segunda-feira, 27 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4745: Tabanca Grande (166): Carlos Farinha, ex-Alf Mil da CART 6250/72, Mampatá e Aldeia Formosa, 1972/74

1. Mensagem de Carlos Farinha, ex-Alf Mil da CART 6250/72, Mampatá e Aldeia Formosa, 1972/74, com data de 24 de Julho de 2009:

Luís, Amigos e camaradas

Já há algum tempo que, por mero acaso numa pesquisa na internet pela palavra Guiné, descobri o vosso blogue. Confesso que fiquei surpreendido por haver tanta gente com histórias e textos tão bem escritos em que se pormenoriza e se datam acontecimentos vividos. Fui até um pouco crítico quanto à bondade do relembrar, do reavivar certas memórias que a todos, duma forma mais ou menos intensa, nos marcaram. Hoje, visito o blogue com alguma frequência e, confesso que, quer pela leitura de vivências doutros camaradas, quer pela quantidade de testemunhos descritos, já consigo ir relembrando a minha experiência e falar dela como algo que pertence ao nosso passado individual e que não nos envergonha.

Nesta lenta transição do país para uma vivência democrática plena, decorridos que são mais de 35 anos após a queda do regime que tanto nos maltratou, parece que nós os que decidimos não desertar, embora a vontade de fugir não faltasse, cometemos algum crime de que tenhamos de nos envergonhar. Como bem sabem, depois de termos sido usados e deitados fora, nunca mais nenhum organismo oficial se preocupou connosco, se precisávamos de algum apoio, assistência, nem um simples questionário! Houve até um tempo, em que falar do nosso passado não era politicamente correcto. Desculpem-me por este desabafo, mas é o que sinto.

Venho pedir que me aceitem na vossa Tabanca Grande e, embora do meu passado guineense não me lembre de histórias pormenorizadas com datas e lugares ou tenha grande jeito para as contar, prometo que alguma coisa se há-de arranjar.

As apresentações:

Sou Carlos Farinha, pertenci à CART 6250 sediada em Mampatá (Aldeia Formosa, hoje Quebo), era Alf Mil e comandava o 1.º Grupo de Combate. Fiz o serviço militar de Julho de 1971 a Outubro de 1974. Fui mobilizado para a Guiné em Junho de 1972, tendo regressado à Metrópole em meados de Outubro de 1974. Hoje, moro em Coimbra.


Fotografias que quero partilhar:

Foto 1 > Saída para o mato em Mampatá

Foto 2 > Centro da aldeia e quartel de Mampatá

Foto 3 > 1.º GComb em farda de descanso

Foto 4 > Uma das luxuosas casernas

Foto 5 > Frente de trabalhos da estrada Mampatá/Nhacobá em construção

Foto 6 > Uma caserna do nosso Destacamento em Colibuia

Foto 7 > Uma caserna do nosso Destacamento em Colibuia

Foto 8 > Mampatá, JUN74 > Encontro com elementos do PAIGC

Foto 9 > Mampatá, JUN74 > Encontro com elementos do PAIGC

Foto 10 > Mampatá, JUN74 > Encontro com elementos do PAIGC

Foto 11 > Mampatá, JUN74 > Encontro com elementos do PAIGC


Foto 12 > Mampatá, JUN74 > Encontro com elementos do PAIGC

Fotos e legendas: © Carlos Farinha (2009). Direitos reservados.


Despeço-me com amizade
Carlos Farinha

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2. Comentário de CV

Caro camarada Carlos Faria
Bem-vindo à nossa Tabanca virtual, onde, se bem lembro, tens já três camaradas, Furs Mil José Manuel Lopes e António Carvalho e, o Cap Mil Luís Marcelino, entrado recentemente para a Tertúlia.

Cada camarada que chega até nós e confessa que lendo o nosso Blogue ganha forças para lembrar e falar do seu passado de combatente, assumindo-o sem complexos ou sentido de culpa, é um bálsamo para continuarmos este trabalho a que nos propusemos.

Não precisas de pedir desculpa por estares a desabafar connosco. O fim do nosso blogue é precisamente que se conte as boas e más experiências da nossa passagem pela guerra da Guiné, servido as mesmas como repositório de uma história que queremos deixar, contada na primeira pessoa, e que ao mesmo tempo sirva de catarse a quem as narre.

Consulta por favor o lado esquerdo da nossa página onde te poderás inteirar dos nossos princípios, aquilo que (não) somos e as nossas normas de conduta.

Pretendemos discutir tudo o que se relacione com a guerra da Guiné, tão abertamente quanto possível e com a maior lisura, respeitando sempre as opiniões contrárias à nossa.

Recebe caro Carlos um abraço de boas-vindas de toda a tertúlia.
Carlos Vinhal
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4742: Tabanca Grande (165): António Dâmaso da CCP 123/BCP 12, Guiné, 1969/71

6 comentários:

mario gualter rodrigues pinto disse...

Caro camarada
Carlos Farinha

Bem vindo á nossa Tabanca. Como tú também estive em MAMPATÁ, pertencia á Cart 2519 os Morcegos de Mampatá. Obrigado pelas fotos que publicaste, pois foi bom recordar Mampatá, depois de outros por lá terem passado. Ainda deu para ver no centro a Cantina por nós construida entre outras obras.
Colibuia no meu tempo era uma Tabanca queimada pelo IN e vários habitantes viviam em MAMPATÁ.
Convido-te a ver o blogue da minha Companhia.
cart2519osmorcegosdemampata.blogspot.com

Um abraço
Mário Pinto
ex. F.Mil.

Luís Graça disse...

Carlos Farinha:

Sê bem vindo até nós, ao blogue dos camaradas da Guiné. Dou-te os parabéns por teres tomado a nem sempre fácil decisão de dar a cara, em público, e vir dizer: Em também estive, na guerra do Ultramar, na Guiné, foram dois anos da minha vida, não os posso esquecer, para o pior e para o melhor, não os posso amputar da minha história de vida, das minhas memórias, do meu 'curriculum vitae'...

Destaco o que escreveste:

"Nesta lenta transição do país para uma vivência democrática plena, decorridos que são mais de 35 anos após a queda do regime que tanto nos maltratou, parece que nós, os que decidimos não desertar, embora a vontade de fugir não faltasse, cometemos algum crime de que tenhamos de nos envergonhar. Como bem sabem, depois de termos sido usados e deitados fora, nunca mais nenhum organismo oficial se preocupou connosco, se precisávamos de algum apoio, assistência, nem um simples questionário! Houve até um tempo, em que falar do nosso passado não era politicamente correcto. Desculpem-me por este desabafo, mas é o que sinto" (...).

Muitos de nós ainda estamos a passar, tantos anos depois, por esses sentimentos contraditórios, de culpa, de vergonha, de abandono, de ingratidão... Deste um passo em frente, para de maneira lúcida, corajosa e frontal, assumires essa parte do teu/nosso passado...

Parabéns pelas fotos que nos mandaste, e que têm uma extraordinário interesse documental, em especial as fotos dos primeiros encontros com os guerrilheiros do PAICG, em Mampatá, a seguir ao 25 de Abril de 1974... Gostava que nos falasse, em mais pormenor, como foram esses encontros, as reacções de um lado e de outro, e os sentimentos e os ressentimentos, as palavras e os pequenos presenets trocados, etc.

Noutros sítios, sobretudo em subunidades que tiveram baixas provocadas por acção da guerrilha, esses encontros não terão sido tão amistosos... É humanamente compreensível... Ninguém estava preparado para a paz... Nós e eles, o PAIGC...

JOSÉ BORREGO disse...

Camarada e amigo Carlos Farinha,
parabéns pela cronologia e pelas excelentes fotografias,em que algumas mostram elementos do PAIGC em perfeita harmonia e convívio com a nossa tropa...é caso para dizer: adversários de anos , mas amigos de sempre, ou, os inimigos de hoje serão os amigos de amanhã!
É assim a natureza humana, e ainda bem!
Abraços do
JOSÉ BORREGO

Zé Teixeira disse...

Carlos

A Mampatá que conheci em 1968 era um pouco diferente. Apenas dava abrigo a um grupo de combate, o meu da C.Caç.2381 - Os Maiorais.
Só quando o centro operacional da construção da estrada se mudou para lá é que a situação mudou.
Em 2008 no Simpósio sobre Guiledje, cruzei-me com o Maiundé Baldé, guerrilheiro do PAIGC que de 1966 a 1974 andou pelas matas do Cantanhez a fazer-nos frente. Comigo cruzou-se três vezes no mínimo, uma elas em Novembro de 68 tentou entrar dentro da povoação à hora do almoço e apanhar-nos com a marmita na mão, mas foi corrido a rajada "di GTris".Nesse encontro em que Mampatá foi cercada ao arame, com tentativa de penetração em pleno dia, foram corridos e levaram feridos com eles. Do nosso lado não houve feridos, mas queimaram onze moranças. Como especialista sapador era ele que colocava as minas que nós e vós encontravamos na estrada.Em 2008 ficamos "ermons" (foi essa a sua vontade)integrado num grupo de antigos gerrilheiros que actuavam na zona.
Segundo ele me disse, só conseguiu entrar em Mampatá, onde tinha um primo, depois do 25 de Abril, tendo convivido com a tropa portuguesa.Possivelmente foi um, dos que contigo conviveram.
Em 2008 também estive em Mampatá e pude abraçar muitos amigos e amigas que tu conheceste.
Continua a ser muito curto este cantinho global.
Abraço fraterno
Zé Teixeira

Carvalho disse...

Força Farinha:o blog precisa de gente como tu.Está na hora de contares a tua Guiné.Tens muito que contar e nós, sobretudo os de Mampatá, estamos ansiosos pelas tuas histórias.

Um grande abraço.

MANUEL MAIA disse...

CARO CARLOS FARINHA,

SOMOS CONTEMPORÂNEOS NA GUINÉ.
TAMBÉM FUI EM JUNHO DE 72 E REGRESSEI EM JULHO DE 74.

ESTAVA PERSUADIDO QUE O IN NUNCA TINHA PROCURADO COMPANHIAS VELHAS PARA "CONFRATERNIZAR"...
AFINAL ESTAVA ENGANADO.

DA MINHA NUNCA SE APROXIMARAM POIS SE O FIZESSEM HAVIA MUITA MUNIÇÃO PARA DESPEJAR...

VOCÊS CONSEGUIRAM UMA COISA MUITA ESTRANHA QUE FOI CONVIVER COM QUEM ANDARAM A PERSEGUIR DURANTE DOIS ANOS.

NUNCA CONSEGUIRIA ESSE VOSSO FEITO.

NÃO SEI DE DEVA CRITICAR-TE PELO ACTO,SE ELOGIAR-TE PELO GESTO,
MAS O QUE INTERESSA É QUE VOCÊS NÃO FORAM PORVENTURA OS UNICOS A PENSAR DESSA FORMA E HOJE ESTÁS AQUI PARA NOS DARES TESTEMUNHO DO CONVÍVIO COM ESSE OUTRO LADO O QUE SERÁ TAMBÉM IMPORTANTE PARA O BLOG.

SÊ BEM-VINDO E ENVIA-NOS O MAIS REGULARMENTE POSSÍVEL INFORMAÇÃO
DESSA TUA GUERRA.
UM ABRAÇO
MANUEL MAIA.