Circulando pelas aldeias e encostas coloridas,
Nos pinta a vida de sonho eterno.
Saúda os rios mesmo no fundo dos vinhedos.
Carrega as pipas, desde a origem para as adegas.
Faz de recoveiro para as mercadorias.
Num constante vai e vem.
Sem nunca reclamar.
É o comboio que vem de além.
Passa as fronteiras sem as cortar.


Ouvindo Schubert "Impromptus"

Berlim, 6 de Novembro de 2020
Jlmg


********************

O ócio

Quem quiser viver ocioso é melhor mudar de planeta.
Este pode ser o dos macacos. De ociosos nunca.
Quem quiser fruir dele tem de dar a sua parte.
Parasitas, nunca.
Ninguém suporta trabalhar para parasitas.
A primeira encomenda deles já seguiu para a Lua.
Quando chegar a hora, outra irá.
Aqui, não!
A ociosidade é mãe de todos os vícios.
Já bastam os naturais.
Esses se vão ceifando para jogar no lixo.
Nem para pentear macacos servem!


Berlim, 7 de Dezembro de 2020
9h16m
Jlmg


********************

Ofensas imerecidas

Há pessoas, de estatura tão alta,
Ninguém consegue ofender.
Sua altura supera tanto
Que os mais arrogantes ficam desarmados e irritados.
O desempenho da sua função,
Tão nobre e competentemente desempenhada,
Fica a salvo de qualquer mancha.
É o caso da ministra da Saúde.
Jovem. Generosa. Entregue à causa.
Não há modo de a denegrir.
Só com baixezas e ordinarices.
Essas ficam sempre em quem as usa.


Berlim, 9h9m de Dezembro de 2020
Jlmg

____________

Nota do editor

Último poste da série de 6 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21615: Blogpoesia (709): "O bem que faz", "A vida é uma lição" e "Se deu certo", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

sábado, 12 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21639: In Memoriam (377): Victor Alves (1949-2016), natural de Santarém, ex-bancário, ex-fur mil SAM (vagomestre), CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, 1971/73)


Óbidos > Restaurante A Lareira > 22/5/2010 > 16º Convívio do Pessoal de Bambadinca 1968/71 >  Da esquerda para a direita: Luís Graça (ex-fur mil, CCAÇ 12, 1969/71), Victor Alves (ex-fur mil SAM, CCAÇ 12, 1971/72), Celestino Ferreira da CostaMajor inf ref,  o 2º Capitão da CCAÇ 12, 1971/72, residente na Trofa, trazido pela mão do Fernando Sousa), Jorge Cabral (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 63, 1969/71).

Foto (e legenda): © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. 
Só agora, lamentavelmente,  soubemos da morte do Victor Alves, ocorrida em 12 de março de 2016, pela leitura de um comentário do António Lalande Jorge, ex-fur mil mec auto, CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, março de 1972/ abril de 1974), com data de 4/8/2016, deixado num poste de 20 de maio de 2011 (*).

O comentário, que vamos reproduzir na íntegra num outro poste, dizia o seguinte em relação ao Victor Alves:

Meus caros camaradas. 

(...) Nunca escrevi nada no blogue porque nunca fui "expert" em computadores e é para mim muito difícil dominar estas tecnologias.No entanto sempre acompanhei, lendo todos os comentários que por aqui foram passando.

Resolvi escrever agora porque achei muito triste não se ter ainda comentado a infeliz partida do nosso camarada Victor Alves, que foi vagomestre da CCAÇ 12 e um dos grandes impulsionadores dos convívios que vimos efectuando há 43 anos consecutivos e que muita saudade nos deixa...Paz à sua alma. (...) 



2. Comentário do nosso editor LG:

 O Victor Alves merece, mesmo que muito tardiamente, ser lembrado aqui, por várias razões:

(i) foi um dos nossos "periquitos",  chegou a Bambadinca, à CCAÇ 12, em fevereiro de 1971, para render o fur mil SAM Jaime Soares Santos (vulgo,  vagomestre; aliás, um dos camaradas a que chamamos os "pais-fundadores" da CCAÇ 12,  que também nunca mais vi, depois do nosso regresso em março de 1971; disseram-me que se formou em  economia e trabalhou na TAP);

(ii) natural de Santarém, era um dos históricos da nossa tertúlia: descobriu em 207, maravilhado, o nosso blogue:

(iii) fazia a ponte entre a geração dos "pais-fundadores" da CCAÇ 12 (, a minha, 1969/71), a segunda geração (a dele, 1971/73), e a da terceira  (como o António Manuel Sucena Rodrigies, 1951-2018);

(iv) tentou. sem êxito, que se realizasse apenas um convívio anual do pessoal da CCAÇ 12, juntando os,  afinal, escassos representantes das três gerações (1969/71, 1071/73, 1973/74);

(v ) conheci-o pessoalmente em Óbidos, em 2010, por ocasião do 16º Convívio do pessoal de Bambadinca (1968/71), bem como o ex-cap inf Celestino Ferreira da Costa (vd. foto acima);

(vi) falámos algumas vezes ao telefone e trocámos alguns emails;

(vii)  foi um dos camaradas que andou a angariar fundos para custear  a  vinda a Portugal do José Carlos Suleimane Baldé  (que eu tive a alegria de rever e abraçar em Coimbra, em 2011); 
(**)

 (viiI) em fevereiro de 2014, escrevia-nos: "Já há algum tempo que nada tenho lido sobre o blogue. Hoje ocasionalmente deparei-me com esta situação.[, inquérito 'on line']. Como tantos também não gostaria de morrer sem voltar à Guiné. Contudo, devido a problemas de saúde, tudo teria de ser bem revisto. Mas em principio também gostaria."

Infelizmente não teve ensejo de realizar esse sonho. Morreria dois anos depois, de doença. Presumimos que tenha nascido em 1949. (****).  

Fica honrada a sua memória. Este caso, de resto, não será virgem: suspeitamos que possa haver mais camaradas  nestas circunstâncias: já falecidos, sem conhecimento dos editores... O blogue vai fazer 17 anos e há membros da nossa Tabanca Grande de quem não temos notícias há muito. 

PS - Soube, entretanto, pelo Fernando Sousa, que o nosso camarada Celestino Ferreira da Costa, major inf ref,  o 2º Capitão da CCAÇ 12, 1971/72, casado e  residente na Trofa, também já nos deixou.

________

Notas do editor:


15 de maio de  2012 > Guiné 63/74 - P9903: Tabanca Grande (338): José Carlos Suleimane Baldé, ex-1º cabo at inf, CCAÇ 12 (Contuboel, Bambadinca e Xime, 1969/74)

22 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8311: Os nossos camaradas guineenses (32): José Carlos Suleimane Baldé... Pensando na CCAÇ 12, em Coimbra, em Amedalai, em Bambadinca... Andando pelo Planaltod as Cesaredas, à procura de amonites e orquídeas-abelhas... Celebrando a biodiversidade, a etnodiversidade, a camarigagem, os nossos encontros e desencontros... (Luís Graça)

(***) Último poste da série > 8 de dezembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21622: In Memoriam (376): Raul Albino (1945-2020): recordando as peripécias da formação e partida da CCAÇ 2402 / BCAÇ 2851, com menos duas baixas de vulto, à chegada a Bissau
 
(****) Alfageme Santarém, Blog dos Antigos Alunos da Escola Industrial e Comercial de Santarém, fundada em 1956. > Faleceu Vítor Alves

Publicado em 2016/03/12 por alfagemesantarem

(...) Amigas, Amigos, acabamos de receber a triste notícia do falecimento do Colega Vítor Manuel Ferreira Alves. Estava casado com Madalena Simões Alves, que também andou na nossa escola.

Frequentou o Curso Geral de Comércio, curso diurno. Foi jogador de hóquei em patins pela equipa da nossa Escola, dos Caixeiros e da Académica de Santarém. Trabalhou no ex-Banco Espírito Santo.

O corpo está em velório desde as 16 horas, numa das capelas das Portas do Sol. O funeral é amanhã [113/3/2016], domingo, às 15 horas, seguindo depois para cremação, em Póvoa de Santa Iria.

Na foto abaixo, Vítor Alves é o 7º, a contar da esquerda, em baixo.

À Família enlutada, expressamos o sentimento do nosso profundo pesar.

A Coordenação.



O Victor Alves, elemento da equipa de hóquei em patins da sua escola, a Escola Industrial e Comercial de Santarém, Nesta foto, sem data, é o 7º a contar da esquerda, assinalado a amarelo.

Cortesia de Alfageme Santarém (Blogue dos Antigos Alunos da Escola Industrial e Comercial de Santarém, fundada em 1956)

Guiné 61/74 - P21638: Os nossos seres, saberes e lazeres (428): Em Belmonte, na companhia de Vitorino Nemésio, e não esquecendo Pedro Álvares Cabral (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Setembro de 2020:

Queridos amigos,
Não fosse eu assumidamente um info-excluído e outro galo cantaria. Andámos em digressão na região de Óbidos e vizinhança, primeira etapa, regressámos à base para retempero, e depois rumou-se a Pedrógão Pequeno, subiu-se à Serra da Estrela, com estadia em Manteigas, de novo em Pedrógão Pequeno para ir à Conservatória entregar a casinha a novo proprietário e montar a operação de ofertas e transferências de trastes.
Entrementes, tiraram-se imagens, muitas, para evitar perdas e a mágoa das mesmas, começou-se por Santa Maria das Salzedas, segue-se hoje Belmonte, agora há que preparar outra visita deslumbrante, ao Mosteiro de S. João de Tarouca, e logo de seguida fazer o elogio do burel, era matéria-prima que ignorava completamente a não ser em fatiota assim especificada. Como a roda da fortuna dá imensas guinadas, dei comigo a ler uma revista Panorama dedicada a Pedro Álvares Cabral, nado e criado em Belmonte, filho de alcaide, o nauta que chegou a terras de Vera Cruz, um número datado de setembro de 1968. E deleitei-me com a prosa de Vitorino Nemésio, chegarei a Belmonte numa atmosfera de canícula e uma neta a pedir constantemente água e sombra, visita abreviada, o guia foi Nemésio e a lembrança para esta terra de judiaria endereçou-se a Samuel Schwarz, como uma das nossas pechas nacionais é a ingratidão, bom seria que se desse ampla divulgação à investida cultural deste engenheiro de minas, que aproveitou poliglota para escrever em diferentes idiomas e portanto em diferentes publicações a importância do fenómeno judaico em Portugal.

Um abraço do
Mário


Em Belmonte, na companhia de Vitorino Nemésio, e não esquecendo Pedro Álvares Cabral

Mário Beja Santos

A revista Panorama publicou-se entre 1941 e 1974, editada pelo Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo (outrora o SNI), e o número a que fazemos referência data de setembro de 1968, o tema era Pedro Álvares Cabral, sobre ele irão dissertar nesta publicação, entre outros, Damião Peres, Hernâni Cidade e Alberto Iria. Mas o texto, no meu modesto entender, de maior vibração, era assinado por Vitorino Nemésio e intitulava-se “Porto seguro em Belmonte”. Estou a relê-lo em Manteigas, amanhã iremos a Belmonte, passaremos ainda por Portalegre antes de arribar em Pedrógão Pequeno. Estou rendido a esta prosa de Vitorino Nemésio, que bom seria que este professor de Cultura Portuguesa amanhã pudesse estar em Belmonte, eu levava esta publicação e pedia-lhe que ele lesse parágrafos admiráveis como estes a propósito do nauta que aportou às terras de Vera Cruz:
“Filho de alcaide, neto de alcaides – eis o que ele é. Valente como as armas, passa de capitão delas em terra a capitão delas no mar. Nada menos parecido estruturalmente com um castelo da Beira do que um castelo de proa. Mas ele, Pedro Álvares, não ia à testa da Armada porque soubesse de rumos e mexesse em papa-figos, senão porque tinha qualidade, coragem e prestança para chefe de chefes. Três, pelo menos, dos seus capitães tinham folha rezada de coisas que não se sabe que ele fizesse: o grande Bartolomeu Dias, seu irmão Diogo Dias e Nicolau Coelho, expertos de larga pilotagem investidos de grandes missões anteriores”. E, mais adiante, caso pudesse acontecer que se ouvisse a voz um tanto roufenha, sibilante e nasalada por restos de falar terceirense deste Grão-mestre da língua portuguesa, pedia-lhe também que lesse o seguinte parágrafo, mas tinha que ser em terras de Belmonte:
“Fui outro dia a Belmonte, com amigos. Romagem cabralina e, para mim (vergonha de coscuvilheiro da história, descobridor sedentário de tudo e de nada!), o vero descobrimento do caminho pela Serra da Estrela desde a Guarda a Viseu. Covilhã, Penhas da Saúde, as lagoas Escura e Comprida a distância, - os brutos, imponentes topónimos de covões que exprimem a rudeza e frieltura da Serra explicados a mim pelo meu piloto em tudo isto, Fernando Russell Cortez. No alto que fizemos em Belmonte, propositadamente não passei de meia dúzia de notas: eu que não sei nada em pormenor de Cabrais e suas alcaidarias, do seu senhorio de Azurara, das muitas e esmeriladas miunças que hão-de colmatar a grande brecha de olvido aberta na vida gloriosa de Pedro Álvares. Preferi respirar o ar serrano do alto da torre albarrã, o ar beirão que sopra já cerca de Espanha, de onde dizem que não vem bom vento, mas vinha! E, por sinal que nestes tempos de calor, sem bafores. A torre, com o paço velho do alcaide-mor desenhado num arco e numa ou outra encosta, a cachorrada de granito sobranceira à porta sobrepujando o brasão das ‘duas cabras passantes’ que deviam estar ‘sotopostas de vermelho e armadas de negro’, mas onde apenas luzia o amarelo sujo do quartzo e o negro da mica corroída”.

Isto e muito mais passou-me pela cabeça, um puro devaneio, mas foi assim que Nemésio veio à procura do rasto de Pedro Álvares Cabral. É um calor tórrido, quase sufocante que nos recebe nesta encosta oriental da Serra da Estrela, é a chamada visita de médico, uma passagem fugaz por este belo castelo, quem resiste a não ficar especado diante daquela janela esplendorosa e vaguear sem olhar para trás no interior do castelo? Passa-se à Igreja de Santiago, há uma criança de nove anos a insistir que quer uma garrafa de água, entra-se no museu judaico com o firme propósito de ir cumprimentar o legado do Engenheiro de Minas Samuel Schwarz, um polaco que se afeiçoou por Portugal, que se naturalizou português e, entre outras proezas, comprou a Sinagoga de Tomar e a ofereceu ao Estado, não se fazem negócios com monumentos nacionais, acresce tratar-se da mais representativa sinagoga tardo-medieval em território português, examina-se cuidadosamente as vitrinas que o homenageiam, é pena saber-se tão pouco sobre este herói português que em boa hora veio trabalhar nas minas da região.

Mandaria o bom-senso turístico que toda esta visita se prolongasse e motivos não faltam, a vila romana da Quinta da Fórnea, as capelas e a sinagoga, visitar mesmo o Convento de Nossa Senhora da Esperança, com tantas ligações ao credo religioso de Cabral. Nisto se repete o que insistentemente já se escreveu noutros lugares e neste: a viagem nunca acaba, quem acaba são os viajantes ou os seus sonhos idealizados ou por idealizar, volta-se qualquer dia, há legítimo pretexto para regressar, estamos enamorados pelos dias de Manteigas e pelo que se visitou na Serra da Estrela, e pela descoberta do burel, de que mais adiante falaremos, há míngua de textos, daremos vazão às imagens, pois pode dar-se o caso de algumas delas valerem por mil palavras.
Uma imagem imponente do Castelo de Belmonte com janela manuelina
Pormenor do Castelo de Belmonte
Belmonte na Rede de Judiarias de Portugal, com Pelourinho à frente
Escritor Vitorino Nemésio
Igreja de Santiago e Panteão dos Cabrais
Revista Panorama, número de setembro de 1978
Sinalética para o Museu Judaico de Belmonte
____________

Nota do editor

Último poste da série de 5 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21613: Os nossos seres, saberes e lazeres (427): Na RDA, em fevereiro de 1987 (6) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P21637: Casos: a verdade sobre... (17): A alegada "insubordinação" da CCAÇ 12, em março de 1973, recusando-se a render no Xime a CART 3494 [João Candeias Silva, ex-fur mil at inf, CCAV 3404 (Cabuca, 1972), CCAÇ 12 (Bambadinca, 1973) e CIM Bolama, 1973/74]


Capa, desenhada pelo Tony Levezinho, fur mil at inf, 2.º Gr Comb, para a capa da História da Unidade: CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/1971), elaborada pelo fur mil armas pes inf Luís M. Graça Henriques, mimeog, Bambadinca, fevereiro de 1971. (Há cópia no Arquivo Histórico-Ultramarino).


1. Comentário do João Candeias Silva, ex-fur mil at inf, de rendição individual,  CCAV 3404 (Cabuca, 1972), CCAÇ 12 (Bambadinca, 1973) e CIM Bolama (1973/74),  ao poste P21614 (*)

Bolama. Natal de 1973. 

Fui transferido da CCaç 12 para Bolama como, deduzo eu, consequência de uma recusa da 12 avançar para o Xime para substituir a companhia que lá estava  [CART 3494 / BART 3873[, e com a qual fizemos algumas operações conjuntas de que destaco duas em Fevereiro desse ano onde tivemos dois contactos com o IN [, ao tempo do  cap mil inf José António de Campos Simão].

Foi um Natal excelente, o de Bolama, porque era para mim o prenúncio do fim da missão. Curiosamente será pelo mesmo motivo que não falamos nas parvoíces fruto da idade, que não falamos em casos como o da Ccaç 12 que fez frente ao comandante da CAOP 3 [, lapso, deve ser CAOP 2, anteriormente designado por CAOP Leste até 22 de agosto de 197o],  sediada em Bambadinca [lapso, deve ser Bafatá]. 

Nunca li uma linha, uma referência a situações como a ocorrida em meados de Março [de 1973] na CCAÇ 12 em Bambadinca. 

Julgo que era o prenúncio do cansaço da guerra e um sinal de que a capitulação dos capitães, com a cobertura do topo da hierarquia,  estava próxima. Por coincidência ou não, pouco tempo depois, cerca de um ano, aconteceu [o 25 de Abril]. 

Situações como a que vivi, nunca vi serem referenciadas nem em blogues nem na "mídia". Será o caso da CCAÇ 12 único? Para se ter um pouco a ideia da situação,  a recusa [em render a CART 3494 no Xime] fez,  2 ou 3 dias depois,  o General Spinola deslocar-se a Bambadinca,  acompanhado de vários quadros africanos. E o assunto foi ultrapassado. 

E com o 25 de Abril saímos o mais depressa possível. No meu caso pessoal,  paguei a viagem na TAP e no fim de Maio [de 1974,] regressei. Tinham-se passado 25 meses. 

Fui em rendição individual em Abril de 72, passei pela CCav 3404, em Cabuca, em seguida, em Janeiro, vou para Bambadinca para a CCAÇ 12, e, por fim, para o CIM [, Centro de Instrução Militar,] em Bolama. 

Talvez noutras companhias também tenham surgido sinais de insubordinação. Talvez seja a altura de partilhar essa parte da guerra porque passámos. 

João Candeias Silva,  furriel mil at inf


2. Comentário LG (*)

João, a história da CCAÇ 12, no papel, fui eu que a escrevi. Até Fevereiro 1971. E está disponível no blogue.

Depois de fevereiro de 71 não há mais nada, de história escrita, até à extinção da CCAÇ 12 em 18 de agosto de 1974. Pelo menos no Arquivo Histórico Militar... Como sabes, para lá do primeiro comandante, o único que conheci, o 
Cap Inf Carlos Alberto Machado de Brito, a CCAÇ 12 teve, até ao final, mais quatro [Vd. ficha da unidade, no ponto 3, a seguir].

Eu e os demais graduados e especialistas, metropolitanos, a chamada 1.ª geração, éramos todos de rendição individual, pertencíamos à CCAÇ 2590, éramos apenas umas 6 dezenas de militares... Fomos dar a instrução de especialidade e a IAO, no CIM de Contuboel, às 100 praças guineenses, oriundas dos regulados de Badora e Cossé... 

A partir de 18 de junho de 1970 passámos a ser, oficialmente, a CCAÇ 12, por alteração da anterior designação de CCaç 2590.

A prineira geração de graduados e especialistas regressou a casa, na sua quase totalidade, a 17 de março e 1971, no T/T Uíge.

O que tu nos contas, ou o que deixas dar a entender, é relevante. E concordo contigo: deve ser partilhada por todos nós, aqueles que temos alguma informação sobre o que terá passado  (**). "Insubordinação"? Recusa em ir para o Xime, rendendo a CART 3494? Se sim, terá sido a segunda "insubordinação" na história da CCAÇ 12...

Teria, de facto,  havido já outra, anteriormente, ao tempo do BART 2917, e do tenente-coronel Polidoro Monteiro, e sendo comandante da CCAÇ 12 o
Cap Inf Celestino Ferreira da Costa... Algo que está mal documentado, mas é referido na história do BART 2917... Terá ocorrido em março de 1971, se não erro, aliás tenho que  averiguar melhor.

Os graduados eram já os da segunda geração....Todos "piras"....Tu e o António Duarte que são da terceira, podem e devem esclarecer o que se passou nessa operação para os lados do Poindom / Ponta do Inglês...

Dessa vez não foi o Spínola, mas o Polidoro Monteiro que, metendo-se a caminho pelo mato fora, terá ido ao encontro dos grupos de combate da CCAÇ 12 que estariam "acampados" no mato, aparentemente recusando-se a cumprir a missão que lhes fora destinada...

O assunto é muito melindroso, ignoro as razões da alegada insubordinação, mas terá havido consequências disciplinares....Enfim, falta-me informação dos protagonistas e de fontes independentes (, se é que as há).

O nosso coeditor  Jorge Araújo também deve saber algo mais sobre o que se passou em março de 1973... De qualquer modo, em finais de março de 1973, a CART 3494 foi para Mansambo e a CCAÇ 12, contrariada ou não, foi para o Xime, 
assumindo a responsabilidade do respetivo subsetor, e ficando  integrada no  dispositivo e manobra do BART 3873 e depois do BCAÇ 4616/73. É desativada a 18/8/1974.

Abraço. Festas boas e quentes. Luís

PS - Tenho pena, João, que não queiras sentar-te aqui connosco à sombra do nosso poilão, apesar dos meus reiterados convites, meus e do António Duarte. Podíamos ao menos falar pelo telefone... Aliás, não precisas de convite. O blogue é teu/nosso. Vejo que estiveste na CCAÇ 12 entre janeiro e julho de 1973.  Portanto, estiveste em Bambadinca e ainda no Xime, já com a estrada alcatroada de Bambadinca até ao cais do Xime... Tens fotos e outros documentos desse tempo? Gostava de os ver e publicar... mesmo que não queiras dar a cara...


 [Vi uma entrevista tua, no You Toube, sobre a mortalidade do sobreiro no concelho de Santiago do Cacém, onde és proprietário: vd. aqui Biosfera - João Candeias, You Tube / Nuno Candeias, 13/5/2012, vídeo 7' 53''. E gostei de te conhecer e ouvir... Também adoro o nosso montado de sobro, tal maltratado nas últimas décadas; também há alguns sobreiros na Quinta de Candoz, junto ao Douro...]

3. Fichas de unidade: CCAÇ 12

Cmdt: 
Cap Inf Carlos Alberto Machado de Brito
Cap Inf Celestino Ferreira da Costa
Cap QEO Humberto Trigo de Bordalo Xavier
Cap Mil Inf José António de Campos Simão
Cap Mil Inf Celestino Marques de Jesus

Início: 18Jun70 (por alteração da anterior designação de CCaç 2590)
Extinção: 18Ag074

Síntese da Actividade Operacional

Em 18Jan70, foi criada por alteração da sua designação anterior, integrando os quadros e praças especialistas metropolitanos, que constituíam anteriormente a CCaç 2590, e pessoal natural da Guiné, da etnia Fula.

Continuou instalada em Bambadinca, como subunidade de intervenção e reserva do CAOP 2, sendo particularmente orientada para a realização de patrulhamentos, escoltas a colunas de reabastecimento e segurança, protecção dos trabalhos de construção da estrada Bambadinca-Xime e acções sobre grupos e bases inimigas, estas efectuadas nas regiões de Enxalé, Ponta do Inglês, Ponta Varela, Satecuta e Madina-Belel, em reforço do sector de Bambadinca. 

Destacou ainda pelotões para aldeamentos da zona por períodos variáveis, nomeadamente
para Missirá, ponte do rio Undunduma e Nhabijões entre outras, com vista a garantir a segurança e protecção das populações.

Em finais de Mar73, rendendo a CArt 3494, assumiu a responsabilidade do subsector de Xime, onde se instalou, ficando integrada no dispositivo e manobra do BArt 3873 e depois do BCaç 4616/73.

Em 18Ag074, foi desactivada e extinta.

Observações
Tem História da Unidade até Fev71 - CCaç 2590/CCaç 12 (Caixa n.º 124 - 2ª
Div/4ª Sec, do AHM).

Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas de Unidade: Tomo II - Guiné - (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002), pág.  632.
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 6 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21614: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (13): O Elias Parafuso e o bolo de chantili

(**) Último poste da série > 13 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21539: Casos: a verdade sobre... (16): Onde foi o "berço da nacionalidade" ? Terá sido em Feto Lugajole, uma colina à cota de 200 mt, frente à atual tabanca de Lugajole ? Fica a 5 km da fronteira, a 40 km de Madina do Boé... E ainda hojé é intransitável de carro, em setembro... (Patrício Ribeiro, Bissau)