Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sexta-feira, 23 de abril de 2010
Guiné 63/74 - P6223: O 6º aniversário do nosso blogue (18): Ensinamento de vida (Joaquim Mexia Alves)
Meus caros camarigos editores
Tenho pensado na forma de festejar o aniversário da Tabanca Grande que se aproxima.
Quis escrever alguma coisa que marcasse o dia.
E fui andando "por qui, por li", como se diz na minha terra e... nada!
Numa procura que estava a fazer de textos antigos para um trabalho em mãos, deparei-me com algo que escrevi e publiquei no meu blogue, depois do nosso Convívio de 2007.
Ao lê-lo percebi que seria a melhor homenagem que poderia fazer ao nosso espaço de tertúlia e amizade.
Anexo o texto.
Porque o mesmo contêm a expressão viva daquilo que eu vivo como homem de fé, compreenderei se acharem que não o devem publicar como "presente" de aniversário, por eventual critica de "proselitismo".
Tal não me passa pela cabeça, mas, volto a dizer, compreenderei perfeitamente a vossa decisão.
Ficará a intenção e a minha sempre constante amizade e camaradagem, para melhor dizer, camarigagem.
Um abraço deste camarigo
Joaquim
ENSINAMENTO DE VIDA
Tive um fim-de-semana muito ocupado, mas sobretudo vivido muito intensamente.
No Sábado estive num almoço convívio com ex-combatentes da Guiné, (onde estive de 1971 a 1973), e hoje, Domingo, participei na Sé de Leiria, na celebração da Eucaristia de Ordenação de um Presbítero, o Marco, e um Diácono, o Marcelo, que pertence desde a primeira hora à nossa Comunidade Luz e Vida.
Perguntarão o que tem uma coisa a ver com a outra, e também eu perguntei isso mesmo ao meu Deus e Senhor, que sempre nos dá algum ensinamento sobre o que vai acontecendo no dia-a-dia das nossas vidas.
No almoço convívio, (de muitos ex-combatentes que se reúnem num blogue, Luís Graça & Camaradas da Guiné), estavam por isso mesmo, muitos camaradas de armas, (como nos costumamos chamar), de diversas idades, proveniências e unidades militares, dos quais muitos não se conheciam ainda pessoalmente.
No entanto, o sentir, a identificação de algo comum, a unidade de uma experiência colectiva, a comunhão de todos estes sentimentos e vivências, fazia com que nos sentíssemos todos iguais, todos irmanados, todos acolhedores, todos no fundo como um só, embora tão diferentes nas nossas vidas, desde a idade, à política e com certeza à religião.
Na Eucaristia da Ordenação do Marco e do Marcelo, estávamos também pessoas de diversas idades, diversas experiências de vida, locais diferentes, diferentes “sentires”, diferentes modos de viver a Fé, mas no entanto, todos unidos, acolhedores, sorrindo uns para os outros, querendo dar as mãos, e na diversidade, comungando a e na unidade com o Senhor Nosso Deus.
E então o que é que em eventos tão diferentes, se pode encontrar como ensinamento para a vida?
E a resposta é a própria vida, a vida que se dá, que se entrega, a vida que se recebe, a vida que se predispõe para os outros e dos outros para nós.
Com efeito, na guerra, colocamos a nossa vida nas mãos dos outros, dos que estão ao nosso lado, que nos acompanham e que às vezes apenas conhecemos ali, enquanto os outros nos entregam as suas vidas, confiando em que as vamos proteger com as nossas próprias vidas.
Só com essa entrega mútua de confiança, é possível sobreviver na guerra.
Essa vivência faz-nos identificar com todos os que estiveram na guerra, no nosso tempo, no nosso sitio, ou tempos e sítios totalmente diferentes.
Quando nos encontramos, conhecendo-nos ou não, apesar de todas as diferenças que possam existir entre cada um, abraçamo-nos, acolhemo-nos e comungamos de um mesmo sentimento: a vida que continuamos a ter.
Na vivência da Fé, na e em Igreja, a vida só tem sentido se for uma oferta permanente a Deus, e por Deus aos outros.
Só posso viver e crescer em comunhão com os outros e para os outros, senão arrisco-me a perecer na primeira dificuldade, a cair na primeira tentação.
A minha salvação só tem sentido na salvação dos outros e os outros contam com a minha entrega em oração por eles, como eu conto com a sua entrega em oração por mim.
Pode mesmo chegar-se um dia ao extremo de termos, por amor, de dar a vida pelos outros, entregando-nos confiantemente nas mãos do Criador, como ainda hoje tantos fazem, em nome de Deus, pelos seus irmãos.
E não interessa onde estamos, onde nos encontramos, no nosso país ou outro qualquer, porque nos identificamos e reconhecemos nessa entrega de amor a Deus e aos outros.
Na guerra os outros confiam que eu os protegerei e contam com as minhas capacidades, como eu conto com as deles, para chegarmos sãos e vivos ao nosso ponto de partida.
Na Igreja, os outros contam com as minhas orações, com o meu testemunho de vida, como eu conto com o deles, para crescermos juntos na Fé e alcançarmos a Salvação, que nos foi dada por Jesus Cristo Nosso Senhor.
A entrega da nossa vida, pelos outros e dos outros por nós, leva-nos a este encontro de comunhão de sermos um só com o mesmo objectivo.
A diferença está em que, na guerra a finalidade é preservarmos a nossa vida, muitas vezes aniquilando a vida do outro.
Na vivência da Fé, em Igreja, a finalidade é a salvação do outro com a entrega da nossa vida, alcançando também a nossa salvação.
Monte Real, 30 de Abril de 2007
JMA
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 6 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6112: Parabéns a você (99): Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil OP Esp (Os editores)
Vd. último poste da série de 23 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P622: O 6º aniversário do nosso blogue (17): Quem disse que hoje não havia rancho melhorado ? (Torcato Mendonça)
Guiné 63/74 - P6222: O 6º aniversário do nosso blogue (17): Quem disse que hoje não havia rancho melhorado ? (Torcato Mendonça)
Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo (uma das mais paradísiacas estâncias de turismo militar) > CART 2339 (1968/69) > Hoje há leitão.. balanta!...
Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo >CART 2339 (1968/69) > Quem disse... Rancho Melhorado ?!
Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > "É, pá, vocês não comam tudo!"...
Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > "Day after": o leitão estava estragado ou foi da "borrachera" ?
Do famoso e fabuloso álbum Fotos Falantes II. Fotos: Foto: © Torcato Mendonça (2006). Direitos reservados
[ Revisão/ fixação do texto / título do poste / selecção, edição e legendas das fotos: L.G.]
1. Mensagem do Torcato Mendonça (Fundão):
Data: 23 de Abril de 2010 10:41
Assunto: O SEXTO (*)
Caros Editores e Camaradas: Dizem-me ser o sexto aniversário do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, e eu folgo com isso. Mas questiono-me: O que é o blogue? Quem faz anos?
O blogue de sexto aniversário é o do Luís. Então faz ele anos e mando-lhe um abraço e uns eteceteras; se o blogue é este espaço, espaço com quatro centenas de pessoas, milhares de escritos onde, porque fica gravado, vêm ler e saber de assuntos ou novas centenas de milhar de visitantes. Ainda por este espaço ser global e as gentes, quer as que a ele pertencem quer as que o visitam, espalham-se mundo fora. Espaço de afectos, espaço de discussão plural, espaço de controvérsia ou só espaço de terapia colectiva de uns quantos. Ou todos?
Penso que é isso tudo. Mais, penso ser um espaço a contribuir para o tratamento futuro da nossa memória colectiva. Da memória de outros Povos que connosco conviveram por séculos.
Os de Bilege? Também porque só prova a necessidade de nos conhecermos melhor como Povo.
Trabalho para historiadores, não para cronistas do reino...
Mas então para quem são os parabéns? Eu escrevi uma ou outra vez, comentei aqui e acolá...e vou dar parabéns a mim? Eu, além disso, só para aqui vim em Maio de 2006 e fiquei.
Penso que os parabéns são para o fundador, para os editores, para todos os que pertencem e se identificam e acreditam na validade deste projecto.
Mas, se me o permitem envio os meus PARABÉNS e os meus agradecimentos aos Editores pelo excelente trabalho. São muitas horas roubadas sabe-se lá a quê e a quem...
Meus Camaradas e Amigos, para vocês o meu bem hajam e, através de vós, felicito toda esta Tertúlia de homens e mulheres de cá, do nosso País, ou da Guiné e os da Diáspora, mundo fora como é sina nossa....partilhando o Mundo...não dando novos...já lá estava....
Abraços T M
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Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste da série > 23 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6220: O 6º aniversário do nosso blogue (16): Um Blogue? Sei lá o que é isso! (Paulo Santiago)
Guiné 63/74 - P6221: Agenda cultural (73): Teatro: Dor Fantasma, com textos do nosso camarada Manuel Bastos, na Casa Conveniente, Cais do Sodré, Lisboa, de 26 de Abril a 2 de Maio
DOR FANTASMA, na Casa Conveniente [Lisboa]
textos: MANUEL BASTOS
direcção: MÁRIO TRIGO
co-produção: teatromosca e Teatro Focus
acolhimento: Casa Conveniente
PONTO DE PARTIDA
SINOPSE
Os «fait-divers» do teatro de guerra - entenda-se, o conjunto de acontecimentos que, em meio do caos, instituem essa espécie de perverso «padrão de normalidade» - são permanentemente desmontados pelo olhar lúcido, clínico, distanciado das personagens, apostadas em transmutar o horror da guerra em material de reflexão política (apartidária) ou em exercício extremo de auto-conhecimento.
A deliberada inclusão da personagem feminina na colagem de que o guião resulta- caucionada pela tematização que Manuel Bastos, atentamente, lhe vota - corresponde à candente necessidade de reconhecimento do papel (ainda hoje secundado) que a mulher portuguesa desempenhou antes, durante e depois do conflito armado aduzido.
O Manuel Bastos mantém, desde 2003, um dos mais antigos Blogues sobre a Guerra Colonial, O Cacimbo. É autor do romance Cacimbados: a vida por um fio (Vila Nova de Gaia: 7 Dias 6 Noites, 2008)
SOBRE O AUTOR > Manuel Correia de Bastos
(ii) Foi mobilizado para ex-colónia de Moçambique com o posto de furriel miliciano, no cumprimento do serviço militar obrigatório
(iv) Tem escrito crónicas sobre a guerra colonial especialmente no Jornal da Associação dos Deficientes das Forças Armadas;
Embora a crítica especializada ainda não tenha «descoberto» este autor seminal, trata-se, sem dúvida, do ponto de vista literário, uma das vozes mais surpreendentes que têm, nos últimos anos, riscado a oferta editorial sobre o tema, ombreando, sem dúvida, com nomes tão fundamentais como António Lobo Antunes, Lídia Jorge, Manuel Alegre, Fernando Assis Pacheco, entre outros.
Da sua escrita pode destacar-se o modo como, glosando um tema tão «obsceno» como é a guerra (a sua, de um modo muito particular), consegue, munindo-se de metáforas límpidas e eficazes, atingir um lirismo de profundo fôlego filosófico de pendor filantrópico.
SOBRE O ENCENADOR > Mário Trigo
Ficha artística e técnica
de 26 de Abril a 2 de Maio
de segunda a domingo 21.30h
Casa Conveniente (Cais do Sodré - Lisboa)
bilhetes 5€ (preço único)
teatromosca
Casa da Cultura de Mira Sintra
Avenida 25 de Abril, Largo da Igreja de Mira Sintra
2735-400 Cacém
Tel.: (351) 91 461 69 49 (351) 96 340 32 55teatromosca@gmail.com teatromosca@hotmail.com
http://teatromosca.com.sapo.pt/
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Nota de MR:
Guiné 63/74 - P6220: O 6º aniversário do nosso blogue (16): Um Blogue? Sei lá o que é isso! (Paulo Santiago)
Camaradas
Entrei, pacificamente, nesta Tabanca em 26 de Junho de 2006, e por cá me tenho aguentado com muita satisfação e bem estar.
Muitos tabanqueiros chegaram a esta morança, porque houve um ou uns tabanqueiros que disseram: é pá, anda aí na net um Régulo, o Luís Graça Baldé, também há quem o conheça por Mamadú Henriques, construiu um Reordenamento, onde se exorcisam antigos fantasmas e se faz blogoterapia... A mim ninguém me deu esta dica.
Em Fevereiro de 2005, fui à Guiné acompanhado pelo meu filho João, sozinhos, malucos, chamaram-nos, e antes da partida, tive de ir à GNR, era na altura arguido com termo de identidade e residência, chamavam-me arruaceiro, tinha batido numa senhora, era a acusação, e assim tive de comunicar a minha ausência para aquela terra vermelha da qual tinha imensas saudades.
A viagem foi um arraial de emoções, está descrita por aí, mas aconteceu que vim mais apanhado, aquele meu encontro, no Quirafo, com a carcassa da GMC, deixou-me arrasado. Tenho de contar esta tragédia, tenho de dar porrada em quem provocou esta mortandade. Como fazê-lo? interrogava-me.
Entretanto, a minha mulher ofereceu-me este portátil, onde continuo a clicar com um só dedo, e um dia um amigo diz-me: oh caralho, tens de fazer um blogue para descarregares essas merdas que tens na cabeça. Um blogue? sei lá o que é isso, respondi-lhe. Mas, esse meu amigo deixou-me umas instruções, e penso que andava à procura de um nome para o tal imaginário blogue, e quando escrevo Guiné, aparece-me a página que bem conheceis. CCAÇ 12, Bambadinca, e aparece-me a foto do Vacas de Carvalho, de lenço amarelo, sentado na torre da Daimller, e recuei a Outubro-Novembro de 1971, era o único que conhecia... e assim entrei para o Luís Graça e Camaradas da Guiné.
Descarreguei tudo. Hoje sinto que sou outro graças ao Luís, não serei o único, estou a lembrar-me do Batista que será uma pessoa diferente daquela que conheci, juntamente com o Álvaro Basto, há três anos atrás. Lembro, recentemente, a guineense Neusa Danho, filha do 1.º Sargento Miliciano Cristóvão Santos, que graças ao blogue conseguiu encontrar camaradas do pai, falecido quando ela era recém nascida. Hoje, curiosamente, recebi um telefonema da Cidália Cunha, viúva do 1.º Cabo António Ferreira, e notei que era outra pessoa, agora já fez o luto, e também aqui graças ao Graça.
Luís, tu criaste esta imensa Tabanca de afectos, mereces o meu/nosso reconhecimento.
Neste aniversário recebe um grande abraço de amizade, extensivo ao Briote, ao Vinhal e ao Magalhães Ribeiro. Agora, graças a vós, os nossos filhos já sabem onde os pais andaram na juventude.
Bem-Hajam!
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 13 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6150: O Spínola que eu conheci (8): O Militar que foi meu Comandante-Chefe (Paulo Santiago)
Vd. último poste da série de 23 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6219: O 6º aniversário do nosso blogue (15): Seis anos de vida! É Obra! Vamos reflectir (Hélder Sousa)
Guiné 63/74 - P6219: O 6º aniversário do nosso blogue (15): Seis anos de vida! É Obra! Vamos reflectir (Hélder Sousa)
O NOSSO BLOGUE
Caros camaradas, amigos e outros…
O nosso Blogue vai fazer 6 anos de vida! É obra!
Nesta época de vertigem, em que as coisas são moda e rapidamente descartáveis, criar, manter, alimentar e desenvolver um Blogue, principalmente com as características deste nosso, é de facto um caso notável.
Mas, afinal, de que estamos a falar? O que é, realmente, o nosso Blogue?
Aquando do aniversário do ‘criador’, o Luís Graça, tive a oportunidade de, para o felicitar, apresentar algumas frases sobre o Blogue, salientando principalmente como ideia-chave que a ‘criação ultrapassou o criador’, ou seja, o Blogue já não seria do Luís Graça (pelo menos em exclusivo e na prática) mas sim de nós todos, que na realidade o adoptámos, o acarinhámos e o desenvolvemos constantemente, de tal modo que podemos escrever sem errar “O Nosso Blogue”, quando a ele nos referimos.
Outras coisas também lhe chamei: lugar de afectos, espaço de memórias, local de controvérsias, catalizador de sentimentos, revelação de poetas e prosadores, propiciador de ‘blogueterapia’, motivador de encontros e reencontros, forja de amizades que se criam e se renovam, etc.
Entretanto, também ocorrem convulsões!
Um ‘post’ recente, do Alberto Branquinho, vem lançar um grito de alerta, provocar um abanão, colocando uma série de interrogações para a aparente abstinência de colaboração de alguns camaradas que já não ‘produzem’ artigos faz bastante tempo. E a propósito desse ‘post’ o Carlos Vinhal avança com algumas considerações, confessando, na prática, que a situação é conhecida e causa preocupação, apelando à participação de todos, conforme as suas possibilidades. Sucedem-se vários comentários de camaradas que fazem sentir a oportunidade e a justeza das interrogações do Branquinho, salientando aqui, sem desprimor para qualquer outro, a intervenção do António Matos, na linha de algumas outras (passadas) intervenções que ele já teve, com a caracterização, na sua opinião, de algumas ‘doenças infantis’ que afectam o nosso Blogue e no sentido de ‘recentrar’ os seus objectivos.
Pois então que se faça essa reflexão, se ‘recentrem’ os objectivos. Como se fará isso? E como? De que modo? E onde? E quando?
O QUE DISTINGUE O NOSSO BLOGUE
Voltando ao “nosso Blogue”, o que mais se poderá dizer? O que o torna distinto e portanto ‘apetecível’? O que o faz ter e manter um conjunto de ‘acompanhantes’ bem mais numeroso do que aqueles que se encorajaram a incorporá-lo?
Há uma questão que às vezes me colocam. “Porquê isso da Guiné? Foi pior para vocês do que para os outros? Há aí alguma competição no sentido de que ‘a minha guerra foi pior que a tua’, foram mais sofredores, ou ganhadores, ou sacrificados que os outros?”.
Não, não há nenhuma competição, não faz sentido algum. Os traços são comuns aos diversos T.O., pois em todos houve os que ‘embarcaram’ convencidos que estavam a ‘defender a civilização ocidental e cristã contra os interesses inconfessáveis dos estrangeiros’ e houve os outros, que foram por sentido do dever, por não terem alternativa, por acharem que sim, por outro motivo qualquer, mas para todos houve na prática o afastamento da família, dos amigos, do meio de vida, da escola, do trabalho, vidas interrompidas (e algumas delas acabadas…), enviados para ambientes estranhos onde houve que fazer adaptações (e rápidas), quer em termos pessoais quer em termos operacionais.
Para o rememorar desses tempos acontecem os encontros, os almoços, as confraternizações: dos diversos grupos funcionais, dos elementos dos cursos, do pessoal das Companhias, dos Batalhões, de outras Unidades e/ou actividades; aparecem vários Blogues, alguns mais simples, outros com qualidade acrescida, dessas Unidades.
E então o que é que diferencia e torna interessante o “Luís Graça & Camaradas da Guiné”?
Um dos méritos é que pretende abranger todo o tempo em que durou o, chamemos-lhe assim, ‘conflito’; transversalmente a todo o espaço territorial; aposta numa atitude de reconciliação com o passado (preservando a memória); estende a mão aos antigos adversários apelando à sua participação; promove uma postura de respeito mas ao mesmo tempo de ‘igualdade’ entre os seus membros. Deste modo será quase possível, com a continuação dos depoimentos e das participações, fazer a história dos diversos locais ao longo desses tempos e também, ao cruzar as informações, fazer o ‘filme’ em cada ano e apreciar os desenvolvimentos ocorridos.
Isto não faz qualquer concorrência com as histórias e convívios das diversas Unidades, mas antes as completa e pode fazer o traço de união para que cada uma delas compreenda o ‘antes’ e também, conforme os casos e a época, o ‘depois’ (onde e quando houve depois) dos locais por onde andaram.
Para além destes aspectos acresce que a relativa pequenez do T.O. (comparado com Angola e Moçambique) faz com que todos os que de nós por lá passaram, de uma maneira geral, ‘conheçam’ o território da Guiné. Em qualquer ponto onde se estivesse chegavam as notícias (muitas vezes deturpadas ou exageradas, é certo) de acontecimentos, perto ou longe, mas que nos irmanavam nos sucessos ou nos lamentos dos sacrifícios e vidas perdidas, que ocorriam em locais cujos nomes eram muitas vezes pronunciados com respeito, temor, reverência. Isso unia-nos e ainda hoje nos une.
Mesmo em Bissau, tantas vezes referenciada como ‘a guerra do ar condicionado’, não eram raras as vezes em que se ouviam distintamente os rebentamentos do outro lado do Geba, provocando reacções de solidariedade e de desejo de que aqueles que estavam a ‘embrulhar’ tivessem sorte. Já relatei que tenho um amigo e colega de curso que estando colocado em Luanda levou uma ‘porrada’ por aquelas coisas menores que aconteciam na tropa e em locais onde era mais exigente o aprumo e, em consequência disso, foi destacado para o Luso. Pois daí enviou-me um aerograma lamentando a sua pouca sorte, pela ‘porrada’ e por ter sido enviado para ‘zona de guerra’, já que “por vezes, ouvia os canhões a apenas 25 km”. Para todos os que estiveram na Guiné é então fácil entender a solidariedade tácita imediata que se estabelece entre nós.
São, portanto, estes dois aspectos essenciais, a ‘transversalidade no tempo e no espaço’, e o da ‘identificação comum de todos com tudo’, aliados ao facto de quase todos termos dito “Guiné, nunca mais!” mas isso ser quase impossível pois “voltamos lá” muitas vezes, seja pela ‘procura da juventude perdida’, seja pela marca indelével que aquela terra, aquela gentes e aquelas paisagens nos deixaram, são esses aspectos, dizia, que nos ligam fortemente ao Blogue a ponto de, mesmo quando é varrido por questões ou assuntos que não nos agradam, mantermos a nossa atenção e o interesse.
Acontece que o nosso Blogue é acompanhado, seguido, ‘vigiado’, por muita gente que, por uma razão ou outra, não se atreve a ‘bater à porta’ da Tabanca, mas isso não é preocupação pois esse período de namoro é absolutamente natural. Algumas coisas originam reservas para que se entusiasmem e passem a colaborar activamente mas, se houver engenho e arte para ‘resolver’ essas questões, é certo que mais vontades se acrescentarão para tornar o ‘puzzle da memória’ mais completo.
Pessoalmente, assim de repente, lembro-me de duas mãos-cheias de gente que conhece e segue o nosso Blogue mas não o integram (ainda?): da Marinha, de Moçambique, da Guiné… acham que não têm relevância ou que as suas histórias não são interessantes, ou então que lhes falta ‘o jeito’, a qualidade… seremos pacientes e aguardaremos que tomem coragem!
E INIMIGOS? TERÁ O NOSSO BLOGUE INIMIGOS?
Certamente que sim!
Não é o Blogue uma espécie de ‘organismo vivo’, em boa medida já bem representativo da sociedade em que se insere? Então, o que é que se espera? Não é a sociedade constituída por antagonismos? Pois também certamente que sim, e isso reflecte-se necessariamente na atitude para com o Blogue.
E como se manifesta essa inimizade?
Bem, há pelo menos dois grandes grupos que podem ser caracterizados, cada qual com as suas ‘nuances’… e existem fora e dentro do Blogue.
Na maior parte dos casos não se trata bem de inimizade, mas sim de mágoa, de interpretações erradas ou também consequência de queixas justas, se bem que pontuais.
Fora, podemos encontrar aqueles que dizem que o Blogue ‘é só para os amigos dos editores’, coisa pouco sustentável porque são tão diversos os camaradas que têm textos e artigos publicados que não se vê maneira de sustentar tal afirmação;
Também há quem reclame da excessiva ‘intelectualização’ (aparente), que levaria ao afastamento ou não-aparição de camaradas com menos capacidade literária, mas isso não é uma verdadeira razão pois temos tido possibilidade de apreciar contributos de camaradas com essas alegadas menores capacidades e a quem os editores ajudam, compondo os textos. As queixas aqui são mais do género 'é só para os antigos oficiais, que agora são todos escritores’, o que é injusto e também pouco sustentável, face à quantidade e variedade das intervenções publicadas.
Mas há aqueles para quem o Blogue, como manifestação de grupo, de solidariedade, de partilha, com capacidade de mobilização de vontades e fonte de esclarecimento, aparece como uma ameaça, pois tudo o que ‘cheirar’ a defesa do colectivo é ‘perigoso’. E isso é verdade tanto para os que se sentem ameaçados quando se veicula a reivindicação pelo respeito e memória dos que tombaram ao serviço da Pátria (fosse lá pelos motivos que fosse) como para aqueles que querem ‘cavalgar’ descontentamentos legítimos e ‘reescrever’ a História à luz das suas próprias concepções.
Dentro, também se podem encontrar sinais que, certamente de modo involuntário, fomentam inimizades. Dum modo geral configuram infracções às regras do Blogue, pelo que, se escrupulosamente respeitadas, evitariam a maior parte das situações menos boas que por vezes surgem e que fazem ‘azedar’ o ambiente. Já alguém alvitrou ao Luís para ‘deixar sair as G3 de vez em quando’ como forma de ‘aliviar tensões’ mas isso, em si mesmo, pode descambar e criar fracções totalmente indesejáveis. É um jogo perigoso.
QUE FAZER?
Para já, impõe-se reflectir como sugerido ou motivado pelo artigo do A. Branquinho.
A forma de o fazer poderá ser constituída por artigos ou textos de opinião ou sugestões enviadas para o Blogue e que cheguem ao conhecimento colectivo, onde se apontem caminhos e acções a tomar e a desenvolver.
Pode também passar pela apreciação e discussão em ‘grupos de trabalho’ que tracem ou sugiram os novos (se for o caso) caminhos a seguir, ou o reforço organizativo existente.
Pensem (pensemos) nisso!
Entretanto, e para terminar, resta dar os parabéns ao “Nosso Blogue”, que é como quem diz, dar os parabéns ao seu criador, aos editores que o materializam e a nós todos que o alimentamos, acarinhamos e defendemos.
Que tenha longa vida e que nos vejamos representados nele!
Um abraço para toda a Tabanca!
Hélder Sousa
Fur Mil TRMS TSF
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 3 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6099: A Guiné aos olhos das actuais gerações (2): Marta Ceitil, sente que está a aprender e a crescer na Guiné-Bissau (Hélder Sousa)
Vd. último poste da série de 23 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6218: O 6º aniversário do nosso blogue (14): Homenagem ao Blogue e aos Mendes que nos acompanharam (Paulo Salgado)
Guiné 63/74 - P6218: O 6º aniversário do nosso blogue (14): Homenagem ao Blogue e aos Mendes que nos acompanharam (Paulo Salgado)
Meu Caro Luís Graça,
Vai a minha participação – mais do que isso a homenagem ao Mendes, aos “Mendes” que nos acompanharam, lado a lado, numa guerra de que ainda não se escreveu de forma verdadeiramente científica…
Posta lá isso, o que vai em itálico.
Um abraço tertuliano.
Paulo Salgado
As notícias
Que me desculpem os companheiros bloguistas e os que, não participando nesta tertúlia – aqueles milhares que palmilharam bolanhas, matas e matagais, tarrafos, rios, riachos – eu não pretendo “armar-me” em intelectual, que não sou. Gosto de ler, de reflectir. É verdade. Lá no Olossato, em tempo de algum breve lazer, e para além das cervejas geladinhas ou gins ou cocas no bar, tive oportunidade de ler o Alves Redol quase todo, algum Rodrigues Miguéis, as pequenas (grandes) obras do Soeiro, o Russell – com troca com outros. Ou ouvíamos a Mahalia Jackson ou o Ray Charles ou la burrita – não sei quem é o autor (o Moreira ainda guarda esse disco ali em Gaia), verdade que às vezes púnhamos a rodar a 3.ª sinfonia ou a 5.ª sinfonia do Beethoven…enquanto ao longe se ouvia o batuque!
Vem isto a propósito do saboroso texto do Miguel Esteves Cardoso que escrevinha todos os dias um artigo interessante no Público. Diz ele, a propósito das nuvens do vulcão: «Já fui atingido pela nuvem de cinza e finalmente compreendi a tragédia. As coisas são mais tocantes quando nos tocam a nós. É que a nuvem atrasou o correio expresso.»
De imediato me lembrei que as nossas “nuvens” (desta natureza) por toda a Guiné eram os atrasos do aviãozinho (Dornier) que trazia o saco verde do correio. Pois é. Toda a maralha ficava fodiscada. Mas quem recordo, meus caros, é o Mendes, o homem da G3 e das imensas fitas que transportava, logo a seguir ao guia (bom, não me recordo se era a seguir imediatamente…) que, em dia de ausência de correio, bebia que se fartava e era um corrupio no que se chamava de caserna. Punha todos em polvorosa: fosse quem fosse, até o filho da puta do alferes… Não admira a razão: era casado, tinha uma filha…
Ao Mendes e a tantos “Mendes” eu quero endereçar neste dia de aniversário do nosso blogue, este humilde contributo.
Na verdade, as notícias que nos interessavam vinham em aerogramas carregados de emoção…
Obrigado, Mendes, pelo teu humano sofrimento de que me recordo vivamente, e que me ajudou a crescer e pensar muito.
Paulo Salgado
23 de Abril de 2010
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(*) Vd. poste de 19 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5500: Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Novo Ano 2010 (11): Natal com calor (Paulo Salgado)
Vd. último poste da série de 22 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6213: O 6º aniversário do nosso blogue (13): A nossa blogoterapia, objecto de artigo da revista Visão, edição de hoje
quinta-feira, 22 de abril de 2010
Guiné 63/74 – P6217: Estórias de Guileje (8): O papel da fragata Orion na batalha de Gadamael (Manuel Reis, ex-Alf Mil At Inf da CCAV 8350)
O nosso Camarada Manuel Reis (*), ex-Alf Mil At Inf da CCAV 8350, (Guileje, 1972/74), enviou-nos a seguinte mensagem, com data de 19 de Abril de 2010:
Camaradas,
Este tema poderá já ter sido abordado no Blogue, anterior à minha participação no Blogue, que data dos finais de 2008.
Não é minha intenção provocar uma tempestade, num momento em que o Blogue navega num mar de calmaria e caminha para o seu 6º Aniversário.
Mensagem de Manuel Reis ( Ex-Alf. Mil. da C. CAV. 8350) sobre:
Nos meus recortes de jornal sobre a Guerra Colonial, encontrei um texto sobre o desempenho da tripulação da fragata Orion na batalha de Gadamael. É um trabalho de investigação do jornalista Eduardo Dâmaso, publicado no Jornal Público no dia 26 de Junho de 2005, descrito nas páginas 12-13-14, com título de 1ª página “ A nave dos feridos, mortos, desaparecidos e enlouquecidos”.
Recordo, de forma resumida e com a devida vénia e respeito, o que nessa data foi escrito pelo jornalista Eduardo Dâmaso.
O trabalho do jornalista é baseado em depoimentos do Comandante, então imediato, Pedro Lauret e do soldado grumete electricista Ulisses Pereira.
A fragata Orion encontrava-se no rio Cumbijã, em missão de apoio aos aquartelamentos construídos recentemente no Cantanhez, quando no dia 1 de Junho de 1973, à hora de jantar, o seu Comandante recebe uma mensagem do Comandante em Chefe, António de Spínola, para subir o rio e proceder ao embarque de uma Companhia de Pára-quedistas, em reforço no Cantanhez.
Participaram nesta operação, para além da fragata Orion, duas lanchas de desembarque médio (LDM), oito botes zebro e uma companhia de “fuzos”.São dadas ordens aos “patrões” das LDM para seguirem para Cacine pelo canal do Melo, enquanto o Orion segue rio acima para recolher a Companhia de Pára-quedistas.
Só às 8 horas da manhã do dia 2 de Junho a Orion chega ao largo de Cacine. Aí, a tripulação é informada pelo Major Pessoa, Comandante do Batalhão de Pára-quedistas, da situação de caos que se vive em Gadamael: Do efectivo de 3 companhias que aí se encontravam não existiam mais de 30 homens a defender o aquartelamento. Os restantes e a população encontravam-se em fuga para Cacine ou na orla da mata.
São transmitidas as ordens de Spínola: “ É proibido o auxílio a cobardes”.
Contrariando as ordens de Spínola, Major Pessoa informa da urgência no socorro a essas pessoas e promete ir buscá-las, nem que fosse de canoa, caso o Comando da Orion não discordasse das ordens de Spínola.
As tropas Pára-quedistas desembarcam e seguem nos botes para Gadamael.
A Orion avançou em apoio das tropas fugitivas até ao ponto onde lhe era possível, sem qualquer comunicação ao Comando da Defesa Marítima. As LDM começaram a percorrer as margens e com a colaboração dos zebros recolheram os soldados que andavam perdidos.
“Havia mortos e feridos. Desaparecidos e enlouquecidos”. Improvisou-se um hospital no convés para assistir os feridos ligeiros, enquanto os feridos graves eram colocados na coberta dos “praças”. Foram recuperadas entre 300 a 400 pessoas que posteriormente foram transportadas para Cacine de modo a terem uma assistência mais eficaz.
Pedro Laurent, Comandante do Orion, recorda uma imagem que nunca mais o abandonou: “À noite, a coberta das praças estava completamente repleta de feridos, não havendo lugar para as praças se deitarem”
Sobre este acontecimento fez-se um manto de silêncio. A hierarquia nunca questionou a desobediência da Orion e o seu Comando e tripulação não foram alvo de qualquer processo disciplinar.
Outras histórias são relatadas pelo Comandante Pedro Lauret e pelo Grumete Ulisses Pereira, que me vou dispensar de as transmitir.
Para todos os camaradas, ex-combatentes, um abraço amigo,
Manuel Reis
Alf Mil At Inf da CCAV 8350
Guiné 63/74 - P6216: Ser solidário (64): Teixeira Pinto (actual Canchungo). Manjaco Francês (Fabien Gomis)
1. O nosso Amigo e leitor guineense, a viver actualmente em França, Fabien Gomis, em 21 de Abril de 2010, enviou-nos um e-mail a solicitar-nos ajuda no seguinte:
Teixeira Pinto
(actual Canchungo)
Manjaco Francês
Bom dia.
Gostaria de agradecer ao blogue pelos “uploads” de imagens do meu país. Mas, mais importante para mim, é que o site permite-me compreender melhor as condições de vida dos soldados na guerra, bem como as dos povos indígenas nessa fase.
Mas primeiro quero me apresentar.
Eu sou francês de origem da Guiné-Bissau (Manjaco de Canchungo), nascido em 1973, em Paris, e secretário de uma Associação de Assistência às Aldeias Manjacas da Guiné.
Também organizamos muitos eventos guineenses na diáspora, em particular em França, onde estamos presentes em eventos culturais, em especial nos “Dias da Cultura”.
Para ser breve, eu solicitava 2 serviços:
Se me poderiam enviar fotos e tudo o que têm, sobre a região de Teixeira Pinto (actual Canchungo), e a devida autorização, a fim de expô-las durante o nosso “Dia Cultural”.
Queria também pedir ao Jorge Picado se me enviava o máximo possível de fotos, sobre os estágios de vida das pessoas, paisagens, casas...
Os meus pais contaram-me que, antes de eu nascer, o meu tio (irmão do meu pai), morreu durante um ataque entre Bachile e Cacheu...
A única informação certa que temos é que ele pisou/accionou uma mina.
O seu nome era Fara Gomes e foi aposentado um dia, mas decidiu regressar à tropa para junto dos seus antigos camaradas, quando foram convidados.
A morte ocorreu durante o 1º trimestre de 1968. Mas eles não sabem mais nada, porque estavam na França, naquele tempo, e as únicas pessoas que podiam adiantar mais alguns dados já faleceram.
Além das fotos, se tiverem notícias ou qualquer documento daquele tempo… tudo seria bem-vindo.
O meu e-mail pessoal é: mandjako@free.fr
Atenciosamente,
Muito Obrigado.
Fabien Gomis
2. Tradução em francês do e-mail:
Manjaco Français
Bonjour.
Je tiens d'abord a vous remercier de mettre en ligne des images de mon pays. Mais surtout, le site me permet de mieux comprendre la les conditions de vie aussi bien des soldats que celles des autochtones durant la guerre.
Mais tout d'abord je tiens a me presenter.
Je suis un francais d'origine Bissau guinéenne (manjaco de Canchungo ) né en 1973 a Paris et secretaire d'une association d'aide aux villages manjacos de Guinée.
Aussi nous organisons beaucoup d'evenements ou la diaspora guinéenne de france est tres presente notament lors des journées culturelles.
Pour etre bref, j'ai 2 services a vous demander:
Serait-il possible de vous emprunter des clichés sur tout ce que vous avez concernant la region de teixeira pinto afin de les exposer durant notre jornée?????
A defaut, est-il possible de demander à Jorge Picardo s'il est possible de lui emprunter un maximum de clichés sur les scènes de vie de la population, les paysages, les édifices....
Mes parents m'ont dit qu'avant ma naissance le frere de mon pere est decede durant une attaque entre bachile et cacheu... C'etait durant le 1er trimestre 1968. Mais ils n'en savent pas plus car ils étaient en France a cette epoque et les seules personnes à meme de fournir des details sont aujourd'hui décédées.
Aussi, si vous aviez des infos, une photo, un quelconque document qui pourrait m'aider serait le bienvenu.
La seule info que l'on a est qu'il aurait marché sur une mine.
Pour info, mon oncle s'appelait Fara Gomes, il était à la retraite au moment des faits, mais il a décidé d'aller se battre avec ses anciens camarades lorsqu'ils furent appelés.
Merci beaucoup,
Fabien Gomis
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Nota de MR:
Vd. último poste da série em:
1 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6086: Ser solidário (63): Gente feliz... com lágrimas: a Cadi e a sua filha, a Maria Alice do Cantanhez (Pepito / Luís Graça)
Guiné 63/74 - P6215: In memoriam (41): O Sem Sentido das Guerras - Relembrando António Ferreira (Mário Migueis)
Caro Vinhal,
De longe em longe, dá-me para te escrever. Uma vezes - as mais das vezes -, para me rir um bocado da tropa contigo e com os nossos camaradas e/ou amigos. Outras vezes – que, francamente, quereria não fossem tantas -, para recordar coisas menos agradáveis e, no limite, como é hoje o caso, de acontecimentos, que, na derradeira fase dessa nossa experiência castrense, nos abalaram profundamente, deixando-nos uma marca bem cavada de tristeza e, por vezes, revolta, cuja evidência todos os dias demonstramos neste blogue, que tão bem nos compreende.
Passaram-se doze meses – como o tempo voa! -, desde que escrevi algumas linhas sobre a “Tragédia do Quirafo”. Fi-lo, na altura, com um objectivo muito concreto – esclarecer o rol de dúvidas que se colocavam e que eu estava em posição de esclarecer -, e uma preocupação primeira - que considerei mesmo um imperativo ético -, que era sossegar o espírito da viúva do nosso camarada António Ferreira, uma das vítimas mortais naquele dia de verdadeiro terror. Senti - aqui sim! -, a satisfação do dever cumprido, tanto mais que toda a acção desenvolvida pelo blogue culminou com uma singela, mas cheia de significado, homenagem ao nosso saudoso camarada no cemitério de Águas Santas, concelho da Maia, onde está sepultado.
Sobre a acção militar em si, contudo, ficaram alguns pormenores por relatar, não por esquecimento, mas apenas porque, tratando-se, do meu ponto de vista, de elementos acessórios, não tinham o carácter urgente dos restantes. Não deixando, porém, de os reputar de interessantes para publicação no blogue, uma vez que, se por outra razão não for, quanto mais informação, melhor, propus-me dá-los a conhecer na melhor oportunidade. Todavia, como era preciso rebuscar uns papéis esquecidos e coisa e tal, passaram-se os tais doze meses - e, agora, repito: “como o tempo voa!” – sem que eu nada tivesse acrescentado ao essencial, isto é, aos factos já narrados.
Pois, caro amigo, tenho a comunicar-te – grande surpresa! - que ainda não é desta que te faculto o tal material acessório, porque – lá estou eu a forjar desculpas para novo adiamento - , depois de matutar um pouco, cheguei à conclusão de que isto de andar a contar as coisas a conta-gotas não será exercício de que a gente se possa orgulhar, nem, se calhar, trabalho com que deva incomodar-te (confesso-te, porém, que o meu esforço reflexivo não chegou tão longe). Por isso, fica para daqui a algum tempo, quando eu tiver tudo arrumadinho.
E, agora, atenção, Vinhal! É aqui que tu, fingindo que concordas com estas justificações esfarrapadas e me perdoas o desleixo, lanças a superior pergunta:
- Mas, assim sendo, o que é que tu pretendes afinal, meu caro Migueis?!...
E eu, esfregando as mãos de contentamento pela oportunidade que me dás, respondo:
- Ainda bem que me fazes essa pergunta, meu caro amigo. Era precisamente por aqui que eu queria, deveria e não soubera começar.
E pronto, meu bom Carlos Vinhal, deixa o resto comigo. A partir de agora, podes sentar-te e descansar um bocadinho que eu, se me permites, passo a dirigir-me directamente a todos os tertulianos e amigos do “luísgraça&camaradasdaguiné”, ficando para ti, entre textos, o meu abraço muito amigo.
Mário Migueis
"António Ferreira"
Acrílico: © Mário Migueis da Silva (2010). Direitos reservados
2. O Sem Sentido das Guerras
Em 02/04/2009, a propósito da emboscada do Quirafo, verificada 37 anos atrás, publicava este blogue (P4117(2)), pela primeira vez, uma foto tipo passe do saudoso António Ferreira, que, como vários outros camaradas, ali perdeu a vida durante o terrível recontro.
A 18 do mesmo mês, na introdução do P4205(3), referia o Carlos Vinhal a certa altura, a propósito da mesma foto, de novo publicada: “…aparece um militar com a mesma pose altiva…”
Pois, caros camaradas e amigos, na altura, o conjunto dessas palavras e da imagem que lhes dera sentido transportou-me imediatamente para um dos poemas - chamem-lhes o que quiserem! - que eu tinha rabiscado nos dias de enorme tensão que se seguiram aos acontecimentos. Mentiria, se dissesse que o poema em causa foi dedicado especificamente ao António Ferreira, já que, na verdade, quando deixei a caneta escrever, à sua livre vontade, o que lhe ia na alma, pensava em todos aqueles rapazes - alegres meninos -, que, na inocência dos seus vinte anos, acabavam de ser vítimas – também eles - de uma “morte cruel e impiedosa”(*). Acontece é que, perante aquela imagem do António Ferreira, vi na altivez do seu porte, na expressividade do seu rosto, aquilo que parecia ter sido talhado para ilustrar aqueles meus momentos de revolta perante um mundo asqueroso que insistia em alimentar situações como a presente, em que jovens inocentes eram subtraídos do aconchego dos seus lares e lançados autenticamente às feras.
Na verdade, naqueles momentos de verdadeiro pesadelo, a minha indignação, que não poupava os que, como cães raivosos, se nos atiravam ao caminho, retalhando ou reduzindo a cinzas os meus próprios semelhantes, dirigia-se, porém, muito especialmente aos senhores dos nossos destinos, que, do alto dos seus pedestais e protegidos pela segurança das distâncias, “determinavam e mandavam publicar” - como é fácil mandar os outros lutar até à morte! - , independentemente da sorte reservada àqueles inocentes, que, como cordeirinhos, haveriam de ser sacrificados ao deus da guerra, esse vampiro infame que, desde as mais remotas eras, alimenta com sangue humano as suas negociatas e interesses pessoais.
Este último ponto parágrafo livrou-me da tentação de fazer – e quem sou eu?... - aprofundadas análises ao “sem sentido “ das guerras - aquelas que enlouquecem, desgraçam, estropiam, matam -, as quais hão-de continuar a massacrar a Humanidade, sem que, incompreensivelmente, as levemos muito a sério. Deixo esse trabalho para os estudiosos e especialistas da matéria, mas, pelo menos, agora que, a pretexto do centenário do nascimento de António de Spínola, se tem falado por todo o país um pouco mais sobre homenagens e honrarias, cuja validade não discuto, quero exortar-vos a não esquecerdes os Antónios Ferreiras - os nossos queridos e verdadeiros heróis, tão ingénuos quanto valentes -, os quais, correndo mil perigos e sofrendo privações de toda a espécie, se aventuravam, dia após dia, nas picadas fartas de minas e armadilhas e nos rios e matas traiçoeiras, uns acabando por sucumbir perante tanta adversidade, outros continuando a suportar estoicamente até ao fim aqueles anos de tortura e pesadelo a que foram condenados. E é bom não ignorarmos que muitos deles, se não a sua esmagadora maioria, tudo fez e suportou na convicção de estar a lutar por uma causa justa e defensora dos princípios sagrados de uma pátria multirracial, una e indivisível, tal fora a doutrina das nossas escolas e igrejas desde a sua mais tenra idade.
A trinta e oito anos de distância temporal dos acontecimentos que lhe deram sentido e forma, deixo-vos, em anexo, com um grande abraço, o pequeno poema que me trouxe até vós, o qual tomo a liberdade de ilustrar com um acrílico da minha autoria, feito a partir da fotografia do António Ferreira, publicada um ano atrás no blogue.
Esposende, 17 de Abril de 2010
Mário Migueis Ferreira da Silva
3. Rosto de Menino
Rosto de menino
Criança traquina
E mataram-te
Vampiros
Filhos da puta
Bando de abutres
Sacanas
Corja de carrascos assassinos!
Corpo chisnado
Em putrefacção
Réstia de pó
Montículo de cinza
E eras vida
Saltinho, 19 de Abril de 1972
Mário Migueis
__________
Notas de CV:
(1) Vd. último poste de Mário Migueis de poste de27 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6057: Parabéns a você (93): Os novos Notáveis do Reino, Sir Charles Vinhal & Sir Edward Mc Ribeiro, armados Cavaleiros da Tabanca Redonda (Mário Miguéis)
(2) Vd. poste de 31 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4117: A tragédia do Quirafo: 37 anos para fazer o luto pelo António Ferreira (Paulo Santiago / Cátia Félix)
(3) Vd. poste de 18 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4205: In Memoriam (19): António Ferreira, 1.º Cabo TRMS da CCAÇ 3490, morto em combate no dia 17 de Abril de 1972 (Cátia Félix)
Vd. último poste da série de 22 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6211: In memoriam (40): Pequena Homenagem ao Piu, da CCaç 3520/Cacine (Daniel Matos)
Guiné 63/74 - P6214: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (13): Força, Luís e Camaradas, porque o Blogue é um momento único e inigualável no mundo (Pepito)
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 4 de Abril de 2010 > "Doação para as escolas rurais da Guiné-Bissau". Foto tirada em 6 de Março de 2010. (Foto reproduzida com a devida vénia...) (*)
I. Legenda: "A 'Memórias e Gentes', associação humanitária portuguesa de Coimbra veio no início de Março de 2010 em expedição terrestre à Guiné-Bissau, trazendo uma importante doação de produtos essenciais destinados aos seus diferentes parceiros locais, os quais terão a responsabilidade de os fazer chegar aos destinatários finais, escolas, hospitais, centros de acolhimento, creches, etc.
"A AD foi contemplada com numerosos cartões contendo livros escolares da 1ª à 9ª classe, brinquedos infantis para as creches e roupa diversificada para raparigas e rapazes, assim como material escolar.
"Na pessoa de José Moreira, presidente da associação, as Escolas de Verificação Ambiental do sector de S.Domingos e o Centro de Animação Infantil de Quelélé em Bissau, passaram a dispor de melhores condições de ensino e material lúdico que encantam as crianças".
II. Mandei há dias correio para o Pepito:
1. Aí tens o menino Chico [de Fajonquito]... de que te falei e que faz parte do nosso blogue... Deves lembrar-te dele, espero que por boas razões.
2. Outra coisa: falei ontem, longamente, com a tua mãe.... Falámos do seu tempo de professora no Liceu Honório Barreto...
3. Vê o novo videoclip dos Melech Mechaya... Feito com um orçamento de mil euros.. Putos com talento... Eu adorei, mas sou suspeito:
http://www.youtube.com/watch?v=7q2PdAuu-ls
4. A Alice quer mandar mais umas roupinhas e sapatinhos para a afilhada de Farim do Cantanhez... Quando é que alguém de vocês passa por Iemberém ? Pode usar de novo a tua caixa postal ?
5. Estive anteontem, 15, no lançamento do livro do Amadu Bailo Djaló, um notável livro de memórias, honesto, surpreendente... Esteve muita gente, incluindo o Alpoim Calvão... Entre os guineenses, o Bamba, que diz ser teu conhecido, e que foi ministro da saúde pública, num governo vosso, pelo Movimento de Bafatá...Estudou na Ucrânia (Kiev ?) e na Itália. Julgo que é engenheiro da área alimentar, foi um contacto breve, tenho o seu telemóvel.
6. Temos começar a preparar a viagem à tua terra em 2011... Qual seria, no teu entender, o nº ideal de pessoas ? Podia ser uma iniciativa Blogue e AD...
7. No dia 23 de Abril de 2010, vamos fazer 6 ANOS!!! A revista Visão vai publicar, na próxima 5ª feira, um artigo sobre nós...
8. Apanhámos mais um susto com os rapazes (fogosos) do batalhão de Mansoa... Gostei da resposta do povo, que veio para a rua... Sei que vocês tão bem.
Um grande chicoração. Luís
III. Resposta do Pepito:
Luís, Amigo
1. Sinceramente não me recordo do Chico lá no Ministério. Ele diz que não me ouviu no dia 20 de Janeiro (Museu). Esquece-se que eu pratico o mesmo que ele diz:"Eu ainda tenho a sorte de pertencer ao grupo dos anonimos que, no contexto da Guiné, é um grande privilegio"
2. Videoclip dos Melech Mechaya: o nosso sistema de internet está péssimo e lento. Não consegui ouvir, mas logo que melhore fá-lo-ei.
3. Diz à Alice que mande roupa sempre que quizer. Deve é avisar-me para eu estar a par e não se perder nos CTT
4. Viagem 2011: vamos a isto com a parceria Blogue-AD. Por razões de alojamento no sul estava a pensar em 14 pessoas. Se houver mais, melhor. Sempre se arranja solução satisfatória. É como no Blogue, há sempre lugar para mais um, ou como dizia o Zeca, venham mais cinco!
5. Dia 23 de Abril: para a menina Tabanca Grande, uma salva de palmas! Força, Luís e Camaradas, porque o Blogue é um momento único e inigualável no mundo.
6. Batalhão de Mansoa: bem quis o Amilcar Cabral que em vez de militares, tivessemos militantes armados. Uma vez acabada a luta pela independência, largavam as armas e continuavam a militar com outras "armas". Foi aí que perdemos a grande oportunidade. Hoje não é só o poder que está na ponta da espingarda. É também a Coca.
abraço amigo
pepito
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Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste da série > 31 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6080: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (12): Guileje, Faro Sadjuma, S. Domingos... Ecoturismo e empreendedorismo no feminino
Guiné 63/74 - P6213: O 6º aniversário do nosso blogue (13): A nossa blogoterapia, objecto de artigo da revista Visão, edição de hoje
Na edição de hoje, 23 de Abril de 2010, da revista Visão, o jornalista João Dias Miguel assina um artigo que ocupa 3/4 partes da página 78, sob a rúbrica Visão > Sociedade. O artigo é ilustrado por uma foto de Nuno Fox (acima reproduzida, com a devida vénia).
O texto começa com uma citação minha, resultado de uma longa entrevista com o jornalista: "Somos uma espécie de grupo de auto-ajuda. Costumamos falar em 'blogoterapia da guerra em África' "... E é depois referida sucintamente a história do nosso blogue, apontado como "presta(ndo), seguramente, um serviço público, ao dar espaço a um assunto tabu - a Guerra Colonial - que estava 'enterrado debaixo de uma pedra' e que continua a fazer sofrer, em silêncio, muitos portugueses".
Destacado a amarelo, lê-se: "O blogue, onde todos se tratam por tu e não existem hierarquias militares, tem como lema a frase 'Não deixes que sejam os outros a contar a tua história por ti' e ali se faz todos os dias a petite histoire - o relato, na primeira pessoa, das experiências que cada um viveu na Guiné-Bissau".
E continua o jornalista:
"Há um efeito terapêutico", diz o fundador. "Muita gente que vivia isolada, sozinha com os seus fantasmas e memórias, sem ligações, sem suporte social, passou a conviver e a verbalizar as suas recordações, passou a registar isso no papel. E nós publicamos".
São citadas algumas histórias que tiveram impacto no público leitor. É ainda referido que o blogue tem mais de 400 membros inscritos, duas mil visitas por dia, que é lido dos EUA à Austrália, que apoia diversas iniciativas humanitárias na Guiné-Bissau e que tem sido fonte de alimentação de livros e autores. "E dali já saíram ideias para livros como, por exemplo, Estórias Cabralianas, pequenos contos sobre o absurdo do dia-a-dia da guerra" (numa referência ao livro do Jorge Cabral, que deve ser publicado este ano).
A foto, algo insólita, em que eu apareço com o título do livro do Amadu Djaló (Guineense, Comando, Português), projectado no rosto, foi tirada numa sala de aulas, com recurso ao projector e à ligação à Internet.
O nosso blogue faz amanhã 6 anos (*).
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Nota de L.G.:
(*) Vd. último poste da série < 22 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6212: O 6º aniversário do nosso blogue (12): Cem pesos ? Manga de patacão, pessoal! ( Luís Graça / Humberto Reis / A. Marques Lopes / Afonso Sousa / Jorge Santos / Luís Carvalhido / Sousa de Castro)
Guiné 63/74 - P6212: O 6º aniversário do nosso blogue (12): Cem pesos ? Manga de patacão, pessoal! ( Luís Graça / Humberto Reis / A. Marques Lopes / Afonso Sousa / Jorge Santos / Luís Carvalhido / Sousa de Castro)
Cópia de uma nota de cem escudos da Guiné (ou pesos), emitida pelo BNU (Banco Nacional Ultramarino), em circulação no nosso tempo.
Esta, por acaso, foi emitida em Lisboa em 17 de Dezembro de 1971, já a rapaziada da CCAÇ 12 (eu, o Humberto Reis, o Tony Levezinho, o Fernandes, o Marques, o José Luís de Sousa, o Gabriel Gonçalves, o Dalot e todos os demais pais-fundadores...) tinha regressado a casa. A nota ostenta a efígie do Nuno Tristão, o primeiros dos nossos camaradas a morrer na Guiné, "país de azenegues e de negros", no já longínquo ano de 1446, "varado por azagaias envenenadas" (sic), como se pode ler algures no Portugal dos Pequenitos, em Coimbra (se nunca lá foram, aproveitem para ir com os netos um fim-de-semana destes).
Foto: © Santos (2005). Direitos reservados
1. A propósito do patacão que ganhavam uns e não ganhavam outros - por exemplo, um capitão, miliciano, 32 anos, engenheiro agrónomo, 4 filhos, responsável por uma companhia de 150 homens, ganhava, no CTIG, em Agosto de 1970, qualquer coisa como 11 contos, limpos (cerca de 55 €, hoje...) (*) - , e a pretexto do 6º aniversário do nosso blogue (**), fomos revisitar as nossas águas furtadas, onde está o nosso baú de memórias, e de lá sacámos uma engraçada conversa entre mim e o Humberto Reis (um dos nossos primeiros bloguistas) e outros camaradas... justamente a propósito do patacão. (***) Muitos camaradas, sobretudo os mais novos, os periquitos (chegados há menos tempos à nossa Tabanca Grande), não estão familiarizados com a I Série do Blogue, onde foram publicados os nossos primeiros 825 postes, de 23 de Abril de 2004 a 31 de Maio de 2006.
2. Cem pesos, manga de patacão, pessoal!
por Luís Graça (***)
Amigos e camaradas:
Há dias o Jorge Santos mandou-nos uma nota de cem escudos da Guiné (cem pesos). Ou melhor: uma nota digitalizada, uma imagem em formato jpg. Puxem pela memória e digam lá, para a gente poder explicar isso aos filhos e netos, bem como à cara metadade, o que se podia comprar/pagar com uma notinha destas, no vosso/nosso tempo…
Eu tenho ideia que era manga de patacão, pessoal ! Eu já não me recordo quanto pagava à lavadeira, em 1969/71, mas se fosse serviço extra, era capaz de lhe dar uma nota destas. A minha não fazia favores sexuais, mesmo em dias de festa: não era cristã nem animista, era uma fula [ou melhor, mandinga], recatada e virtuosa… Mas em Bissau ou em Bafatá, uma queca (como os nossos filhos e as nossas tias dizem agora, 'tás-a-ver...) podia custar uma nota (preta) destas... Já não me lembro das cotações no lupanário em tempo de ocupação e de guerra... As verdianas do Pilão, essas, podiam ser até mais caras…
Com uma nota destas, ó tuga, tu compravas duas garrafas de uísque novo (disso lembro-me bem…). O Old Parr (uísque velho, muito apreciado lá e cá) já custava mais: 130 ou até 150 pesos, se não me engano… Além do pré (600 pesos/mês), os meus soldados africanos (que eram praças de 2ª classe!) recebiam mais, creio eu, cerca de 25 pesos por dia pelo facto de serem desarranchados. Nunca joguei à lerpa, mas o Humberto pode dizer quanto ganhava ou quanto perdia numa noite de insónias e de rodadas de uísque…
Ainda em matéria de comes & bebes, um quilo de camarões tigres, do Rio Geba, comidos na tasca do tuga [Zé Maria] que era turra (ou, pelo menos, suspeito de vender e comprar vacas aos turras), em Bambadinca, com uma linda vista para o rio, custava cinquenta pesos… Um bife com batatas fritas e ovo a cavalo (supremo luxo de um operacional como eu ou o Humberto) na Transmontana, em Bafatá, já não me lembro quanto custava (talvez vinte a vinte e cinco? ).
Ainda me lembro, isso sim, de o vagomestre comprar uma vaca raquítica por 950 pesos, depois de bater não sei quantas tabancas da região de Bambadinca… Nas tabancas, fulas, por onde passei e onde fiquei, uma semana ou mais [de cada vez], era costume comprar, mesmo a custo, galinhas e frangos, mas já não me lembro quanto pediam pelos bichos de capoeira (sete pesos e meio?)… As ostras em Bissau custavam 20 pesos (uma travessa)… E por aí fora.
Amigos e camaradas: actualizem ou rectifiquem a lista. Não sei se depois de 1973, a inflação também chegou à Guiné… O Sousa de Castro [, 1972/74, ] é que nos pode dizer… De qualquer modo, o que comíamos e bebíamos era praticamente tudo importado...
O grande ventre de Bissau era alimentado por uma economia de guerra que deu dinheiro a ganhar a muita gente... Manga de patacão, pessoal! ... Desde as rachas de cibe [, a sete e quinhentos cada uma, no reordenamento de Nhabijões, se a memópria me não atraiçoa] ao cimento (a construção de aldeias estratégicas, como a de Nhabijões, com cerca de 350 casas, deve ter ajudado a dourar a reforma de muita gentinha mais patriótica do que eu) até aos transportes (civis) em comboios militares, sem esquecer os efeitos (mais nefastos do que benéficos) que a guerra teve na pobre economia natural dos guinéus.
Um deles foi a sua própria militarização. Nos últimos anos da guerra, tudo girava à volta (e vivia) da guerra. A guerra tornou-se, ao mesmo tempo, o ópio e a grande sanguessuga dos guinéus (e dos próprios tugas). E a prova disso, quase quatro décadas depois, é a bidonvilização, a lumpenproletarização da população que engrossou Bissau.
Luís Graça
PS - Perguntas ao Humberto:
Como tens uma boa memória, pode ser que te lembres disso... Eu já nem me lembro sequer de quanto ganhávamos... Cerca de cinco notas de conto, não ? Os alferes, sete; os capitães, não faço ideia... E os nossos soldados africanos, que eram praças de 2ª ? Tenho ideia que ganhavam seiscentos pesos, mais outro tanto (25 pesos / dia) por serem desarranchados... Como eram islamizados, não podiam comer a comida do tuga, pelo que foram mais tarde autorizados a receber o subsídio de alimentação... Mandaram-me isso à cara, no Xime, quando morreu o Cunha e o restante pessoal da CART 2715... Os sacanas tiveram um momento de hesitação, antes de aceitarem ir comigo resgatar os corpos dos nossos camaradas mortos, à cabeça da coluna (vd post de 25 de Abril de 2005 > Guiné 69/71 - VII: Memórias do inferno do Xime (Novembro de 1970):- Pessoal africano só ganha seiscentos pesos! - Que é como quem diz: vai lá tu, que os mortos são do vosso sangue, são do vosso chão, são da vossa terra, são tugas... Foi o único momento, em toda a minha comissão, em que vi os nossos soldados terem medo...
E uma passagem de avião, para virmos a casa, de férias ? E o famigerado Hotel da Cona Rachada [sic, em linguagem de caserna], onde a gente ficava, de passagem, em Bissau ? Eu pelo menos fiquei uma vez ou duas, se não me engano... (Ou era outra pensão ainda mais reles ? Recordo-me que um dia rebentaram-me a mala e fanaram-me o uísque, no Chez Toi)... Tu tinhas os teus conhecimentos em Bissau [, em Bissalanca, na BA 12]...
Guiné > Moeda de 5 e 10 escudos (pesos). Frente e verso
Foto: © Afonso Sousa (2005). Direitos reservados.
3. Resposta rápida, artilhada, telegráfica, à ranger, do Humberto Reis (***):
Das chamadas Meninas & Vinho Verde [já] não me lembro, mas dos produtos que eu mais consumia, entre 69 e 71, não me esqueci:
- Um maço de SG Filtro: 2,5 pesos (sempre que saía para o mato levava 3 a 4 maços para 2 dias);
- Uma garrafa de whisky novo (J. Walker Juanito Camiñante de 5 anos, rótulo vermelho, JB): 48,50 pesos;
- Idem, de 12 anos, J. Walker rótulo preto, Dimple, Antiquary: 98,50
- Idem, de 15 anos, Monkhs, Old Parr: 103,50;
- Um whisky, no bar da messe, eram 2,50 pesos sem água de sifão e com água eram 3,00 pesos;
- Quanto à lerpa, ou ramim, uma noite boa, ou má, poderia dar (valor médio) 200 a 300 pesos para a lerpa e 50 a 100 para o ramim.
Já não me lembro da maioria dos preços mas tenho uma ideia de que uma viagem na TAP em Março de 1970, Bissau-Lisboa-Bissau, me custou à volta de 6 contos [ 30 euros, em moeda actual] e nós ganhávamos cerca de 5.
O pré dos soldados era de 600 pesos, os de 2ª [classe, os africanos], 900 pesos os de cá e os cabos 1200 pesos. Eu sei dessa diferença, pois tinha no meu Gr Comb o Arménio (o Vermelhinha) que foi como soldado, visto que levou cá uma porrada (foi apanhado numa rusga pela PM no Porto quando já estávamos no IAO em Santa Margarida) que lhe lixou a promoção.
Em Bissau, como normalmente ficava instalado na BA 12 [Base Aérea nº 12] nos alojamentos dos pilotos, pois tinha lá malta minha conhecida de cá, não sei qual o preço das pensões, e do bifinho na Transmontana de Bafatá também já não me lembro.
Sei bem, isso não me esqueceu, que o visque era mais barato que a cervejola : 2,50 [pesos] simples contra 3,00 ou 3,50, além de que dava direito, o whisky, a gelo. As cervejas nunca estavam suficientemente geladas pois os frigoríficos da messe, a petróleo, não tinham poder de resposta para a quantidade de pedidos.
Não se riam, meus amigos, com a expressão dos frigoríficos a petróleo, pois era assim mesmo que funcionavam, visto que o gerador eléctrico [de Bambadinca] só trabalhava à hora de almoço e depois durante a noite. Disto, da produção de frio/ar condicionado falo de cátedra pois é a minha vida profissional (eu costumo dizer que vivo do ar condicionado).
Aquele sistema de produção do frio a partir de uma fonte quente ainda hoje é utilizado, chama-se de absorção, e utiliza como refrigerante a água, ao contrário dos sistemas mais vulgarizados que utilizam alguns gases, mais ou menos poluentes da camada de ozono. Posso dar-vos como exemplo alguns dos sistemas de produção do frio para o ar condicionado, que conheço pois acompanhei de perto: Estalagem da Srª das Neves, no nordeste transmontano, do Hospital de Matosinhos, dos edifícios do BCP-Millennium no Tagus Park em Oeiras, do Hospital de Mirandela, etc., utilizam sistemas destes.
Um abraço, Humberto Reis
4. Comentário "do sábio e sensato, do nosso mui experiente operacional e grande conhecedor da Guiné, do antes e do depois, A. Marques Lopes" (**):
Interessante também esta reflexão (fez parte da nossa vida). No entanto, eu, pessoalmente, muito pouco posso dizer. Lembro-me que pagava 5 pesos quer à minha lavadeira de Geba quer à de Barro; além da lavagem também trabalhavam com as mãos (eram fulas, pois).
Quanto a tainadas e saber o preço delas, é um bocado difícil pois nunca tive tempo para muitas... Só sei que, quando em Bissau à espera de embarque, paguei 5 pesos aos miúdos que andavam perto do Bento (a 5ª Rep...) a vender sacos de camarão.
Quando em Geba fui uma vez a Bafatá e, talvez, à Transmontana, não sei bem (só sei que o dono, já entradote, tinha uma mulher loura mais nova e também comestível). Um dia, eu e o capitão [da CART 1691] (o tal que morreu na estrada para Banjara) decidimos ir os dois até Nova Lamego de jeep (maluqueiras!) onde comemos qualquer coisa não sei aonde e não me lembro o que paguei.
Quando em Bissau, no Pilão, frequentei várias vezes a Fátima, que não era caboverdiana mas sim fula, e dava-lhe 50 pesos de cada vez. Uma rapariga esperta: uma noite, a Fátima propôs-me que eu trouxesse uma grade de cervejas do QG para ela vender aos visitantes (era giro ouvi-la gritar da cama: está ocupado!, quando os páras ou os fuzos batiam à porta dela), dava-me metade da venda (não entrei nisso, claro). Também frequentei a casa que um branco tinha perto do campo do UDIB, e onde tinha as filhas à disposição, mas aí só paguei as cervejas.
Quanto às bebidas da tropa, não me lembro rigorosamente nada dos preços. Mas bebi de tudo, garanto-vos, e em grande quantidade (latas de rum com coca-cola, de cerveja com coca-cola, whisky, gin, cerveja, 1920...). Só procurei beber muito pouca água, e nunca apanhei nenhuma doença, por isso, com certeza. Quando chegava das operações, eu e os furriéis esticavamo-nos ao comprido e o soldado faxina já sabia que tinha de trazer uma grade de cervejas para nos saciar...
Como vêem, quanto a este custo de vida sei muito pouco.
Marques Lopes
PS - Não me lembrei dessa dos maços de tabaco porque nunca fumei no mato. Nem ninguém dos que saíam comigo podia fumar. Regra de segurança para as muitas noites passadas fora. E creio que foi muito útil.
5. Achegas do Luís Carvalhido (***):
Bom dia, companheiros!
Que lembranças! Aquilo que se comprava com meia dúzia de pesos!... Onde eu investia muito era iske e na coca-cola. Nas outras coisas, não precisava muito, porque sempre fui um rapaz com muita sorte. Não fiquem com inveja; já pelo contrário, nunca me saiu nada ao jogo.
Luís, dei esta morada a um companheiro de armas que está nos States e que tem histórias e fotos do Saltinho. Dentro em breve teremos aqui outros olhares.
Quanto a mim dentro de dias vou para o nordeste brasileiro. Depois conto como é que foi, porque aqueles que lá vão ficam amarrados. Eu só vou olhar porque comigo vai a comandante da guarnição e ela não é de brincadeiras.
6. Apontamento do Sousa de Castro (***):
Olá, amigos!
Quero dizer-vos que no meu tempo (1972/74) não era muito diferente: os preços que se praticavam eram mais ou menos os mesmos....
Puxando um pouco pela memória, eu como 1º cabo radiotelegrafista ganhava 1.500$00, sendo 1.200$00 por ser 1º cabo e mais 300$00, de prémio de especialidade.
A dita queca, se a memória não me trai, creio que era assim: para os soldados cinquenta pesos; para os cabos sessenta pesos; a partir daqui não me lembro quanto pagavam os mais graduados... Quanto às cabo-verdianas, a coisa era de facto mais cara, em final de comissão paguei cento e cinquenta ou duzentos pesos, isto em Fevereiro de 1974.
Recordo que, com um peso, comprava quatro ou cinco bananas. Os uísques novos como o Johnnie Walker (cavalo branco) e outros custavam, em 1972/74, cinquenta pesos; o Dimple 100 pesos; o Old Parr 150 pesos; e havia o Monks, a 250 pesos.
Julgo serem estes os preços daquela altura, alguém que me corrija. Por lavar a roupa, como cabo pagava 60 pesos.
Anexei uma nota de cinquenta pesos, frente e verso para recordação.
Sousa de Castro
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Notas de L.G.:
(**) vd. poste de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6198: O 6º aniversário do nosso blogue (11): Selecção dos melhores dos primeiros cem postes publicados na I Série do nosso blogue (Os editores)
(***) Vd. postes da I Série: