sábado, 1 de dezembro de 2012

Guiné 63/74 - P10743: Do Ninho D'Águia até África (31): O Movimento Nacional Feminino em Mansoa (Tony Borié)

1. Trigésimo primeiro episódio, enviado em mensagem do dia 27 de Novembro de 2012, da narrativa "Do Ninho de D'Águia até África", de autoria do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), iniciada no Poste P10177.


Do Ninho D'Águia até África (31)

O Movimento Nacional Feminino em Mansoa

Todos sabíamos que era domingo em Mansoa, e ia haver “manga de ronco”, com o rancho um pouco melhorado, para mais trabalho do cabo do rancho, o bom do Arroz com Pão, que logo pela manhã, andava aflito a procurar voluntários para o descasque de batatas em particular, pois tinha havido missa pela manhã, e o padre tinha dito:
- Tenho o orgulho de dizer que está presente entre nós, Sua Excelência, o Senhor Segundo Comandante do Território e a Digníssima Senhora Presidente do Movimento Nacional Feminino, nesta província.

Isso era verdade, alguns militares já tinham reparado nessas personalidades, embora a maioria deles só tivesse olhos para as filhas do Libanês, que “inundavam” toda a igreja com o seu perfume exótico!

À tarde, próximo da igreja, num palanque feito a preceito, foto em baixo, e revestido com folhas de palmeiras e de outras árvores tropicais, onde estavam presentes, estas entidades, o comandante do comando a que o Cifra pertencia, e outros comandantes das forças de intervenção que estavam estacionadas no aquartelamento em Mansoa, mais o Régulo da vila, entre outros.


Desfilaram, primeiro, alguns militares, que foram voluntários, pois nesse momento tinham roupa lavada, onde ia o furriel miliciano, a fumar um cigarro feito à mão, e que, alguns diziam que se queria mostrar às filhas do “Libanês”, também tinham pedido ao Curvas, alto e refilão para desfilar com a sua medalha Cruz de Guerra, ao que ele perguntou se era uma ordem, e dizendo-lhe que não, ele respondeu:
- Só vou no desfile, com a minha medalha Cruz de Guerra, se for com as estrelas de General nos ombros, que é para vos mandar a todos para Portugal e acabar com esta merda de guerra. - Era assim, o homem, rude na linguagem, mas directo.


Em seguida desfilaram os “Homens Grandes”, das aldeias próximas da vila, alguns com cinco e seis mulheres, foto ao lado, com o Cifra, e quando passaram em frente à tribuna, olharam as entidades por segundos, desviando o seu olhar para as referidas mulheres, para que continuassem juntas, querendo mostrar às entidades presentes que as mesmas eram sua propriedade. Depois desfilou um rapaz africano, com um corpo de “campeão de pesos pesados”, foto em cima, quase nu, a soprar num corno, emitindo um ruído que obrigava a tapar os ouvidos, a seguir vem a multidão, que eram os curiosos, como por exemplo o Cifra, o Setúbal e o Curvas, alto e refilão, alguns naturais, uns descalços, e só com um farrapo a tapar-lhe os órgãos genitais, com algumas pulseiras de missanga nos braços e nas pernas, outros com uma vestimenta branca a cobrir-lhe todo o corpo, e com um gorro de lã na cabeça, algumas crianças, também descalças, algumas com o dedo na boca e o ranho no nariz, e mulheres com bebés amarrados com uma fita de pano nas costas. Também desfilaram alguns naturais que ajudavam os militares, servindo de guias tradutores, fotos em baixo, com o Cifra.


O Curvas, alto e refilão, primeiro dizia que queria ser general e mandar tudo para Portugal e acabar com a guerra, e agora não parava de dizer:
- Isto é tudo fachada! Estão aqui muitos guerrilheiros disfarçados, no meio de toda esta gente. Segurem-me, se não ainda vou buscar a G-3!

Todos nós sabíamos que só saíam bazófias da sua boca, mas adiante, vamos continuar, foram buscar o carro da Psico com a sua aparelhagem sonora, houve discurso a preceito, fotografias, e no final distribuição de lembranças, como por exemplo, lâminas para a barba, cigarros, aerogramas, isqueiros, uns santinhos com a imagem de Nossa Senhora de Fátima em cima de uma árvore e os pastorinhos de joelhos, com o terço na mão, muito tristes a olharem para ela, que alguns militares passaram a usar no capacete quando saíam em patrulha, e que o Mister Hóstia, gravura ao lado, se encarregou de distribuir, umas carteiras em plástico, com um buraquinho, para se aplicar um fio, e pendurar ao pescoço, para guardar os documentos de identificação para os naturais, com o escudo de Portugal, onde se lia, a letras douradas, “Território Português - Província da Guiné”.

Quase ao acabar toda esta cerimónia, uma das senhoras presentes, talvez porque o Cifra andasse por ali, talvez informada, ou única e simplesmente se recordasse da cara do Cifra, porque este, antes lhe tinha pedido um isqueiro para o Curvas, alto e refilão, que andava sempre a “pedir lume” a toda a gente, chama-o e entrega-lhe um embrulho com umas centenas de aerogramas, e alguns isqueiros, dizendo-lhe:
- Por favor leva isto, e distribui pelos militares no aquartelamento.

O Cifra, gravura à esquerda, com a ajuda do Setúbal e do Curvas, alto e refilão, trouxe o embrulho para o aquartelamento, e tal como a senhora lhe tinha pedido, começou a distribuir os aerogramas e os isqueiros a outros militares. Correndo o boato, no aquartelamento, que o Cifra tinha aerogramas do Movimento Nacional Feminino para distribuir, foi distribuindo, até não haver mais.

Quando se acabaram, ninguém acreditava que o Cifra não tinha mais, daí começou novamente o boato que o Cifra era o representante do Movimento Nacional Feminino, que tinha muitos aerogramas e isqueiros, mas que não queria distribuí-los.

Teve o comandante que interferir e colocar uma folha oficial, no refeitório, para todos lerem, em abono da verdade, que o Cifra não tinha mais aerogramas nem isqueiros.

Desses aerogramas, que eram de cor amarela, o Cifra não usou nenhum, só começou a usar aerogramas, quando vieram uns novos com uma cor de azul esbatido. Assim como com os isqueiros, pois o Cifra tinha um, que uma madrinha de guerra de Espanha, lhe tinha mandado com o emblema da ONU, que conservou até final da comissão.

Quando alguém interpelava o Cifra, a respeito dos aerogramas, e o Curvas, alto e refilão, estava presente, ele logo dizia:
- Filho da p....! És pobre e mal agradecido, ainda vais levar com este isqueiro no focinho, se voltas a insultar o Cifra!


Ao outro dia, o Cifra passa na altura em que desmanchavam o palanque e vê dezenas de santinhos pelo chão, pois possivelmente os tinham distribuído aos naturais, foto em cima, que não sabiam o que aquilo era, que o Cifra apanhou, juntou e, como se fosse um baralho de cartas, levou para o Mister Hóstia, que emocionado lhe disse:
- Já vejo que te estás a aproximar de Jesus Cristo, pois tanto tu, como o Setúbal e o Curvas, alto e refilão, já não têm alma, andam em pecado mortal há muito tempo!

(Texto, ilustrações e fotos: © Tony Borié (2012). Direitos reservados)  
____________

Nota de CV:

Vd. os últimos 10 postes da série de:

27 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10578: Do Ninho D'Águia até África (21): O Tabaco, para alguns (Tony Borié)

30 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10594: Do Ninho D'Águia até África (22): Uma história de amor em pleno conflito (Tony Borié)

3 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10611: Do Ninho D'Águia até África (23): O maldito dente (Tony Borié)

6 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10627: Do Ninho D'Águia até África (24): O nosso Cabo Reis (Tony Borié)

10 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10646: Do Ninho D'Águia até África (25): O comboio das seis e meia (Tony Borié)

13 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10661: Do Ninho D'Águia até África (26): Raízes de agricultor (Tony Borié)

17 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10683: Do Ninho D'Águia até África (27): O perfume exótico das filhas do Libanês (Tony Borié)

20 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10699: Do Ninho D'Águia até África (28): A avioneta do correio (Tony Borié)

24 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10716: Do Ninho D'Águia até África (29): Maldita matacanha (Tony Borié)
e
27 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10729: Do Ninho D'Águia até África (30): As lavadeiras (Tony Borié)

4 comentários:

admor disse...

Caro Tony Borié,

Ainda bem que te salvaste de seres um herege desalmado, pois assim continuas a deliciar-nos com os episódios que viveste na Guiné.
O tens um diário muito bem circunstanciado ou então tens uma memória prodigiosa.
Continua a transmitir-nos as tuas vivências.
Um grande abraço.
Adriano Moreira

Bispo1419 disse...

Que mimo de texto e que bela reportagem!
Um grande abraço, meu caro Tony Borié!
Manuel Joaquim

Anónimo disse...

http://prixviagrageneriquefrance.net/ viagra
http://commanderviagragenerique.net/ viagra
http://viagracomprargenericoespana.net/ viagra sin receta
http://acquistareviagragenericoitalia.net/ viagra

Anónimo disse...

http://achatcialisgenerique.lo.gs/ acheter cialis
http://commandercialisfer.lo.gs/ cialis
http://prezzocialisgenericoit.net/ comprare cialis
http://preciocialisgenericoespana.net/ cialis comprar