Carlos Barros, Esposende
1. Mais uma pequena história do Carlos Barros [, um de "Os Mais de Nova Sintra", 2ª C/BART 6520/72 (Bolama, Bissau, Tite, Nova Sintra, Gampará, 1972/74), os últimos a ocupar o aquartelamento de Nova Sintra antes da sua transferência para o PAIGC em 17/7/1974; membro da Tabanca Grande nº 815, tem 14 referências no nosso blogue; vive em Esposende, é professor reformado]
O morcego e a cria…
por Carlos Barros (**)
O Comando da 2ª Cart de Nova Sintra, escalou, mais uma vez, o 3º grupo de combate para garantir a segurança da estrada Tite-Enxudé, uma via de extrema importância uma vez que garantia o acesso, por via marítima e fluvial, à cidade de Bissau, através da utilização de pequenas embarcações.
Numa 4ª feira, o furriel Barros estava descansado, devidamente armado, no seu posto de vigilância nesse percurso e, por sinal, entretinha-se a caçar alguns pássaros com a sua arma de pressão, no meio dos cajueiros.
Num cajueiro, amarrado a um ramo, encontrava-se um morcego e o Barros, decidiu dar-lhe um tiro já que nunca tinha visto ao perto um morcego.
Um tiro certeiro e passados segundos, esse animal cai no chão poeirento do posto de vigilância e, algo de imprevisível tinha acontecido: o morcego caiu morto e tinha uma cria junto de si e o destino da cria estava traçado…
O Barros estava amarelo e tremendamente arrependido por ter morto o morcego já que nunca suspeitou que existia uma cria em amamentação pois, se soubesse, jamais atiraria ao infeliz animal.
Um dia estragado, mais um “desastre” na caçada do Barros, e este militar, como muitos outros, andava um “pouco apanhado” da guerra que transformava os homens em autênticos “animais irracionais”…
Se houvesse, na altura uma Associação Protectora dos Animais, o Barros assumiria a culpa e suportaria as consequência e digo isto, porque o furriel, em parte, recuperou das mazelas psíquicas que a atroz guerra provocou.
A partir desse momento, a arma de pressão entrou de féria durante muito tempo…
Nova Sintra, 1972
Barros
_____________
Notas do editor:
Um dia estragado, mais um “desastre” na caçada do Barros, e este militar, como muitos outros, andava um “pouco apanhado” da guerra que transformava os homens em autênticos “animais irracionais”…
Se houvesse, na altura uma Associação Protectora dos Animais, o Barros assumiria a culpa e suportaria as consequência e digo isto, porque o furriel, em parte, recuperou das mazelas psíquicas que a atroz guerra provocou.
A partir desse momento, a arma de pressão entrou de féria durante muito tempo…
Nova Sintra, 1972
Barros
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Notas do editor:
(*) Excertos: Considerações Finais (pp. 77/78)
(...) Uma das principais ameaças que recai sobre os morcegos do Oeste africano é a falta de estudos dirigidos à conservação. Nas últimas décadas, poucos trabalhos têm sido realizados nesta região, sendo assim difícil avaliar, não só a situação das populações de morcegos, mas também os verdadeiros factores de ameaça que recaem sobre estas espécies.
Não constituindo uma excepção, os trabalhos realizados até à data, na Guiné-Bissau, não permitem obviamente, avaliar o estado das populações de quirópteros aí presentes, de modo a determinar o seu estatuto de ameaça ou a sua tendência populacional. No entanto, da análise que nos é permitida fazer aos dados de que dispomos, evidenciam-se alguns pontos que merecem ser aqui ser referidos:
(i) Constata-se que a maioria dos quirópteros encontrados na Guiné-Bissau, são espécies florestais, que utilizam estas áreas para abrigo e alimentação. É também bastante evidente que este é o habitat mais (sobre) explorado no território. Num país onde a energia eléctrica se reduz à área da capital, e mesmo aí sofre frequentes interrupções, é fácil compreender o valor do carvão como fonte de energia.
Agravando ainda mais esta situação, existe uma política de incentivo à exploração de madeira e procede-se à eliminação da floresta para dar lugar a campos agrícolas. Assim, este habitat, onde ocorre a maioria do quirópteros conhecidos para a Guiné-Bissau, sofre uma redução considerável e continuada que é bastante preocupante. Esta situação revela a necessidade urgente da tomada de medidas prementes para o controlo da destruição desregrada da floresta.
A estratégia de controlo da desflorestação parece quase inevitavelmente passar pela recurso a energias alternativas, nomeadamente à energia solar. Um exemplo excepcional que vai de encontro a esta estratégia é o plano da IUCN (em implantação em 1998), de divulgação de fornos solares de alto rendimento, a qual deveria ser feita, não apenas em áreas protegidas, mas também a nível nacional.
(ii) A reconversão da floresta em arrozal já desde há muito se provou ineficaz, já que os anos de produtividade são muito reduzidos, sendo estes campos geralmente abandonados após um curto espaço de tempo. O acelerar da recuperação de muitos terrenos de cultura, com plantação de espécies pioneiras, seria outra estratégia a tomar, juntamente com prévia análise e controlo das áreas a desflorestar para a agricultura.
Também se verifica a reconversão da floresta para plantações frutícolas, sobretudo de cajueiros, resultante de uma política de incentivo à produção, tendo em vista a exportação de frutos. Neste caso, dever-se-ia tentar utilizar os terrenos já previamente desflorestados, para esta actividade.
(iii) De salientar também que, para além das áreas florestais, as savanas do tipo Guineano, do Oeste Africano, são consideradas como centros de riqueza específica (...) ao nível africano, o que confere uma responsabilidade acrescida na preservação deste habitat no território.
(iv) Ao nível de populações de morcegos, o reduzido número de capturas e a reduzida riqueza específica revelados nas ilhas de Bubaque e Orango, justificam o estudo da capacidade de migração de algumas das espécies aí presentes e assim averiguar a viabilidade das populações de morcegos insulares.
(v) Também as grutas do Boé, cuja importância a nível nacional é inegável, deveriam
ser regularmente monitorizadas, para acompanhamento das colónias que as ocupam e controle
atempado de potenciais ameaças.
(vi) Da listagem de espécies obtida para a Guiné-Bissau, 8 espécies podem ser
preliminarmente consideradas como prioritárias nos estudos a desenvolver, pelo estatuto que
lhe é atribuído pela UICN a nível mundial, pela falta de confirmação da sua presença ou por se
encontrarem no limiar da sua área de distribuição.
Estas são: H. monstrosos, E. buetticoferi, C.
afra, H. cyclops, H. abae, R. alcyone, R. denti, H. fuliginosus, E. guineensis, C. poensis e C.
beatrix. Os estudos a desenvolver deveriam ter como fim o desenvolvimento de planos de
acção para estas espécies.
Obviamente que todos estes pontos têm subjacente o reconhecimento político e
popular da necessidade de conservação dos quirópteros. Os morcegos são raramente incluídos
em políticas ambientais ou projectos educacionais, sendo por isso importante garantir que os
políticos e decisores sejam totalmente esclarecidos sobre a importância dos morcegos e do seu
papel nos ecossistemas africanos (...).
Este deverá certamente ser o primeiro
passo a dar na conservação dos morcegos na Guiné-Bissau. Refira-se por exemplo, a propósito
de projectos educacionais, que, apesar de actualmente a situação não parecer particularmente
gravosa, se deveriam também realizar algumas campanhas informais de esclarecimento dos
proprietários das fruticulturas sobre a importância dos morcegos frugívoros, e do real impacto
que estes têm sobre esta actividade, geralmente sobrestimada. (...)
[Revisão e fixação de texto para efeitos de edição neste blogue: LG]
(**) Último poste da série > 5 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21517: Pequenas histórias dos Mais de Nova Sintra (Carlos Barros, ex-fur mil at art, 2ª C/BART 6520/72, 1972/74) (10): Relembrando a morte, por acidente com um dilagrama, no CIM de Bolama, em 10/7/1972, do alf mil Carlos Figueiredo
5 comentários:
Carlos, uma história... "corajosa" porque hoje não é "politicamete correta"... Mas, deixa-me dizer-te que também tive um "problem de consciência ecológica" como tu... Nunca fui, felizmente, caçador (,mas gostava de caça no prato,cá e lá: lebres, perdizes, coelhos, galinhas de mato, gazelas...).
A única vez na vida (!) que dei um tiro a uma ave foi na ponte de Udunduma: dias e dias de tédio, a viver como as "toupeiras" num "buraco" (o destacamento da ponte sobre este afluente do rio Geba, na estrada Xime-Bambadinca, vital para as conunicações com todo o leste...).
O alvo não era... um morcego, mas sim um jagudi (, um animal tradicionalmente protegido pelas populaçõs locais). Estava bastante longe, no akto de uma árvore, numa das margens do rio...Felizmente que falhei o alvo... Mas fiquei danado comigo: era um tiro de raiva, também de uma "apanhado do clima" como tu...
Um abracelo, Luís (no dia de São Martinho, em que temos de comer as castanhas sozinhos, que tristeza!, mas havereremos de ganhar a batalha contra a pandemia de Covid-19...)
quiróptero
qui.róp.te.rokiˈrɔptəru
adjetivo
ZOOLOGIA pertencente ou relativo aos quirópteros
nome masculino
ZOOLOGIA espécime dos quirópteros
nome masculino plural
ZOOLOGIA grupo (ordem) de mamíferos a que pertencem os morcegos, cujos membros anteriores, providos de membrana alar desenvolvida, estão adaptados ao voo
Do grego kheír, kheirós, «mão» +pterón, «asa»
https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/Quir%C3%B3ptero
Carlos, só agora (!) reparou no morcego ao canto inferior direito da tua foto!... E agora percebo porquê!... Passaste a ser amigos dos morcegos que, na imaginário popular, são animais das trevas, mamíferos que voam e que se alimentam de sangue,tendo por isso pacto com o diabo e coma as bruxas...
O desaparecimento dos morcegos é um indicador (mais um...) da terrível depradação do planeta, cometido pelo "Homo Sapiens Sapiens" que pouco ou nada tem de sábio... Estamos a dar cabo de tudo, das nossas forestas, da Guiné-Bissau à Amazónia... Mas não é agora,´é de há 300 anos, com a revolução industrial, a urbanizaçao, a agricultura (extensiva e intensiva), a expansão colonial, etc.
Luis
Eu tambem abati um destes bichos em S. Domingos.
Mas a bem da ciencia...
Entreguei o em mão as estas duas investigadoras.
Quando as acompanhei nesta data,nas recolhas pelo o Norte da Guiné.
Abraço
No nosso Quartel de Baixo, em Nova Lamego, havia uma árvore de médio porte, junto ao refeitório, que durante o dia estava cheia de folhas e durante a noite ficava sem muitas dessas folhas. Mais tarde, viemos a verificar que muitas das daquelas folhas eram, afinal, dezenas de morcegos que ficavam dependurados durante o dia e à noite saíam para a sua vidinha.
Abracelos
Valdemar Queiroz
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