Carlos Vinhal
Junto mail que me foi enviado pelo General Bento Soares acerca da recente inauguração do Monumento Memorial evocativo dos Antigos Combatentes da Guerra do Ultramar a 1JUN11 em Penamacor, dia do concelho.
Penso que o General não se importará se quiseres divulgar este acontecimento.
Um abraço
Carlos Pinheiro
INAUGURAÇÃO DE MEMORIAL EM PENAMACOR
Minhas Senhoras e Meus Senhores:
É que felizmente, apesar de geograficamente diminuído, Portugal ainda é bastante rico espiritual e culturalmente para que haja muitas maneiras diferentes de cumpri-lo.
Luís Forjaz Trigueiros
Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Penamacor
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia Municipal
Exmo. Senhor Presidente da Direcção Central da Liga dos Combatentes
Exmas Entidades Civis, Militares e Religiosas
Caros Companheiros Antigos Combatentes e seus Exmos Familiares:
Escolhido que foi o Dia do Município para a inauguração que hoje nos reúne, uma primeira palavra será difícil silenciar. É a do legítimo orgulho que sempre nos domina ao evocarmos os ilustres pergaminhos de Penamacor, nobre sede do nosso concelho natal.
Pergaminhos que enraízam nos primórdios da nacionalidade. É D. Sancho I a conceder-lhe foral em1.189 para depois o reformar pela Carta Foral de 1.209. Também no seu reinado é erigido o Castelo – peça fundamental na consolidação da fronteira raiana beirã – e que, decorridas sete décadas, o grande Rei D. Dinis manda reconstruir e reforçar com novas torres e muralhas a cercarem a Vila. Seria mesmo este nosso monarca, o Rei Poeta e Lavrador, que – na sequência do Tratado de Alcanizes (1279) – consolidaria as fronteiras europeias de Portugal. São, aliás, as mais antigas da Europa, como assinalam historiadores – nacionais e estrangeiros – (1). Nessa consolidação, nomeadamente dos limites raianos da Beira, conseguiu D. Dinis a inclusão das Terras de Riba Côa, aquando do regresso duma sua incursão em Castela.
Quer dizer: Penamacor é definitivamente Praça Forte com importância decisiva na defesa da fronteira. E ao longo dos séculos, até aos nossos dias – digamos, até às últimas décadas do séc. XX – teve o privilégio, raro em vilas portuguesas, de manter a presença de unidades militares. Vale aqui um registo de notável coincidência: A Vila-berço do mui ilustre Ribeiro Sanches, médico e cientista de renome europeu, mereceu receber, por volta de 1.814, um dos melhores exemplos da arquitectura hospitalar militar em Portugal. Falo do Hospital Regimental do Batalhão de Caçadores nº 4, o qual foi colocado, de forma integrada, num extremo da muralha. (2)
Pois bem, é esta Vila histórica que mereceu a divisa de “Chave do Reino”, a Praça Forte de secular ligação às Forças Armadas, que hoje inscreve em seus pergaminhos nova página nobilitante.
Senhor Presidente da Câmara:
Vossa Excelência e sua Edilidade tornaram-se credores do nosso reconhecimento e firme louvor com a decisão de mandar construir o Monumento Memorial que vamos inaugurar. É grato registar o célere acolhimento que lhes mereceu a Proposta dos Antigos Combatentes da Guerra do Ultramar naturais do nosso concelho. A Proposta teve em vista – agora que se completam 50 anos sobre o início do conflito – a prioritária homenagem dos que, nessa Guerra, entregaram à Pátria a dádiva suprema da própria vida. Seja-me permitido evocar um deles, o Alferes Nabais, pela circunstância pessoal de ser meu conterrâneo e tê-lo podido acompanhar à última morada no cemitério da Meimoa. Circunstância mais dramática ainda por ter ocorrido já na fase final do conflito – Fevereiro de 1974. Mas são 25 os filhos deste nosso concelho caídos ao serviço de Portugal. É para todos eles que se dirige nossa ardente e sentida homenagem por terem sabido responder ao chamamento pátrio em cumprimento de um sentimento marcadamente nacional.
Sejamos claros: as Forças Armadas não são catalogáveis em FA deste ou daquele regime político. São antes e tão só, porque da sua essência se trata, o supremo garante da soberania de um Povo. Respondem ao apelo dos superiores desígnios da Nação, desígnios esses que os Governantes curarão de interpretar em cada momento da História.
Consideramos por isso da maior oportunidade as palavras recentemente proferidas pelo Comandante Supremo das Forças Armadas – o Senhor Presidente da República – e que me apraz, neste momento, registar. Cito (3):
“Para lá da memória, impõe-se o reconhecimento de todos os que, pela sua acção na defesa de Portugal, sofreram no corpo e na alma o preço do dever cumprido. São merecedores de todo o nosso profundo respeito”.
E mais adiante acrescentou:
“Às gerações mais novas é importante transmitir o testemunho de quem enfrentou a adversidade ombro a ombro com aqueles a quem confiava a vida e por quem a daria também; o testemunho de quem conhece a relevância de valores como a solidariedade, o mérito e a honra, a família e o país.”
Minhas Senhoras e meus Senhores:
Um País, um Povo, sem memória é um Povo sem Identidade própria e sem História.
Nunca deverá, nunca poderá ser o caso do nosso Portugal, que é rico na História, na Tradição e na Cultura portadora de Valores multisseculares. Daí ter deixado marca indelével no progresso da Humanidade. Regressado hoje à faixa continental, detemos, no entanto, com o contributo insular, a mais extensa ZEE – Zona Económica Exclusiva da Europa, uma valia económica e estratégica que importa assinalar.
Entendemo-nos na Língua de Camões, idioma oficial de seis países, além do nosso, espalhados por três continentes fora da Europa. Falado, sem prejuízo de outros, pelos portugueses da diáspora, juntamente com diversas comunidades falantes do Português, dão expressão universal à nossa Língua.
Em suma: apetece-me dizer com o imortal Fernando Pessoa: “A minha Pátria é a Língua Portuguesa”. Pátria Lusa, que “deu novos mundos ao mundo”, como eloquentemente reconhece o conhecido historiador britânico Toynbee (1889 – 1975) ao afirmar:
“O mundo, no aspecto da história das sociedades e das relações que entre elas se puderam estabelecer, divide-se em dois períodos: antes e depois de Vasco da Gama ou antes e depois dos Descobrimentos”.
Há portanto sobejas razões para nos podermos orgulhar da nossa Pátria, sabendo honrar os seus heróis.
Mas não só heróis. Também nos cabe honrar como digno do nosso orgulho o povo anónimo, derramado pelos dois hemisférios, na sua fidelidade a princípios de sã convivência inter-racial e inter-cultural.
Povo fiel a seus brandos costumes, firme no respeito dos valores humanos e dotado de uma grande capacidade de miscigenação.
Povo colonizador que mereceu o aplauso insuspeito de um sociólogo de elite – o eminente Gilberto Freyre – que estudou e cientificamente estruturou o modelo da nossa presença colonizadora com o imortal carimbo do “Luso-Tropicalismo”.
Senhor Presidente da Câmara:
O que aqui nos traz hoje é um gesto simples e humilde, mas de grande significado. A nossa Vila, por mercê do Executivo a que Vossa Excelência preside, fica mais completa nos seus pergaminhos e em seus valores ancestrais, ao acolher o Memorial de Homenagem a seus filhos Antigos Combatentes da Guerra do Ultramar.
E é na fidelidade ao sentir Penamacorense que desejo terminar, renovando a saudação que oportunamente dirigi, em quatro singelas estrofes à Nossa…
… NOBRE VILA DE PENAMACOR
Rezam assim:
Em tempos idos cobriu-se de glória
A Fortaleza da raiana Beira,
Guardada para sempre na memória
De quem a canta ou dela se abeira.
Foral antigo, D. Sancho outorgou
E mandou erigir forte Castelo,
O povo honrado, seu sangue doou
Em defesa da terra: gesto belo.
E do alto da Torre de Menagem
A ordenança, aos vindouros reza
Que seu chão foi lavrado com suor.
Saiba a História prestar homenagem
E lembrar teu passado de grandeza
Oh! Nobre Vila de PENAMACOR!
Tenho dito.
João Afonso Bento Soares
Major General
Penamacor, 1 de Junho de 2011
Notas:
(1) A título de exemplo: Orlando Ribeiro em “Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico” e Michael Harsgor, “Portugal in Revolution”, 1976.
(2) Augusto Moutinho Borges, “O Real Hospital Militar de Penamacor: espaço e memória”. Artigo incluído em “Penamacor – 800 Anos de História” (publicação da CMP).
(3) Discurso do Senhor Presidente da República na Cerimónia de homenagem aos Combatentes, por ocasião do 50º Aniversário do início da Guerra em África. Forte do bom Sucesso em Lisboa, 15 de Março de 2011.
Citação inicial: Intervenção Luís Forjaz Trigueiros no Colóquio “Cumprir Portugal”, promovido pelo Instituto Dom João de Castro e coordenado pelo Professor Adriano Moreira, 1988.
Nota Biográfica (Síntese)
Major General João Afonso Bento Soares
- Estudou em Coimbra, no Liceu Normal D. João III (1º ao 7ºanos), após o que ingressou na Academia Militar em 1959.
- Pertence à Arma de Transmissões do Exército, sendo Licenciado em Engenharia Electrotécnica pelo Instituto Superior Técnico (1966).
- Possui o Curso de Comando e Estado-Maior e Grau Académico “Master of Military Art and Science”, EUA em 1982 – 83.
- Foi o 1º Director da Estação Portuguesa de Comunicações por Satélite, do Sistema Nato de Comunicações.
- Possui duas comissões de serviço na Guerra do Ultramar: Guiné (1968 - 70) e Angola (1975).
- Foi Director do Depósito Geral de Material de Transmissões.
- Foi Professor do Instituto de Altos Estudos Militares.
- Foi 2º Comandante da Zona Militar dos Açores e Chefe de Estado-Maior do Comando Operacional dos Açores).
- Foi Chefe de Estado-Maior da Missão de Paz da ONU em Angola (1995 – 96).
- Foi Director do Instituto Militar dos Pupilos do Exército.
- É Comendador da Ordem do Infante D. Henrique.
- É natural da Meimoa (nascido a 2JAN1941). Tem três filhos e três netos.
Barcarena, 2011
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 28 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8345: Efemérides (49): 28 de Maio de 1969: o ataque de 40 minutos a Bambadinca (Carlos Marques Santos / Beja Santos / Luís Graça)
3 comentários:
Caro camarigo Carlos Pinheiro
Fizeste bem em trazer ests informações.
Parece que, aos poucos, aqui e ali, se vai fazendo o 'registo da memória' e isso não pode deixar de ser saudado como uma coisa boa e positiva.
Abraço
Hélder S.
Agradeço ao camarada Carlos Pinheiro a divulgação deste evento.
Confesso que estou emocionado.Finalmente foi feita justiça,nomeadamente aos naturais deste concelho que deram a sua vida no campo de batalha,independentemente dos valores políticos de cada um.Esta terra foi um dos baluartes na defesa do nosso PORTUGAL,tanto como praça militar,na defesa da fronteira com Castela,como posteriormente na 1.ª guerra mundial em Moçambique contra a cobiça alemã (daqui foi mobilizado um batalhão para o norte de Moçambique),sendo que também muitos naturais deste concelho foram incorporados no C.E.P.
Existe um memorial a estes combatentes.
Quero realçar que no memorial não constam só militares mas também um policia, morto no assalto à esquadra de S.Paulo em Luanda.Na India não houve mortos,felizmente,o 2.º Comandante Brig. Leitão era natural deste concelho.
Já agora na foto da esquerda para a direita, eu, o General Bento Soares,o General Xito Rodrigues, Presidente da Liga dos Combatentes e natural de Castelo Branco e o Presidente do núcleo distrital da Liga de Castelo Branco.
Quero por último prestar a minha homenagem ao Professor Libério Lopes, principal mentor deste acontecimento,que foi combatente na Guiné e que já escreveu no blog.
Um alfa bravo para todos
C.Martins
Para o Hélder e para o C. Martins. Não têm que me agradecer nada até porque o trabalho foi-me enviado, como disse, pelo meu, então meu Comandante, na altura Capitão Bento Soares, hoje General na reforma. A ele, unica e exclusivamente se deve esta divulgação mais que merecida. Só é pena é que em muitos concelhos nunca ninguém tenha feito nada para enaltecer, recordar e de algum modo agradecer às muitas centenas de milhar de jovens que naquela altura deram o coirão ao manifesto. E, em muitos casos, pior do que tudo o que acabei de dizer, muitos concelhos, esqueceram, ou nunca se lembraram dos seus que lá deram a sua vida e muitos deles nem os restos mortais foram recuperados. No caso de Alcanena, o meu concelho de nascimento,é bem visivel no talhão dos Bomebrios Municipais, duas placas de dois soldados porque já eram Bombeiros antes de irem para a tropa,e deram a sua vida, o Carlos Galveis Ramos em Moçambique e o José Gonçalvaes na Guiné. Mas é assim.
A história vai-se fazendo, recordando muito do que se passou, e alguém um dia fará a sua compilação.
Um abraço
Carlos Pinheiro
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