Em representação das Nações Unidas nas zonas detidas pelo PAIGC: Folke Löfgren com alunos da escola de mato Areolino Lopes Cruz, na base de Cubucaré, consultando o livro escolar O Nosso Livro, impresso na Suécia, Uppsala, abril de 1972 (Foto gentilmente cedida por Folke Löfgren) (Fonte: Tor Sellström, op-. cit. 2008, pág. 167)
Nessa publicação ele conta-nos como é que os chamados "Grupos de África" (organizações suecas de solidariedade com a luta dos povos da África Austral, e nomeadamente contra o apartheid) e o governo sueco começaram a interessar-se pelo que se estava a passar na Guiné-Bissau, no final dos anos 60.
A partir de 1969, a Suécia começou a dar, ao PAIGC, uma "ajuda humanitária" substancial, primeiro em géneros, depois em dinheiro, que se prolongou muito para além da independência, até meados dos anos 90. Em meados dessa década, fechou abruptamente a torneira, ao perceber que estava a mandar o dinheiro dos contribuintes para o lixo.
"As exportações financiadas com doações da Suécia representavam, durante este período, entre 5 por cento e 10 por cento do total das importações da Guiné-Bissau". Estamos a falar de valores que chegaram aos 2,5 mil milhões (!) de coroas suecas [c. 269,5 milhões de euros] durante o período de 1974/75-1994/95 (sendo de 53,5 milhöes de coroas suecas, ao valor actual, ou sejam, cerca de 5, 8 milhões de euros, de 1969/70 até 1976/77).
Sáo factos que já pertencem ao domínio da História. Mas, passados estes anos todos, julgamos que ainda pode ter algum interesse, para os nossos leitores, saber um pouco mais sobre o envolvimento da Suécia, mesmo que indireto, na "nossa" guerra colonial.
Vamos continuar a seguir esta narrativa, reproduzindo, com a devida vénia, mais um excerto do livro de Tor Sellström. Já chamámos, logo no início, a atenção para alguns factos e dados que merecem a nossa contestação ou reparo crítico, nomeadamente quando o autor fala do trajeto do PAIGC e do seu líder histórico, não citando fontes independentes e socorrendo-se no essencial da propaganda do PAIGC (ou de fontes que lhe estavam próximas)...
Já apontámos, nos postes anteriores, para alguns exemplos desse enviesamento político-ideológico: (1) a greve dos trabalhadores portuários do Pijiguiti e o papel do PAI (mais tarde, PAIGC); (ii) a batalha do Como em 1964: (iii) o controlo de 2/3 do território e de 400 mil habitantes (!) por parte do PAIGC; (iv) as escolas, os hospitais e as lojas do povo nas "áreas libertadas"; (v) a morte de Amílcar Cabral e o seu contexto, etc.
O texto (na parte que nos interessa, a ajuda sueca ao PAIGC, pp. 138-172) tem demasiadas notas de pé de página, que são úteis do ponto de vista documental e até têm informação relevante mas são extremamente fastidiosas para a generalidade dos nossos leitores. (Vamos mantê-las, para não truncar a narrativa; podem ser lidas na diagonal)
Os negritos são nossos: ajudam a destacar alguns dos pontos importantes do texto. O "bold" a vermelho são passagens controversas, são uma chamada de atenção para o leitor, devendo merecer um comentário crítico (ou o recurso a leituras suplementares).
Corrigimos um ou outro erro de português. Os excertos, que reproduzimos, seguem o Acordo Ortográfico em vigor.
Para já aqui ficam os nossos agradecimentos ao autor e ao editor, Nordiska Afrikainstitutekl (em inglês, The Nordic Africa Institute).
Ficha técnica:
Tor Sellström - A Suécia e as lutas de libertação nacional em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. Nordiska Afrikainstitutekl, Uppsala, 2008, 290 pp. Tradução: Júlio Monteiros. Revisão: António Lourenço e Dulce Åberg. Impresso na Suécia por Bulls Graphic, Halmstad 2008ISBN 978–91–7106–612–1.
Disponível em
https://www.diva-portal.org/smash/get/diva2:275247/FULLTEXT01.pdf
(Também disponível na biblioteca Nordiska Afrikainstitutekl (ou Instituto Nórdico de Estudos Africanos) aqui, em "open acess" .)
Resumo dos excertos anteriores (*):
Com base numa decisão parlamentar aprovada por uma larga maioria, a Suécia tornou-se em 1969 o primeiro país ocidental a dar ajuda oficial aos movimentos nacionalistas das colónias portugueses (MPLA, PAIGC, FRELIMO). O PAIGC vai-se tornar o principal beneficiário dessa ajuda (humanitária, não-militar). Muito também por mérito de Amílcar Cabral e da sua habilidade diplomática.
O êxito da campanha contra a participação da empresa sueca ASEA no projecto de Cahora Bassa em Moçambique, por volta de 1968–69, na altura em que decorria a guerra do Vietname, levou a que os principais grupos de pressão (“Grupos de África”, oriundos de cidade como Arvika, Gotemburgo, Lund, Estocolmo e Uppsala) se ocupassem, quase em exclusivo, da luta armada nas colónias portuguesas, com destaque para a Guiné-Bissau (Parte I).
Em 3 páginas (pp. 141-143), o autor faz um resumo da "luta de libertação na Guiné-Bissau", usando unilatereal e acriticameente informaçáo propagandística do PAIGC, alguma particularmente grosseira como a pretensão deste de controlar 400 mil habitantes (numa população de pouco mais de meio milhão)... (Parte II).
Nas páguinas 144-147, fala-se dos primeiros contactos com o PAIGC e das primeiras visitas ao território (Parte III).
Nas páginas 148-152, é referido a primeira visita (de muitas) de Amílcar Cabral à Suécia em novembro de 1968 (Parte IV).
As conversações de Ström com o PAIGC foram bastante simples. No seu relatório, descreveu Amílcar Cabral, secretário geral do PAIGC, como ”um jovem agrónomo bastante jovial, elegante, intelectual e um conversador desenvolto e muito animado. Nada de apelos patéticos nem declarações solenes. As suas intervenções eram objectivas, claras e concisas” (Parte V, pp. 152-154).
Os suecos quiseram, na sua ajuda "não-militar", privilegiar os sectores da educação e a saúde. onde o PAIGC estava confrontado com "enormes desafios". O pressuposto era de que, em 1971, calculava-se que viviam 400.000 pessoas nas zonas libertadas da Guiné-Bissau, (...) na sua maioria artesãos e camponeses (sic) (Parte VI, pp. 154-157. Uma estimativa, disparatada, que fazia parte do arsernal de propaganda do PAIGC...
Tor Sellström - A Suécia e as lutas de libertação nacional em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau: o caso da ajuda ao PAIGC - Parte VIII:
Excerto do índice (pág. 4)
O PAIGC da Guiné-Bissau: Desbravar terreno | Pág. |
As colónias portuguesas no centro das atenções | 138 |
A luta de libertação na Guiné-Bissau | 141 |
Primeiros contactos | 144 |
Caminho para o apoio oficial ao PAIGC | 147 |
Uma rutura decisiva | 152 |
Necessidades civis e respostas suecas | 154 |
Definição de ajuda humanitária | 157 |
Amílcar Cabral e a ajuda sueca | 161 |
A independência e para além dela | 168 |
A cooperação com o PAIGC da Guiné-Bissau dominou a ajuda oficial sueca aos movimentos de libertação africanos durante a primeira metade dos anos setenta. Começando a um nível relativamente alto (131), a ajuda em bens aumentou de forma sustentada ao longo dos anos e, apesar das diferenças culturais e das circunstâncias, em geral difíceis, baseou-se em confiança mútua entre as partes e foi aplicada de forma satisfatória tanto para os doadores como para os beneficiários da ajuda.
O facto de o secretário geral do PAIGC se ter empenhado, pessoal e profundamente na concepção, aplicação e seguimento da ajuda oficial facilitou as operações de cooperação (132), como é natural.
Também ajudou o facto de, antes de se iniciar o relacionamento, o PAIGC ter já um
representante residente na Suécia, que participou activamente no debate, e com quem a ASDI teve consultas frequentes. Onésimo Silveira foi, contudo, destituído em novembro de 1972 (133) e apenas dois meses depois, a 20 de janeiro de 1973, Amílcar Cabral foi assassinado (134).
Nessa altura, a cooperação com o PAIGC estava já firmemente
enraizada. O assassinato de Cabral não provocou uma crise aberta no movimento
de libertação, que fizesse com que o governo sueco tivesse de suspender a
ajuda, como aconteceu aquando do assassinato do presidente da FRELIMO, Eduardo
Mondlane, em Fevereiro de 1969.
Tanto o sucessor de Cabral no cargo de secretário-geral
(Aristides Pereira), como o seu irmão Luís Cabral, que viria a ser eleito
presidente da Guiné-Bissau independente, tinham trabalhado desde o início, de
forma estreita, com a ASDI e, a seguir ao assassinato, ficaram com os seus
contactos junto da agência de ajuda (135). A ASDI retomou as remessas de ajuda
para Conacri logo em meados de Fevereiro de 1973 (136).
A morte de Cabral teve um profundo impacto na Suécia (137). Descrito como o ”mais profundo, do ponto de vista teórico, dos líderes nacionalistas da África portuguesa” (138), tinha capacidades extraordinárias para conseguir apoios para o PAIGC num espectro político vasto, da esquerda não-parlamentar ao Partido Liberal.
Ao longo do tempo aproximou- se muito da
liderança social-democrata, à volta da pessoa do primeiro ministro Olofe Palme, mas
tinha relações calorosas com a ASDI e com o movimento de solidariedade.
Dizendo que ”a ideologia era, acima de tudo, saber o que se pretendia nas circunstâncias particulares em que se estava”(139), as suas ideias seriam, contudo, muitas vezes citadas, mas também distorcidas, em prol de determinadas posições políticas.
A Suécia e a União Soviética eram os maiores doadores do PAIGC (143). Enquanto a Suécia privilegiava a componente civil, os soviéticos eram os principais municiadores da luta no campo militar (144).
Havia uma divisão não coordenada, mas não menos real, de facto, entre os dois estados o que foi, em larga escala, copiado para os movimentos de libertaçãoda África Austral (145).
O
facto de, aos olhos dos Estados Unidos e de outros grandes estados ocidentais, a
Suécia ser vista como estando a partilhar uma causa com o bloco comunista, não
desencorajou o parlamento nem o governo suecos de fornecer ajuda não
militar (146).
No início da década de setenta a maior crítica que se fazia ao governo social- democrata (tanto por parte da oposição não-socialista do Partido Liberal, como pelo movimento de solidariedade) tinha a ver com as relações comerciais que a Suécia mantinha com Portugal, seu parceiro na EFTA, pois dizia-se que aumentar a ajuda humanitária oficial ao PAIGC e seu aliados da CONCP e, ao mesmo tempo, aumentar o comércio com a potência colonial portuguesa era altamente imoral e contraditório (147).
Para os Grupos de África
este facto constituía a prova de que o governo ”protegia os interesses dos
imperialistas suecos” (148). O escritor e activista Göran Palm que, depois de uma
visita às zonas libertadas da Guiné-Bissau, nos finais de 1969, escrevera
entusiasticamente que fora recebido ”como um príncipe” por causa da ajuda
sueca (149), concluía em 1971 que ”a Suécia dá com a mão esquerda social-democrata, mas tira com a mão direita, capitalista” (150).
As conclusões de Palm foram apresentadas no prefácio de um livro de textos em sueco, escrito por Amílcar Cabral, e publicado com o título A nossa luta, a Vossa luta. O título foi retirado de um discurso feito em 1964, no qual Cabral declarava que o Imperialismo era o inimigo comum da classe operária internacional e dos movimentos de libertação nacionais. Daí que devesse ser combatido numa ”luta comum” (151). O discurso de Cabral, incluído na antologia Guerrilha (152), de Anders Ehnmark, foi muito citado pelo movimento anti-imperialista sueco.
Numa conferência em Estocolmo em que participaram os Grupo de África de
Arvika, Gotemburgo, Estocolmo e Uppsala, que se auto-proclamavam ”grupos de
trabalho anti-imperialistas” (153) e que definiram como um dos seus principais
Terminada conferência, os grupos enviaram cartas para os gabinetes da FRELIMO, do MPLA e do PAIGC, informando-os de que o trabalho do movimento de solidariedade se baseava ”no princípio formulado pelo camarada Amílcar Cabral”, nomeadamente que "a melhor forma de provar a vossa solidariedade é lutar contra o imperialismo nos vossos países,ou seja, na Europa. Enviar-nos medicamentos é positivo, mas secundário" (156).
Independentemente das suas posições quanto ao imperialismo, era difícil afirmar, pelo menos no caso da Suécia, que os líderes do PAIGC, da FRELIMO e do MPLA tenham ficado muito estimulados por, no início de 1971, terem sido informados da aplicação de uma declaração geral feita em 1964 e que se aplicava a uma situação concreta, existente nesse primeiro momento (157). É além disso improvável que considerassem a ajuda humanitária como algo secundário, ou que vissem de todo a Suécia como um país imperialista (158).
O líder citado do PAIGC participara activamente na ajuda sueca. Cabral tinha também uma enorme abertura de espírito face ao relacionamento entre a Suécia e Portugal. Durante a sua primeira visita, realizada nos finais de 1968, declarou, segundo narra Pierre Schori, que Portugal não devia ser excluído da EFTA, pois isso significaria ”que o país poderia agir com ainda mais à-vontade” (159).
Como consta das notas de uma reunião entre o representante das Nações Unidas, Sverker Åström, e Cabral, realizada em fevereiro de 1970, este último deixou clara a sua opinião, dizendo "perceber perfeitamente que a filiação de Portugal na EFTA impunha certos limites à Suécia, mas que queria destacar que não gostaria, de forma alguma, de recomendar uma interrupção das relações comerciais entre a Suécia e Portugal, corte esse que sabia ser exigido por certos núcleos radicais de jovens na Suécia" (160).
Uma vez que encabeçava uma luta de libertação que estava a correr bem e tendo a intenção de manter e desenvolver relacionamentos internacionais depois da independência da Guiné-Bissau, a diplomacia conduzida por Cabral caracterizava-se por um realismo pragmático.
De acordo com o académico guineense Carlos Lopes, o seu principal mote condutor era ”a nossa ideologia é o nacionalismo, obter a nossa independência, e obtê-la de uma forma absoluta, e fazendo tudo o que estiver ao nosso alcance usando as nossas próprias forças, embora cooperando com todos os outros povos para conseguir desenvolver o nosso país” (161).
Esta posição não só contrasta com a interpretação ideológica do conceito de luta nacionalista feita pelo movimento de solidariedade sueco, como levou Cabral, nessa altura, a retirar algum destaque a várias iniciativas, levadas a cabo na cena internacional, em prol do PAIGC.
Isso mesmo fica claramente demonstrado antes da Assembleia Geral das Nações Unidas em novembro de 1972 quando, por deferência estratégica para com a Suécia e os outros países nórdicos, recusou a possibilidade que lhe foi dada de se dirigir ao pleno da assembleia, como primeiro representante de um movimento de libertação.
O pano de fundo para essa recusa foi o seguinte: O Comité das Nações Unidas para a Descolonização (162) (também chamado Grupo dos 24) organizou uma visita única de apuramento de factos à Guiné em abril de 1972 ”com o objectivo de desmistificar as afirmações portuguesas segundo as quais não existiam quaisquer zonas libertadas e dar legitimidade aos movimentos africanos de libertação” (163).
A delegação era composta por três jovens diplomatas das Nações Unidas, um dos quais (de nome Folke Löfgren, o primeiro secretário da missão permanente em Nova Iorque) representava a Suécia (164), país que, na altura, era o único membro ocidental do Comité para a Descolonização (165).
Uma vez que o governo sueco tinha alargado bilateralmente, e de forma considerável, a ajuda humanitária ao PAIGC, a iniciativa foi seguida com todo o interesse pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros em Estocolmo.
Organizada ”de forma clandestina” (166), a missão das Nações Unidas provocou indignação em Portugal (167). Durante a visita, os portugueses intensificaram os bombardeamentos aéreos e a actividade militar em geral contra as zonas libertadas. Löfgren diria depois que ”fomos ingénuos, ao ponto de não acreditar que Portugal poderia tratar as Nações Unidas desta forma” (168).
As Nações Unidas ficaram ”impressionadas com o entusiasmo e a cooperação abnegada que o PAIGC recebe das populações nas zonas libertadas e o grau de participação dessa mesma população na maquinaria administrativa criada pelo movimento de libertação” (169), concluindo que o PAIGC não apenas controlava militarmente, mas governava de facto os territórios libertados.
Löfgren teve oportunidade de registar in loco que a ajuda humanitária sueca (nomeadamente em termos de material escolar, mormente na forma do livro escolar O Nosso Livro) chegava às populações no interior do país (170).
Em geral,a missão confirmou o apoio popular de que gozava o PAIGC nas zonas visitadas, tendo recomendado o reconhecimento da declaração planeada de independência da Guiné-Bissau (171).
Com base nas suas conclusões, o Comité das Nações Unidas para a Descolonização aprovou, numa reunião em Conacri a 10 de abril de 1972, na qual participou Amílcar Cabral, uma resolução, em que reconhecia o PAIGC "como o único e autêntico representante do território da Guiné-Bissau, solicitando a todos os estados e agências especializadas, bem como outras organizações do sistema das Nações Unidas, que tomassem esse facto em consideração ao tratar de questões que se relacionassem com a Guiné-Bissau e Cabo Verde" (172).
Tratou-se de um grande êxito politico e diplomático para o PAIGC e, de uma forma mais geral, de ”um enorme avanço em termos da compreensão internacional para a maior legitimidade dos movimentos africanos de libertação junto das Nações Unidas”.173
Com base no relatório da missão (**), o Comité das Nações Unidas para a Descolonização pôde então instar ao reconhecimento dos movimentos de libertação enquanto observadores, e não apenas como peticionários (174).
Ainda mais importante do que isso foi que, pela primeira vez na história das Nações Unidas, foi possível que um representante de um movimento de libertação se dirigisse directamente à Assembleia Geral das Nações Unidas, honra essa que teria cabido a Amílcar Cabral mas que, devido às reservas da Suécia e dos países nórdicos, não se veio a verificar. Numa entrevista datada de 1995, o presidente do Comité de Descolonização das Nações Unidas, Salim Ahmed Salim da Tanzânia, relembra:
"Amílcar Cabral veio a Nova Iorque e nós tentámos que ele falasse na Assembleia Geral dasNações Unidas. Nessa época era inconcebível que um representante de um movimento de libertação se dirigisse à Assembleia Geral, mas nós dispúnhamos dos apoios necessários para tal.
"Contudo, os países nórdicos tinham reservas. Lembro-me do embaixador da Suécia e os outros embaixadores nórdicos me dizerem: ”Olhe que não estamos satisfeitos com isto. Em termos legais, teremos problemas se representantes dos movimentos de libertação se dirigirem à Assembleia Geral. É algo sem precedentes e que vai provocar imensos problemas.”(175).
"Fui então ter com Amílcar Cabral e disse-lhe:
”Sr. Secretário Geral, se quiser dirigir-se à Assembleia Geral, nós dispomos de
votos para tal. Temos o apoio necessário dos países africanos e asiáticos, bem
como de um conjunto de países sul-americanos. Mas quero que saiba que os países
nórdicos estão muito descontentes com isso. O que fazemos?” Cabral então disse:
”Olhe, os países nórdicos são nossos amigos. Ajudaram-nos nas alturas mais
difíceis e não queremos criar-lhes dificuldades. Não me dirigirei à Assembleia
Geral”.
"Havia imenso respeito pela posição dos países nórdicos. Nem
se punha a possibilidade de duvidar da sua integridade ou da sua sinceridade
relativamente aos movimentos de libertação. Se qualquer outro país ou conjunto
de países tivesse dito que não, nós teríamos trazido a questão ao conhecimento
da Assembleia Geral e recebido os votos necessários. [...] Nós sabíamos que a
posição dos países nórdicos era de apoiar os movimentos de libertação de uma
forma prática.
"Essa era, também, a única maneira de entender a posição de Cabral, pois ele era um desses visionários, um gigante entre as pessoas, que não hesita. Ele mostrou o respeito que nutria pelos países nórdicos e, como é óbvio, esse respeito foi partilhado por aqueles que o apoiavam e que apoiavam a luta (176).
131. A primeira dotação ao PAIGC em 1969–70 foi de 1 milhão
de coroas suecas. O primeiro donativo à SWAPO da Namíbia, concedido em 1970–71,
foi de 30.000 coroas suecas e a ajuda regular ao ANC da África do Sul foi de 150.000
coroas suecas em 1972–73.
132. Amílcar Cabral opunha-se firmemente à ideia de receber ajuda oficial sueca via o Comité de Libertação da OUA (Marianne Rappe: Memorando (”Samtal med Folke Löfgren på SIDA den 21.4.1972: PAIGC”/”Conversa com Folke Löfgren na ASDI 21.4.1972: PAIGC”), ASDI, Estocolmo, 24 de Abril de 1972) (MFA).
As relações diretas e bilaterais não só aumentaram a influência do movimento de libertação sobre o programa de apoio, mas fortaleceram também a posição do mesmo na cena internacional. Deve-se acrescentar a isto as limitações administrativas da OUA. Todos os movimentos de libertação da África Austral apoiados pela Suécia partilhavam do ponto de vista de Cabral neste aspeto.
No caso do Zimbabué, o antigo vice-secretário das Finanças da ZANU, Didymus Mutasa,
explicaria depois: ”Nós sentimos muito o peso da burocracia que reinava no seio
da OUA. Eles diziam que tínhamos de esperar pela cimeira dos chefes de estado
que, depois de reunir, ainda iria demorava muito tempo a decidir se era ou não
necessário que avançássemos com a luta de libertação. Entretanto, nós ficávamos
sentados ao sol, à espera e na esperança de que chegasse ajuda. Daí que
tenhamos pensado porque não haveríamos de receber o dinheiro directamente”
(Entrevista com Didymus Mutasa, p. 218). Cf. Ansprenger op. cit.
133. De acordo com Aristides Pereira, que visitou Estocolmo no início de janeiro de 1973, o afastamento de Silveira foi uma ”medida disciplinar”, motivada pelo facto deste se ter recusado a viajar para a Guiné, para debates com o PAIGC. Contudo, o movimento estava ”muito satisfeito com o trabalho feito por Silveira na Suécia” (Anders Möllander: Memorando (”Minnesanteckningar från besök 1973 01 02 av Aristides Pereira, PAIGC”/”Notas davisita de 1973 01 02 de Aristides Pereira, PAIGC”), Estocolmo, 4 de janeiro de 1973) (SDA).
O novo representante do PAIGC, Gil Fernandes, foi apresentado por carta de Aristides Pereira pouco tempo depois (Carta de Aristides Pereira à ASDI, Conacri, 11 de janeiro de 1973) (SDA). Fez a sua primeira visita à ASDI em meados de fevereiro de 1973, na companhia de Fernando Cabral, irmão do líder do PAIGC recentemente assassinado (Carta (”Svensktvarubistånd till PAIGC”/”Ajuda sueca em géneros ao PAIGC”) de Marianne Rappe, ASDI a Gun-Britt Andersson, Ministério dos Negócios Estrangeiros, Estocolmo, 26 de fevereiro de 1973) (SDA).
Em resumo, quanto à representação do PAIGC na Suécia, não houve grandes quebras no relacionamento. Silveira veio depois a trabalhar para as Nações Unidas em vários países africanos. Em novembro de 1998 formou um novo partido político, o Partido do Trabalho e da Solidariedade (PTS) em Cabo Verde, seu país de origem.
134. O governo português sabia do plano do PAIGC de declarar a Guiné-Bissau independente em 1973, e receava que isso se traduzisse num aumento da pressão no sentido de se fazer a descolonização em Angola e Moçambique, e num desafio à sua autoridade em Portugal.
O assassinato de Cabral
resultou duma operação iniciada pela PIDE, que contou com a ajuda de um grupo
de dissidentes do PAIGC. Cabral foi alvejado a tiro em pleno dia, em frente ao gabinete
do PAIGC em Conacri, por um antigo comandante naval do PAIGC (ver Chabal op.
cit., pp. 132–43).
135. Aristides Pereira foi confirmado como novo secretário
geral e Luís Cabral como vice secretário geral, no congresso do PAIGC realizado
no Boé (no leste da Guiné-Bissau) em julho de 1973.
136. Carta (”Svenskt varubistånd till PAIGC”/”Ajuda sueca em
géneros ao PAIGC”) de Marianne Rappe, ASDI para Gun-Britt Andersson, Ministério
dos Negócios Estrangeiros, Estocolmo, 26 de fevereiro de 1973 (SDA).
137. A memória de Cabral foi objecto de homenagem, entre outras, do primeiro ministro Palme, no parlamento (”Extracto do discurso de abertura do primeiro ministro, Olof Palme, no debate político na generalidade, Riksdag”, 31 de janeiro de 1973, em Ministério dos Negócios Estrangeiros: Documents on Swedish Foreign Pollicy: 1973, Estocolmo, 1976, pp. 19–20).
Palme tinha já enviado as suas condolências ao PAIGC e à viúva do secretário geral assassinado, caracterizando-o como ”um dos líderes mais proeminentes do Terceiro Mundo” (Telegrama do Ministro dos Negócios Estrangeiros à delegação sueca nas Nações Unidas em Nova Iorque, Estocolmo, 22 de Janeiro de 1973) (MFA).
Mostra das tensas relações entre o movimento de solidariedade e o governo nessa altura é a forma como os pêsames de Palme foram descritos pelos Grupos de África, ou seja, como ”uma desagradável tentativa de tirar partido do bom nome e da reputação do PAIGC, à escala mundial, num momento de dor” (Södra Afrika Informationsbulletin, nº. 19, 1973, p. 9).
138.
MacQueen op. cit., p. 21.
139. Carlos Lopes: Guinea Bissau: From Liberation Struggle to Independent Statehood, Westview Press, Boulder, Colorado and Zed Books, Londres e New Jersey, 1987, pp. 57–58.
141. Em janeiro de 1972, o presidente do Partido de Esquerda Comunista, C.H. Hermansson, apresentou uma moção ao parlamento, exigindo o ”fim do princípio de tutela para a ajuda humanitária aos movimentos de libertação nas colónias portuguesas e a favor de um princípio de ajuda incondicional” (Parlamento sueco 1972: Moção nº. 57, Riksdagens Protokoll, 1972, p. 5).
Entrevistado em 1996, Hermansson explicou que ”na nossa opinião, os movimentos de libertação deveriam, por exemplo, ter a possibilidade de comprar armas (e tudo o que precisassem para a sua luta) com a ajuda sueca” (Entrevista com C.H. Hermansson, p. 291).
142. O governo norueguês decidiu, em março de 1972, atribuir um milhão de coroas norueguesas ao PAIGC. Essa ajuda foi aumentada para 1,5 milhões de coroas norueguesas em 1973. Para mais informações sobre a Noruega e o PAIGC, consulte Tore Linné Eriksen: ”As origens de um relacionamento especial: Noruega e África Austral 1960– 1975” em Eriksen (ed.) op. cit., pp. 72–77.
Antes
de o governo finlandês tomar, em 1973, uma decisão de princípio em prol da
ajuda directa aos movimentos de libertação africanos, Cabral fez uma visita a
Helsínquia. Convidado por um comité ad-hoc, de um conjunto muito largo em
termos de base de ONGs, presidido pelo futuro primeiro ministro social
democrata Kalevi Sorsa, Cabral foi oficialmente recebido em outubro de 1971
pelo presidente Urho Kekkonen. Segundo Soiri e Peltola, Cabral ”foi o primeiro
líder dos movimentos de libertação africanos a ser tratado como um estadista na
Finlândia”. A visita ”foi um êxito e congregou, pela primeira vez, os partidos
políticos finlandeses à volta da questão de acabar com o colonialismo em
África” (Iina Soiri e Pekka Peltola: Finland and National Liberation in
Southern Africa /”A Finlândia e a Libertação Nacional na África Austral”/,
Nordiska Afrikainstitutet, Uppsala, 1999, pp. 51–52).
143. Marianne Rappe: Memorando (”Samtal med Folke Löfgren på
SIDA den 21.4.1972: PAIGC”/”Conversa com nFolke Löfgren na ASDI 21.4.1972:
PAIGC”), ASDI, Estocolmo, 24 de Abril de 1972 (SDA). A ASDI solicitou informação
sobre outros doadores ao PAIGC e aos movimentos de libertação da África
Austral. A informação era regularmente incluída nos documentos apresentados ao
Comité Consultivo para Ajuda Humanitária.
144. Na fase final da guerra de libertação, a União
Soviética forneceu ao PAIGC mísseis terra-ar, dando a supremacia, de forma
decisiva, ao movimento de libertação. Os mísseis foram pela primeira vez usados
em março de 1973, altura em que o PAIGC abateu dois caças-bombardeiros
fornecidos pela República Federal da Alemanha. No ano que se seguiu, os
portugueses perderam trinta e seis aviões (Rudebeck op. cit., pp. 52–53).
145. No caso da ZANU do Zimbabué, o principal fornecedor de
armas era a República Popular da China.
146. Ver, por exemplo, as entrevistas com o antigo director
geral da ASDI (1965–79) Ernst Michanek (p. 323) e com a antiga Ministra para a
Cooperação para o Desenvolvimento Internacional (1985–91) e dos Negócios
Estrangeiros (1994–98) Lena Hjelm-Wallén (p. 293). Em 1998, Hjelm-Wallén foi
nomeada vice primeiro ministro.
147. Esta perspectiva era também partilhada por importantes grupos dentro do Partido Social Democrata, no poder. Birgitta Dahl, por exemplo, levantou no parlamento sueco a questão da legislação contra investimentos em Portugal e nas suas colónias (”Resposta do Ministro dos Negócios Estrangeiros a uma interpelação pela Sra. Dahl”, 10 de dezembrde 1973, em Ministério dos Negócios Estrangeiros: Documents on Swedish Foreign Policy: 1973, Estocolmo, 976, pp. 155–59).
148. AGIS op. cit., p. 194.
149. Göran Palm: ”Rapport från Guiné-Bissau”/”Relatório da
Guiné-Bissau” sem indicação de local nem data (SDA).
150. Introdução por Göran Palm a Cabral (1971) op. cit., p.
25.
151. Cabral
(1971) op. cit., p. 37.
152.
Ehnmark (1968) op. cit., pp. 139–58.
153. ”Protokoll”/”Actas” (”Konferens mellan Afrikagrupperna
i Sverige, 2–3 januari 1971”/”Conferência entre os Grupos de África na Suécia,
2–3 de janeiro de 1971”) sem indicação de local nem data (AGA).
154. Os Grupos de África na Suécia: ”Circular nº. 3”, sem
indicação de local, 8 de abril de 1971 (AGA).
155. Ibid. Ver também Södra Afrika Informationsbulletin, nº.
11, 1971, p. 2.
156. Carta (em francês) em nome dos Grupos de África de
Arvika, Lund, Estocolmo e Uppsala, escrita por Dick Urban Vestbro e enviada à
FRELIMO, ao MPLA e ao PAIGC, Estocolmo, 3 de janeiro de 1971 (AGA).
157. Pelo contrário, numa alocução conjunta com Göran Palm na Universidade de Uppsala, em novembro de 1968, Cabral disse: ”Não se limitem a manifestar-se. Façam também algo de concreto. [...] Enviem-nos medicamentos e outros bens de que necessitamos” (Upsala Nya Tidning, 28 de novembro de 1968).
O primeiro pedido de ajuda sueca à luta de libertação nas colónias portuguesas
em África foi feito por Marcelino dos Santos em nome do MPLA, em 1961.
Centrava-se no pedido de medicamentos para os refugiados angolanos na região do
Baixo Congo.
Apercebendo-se da reacção positiva do jornal Expressen,
Cabral também pediu ao jornal liberal sueco que ajudasse a conseguir
medicamentos.
158. Cf. as entrevistas com Lúcio Lara do MPLA (pp. 18–21) e
Marcelino dos Santos da FRELIMO (pp. 47–52).
159. Citado em ”Portugals argumentnöd bevisar:
Kolonialkrigen går dåligt!” (”A falta de argumentos de Portugal prova que as
guerras coloniais não estão a correr bem!”), em Arbetet, 13 de dezembro de
1968.
160. Carta (”Samtal med Amílcar Cabral om läget i Portugisiska Guinea”/”Conversa com Amílcar Cabral sobre a situação da Guiné portuguesa”) de Sverker Åström para o Ministério sueco dos Negócios Estrangeiros, Nova Iorque, 26 de fevereiro de 1970 (SDA).
161. Cabral citado em Lopes op. cit., p. 57.
162. Ou seja, o Comité Especial das Nações Unidas sobre a situação relacionada com a Aplicação da Declaração de concessão de independência aos países e povos coloniais, ou o Comité das Nações Unidas para o acompanhamento dos acontecimentos relativos à Declaração de Descolonização de 1960.
163. Entrevista com Salim Ahmed Salim, p. 244. Na altura,
Salim era o presidente do Comité das Nações Unidas para a Descolonização.
Pessoa próxima dos movimentos africanos de libertação, foi depois nomeado
Ministro dos Negócios Estrangeiros (1980–84) e primeiro ministro (1984–85) da
Tanzânia. Em 1989, Salim foi eleito secretário geral da OUA.
164. A missão das Nações Unidas foi chefiada por Horacio
Sevilla-Borja, do Equador. O terceiro membro era Kamel Belkhiria, da Tunísia.
Acompanhados por uma numerosa escolta militar do PAIGC, os três diplomatas
fizeram-se acompanhar de uma secretária e de um fotógrafo. A visita realizou-se
entre 2 e 8 de abril de 1972.(**)
165. Carte de Brita Åhman ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, Nova Iorque, 7 de março de 1972 (MFA). A participação da Suécia no Comité das Nações Unidas para a Descolonização foi da maior importância, devido aos contactos que tinha e às políticas que desenvolvia com os movimentos africanos de libertação.
Em abril de 1972, por exemplo, o representante sueco, Brita Åhman, participou nos debates deste comité com um total de quinze movimentos, em Conacri (Guiné), Lusaca (Zâmbia) e Addis Ababa (Etiópia). Num extenso relatório das ”audições”, enviado ao Ministério sueco dos Negócios Estrangeiros, fez uma avaliação das políticas e da força de cada um dos movimentos de libertação, dando uma orientação preciosa ao governo sueco (Brita Åhman: Memorando (”Kolonialkommitténs session i Afrika 1972”/”A sessão do Comité para a Descolonização em África, 1972”), Nova Iorque, 19 de junho de 1972) (MFA).
166. Entrevista com Salim Ahmed Salim, p. 244.
167. De forma notável, o embaixador sueco em Portugal, Karl Fredrik Almqvist, também repudiou a iniciativa.
Enquanto o secretário geral das
Nações Unidas, Kurt Waldheim, felicitava os membros da missão pela visita
difícil, mas bem-sucedida, Almqvist descrevia-a como ”uma violação da soberania
de outro país”, dizendo que a missão tinha ”violado a legislação internacional”
e que a participação da Suécia poderia prejudicar a ”boa-vontade internacional”
para com a Suécia (Carta de Karl Fredrik Almqvist ao Ministério dos Negócios
Estrangeiros, Lisboa, 14 de abril de 1972) (MFA).
168. Citado em Marianne Rappe: Memorando (”Samtal med Folke
Löfgren på SIDA den 21.4.1972: PAIGC”/”Conversa com Folke Löfgren na ASDI
21.4.1972: PAIGC”), ASDI, Estocolmo, 24 de abril de 1972 (SDA).
169. Nações Unidas: ”Relatório da Missão Especial das Nações Unidas à Guiné-Bissau”, Reimpresso de Objective: Justice, Vol. 4, Nº 3, Nova Iorque, setembro de 1972, p. 12.
170. Johnny Flodman: ”Svensk FN-diplomat jagades av
portugiser i Guinea” (”Diplomata sueco das Nações Unidas foi perseguido pelos
portugueses na Guiné”), em Svenska Dagbladet, 17 de abril de 1972.
171. A missão visitou a Guiné-Bissau numa altura em que o
PAIGC estava a conduzir os preparativos para as primeiras eleições nacionais no
país, nas zonas libertadas. As eleições para os conselhos regionais
realizaram-se em agosto de 1972. Os conselheiros elegeram, por sua vez, os
membros de uma Assembleia Nacional.
172. Nações Unidas: Secretariat News, Vol. XXVII, nº. 10,
Nova Iorque, 31 de maio de 1972, p. 9.
173. Entrevista com Salim Ahmed Salim, p. 244.
174. Ibid.
175. De acordo com a delegação sueca às Nações Unidas, foi
transmitido a Cabral que ”a Suécia votaria, naturalmente, a favor na questão da
sua proposta alocução perante a Assembleia Geral, mas [...] chamava a sua
atenção para o facto de parecer evidente que a própria causa de Cabral não vir
a sair beneficiada, se uma tal proposta der azo a divisões de opinião e a uma
votação” (Telegrama da representação sueca nas Nações Unidas ao Ministério dos Negócios
Estrangeiros, Nova Iorque, 24 de outubro de 1972) (MFA).
176. Entrevista com Salim Ahmed Salim, pp. 244–45.
[ Seleção / adaptação / revisão / fixação de texto / itálicos / bold, para efeitos de publicação deste poste no blogue: L.G ]
____________(*) Último poste da série > 5 de agosto de 2023 > Guiné 61/74 - P24534: Antologia (96): "A Suécia e as lutas de libertação nacional em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau", por Tor Sellström (2008). Excertos: o caso da ajuda ao PAIGC – Parte VII
(**) Vd. postes anteriores da série >
8 comentários:
Olá Camaradas
Através de textos como estes ficamos a conhecer (melhor) o internacional-porreirismo da Suécia o que para nós não é novidade. Mas... é a vida... Porque é que o professor tem um braçal da ONU? A ONU apoiava o PAIGC com tanta clareza. Na realidade ele pertenceria (talvez) a uma ONG bem-intencionada lá do sítio...
Um Ab.
António J. P. Costa
Caros amigos,
Acho que a ONU, através do seu Comitê para a descolonização fez o que devia ser feita na altura para ajudar os movimentos que lutavam para a liberdade e dignificação das populações dos seus países, todavia, como se costuma dizer, de boas intenções o inferno está cheio. A resolução tomada por este Comitê em 1972, em Conacry que considerava o PAIGC como o "único e legítimo representante do território da GBissau" será mais tarde interpretado como se os membros deste fossem os proprietários legítimos do país e em consequência podiam fazer o que se lhes desse na gana. Ainda hoje, apesar da abertura política e o advento do multipartidarismo, enfrentamos as consequências desse mal entendido que nasceu da simples vontade de ajudar a causa de uma luta que, na perspectiva dos seus fundadores, tinha como objectivo libertar o país das amarras do colonialismo, devolver a dignidade as populações e criar condições para o bem estar de todos sem excepção. Mas, o oportunismo de certas pessoas que, pelo caminho, afastaram o seu líder, acabaram por o transformar num instrumento para dominar o resto da população.
Cherno Baldé
Tó Zé:
O jovem diplomnat5 sueco, Folke Löfgren, integrava a "missão especial das Nações Unidas", aos territóri0os "sob controlo do PAIGC", à revelia naturalmente do governo portuguès...Como se lê numa das notas de rodapé, a missão chefiada pelo diplomata Horacio Sevilla-Borja, do Equador. O terceiro membro era Kamel Belkhiria, da Tunísia (jã falecido).
Eram "acompanhados por uma numerosa escolta militar do PAIGC" (sic). Tinham ao seu serviço uma secretária e um fotógrafo. A visita realizou-se entre 2 e 8 de abril de 1972. Já aqui publicamis uma versão (portuguesa, mazinha) do relatório dessa controversa missão (documento facultado pelo António Graça de Abreu, do seu tempo de estudante). Gostava de apanhar as fotos do japonês... Será que alguém sabe por onde páram ?
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2019/03/guine-6174-p19587-do-outro-lado-do_16.html
antonio graça de abreu disse...
Obrigado, Luís, por publicares o Relatório.Foi policopiado e distribuído no meio estudantil, na época. Eu tinha sido dirigente associativo, na Pró-Associação (meio maoísta!) da Faculdade de Letras de Lisboa, em 1972 era aspirante.of.mil., estava na tropa na Amadora, mas continuei a fazer cadeiras do meu curso na Faculdade, e guardei o Relatório, embora, na altura, já me parecesse exagerado. Logo a seguir à visita desses "distintos" diplomatas fui parar à Guiné, ao CAOP 1, e vi "claramente visto."
Mas o Relatório é interessante e, ao tentar mostrar a força do PAIGC, evidencia bem as suas enormes carências e fragilidades no terreno da luta.
Abraço.
António Graça Abreu
17 de março de 2019 às 23:09
Ainda não encontramos, na Net, o documento original, em inglês, do Comité Especial para a Descolonização, das Nações Unidas, que visitou as "áreas libertadas" da Guiné-Bissau, em plena guerra colonial, em abril de 1972, a convite de...Amílcar Cabral. Ou, melhor, temos encontrado excertos... Mas o relatório original, em inglês, está documentado com fotos, mapas, itinerários, etc.
A cópia, em papel, de que dispomos foi-nos fornecida há anos [por volta de 2010, na sequência dos comentários ao poste P5680, e não foram poucos: cerca de duas dezenas e meia!] pelo nosso camarada António Graça de Abreu, com vista a uma eventual publicação no blogue.
O documento é capaz de corresponder à seguinte referência bibliográfica que encontramos no portal das Memórias de África e de Oriente:
BORJA, Horácio Sevilla - A missão especial da ONU na Guiné Bissau, Abril 72 / Horácio Sevilla Borja, Folke Lofgren, Kamel Belkhiria. - [S.l.] : PAIGC, 1972. - 11 p.. - Corresponde a: Relatório [...]
Cota: BAC-135|CIDAC.
(..:) Logo na página não numerada, entre a capa e a página 1, se explica qual é a natureza e a autoria do documento:
(i) o texto editado, em português, é "a parte principal do relatório escrito e apresentado pela Missão Especial";
(ii) três membros do Comité Especial de Descolonização da ONU visitaram as "áreas libertadas da Guiné-Bissau" (sic), de 2 a 8 de abril de 1972, a convite do PAIGC;
(iii) nesse curto espaço de tempo (menos de um semana), terão percorrido 200 quilómetros (ida e volta), quase sempre a pé, visitando 9 localidades diferentes (o que, convenhamos, é obra para quem, como nós conheceu a Guiné, ou uma parte dela, a "penantes" ou de "viatura militar": Unimog, GMC, Berliet, Jeep...);
(iv) o objetivo da visita, que se fez à revelia do governo português de então, e sob protesto deste, era "assegurar informações em primeira mão sobre as condições nas áreas libertadas" (sic) e, simultaneamente, "averiguar as intenções e aspirações do povo no que respeita ao seu futuro"; (...)
A edição do documento é atribuída. pelo CIDAC, ao PAIGC. Amílcar Cabral fez o que lhe competia e convinha: tirou o máximo proveito propagandístico desta polémica missão a que já nos referimos em poste anterior.(...)
Na capa vem um mapa da Guiné, com o território assim distribuído:
(i) "áreas libertadas"; (ii) "áreas onde há luta"; (iii) "áreas controladas pelo exército colonial português"; e (iv) "aquartelamentos do exército colonial"... Presume-se que o mapa seja da autoria do PAIGC e se reporte à situação militar no 1º trimestre de 1972.
Salta logo à vista que faltam, no que diz respeito às posições das NT em 1972, inúmeros aquartelamentos, destacamentos e tabancas em autodefesa, com pelotões de milícia, em todas as três grandes regiões: Norte, Leste e Sul...Logo no setor L1, que eu conheci: há só referência a Bambadinca e Saltinho, faltam 3 importantes aquartelamentos (Xime, Mansambo e Xitole), fora os destacamentos do exército e das milícias... (...)
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2019/03/guine-6174-p19586-do-outro-lado-do.html
Olá Camaradas
Os visitantes das "áreas libertadas" ou eram céguinhos ou gostavam de constituir ambientes., como convinha ou lhes tinha sido encomendado. "Recebidos como príncipes" em áreas pobres e onde faltava tudo, o sacrifício era grande e o ambiente político-partidário não era mau porque era péssimo, "obviamente à revelia naturalmente do governo português" só pode ser considerado um jeitinho político ao PAIGC que efectivamente era o "único e legítimo representante do território da GBissau" que era ele que lá andava a enfrentar os colonialistas, salazaristas e imperialistas. Segundo a resolução tomada pelo tal Comitê em 1972, em Conacry poderia ser alterada após a independência. Digo eu que sou estrangeiro...
Três bravíssimos três jovens diplomatas "acompanhados por uma numerosa escolta militar do PAIGC" (numa zona libertada)?. É estranho...
Tinham ao seu serviço uma secretária (de 2 pernas, suponho). Para quê? E um fotógrafo para fazer fotos da vida nas áreas libertadas, mas com cuidado, para ficarem belas e exploráveis e poderem ser expostas nalgum salão de fotografia de Estocolmo para intelectual ficar sensibilizado...
Enfim, já se passou...
Um Ab.
António J. P. Costa
Em suma, Zé Belo, que não se metam com os suecos (nem com as suecas, pelo menos no futebol).
Vê-se pelo teu comedido mas irónico comentário , que há uma santa ignorância nossa sobre os nossos parceiros e aliados suecos, a começar pela sua história, economia, diplomacia e interesses geoestratéticos....
Quando no início dos anos 90 estive em Karlstas, apercebi-me (não tinha essa noção) de que um país não pode ser neutral, "desalinhado", sem forças armadas e indústria de guerra. E os suecos já tinham uma indústria militar com tecnologia de ponta...
Fica aqui A grande diferença em relação a Portugal é a sua história recente, a sua democracia, a importância da concertação social, a aposta na educação e na saúde... Nada disso conhecemos nós no Estado Novo... Salazar tinha um medo que se pelava da palavra "modernização": para ele era uma caixinha de Pandora...
Fica também aqui uma palavra minha de admiração e apreço pela Suécia e o seu povo, independentemente das nossas "idiossincrasias"...
Olá Camaradas
Em resumo, "naquele tempo" a Suécia era um país que gostava muito de ajudar os "povrezinhos", mas de modo que não se desse por isso...
Nós fazíamos "papel de embrulho"...
Um Ab.
António J. P. Costa
Volvos e Scanias eram o máximo para os camionistas nas imensas estradas em Angola.
Puseram as máquinas americanas de lado ainda nos anos 50.
Mesmo a Mercedes com dificuldade fazia frente aquelas máquinas.
Os suecos tinham e protegiam grandes representantes para as suas marcas em Angola.
Comercializaram um automóvel a dois tempos Saab, bonito, moderno, nos anos sessenta, durante a guerra toda a guerra do ultramar, Saab esse que dava cartas em ralis com grandes marcas e grandes potências.
Acontece que quando daquela da ajuda sueca na ONU aos turras, Marcelo e Angola fizeram boicote às importações suecas e houve uma pequena invasão japonesa de máquinas com vantagem pelo menos de preços, mas tecnicamente não ficavam atraz.
Atenção que os suecos comercialmente deram a volta, como não sei, que o governo e os suecos fizeram as pazes.
Mas muito material japonês, criou hábitos e ficou.
Não há dúvidas que os Suecos são engenhosos, mas tinham muito que aprender
a colonizar connosco.
O que eles fizeram na Guiné não foi ajudar, foi exibicionismo puro e duro de uma felicidade que nunca dirá nada àquela gente.
Há outros meios, mas tudo se complicou.
O Salazar sabia que não era com armas que a guerra se ganhava.
Foi com armas que se perdeu, a ajuda sueca também ajudou, mas pouco.
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