segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9540: Notas de leitura (337): Guerra Colonial & Guerra de Libertação Nacional 1950-1974: O Caso da Guiné-Bissau, de Leopoldo Amado (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Janeiro de 2012:

Queridos amigos,
Proponho-me saudar esta longa, rigorosa e utilíssima incursão de estudo histórico que consagrou o nosso confrade Leopoldo Amado como doutor em História pela Faculdade de Letras de Lisboa. Leopoldo Amado, naturalmente sujeito às contingências das regras que acompanham os procedimentos de um doutoramento, espraia-se sobre um pano de fundo onde já não pode haver mais novidades, é vincadamente original na investigação a que procede sobre a fase embrionária no nacionalismo, carreia enorme documentação sobre os acontecimentos bélicos dos primeiros anos, com enorme suporte documental e vai por aí fora até a uma reflexão desassombrada sobre o legado de Amílcar Cabral.
Esta edição patrocinado pelo IPAD merece estar nas bibliotecas de todos nós.

Um abraço do
Mário


Guerra Colonial versus Guerra de Libertação Nacional:
O caso da Guiné-Bissau (1)

Beja Santos

Temos finalmente a tese de doutoramento do Leopoldo Amado em formato de livro. São 400 páginas espessas, trata-se de uma obra que obedece a requisitos específicos, um doutorando é orientado e negoceia com o mestre a tessitura das áreas a investigar e a exploração dos objetivos, desse longo debate resulta imperativamente um texto organizado com o enunciado de teses e conclusões. Por isso a obra de Leopoldo Amado tem um pano de fundo que abraça os conceitos de guerra revolucionária e contrarrevolução, explora o tema das origens do conflito, a ideologia colonial do Estado Novo e a as atitudes da população guineense face ao eclodir da guerra; segue-se a apresentação dos movimentos em presença, é um historial riquíssimo, temos aqui uma peça incontornável sobre os alvores do movimento de libertação a etapa seguinte abraça a evolução e consolidação da guerrilha, o estudioso como quase põe ao espelho as forças em campo, fica-se com uma ideia da assessoria cubana ao PAIGC, o trabalho da DGS e o quadro de agravamento progressivo da situação político-militar; o duelo de titãs, o confronto entre Cabral e Spínola, é outra investigação com marcas de singularidade, de facto foi o confronto político e militar mais poderoso, foram dois adversários à altura; a chegada dos mísseis Strella rompem todos os equilíbrios, a sua chegada ao teatro de operações faz latejar um novo desfecho, diante do fantasma do colapso militar a resposta foi a constituição, na própria Guiné, do Movimento dos Capitães, é um processo que culminará com as negociações entre o PAIGC e Portugal e a descolonização da Guiné e Bissau; e esta poderosa obra de investigação encerra com uma análise do legado político de Amílcar Cabral e as respetivas conclusões face aos pontos de partida: a aguda perceção que os efeitos desta guerra continuam a marcar a atualidade da Guiné-Bissau; e a necessidade de continuar a estudar a guerra da Guiné não tanto na perspetiva da história militar mas sobretudo pela confrontação das teses que se afrontaram a nível dos Estados-Maiores, privilegiando os seus fundamentos ideológicos, as suas perspetivas estratégicas e táticas. Tanta substância não se pode confinar ao alinhavo de umas notas quaisquer. A investigação de Leopoldo Amado merece ser tratada com respeito e consideração. Por isso a repartimos por diferentes textos.

O livro vem prefaciado por outro historiador, Peter Karibe Mendy, antigo diretor do INEP e atualmente professor de História e Estudos Africanos no Rhode Island College. Ele destaca a investigação feita nos arquivos da PIDE/DGS e o tratamento de documento cruciais para o conhecimento do período em apreço, bem como as entrevistas a militantes que tiveram cargos preponderantes no PAIGC e outras fontes igualmente relevantes. Peter Mendy considera que este contributo conduz a uma reapreciação tanto da liderança de Cabral como para análise dos dois contendores, dentro da cronologia dos acontecimentos.

Leopoldo Amado lança um olhar sobre guerras revolucionárias a partir do século XIX, destaca as formas de guerrilha e os processos de contrainsurreição a elas associados. É com os êxitos da consolidação do marxismo-leninismo na China que Mao lançou bases teóricas para dar corpo teórico e justificar o sucesso dos cerca de 20 anos de luta de guerrilhas, a sua obra “Problemas Estratégicos da Guerra Revolucionária na China” tornou-se uma obra de referência, dela ou de estrategas como o vietnamita Vo Nguyen Giap e o cubano Che Guevara vão procurar fundamentos para as guerrilhas e futuras doutrinações. Cabral conhecia tais doutrinas, a sua estratégia subversiva era tributária destas teorias da guerra revolucionária mas foi-se adaptando às realidades geográficas, sociais e sociológicas guineenses. Quanto ao Exército Português, como observa Amado, a estratégia utilizada derivava das grandes premissas do pensamento estratégico ocidental quanto à contrassubversão. Amado ilustra estas teses e no tocante à estratégia de ação direta lembra como as forças que se encontravam nos territórios coloniais, dependentes do Ministério das Colónias, passaram para a defesa do Ministério da Defesa Nacional, a partir de 1961. O contingente militar, no início da década de 60 era de 4700 homens na Guiné, quando foram encetadas ações subversivas em Janeiro de 1963 houve que montar um aparelho de suporte logístico e deslocar tropas praticamente impreparadas para aquele tipo de combates. As grandes prioridades da doutrina militar portuguesa contra subversiva ficaram plasmados no título “O Exército na Guerra Subversiva”, nele se desenhava uma adaptação a uma nova conceção de guerra.

O autor procede à caracterização do teatro de operações que de tão conhecido nos escusamos a qualquer referência. E depois lança-se em considerações sobre as origens longínquas do conflito, enumera detalhadamente sublevações de toda a ordem, particularmente a partir do século XIX até às guerras de pacificação. E observa: “A colonização portuguesa na Guiné não foi de molde a criar condições para o surgimento de uma elite local que fosse capaz de assegurar a administração dos negócios coloniais”. Mostra como as importações continuaram a ser feitas por outros Estados, por incapacidade da parte portuguesa. As origens próximas do conflito, Amado não podia ter uma visão diferente da existente na historiografia mundial, decorrem da natureza descolonizadora que está implícita à Carta das Nações Unidas e à ascensão do pan-africanismo, que ele documenta minuciosamente. E assim chegamos às independências da Guiné-Conacri e do Senegal, toda a movimentação que aí ocorreu inevitavelmente que se repercutiu no interior da Guiné. Entretanto, a rogo dos países afro-asiáticos, o Conselho de Segurança das Nações Unidas começou a ocupar-se de Portugal e da sua política colonial. Em simultâneo, Cabral chega a Conacri. Em Outubro de 1960 é aprovada a Resolução 1514, a política portuguesa fica-se sujeita ao crivo das apreciações do Palácio de Vidro. Em termos diplomáticos, a política portuguesa nunca mais se recompôs e o isolamento internacional cresceu gradualmente.

Chegamos a um ponto fundamental da reflexão que é o estudo da negritude e da consciencialização africana, indispensáveis para se compreender a contestação colonial e o quadro de apoios que a mesma obteve, sobretudo nos meios intelectuais progressistas norte-americanos e europeus ocidentais.

O pano de fundo da ideologia colonial aparece bem arrumado, bem documentado e claramente exemplificado como se exercia na Guiné, fundamentalmente até à chegada de Sarmento Rodrigues: a submissão ao imposto palhota e ao trabalho forçado, a natureza dos estatutos dos civilizados e dos assimilados, por exemplo. E por último, o autor dá-nos um esboço da organização da sociedade portuguesa em face de guerra e como se organizava a sociedade guineense e de que modo os grupos étnicos, sobretudo na fase de arranque da guerra, apoiaram os guerrilheiros ou a entidade colonizadora.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 24 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9528: Notas de leitura (336): Os Últimos Guerreiros do Império (2) (Mário Beja Santos)

10 comentários:

antonio graça de abreu disse...

Não desejo mais desentendimentos entendidos com o Mário Beja Santos.
Cada um é como é, macacos no galho de cima, macacos no galho de baixo.

Para além da eterna referência aos Strela e à derrota antecipada das Forças Armadas Portuguesas, registo
as palavras do nosso recensor-mor.

"Com os êxitos da consolidação do marxismo-leninismo na China que Mao lançou bases teóricas para dar corpo teórico e justificar o sucesso dos cerca de 20 anos de luta de guerrilhas."

Hoje qualquer historiador sério,honesto e rigoroso(atenção Leopoldo Amado!) sabe, porque a História nos ensinou, que a consolidação do marxismo-leninismo na China não foi nenhum êxito, nem sucesso.
A não ser que se considere os três milhões de camponeses fuzilados em 1951/53 como um sucesso, que se considere a campannha Anti-Direitista de 1956,-- com o melhor da intelectualidade chinesa presa e deportada, às centenas de milhares de cidadãos para os lougai, os gulags chineses, onde apodreceram e morreram até à revisão desta política em 1978 --
a não ser que se considere tudo isto, tal como diz o Mário Beja Santos, como um êxito, um sucesso.
Tal como o voluntarista Grande Salto em Frente, de 1957/58
que levou à desorganização das estruturas produtivas e concluiu em 1959/61 com uma gigantesca catástrofe social, com 20 milhões de mortos por carências alimentares, por fome. O avô da minha mulher, o senhor Dong Weicai morreu de fome, em 1961. Na Primavera de 2011, em Hefei, província de Anhui,China curvei-me diante dos restos
do avô, no seu túmulo.
É por isso que ainda me apetece mandar alguns tertulianos para um sítio muito feio.

Abraço,

António Graça de Abreu

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Henrique Cerqueira disse...

Antonio Graça Abreu
Tem lá um pouco de passiência.Tens de refrear esse teu apetite de impores as tuas ideias.
Naturalmente que tens todo o direito do mundo de expressar as tuas opiniões e convicções sobre o tempo da tua guerra assim como o pós guerra.Até tens tido sempre a tua oportunidade de publicar textos do teu livro expressavam o teu sentir a guerra quando a praticaste.Tens publicado todas as tuas opiniões sobre outros pareceres ainda que documentados e autenticados,por que os tem publicado.(Refiro os doc.do Luís Vaz).Toda a gente que não está de acordo contigo,responde-te com correção e factos. No entanto no comentário sobre a publicação do Beja Santos fases uma data de considerações que eu estou em total acordo contigo,mas não pelo motivo que o fases.Lamento que tenhas terminado perdendo a compostura mandando alguns tertulianos para o "sítio muito feio...)todos entendemos onde queres que vão quem estiver em desacordo contigo.
Um abraço Henrique Cerqueira

Anónimo disse...

Caro António,
Faço este comentário, para referir-te que, estética, e éticamente, não gostei do que escreveste.
O livro em apreço trata da "Guerra Colonial & Guerra de Libertação Nacional 1950/1974".
Ora, os teus parâmetros foram por essa terra fora até à China, que criticas ferozmente no período do grande líder, da ditadura estrénua que vitimou muitas familías feudais. Esse período atraíu-te, e ainda te apanhou também, e ao Cabral, provavelmente,a conviverem na nação amarela. Tu como residente, professor com origem no PCP-ML,que contribuías para uma faceta universalista e progressista da política que lá se praticava; o Cabral por razões muito diferentes, pois teria intenções de obter apoios políticos e materiais, e treino militar para os quadros da guerrilha.
Provavelmente farias contas à vida, já que o curriculum não te permitiria convites para te internacionalizares no ensino.
Mas o livro não trata dessas coisas, e a recensão não te faz referência, apenas, porque não consta qualquer tua acção relevante nas linhas publicadas. No texto do M.B.S. - que não consta tenha estado na China, com um estatuto que, não sei se colaboracionista, se de internacionalista proletário, não vi qualquer referência aos mortos que referes, logo, não se lhe poderia referir como "êxito" ou "sucesso".
E voltas à carga com os "Strela e a derrota antecipada das Forças Armadas".
Eu não li (interpretei) nada disso. Mas segundo o formato de educação militar compulsivo, a eficiência com que destrói a variedade e impõe a uniformidade só se pode comparar com a sua exigência de conformismo.
De outro passo, "a desvantagem do comportamento instintivo é que é inflexível, sem discernimento e de modo algum seguro".
Francamente, eu que fui instruendo, instrutor, atirador, "mines and bloody traps", sempre a alinhar, voluntário em algumas acções, não consigo perceber como é que te deixaste tornar tão rígido de pensamento. Provavelmente foi contágio da China dos horrores, ainda hoje fértil em resquícios de escravidão.
Um abraço
JD

JD disse...

Caro António, Tertulianos,
Peço desculpa pela minha falta de contenção.
Era para ser, mas não foi, e fiz o comentário anterior, do género adocicado.
Não fiquei de bem comigo.
Se nenhum dos editores tomou posição sobre a matéria, eu antecipo-me (já não sou do quadro redatorial), para convidar o A.G.A a retratar-se do seu último parágrafo.
Não é tanto pela má educação expressa, e falta de respeito à Tabanca, antes, porque exprime um nazismo intolerante. Se o A.G.A. não se deu conta, retrate-se, se foi uma tentativa de animar a tertúlia, foi de tão mau gosto e ofensivo, que deve retratar-se,
caso contrário, não voltarei a cumprimentá-lo.
JD

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Às vezes perde-se a razão tendo-a.

Por tudo o que aqui já foi escrito, penso que continuar a "chover no molhado" ou a discutir o "sexo dos anjos" (eu incluído)...de guerra ganha perdida ou empatada...confesso que já não dou mais para este peditório, estou farto.

Cada um que fique com a sua verdade.

C.Martins

Anónimo disse...

Só alguém convencido, ressabiado e temperado em molho de vinagrete, consegue proferir insultos daquele calibre.

Haja paciência.

Continua Mário, porque ainda há muita e boa gente interessada, no teu trabalho.

A.Almeida


P.S.- Se os editores acharem que devem eliminar este comentário, respeito tal decisão, sem dramatismos, nem melindres, mas estou farto dos dislates "deste tipo". Há já alguns anos, noutro sítio e noutro contexto. Sempre a mesma arrogância, com a razão sempre do seu lado, mesmo daquilo em que não percebe patavina.Foi assim uma vez comigo, uma vez, porque o ignorei.

antonio graça de abreu disse...

Eu falo em alhos e respondem-me em bugalhos.

Falei na eterna referência aos Strela e à derrota antecipada das Forças Armadas Portuguesas, porque está no texto do Mário Beja Santos,
falei da História da China, dos primeiros anos do comunismo chinês, com um saldo de muitos milhões de mortos. Apenas isto, a verdade com que se faz a História.
Concluí com o desabafo de me apetecer mandar alguns tertulianos para um sítio feio. Alguns tertulianos sentiram-se atingidos
(porquê se eu não falei em ninguém?)e lá vieram os bugalhos.
Apetece-me tanta coisa na vida que não concretizo... Pode não ser justo nem correcto. Não insultei ninguém.
Mas fui contemplado pelo Zé Dinis com a afirmação de que eu exprimo "um nazismo intolerante".
Isto insulta quem quer. E eu não quero insultar ninguém.

Abraço a todos.

António Graça de Abreu

Anónimo disse...

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