segunda-feira, 27 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4744: Estórias do Juvenal Amado (18): Romão, o único prejudicado

1. Mensagem de Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74, com data de 25 de Julho de 2009:

Caros Luís, Carlos, Virginio, Magalhães e restante camaradas da Tabanca Grande

Esta é mais uma estória que envolve alguma solidariedade, que se praticava e como se tentava proteger quem achavamos mais limitado fisicamente.

Quanto ao tenente Raposo quero deixar bem claro que era um homem bondoso que nunca aplicou um castigo a ninguém. Quando nos juntamos nos nossos almoços o seu nome é sempre falado com amizade.

Um abraço para todos
Juvenal Amado


O ÚNICO PREJUDICADO FOI O ROMÃO

O Romão pertencia ao Pel Rec, mas era dado assente que ele nunca aguentaria fisicamente o esforço, que lhe seria exigido durante a comissão.
De fraca figura magro, era quase considerado a mascote e todos o ajudavam a superar as dificuldades, que a sua especialidade impunha.

O seu estado físico piorava a olhos vistos, urgia pois arranjar uma solução que o tirasse do mato.
Assim pediu-se ao Furriel Castro, responsável pela cantina dos praças que intercedesse de forma que o Romãozinho passasse para cantineiro acabando assim com as preocupações, que os camaradas dele tinham quando iam para as operações.

Assim foi, o Romão passou a vender cervejas, coca-colas, etc. Esqueceu a G3 bem como as picadas e as caminhadas ao sol abrasador.

Nem sempre facilitava a vida a quem tanto se preocupou com ele é bem verdade, havendo por vezes comentários ácidos em relação à abertura e fecho da respectiva cantina.

Lá foi fazendo a sua vida da forma mais calma que podia, até que um dia o impensável aconteceu. O valor resultante do dia de vendas desapareceu. Não me lembro dos valores em causa, mas era muito dinheiro para o Romão conseguir repor.

É afastado de imediato das funções e substituído por outro soldado do Pel Rec que se fez operar às unhas encravadas e por último ao prepúcio que muito o incomodava segundo ele dizia.

Tudo isto não fez aparecer o patacão, e a solução passou pelo aumento dos produtos que nós consumíamos, até perfazer o valor em falta.
Assim foi cada cerveja mais X, cada coca-cola mais Y, durante bastante tempo à boa lógica dos governos quando impõem impostos.
Lá fomos pagando, mas a coisa tendia a eternizar-se. Os camaradas das outras companhias, quando nos visitavam, queixavam-se e nós também.

Nós condutores constatávamos pelas diversas cantinas da zona Leste que a nossa era de longe a mais cara. Começou o falatório como era de esperar.
Numa bela manhã, na formatura do primeiro almoço onde normalmente duas dúzias de camaradas respondiam pela Companhia toda fazendo ginástica com a vós, de forma a que cada um respondia por vários, o tenente Raposo fez a costumeira pergunta - “alguém tem alguma coisa a dizer”?

Normalmente teria como única resposta entre dentes - “adeus ou vai-te embora”. Mas desta vez foi diferente - ”ó meu tenente porque razão nós continuamos a pagar muito mais caro os produtos da nossa cantina do que nos outros destacamentos

O homem mudou de cor - ”queres ver que levas já uma chapada nas trombas meu bandalho?” “Queres tu dizer que sou eu que fico com o dinheiro para mim?”. “Malvada a hora em que me meti com esta tropa fandanga” - lastimou-se.

Sendo ele oriundo da Guarda Fiscal onde era 1.º Sargento, habituado a lidar com homens de certa idade, convivia mal com a nossa pouca idade e as nossas maluqueiras.
E lá continuou agora já de papel na mão, “dá cá o teu número ó bardamerda”.
O resultado desta cena foi os preços terem baixado aos consumidores.

Muito mais tarde, o dinheiro desaparecido apareceu dentro de uma caixa inexplicavelmente, como inexplicável foi o seu desaparecimento.

E como o nosso povo muito bem diz, “uma mão lava a outra” os produtos da nossa cantina baixaram, para nos ser reposto os meses que pagamos a mais.

Só ao Romão não foi reposto o que lhe tiraram.

Juvenal Amado
25.08.009

Visita do General Bettencourt Rodrigues a Galomaro

Tenente Raposo

Passos, Ivo, Catroga, Setã, Alfredo, Silva, Ferreira, Romão e Viseu

Fotos e legendas: © Juvenal Amado (2009). Direitos reservados.

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4509: Estórias do Juvenal Amado (17): Ataque a Campata

2 comentários:

MANUEL MAIA disse...

CARO JUVENAL,

PELO QUE ME FOI DADO LER,O PROBLEMA DO GALOMARO ERA "TRANSMITIDO NOS GENES",ISTO É,PASSAVA DE COMPANHIA PARA COMPANHIA...

ACABEI DE COMENTAR UM TEXTO DO VASCO JOAQUIM DA GALOMARO 70/72
QUE SE QUEIXAVA DE FOME E DA NECESSIDADE DE LEVANTAMENTO DE RANCHO PARA A COISA MELHORAR...

DAVAM-LHES FOME E AINDA OS OBRIGAVAM A FORMAR PARA A PSEUDO REFIÇÃO...
MUITA GENTE ENCHEU OS BOLSOS NA GUINÉ!!!
SEI QUE NÃO ESTOU A DAR NOVIDADE A NINGUÉM,MAS...
COMPRAVAM-SE AUTOMÓVEIS COM O RICO DINHEIRINHO DO PESSOAL. OS TRINTA ESCUDOS DO GENERAL BETTENCOURT ERAM IGUAIS AOS DO "ROMÃOZINHO"...

COMPRAVAM-SE TERRENOS COM O RICO DINHEIRINHO DO PESSOAL...

DAVAM-SE ENTRADAS PARA APARTAMENTOS COM O RICO DINHEIRINHO DO PESSOAL...

URGE FALAR NESTAS COISAS.

NÃO ERAM OS MILICIANOS A PÔR A MÃO AO SACO...


UM ABRAÇO
MANUEL MAIA

Anónimo disse...

Oh amigo e homónimo Juvenal!
Então vocês deixaram o Romãozinho meter a mão na massa?

Deixa lá que eu tive um cabo do rancho, em Cacine, que roubava os géneros para os ir vender ao único comerciante branco que por lá existia!
Depois a malta comia mal no rancho e tinha que ir lá almoçar!

Otários! Estávamos a pagar duas vezes!

Boa história!

Um abraço.

Juvenal Candeias