sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7864: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (13): Dom Quixote de Lapin

1. Mensagem José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), com data de 24 de Fevereiro de 2011:

Caros Camaradas
Dos fracos não reza a história.
Mas todos os vencedores já perderam.
Por isso, vamos continuar.
Um abraço do Silva


Memórias boas da minha guerra (13)

Dom Quixote de Lapin

Estávamos em meados de Outubro de 1965.

Domingo de manhã na Escola Prática de Cavalaria, em Santarém. Fim de semana para toda a gente menos para os de longe e para os castigados.

Nesse curso, havia apenas três gajos da zona do Porto: O Egas (o da corda) de Gondomar, o Fonseca de Rio Tinto e eu, de Fiães. Enquanto que os outros nortenhos seguiram para gozar o fim-de-semana, eu, com três castigos no “placard”, fiquei, mais uma vez, meio abandonado a moer a minha revolta.

Junto ao Pavilhão Polidesportivo faziam-se equipas para alguns passatempos e eu, talvez porque aparentava alguma antipatia, ou, então, por ser um “estrangeiro de lá de cima”, fiquei sentado a contemplar os dotes desportivos daqueles craques, onde eu não merecia lugar em qualquer das equipas. Mas, afinal, não estava sozinho, porque me apercebi logo que o algarvio, a quem chamávamos Dom Quixote de Lapin, também havia sido preterido. Ora, o Rodrigo, tinha trazido do Algarve alguns vizinhos que já o conheciam por esse apelido “de Lapin”. Era esquelético, alto e de cara afiada. Tinha uma boca pequena de onde se salientavam os tais dois dentes grandes, cujo aspecto lhe teria dado justamente o tal apelido de Lapin. Tinha os cabelos aloirados e especados em várias direcções, resistentes a qualquer tipo de penteado. A farda sobrava-lhe tanto que os respectivos colarinhos lhe davam para meter dois pescoços. Pois, o Dom Quixote de Lapin tornou-se facilmente numa figura extremamente conhecida. Todavia, os nossos camaradas não lhe viram qualidades para o desporto, o que era absolutamente natural, ou então, recearam que ele, tão frágil, se pudesse magoar.

Vista parcial de Santarém.
Foto retirada do site da Câmara Municipal, com a devida vénia

Ao ver-me meio sisudo e pouco alegre, abeirou-se para me reconfortar. Foi metendo conversa e, de repente, apareceu-me de luvas de boxe calçadas e com outro par para mim.

- Oh pá, vamo-nos entreter com isto. Vais ver que é porreiro – incentivava ele.

- Pois pode ser, mas eu não quero saber nada disso e para mais é um desporto que não gosto e em que perdem sempre os dois – respondi-lhe.

Ele pôs as luvas sobre os meus joelhos e começou a fazer gestos de pugilista, na minha direcção, enquanto insistia para eu experimentar. Além de não gostar daquela modalidade, também não queria ter a responsabilidade de lhe partir os ossos, pois acreditava nas capacidades físicas do meu corpinho de atleta. Ele, não me convencia. Tanto insistiu que eu, por curiosidade, enfiei as luvas. Daí, até lhe responder, com os meus gestos, foi um repente.

Começou a tocar-me na “fronha” e eu, querendo responder-lhe, não lhe acertava uma. Até que tomei a atitude de reagir com mais agressividade. Levei um “penso” que me estatelei logo no chão. Meio atordoado e muito melindrado com a situação, levanto-me e tento fazer-lhe o mesmo. Então é que ele me acertou em cheio. Devo ter levado um tempito para reanimar. Mal me apercebi da humilhação que estava a levar, enraivecido, corro para ele, procurando atingi-lo de qualquer maneira e em qualquer parte do corpo. O Dom Quixote gritava para eu ter calma, que éramos amigos, etc etc. Como um cavalheiro (ou não fosse ele um sósia do tal Fidalgo de La Mancha), pediu-me desculpa por se ter excedido e não me ter informado que era atleta de Boxe e que se aproveitara da oportunidade por sentir muita necessidade de treinar. E foi adiantando que eu, da forma como reagia, não tinha quaisquer hipóteses de sucesso nessa modalidade desportiva.

À noite, quando chegaram os meus amigos, foram procurar-me aos balneários, onde eu, com água fresca, ainda tentava emagrecer as minhas maltratadas feições.

- Hi, cun’ cara...go! Oh Egas, olha o que fizeram ao nosso vizinho Silva – gritou o Rio Tinto. - Ele está com as “bentas” inchadas. Coseram-lhe a “tromba” – continuava ele.

O Egas, um gondomarense de gema, abeirou-se e logo, valentemente, perguntou:

– Quantos eram, quantos eram? E aumentando o tom de voz: - Até os comemos! Ele, que não podia com uma gata pelo rabo (estava à espera de Junta Médica para ser recusado por “incapaz”), já estava a preparar a devida resposta aos agressores, quando eu afirmei:

- Foi só um!

- O quê, que não ouvi bem? – interpelava o Rio Tinto.

Lá respondi: – Foi o Dom Quixote de Lapin!

Gargalhada geral.

- Como? – voltou o Rio Tinto - Aquele transparente, que não aguenta uma revoada de vento?

– Sim – respondi-lhe - Sim, esse pau-de-virar-tripas, que é praticante de Boxe e que eu, feito Tarzan Taborda, tentei assapar-lhe o pelo!

Silva da Cart 1689
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7766: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (12): Uma madrinha de guerra

Guiné 63/74 - P7863: Memória dos lugares (144): Bedanda 1972/73 - Filhos da Terra / Filhos da Guerra (1) (António Teixeira)

1. Mensagem de António Teixeira* (ex-Alf Mil da CCAÇ 3459/BCAÇ 3863 - Teixeira Pinto, e CCAÇ 6 - Bedanda; 1971/73), com data de 23 de Fevereiro de 2011:

Carlos
Cá vão mais algumas fotos para a história de Bedanda

É ainda com imensa saudade e ternura que revejo estas fotos.
Estávamos habituados a ver aquelas crianças sempre por ali, sempre simpáticas, com um sorriso aberto e leal. Outras, com um olhar mais triste, talvez já adivinhando um futuro sem grandes promessas.

Que será feito delas? Terão sobrevivido? Terão vingado? Nunca o saberemos, como também não sei os seus nomes, nem as suas famílias, nem as suas moranças.
Eram crianças apenas.
Que até para brincar tinham que construir os seus próprios brinquedos.
Tentei captar alguns desses rostos, desses olhares.

Um grande alfa bravo
António Teixeira


BEDANDA 1972/73

FILHOS DA TERRA / FILHOS DA GUERRA (1)










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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 21 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7831: Memória dos lugares (141): Bedanda vista por António Teixeira, ex-Alf Mil da CCAÇ 6 (1971/73) (3)

Vd. último poste da série de 25 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7859: Memória dos lugares (143): Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, 1971/72 (Paulo Santiago, instrutor de mílícias, ex-Alf Mil At Inf, Pel Caç Nat 53)

Guiné 63/74 - P7862: (Ex)citações (133): Obrigadinho, Jorge, salvaste-me a vida!... (David Guimarães, ex-Fur Mil At Art, Minas e Armadilhas, CART 2716, Xitole, 1970/72)


Guiné-Bissau > Zona Leste > Saltinho > 2001 > O David Guimarães junto à ponte sobre o Rio Corubal, no Saltinho, um dos sítios paradisíacos da Guiné, onde havia, durante a guerra colonial, um aquartelamento que ficava a 20 Km de Xitole na estrada Bambadinca-Aldeia Formosa (hoje, Quebo). Esta ponte, no nosso tempo (1969/71), chamava-se Craveiro Lopes, e estava interdita...


Foto:  © David Guimarães (2005). Todos os direitos reservados




Guiné-Bissau > Saltinho > 2005 > "No Saltinho, as bajudas continuam lindas, ontem, como hoje", escreveu o José Teixeira, quando lá voltou em Abril de 2005... (E já lá voltou depois mais vezes, e vai voltar em Abril de 2011, desta vez levando os filhos, um deles médico)...  Mas esta é (ou era, no nosso tempo) também uma região... palúdica, devido à existência de rios e charcos de água, acrescenta o nosso David Guimarães, que fez do Xitole, tabanca também ribeirinha do Corubal mas mais a norte, a sua tabanca da Guiné...


Muita malta não sabe que o David Guimarães, filho de de um herói da 1ª Guerra Mundial (!), também foi vítima... do paludismo, como quase todos nós, tanto ou mais do que dos encantos das bajudas fulas... Além de mestre da viola, foi um exímio manipulador de minas e armadilhas... Brincou muitas vezes com o fogo, mas felizmente para ele (e para nós, seus camarigos) teve a sorte do seu lado (o mesmo não se  pode dizer dos infelizes Quaresma, decapitado, e Leones, que ficou cego e sem dedos) (LG) (*) 


Foto: © José Teixeira (2005). Todos os direitos reservados




1. Mensagem do  David Guimarães (nosso camarigo, tabanqueiro da primeira hora, Maio de 2005), com comentários ao Poste P7857 (**):

Luis, e restantes camaradas... JORGE:

Esta entrada de Jorge Silva (**) , com seus escritos de memória (na tabanca), se a todos será de boa e interessante leitura,  a mim não me poderá passar ao lado naturalmente. Não tenho comentado muito as situações vividas por todos os companheiros e eu mesmo ali pelas Tabancas de Matosinhos e dos Melros. Enfim,  assinalo pelo menos a minha presença... Nque os escritos valem o que valem e será o ponto que mais nos poderá unir uns aos outros...

Um dia alguém disse (creio que o Mexia Alves)  que todos acabamos por ter uma terra na Guiné, que foi aquela onde estivemos aquartelados... Uns tiveram mais que uma,  caso dele e caso do Jorge...



E então vamos, eu dar os parabéns a um combatente que a esta distância descreve uma operação sem a ajuda de nenhum escrito, sem nenhum apontamento (ontem mesmo o Jorge me confirmou) e com aqueles pormenores, a nível de ser um dilagrama lançado da G3 do nosso camarada de que o Silva fala e que vive para aí em Vila de Azeitão, o Rei, (então,  sim,  é memória de elefante), a parar uma emboscada...

Ao Jorge, num comentário que fiz logo ao Silva,  só lhe corrigi isto: não foi uma avioneta mas sim um helicópetero quem nos guiou... Logo ele corrigiu em documento final,  sendo que eu,  então já documentado,  informei o nome da Operação [...

Nessa operação, que o Jorge tão bem conta, na cena do dilagrama estava eu junto do Rei, assim se chama o nosso ex-camarada e querido amigo... Trocava eu e ele cigarro e lume e eis que as costureirinhas começaram a funcionar... Imediatamente nos deitamos atrás de uma árvore bem fina para abrigar um e eu disparei três tiros de G3,  ainda hoje me pergunto porquê... A tensão era maior claro, e ele disse:

- Calma,  Guimarães ... - E lá foi o bendito engenho que os calou...

Nunca vi um documento tão bem escrito como este do Jorge quanto a precisões e detalhes do que nesse dia se passou, em que não conseguimos entrar em Satecuta porque eles não deixaram...  Que coisa esquisita,  tudo aos tiros e as granadas de morteiro deles a caírem bem entre a nossa companhia, foi o dia em que senti terra a cair por cima de mim, manga de cu pequenino mas, no fim,  disse eu no comentário ao texto dele:

- Que sorte tivemos,  Jorge!...


Nunca mais daríamos com o caminho de volta... e a operação acabou,  como ele disse claro... PONTE DOS FULAS,  XITOLE, com  todos a receber-nos eufóricos de alegria, uma companhia de indivíduos que tinham saído de camuflados muito limpos e regressavam todos sujos, cansados,  mas se a missão não tinha sido cumprida, pelos motivos mais que  evidentes de não termos entrado no aquartelamento/tabanca deles, vínhamos no entanto todos com os dedos a mexer... Aquela água dos bidões limpou-nos por fora e as bazucas  [, cerveja,] como Jorge diz e bem, limpou-nos por dentro e serviu de calmante...´


Assim tenho que evidentemente render homenagem ao Jorge que começou a escrever e bem - e já está a falar da minha terra da Guiné, XITOLE...

Estou á espera - ontem falámos nisso - , de como ele um dia me salvou a vida... Diz-me o Jorge, andávamos nós a desmontar as minas, na sobreposição...

- Olha aí entre os teus pés... - Eram as três hastes da espoleta de uma mina antipessoal m/966 que eu tinha montado no início da Comissão junto ao aquartelamento mas com capim...


Quando fomos levantar,  estávamos no tempo seco, levei o detector de minas para não correr riscos e só aí vi que o risco foi maior ainda: aquele local tinha sido antes uma antiga serração e o chão estava juncado de matéria metálica das serras... Lá se fora o préstimo do detector de minas pois apitava em todo o lado... Como eu tinha a certeza que tinha sido ali, pronto,  foi fácil detectá-la,  olhando só,  que eu quase a calcava... Assim se morre no fim da guerra, mas  ainda bem que o Jorge estava lá pela beira....


OBRIGADINHO, Jorge,  salvaste-me a vida ou partes do corpo...


Colando o Blogue que o Jorge fez dentro do mesmo espírito que o nosso - acho muito giro que seja aproveitado tudo o que ele conta da ponte dos Fulas (e daquele ponto de tiro que ele engendrou em cima do Fortim junto à ponte onde se meteu uma metralhadora - creio... e tantas peripécias que ele sabe tão bem quanto eu durante o tempo que lá andou - antes de ir para "empresário de festas" no BENG em Bissau - após a nossa vinda para a Metrópole, assim era na altura)...

Parabéns,  Jorge,  e agora escreve e vai ler o que digo e é do teu tempo - para ver se pomos ordem na nossa Companhia....

Um abraço,

David Guimarães
Furr Mil 173545368
At Art Minas e Armadilhas

CART 2716,
Xitole,  1970/1972


PS - Continua, Jorge Silva,  conta aquela vez em que eles apontaram pela primeira vez os canhões em recuo para o Xitole e parece que dispararam em rajada - e tu a tomares banho ... Contaste-me ontem... Não contes quando um dia andavam à minha procura e não me encontravam, e,  pronto,  estava eu e o Martins metidos na vala junto ao nosso abrigo, tínhamos bebido um pouquinho a mais só,  e aquele metro e meio de vala era muito alto e a cerveja era pesada para caramba...



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Notas de L.G.:


(*) Vd.  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, I Série, poste de 10 Julho 2005 > Guiné 69/71 - XCIX: Estórias do Xitole: Com minas e armadilhas, só te enganas um vez (David Guimarães)


(**) Vd. poste de 24 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7857: (Ex)citações (132): O glorioso dia zero, 25 de Março de 1972, o mais feliz da vida dos jovens da CART 2716, o da véspera do regresso a casa (Jorge Silva)

Guiné 63/74 - P7861: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (71): Na Kontra Ka Kontra: 35.º episódio




1. Trigésimo quinto episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 24 de Fevereiro de 2011:


NA KONTRA
KA KONTRA


35º EPISÓDIO

O calor aperta e resolve tornar ao quartel. Não vai pela avenida principal, que a essa hora e a subir é penoso percorrê-la. Vai antes por um caminho totalmente arborizado e plano que conduz à mãe d’água de Bafata, zona muito aprazível onde até há mesas e bancos para piqueniques, local que é conhecido por Sintra de Bafata. Pelo caminho cruza-se com bandos de macacos-cão que estão sempre por ali à espera que se lhe dê qualquer coisa para comer. Da mãe d’água, onde também há um grande chafariz, até ao quartel só tem que subir um pequeno desnível, passando ao lado da casa do Comandante do Esquadrão. Não é raro neste local verem-se uns enormes “lagartos” com mais de um metro de comprimento mas perfeitamente inofensivos.

O Alferes Magalhães no caminho de Sintra de Bafata.

Chegado ao quartel vai deitar-se. O Comandante tinha-lhe atribuído três dias de descanso e portanto aproveita.

O nosso Alferes passa os três dias concedidos quase exclusivamente a descansar. Come dorme e sobretudo vai pensando o que fazer da sua vida. O dia-a-dia do quartel não o ajuda muito a resolver a situação.

Começa a pensar no fim da comissão que se aproxima e também nos seus familiares da metrópole. Pensa na namorada que lá deixou e com quem, nos últimos tempos não tem mantido correspondência. Talvez ela já tivesse arranjado outro namorado, ou talvez não… Mesmo assim resolve escrever-lhe. Se ela ainda lhe responder terá aí um grande apoio para continuar a aguentar o passar dos dias, das horas, dos minutos…

Com tempo de sobra e contrariamente ao que era habitual, escreve-lhe uma grande carta ocupando quatro aerogramas. Diz-lhe uma “pequena mentirinha”: Que esteve dois meses isolado numa tabanca no mato. Relata-lhe os “perigos” por que passou, repete, como suas, as palavras do Furriel de Madina Xaquili que demonstrou a intenção de levar para lá a esposa e aí viverem felizes para sempre. Refere-lhe que agora cada dia que passa se sente mais só, que ainda gosta muito dela, o que desta vez não é mentira.

Quando vai entregar a carta no SPM ainda hesita enviá-la, mas por fim, sem nada a perder, deixa-a cair na caixa do correio. Se houver resposta irá demorar alguns dias.

No primeiro fim de semana em que há cinema, não perde a oportunidade, acima de tudo para rever o seu amigo Ibraim. Está um calor sufocante mas porque há a ameaça de um tornado tem que levar no braço um impermeável da tropa, que vestido lhe chega aos pés, protegendo-o totalmente.

A rua onde se situa o Cinema.

Vai directo ao recinto, ao ar livre, onde se projecta o filme. Lá chegado vê logo o Ibraim. Está a vender os bilhetes e a controlar as entradas. Nem sequer repara no cartaz que anuncia o filme dessa noite. Deixa entrar as pessoas que estavam à porta e sem mais ninguém para o porteiro atender, dirige-se ao seu amigo:

- Ibraim, há tanto tempo que não nos vemos. Tenho muitas coisas para lhe contar. Estive dois meses numa tabanca…

O porteiro, sentado a uma pequena mesa onde tinha os bilhetes e o dinheiro das entradas, sem sequer levantar os olhos para o amigo, mantendo-se a olhar para o maço de bilhetes como se estivesse muito atarefado, responde:

- Senhor Alferes, agora tenho muito que fazer e não podemos conversar.

O Alferes ficou aparvalhado, sem saber o que dizer. Passava-se alguma coisa com o seu amigo. Antes de ir para Madina Xaquili davam-se como verdadeiros amigos e agora a reacção do Ibraim era perfeitamente incompreensível. Estendeu o dinheiro, recebeu o bilhete e entrou. Sentado à espera que o filme comece pensa em tudo o que podia ter provocado aquela reacção, não chegando a conclusão alguma. Decide que no fim do espectáculo irá tirar tudo a limpo, confrontando o amigo com a reacção que tinha tido.

Depois dos documentários, que desta vez foram sobre as Pousadas de Portugal, e começado o filme dessa noite é que o Alferes se apercebe que se trata do “Deserto Vermelho” de Antonioni. Óptimo filme, mas nestas circunstâncias talvez preferisse um tema menos pesado, quiçá uma “coboiada”.

O que é certo é que no intervalo metade da assistência já não voltou à sala. O filme era realmente difícil.

No fim o Alferes deixou sair todo o pessoal e só depois de dirigiu para a saída. O Ibraim não teria justificação para não falar com ele.

Fim deste episódio
Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 24 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7854: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (70): Na Kontra Ka Kontra: 34.º episódio

Guiné 63/74 - P7860: Convívios (294): Convivío do BCAV 3846, dia 13 de Março no Restaurante Quinta do Paúl, em Paul, Ortigosa, Leiria (Delfim Rodrigues)




1. O nosso Camarada Delfim Rodrigues, ex-1º Cabo Aux Enf da CCAV 3366 do BCAV 3846, Susana e Varela, 1971/73, enviou-nos com pedido de publicação o seguinte programa da festa anual do seu batalhão para 2011:

Camaradas,

Agradecia que publicassem o programa do almoço anual do Batalhão de Cavalaria 3846, que esteve na Guiné em 1971/73 - Ingoré, São Domingos, Susana, Antotinha, Sedengal e Varela -, e ao qual eu pertenci.

Um abraço
Delfim Rodrigues
Convivío do BCAV 3846
Caros Amigos,


É com enorme prazer que neste começo de novo ano desejamos a Todos e suas Famílias um óptimo ano 2011 e, ao mesmo tempo, aproveitamos para vos comunicar a data e o local do nosso próximo Almoço/Convívio.
Este ano realiza-se no próximo dia 13 de Março num local já nosso conhecido Restaurante Quinta do Paúl em Ortigosa que esperamos seja do vosso agrado, dado o nível de qualidade conseguido há 2 (dois) anos.
Contamos com a vossa presença, para que juntos possamos fazer deste Almoço/Convívio mais um momento inesquecível e de grande confraternização, espelhando a alma de amizade que temos vindo a preservar ao longo deste últimos 38 anos e que perdurará para sempre nas nossas memórias.
Ás 12H00 será celebrada missa pelo nosso Capelão, onde serão recordados Todos aqueles que nos deixaram. Por volta das 13H00 será servido o almoço.


Restaurante: Quinta do Paúl em OrtigosaMorada: Estrada Nacional 109 – Paúl – Ortigosa – LeiriaTelefone: 244 613 438
Os Preços para este ano são:

ð Crianças entre os 5 e 10 Anos = 10,00 €;
ð Para os restantes = 28,00 €
Para qualquer esclarecimento poderão contactar:

- Alberto Toscano: 912381293 – albertotoscano@netcabo.pt
- Carlos Conceição (Xina): 919489378 –
carlosconceicaonovoa@gmail.com
- Laureano: 966452001-
laureano@netmadeira.com

A confirmação da vossa presença deverá ser feita até 8 de Março.
Esperamos contar convosco neste dia e até lá desejamos a Todos Boa Viagem.
Um forte abraço do Toscano, Xina, Laureano e Capelão


PS:
- Pedimos, por especial favor, a quem possui E-mail que o mesmo seja fornecido à Organização. Obrigado.


Como chegar ao Restaurante a partir de Leiria:
  • Leiria – Ortigosa: Distância: 11,7 km (aprox. 17 min.)
  • Ponto de referência: Av. Dom João III (avançar 170 m)
  • Na rotunda, seguir pela 3.ª saída para Av. Dr. Adelino Amaro da Costa
  • Passar 1 rotunda (avançar 1,0 km) Na Rotunda Almoinha Grande, sair na 2.ª saída para N113 (a avançar 350 m)
  • Na rotunda, seguir pela 1.ª saída para N109. Passar 2 rotundas (avançar 9,4 km) em direcção a Figueira da Foz/Monte Real.
  • Virar à direita (avançar 93 m) e está em ORTIGOSA
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Nota de M.R.:

Guiné 63/74 - P7859: Memória dos lugares (143): Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, 1971/72 (Paulo Santiago, instrutor de mílícias, ex-Alf Mil At Inf, Pel Caç Nat 53)


Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Estrada Bambadinca - Xime > Ponte sobre o Rio Udunduma >  1971 (?) > O Alf Mil Paulo Santiago é o terceiro e o Celso o segundo, a contar da direita... Os restantes militares são da CCAÇ 12...



Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Estrada Bambadinca - Xime >  Ponte sobre o Rio Udunduma >  1971 (?) > Um militar da CCAÇ 12 apanhando peixes depois do lançamento de uma granada, técnica que permitia o regular abastecimento de peixe aos cerca de 30 homens que defendiam a ponte... O Rio tinha água todo o o ano (e era rico em peixe), deseguando a escassos quilómetros no Rio Geba...




Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Estrada Bambadinca - Xime > Ponte sobre o Rio Udunduma >  1971 (?) > Na margem direita, vê-se uma das "suites" desta "estância de turismo"...

Fotos: © Paulo Santiago (2011). Todos os direitos reservados





Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Localização da Ponte sobre o Rio Udunduma (e não Undunduma...), afluente do Rio Geba (ou Xaianga), a meio caminho entre Bambadinca  e Xime... A ponte foi dinamitada e parcialmente destruída por acção do PAIGC, na noite de 28/29 de Maio de 1969, por ocasião do ataque a Bambadinca (quatro/cinco km a nordeste), levado  a cabo por 2 bigrupos (cerca de 100 homens)...  A partir desse ataque, passou a ser destacado um grupo de combate para defender este ponto nevrálgico...

Durante anos, até à construção da nova estrada  (alcatroada) Xime-Bambadinca, milhares e milhares de homens e viaturas, desembarcados em LDG no Xime passaram por aqui a caminho do leste (e vice-versa)... 


O nosso camarigo Carlos Marques Santos (ex-Fur Mil, CART 2339, Fá e  Mansambo, 1968/69) diz que foi o primeiro a avançar, para a Ponte do Rio Udunduma, logo no dia 29 de Maio de 1969, com o 3º Gr Comb da sua companhia, vindo em marcha forçada de Mansambo...

Infogravura: Pormenor da carta de Bambadinca (1955), 1/50000.




1. Mensagem do Paulo Santiago, com data de 24 do corrente, com informação adicional ao poste P7852 (*):


Luís
O destacamento da ponte sobre o rio Undunduma [, ou melhor, Udunduma,] continuou a existir após a inauguração da estrada asfaltada entre o Xime e Bambadinca. 


Entre Outubro de 1971 e Março de 1972 passei lá imensas vezes, tanto de dia como de noite, acompanhado pelas companhias de instrução de milícias, em deslocação para a carreira de tiro, que ficava aí a 1 km daquele destacamento, indo em direcção ao Xime. 


Era uma temeridade ir fazer tiro nocturno para tal local...


Na primeira foto,  vê-se um militar da CCAÇ 12, julgo que apanhar peixe após alguém ter lançado uma granada. 


Na outra, excepto eu e o matulão (Celo) ao meu lado, estão militares da CCaç 12.


Na terceira, vê-se ao fundo à direita umas chapas e bidões do "alojamento".


Penso que o Mexia Alves também esteve naquela "estância", já numa data posterior a  Março de 1972. 
Abraço


Paulo Santiago


(ex-Alf Mil t Inf,
Pel Caç Nat 53,
Saltinho1970/72,
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Notas de L.G.:


 (*) Vd. poste de 24 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7852: A minha CCAÇ 12 (12): Dezembro de 1969, tiritando de frio, à noite, na zona de Biro/Galoiel, subsector de Mansambo (Luís Graça / Humberto Reis)

(**) Último poste da série > 22 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7842: Memória dos lugares (142): Bissau, Santa Luzia, Clube de Oficiais, Outubro de 1973 (António Graça de Abreu, ex-Alf Mil, CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74)

Guiné 63/74 - P7858: Parabéns a você (220): Gumerzindo Silva, ex-Soldado Condutor da CART 3331 (Tertúlia / Editores)


PARABÉNS A VOCÊ

25 DE FEVEREIRO DE 2011


Caro camarada Gumerzindo, a Tabanca Grande solidariza-se contigo nesta data festiva (*).

Assim, vêm os Editores, em nome de toda a Tertúlia desejar-te um feliz dia de aniversário junto dos teus familiares e amigos.

Que esta data se festeje por muitos anos, repletos de saúde, tendo sempre por perto aqueles que amas e prezas.

Na hora do brinde não esqueças os teus camaradas e amigos do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, que irão erguer também uma taça pela tua saúde e longevidade.


Manda-nos, entretanto, notícias: ainda vives na Alemanha para onde emigraste em Abril de 1973 ?
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 25 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5880: Parabéns a você (81): Gumerzindo Silva, ex-Soldado Condutor da CART 3331, Cuntima, 1970/72 (Editores)

Vd. último poste da série de 24 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7855: Parabéns a você (219): Manuel Henrique Quintas de Pinho, marinheiro radiotelegrafista, LDM 301 e LDM 107 (1971/73)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7857: (Ex)citações (132): O glorioso dia zero, 25 de Março de 1972, o mais feliz da vida dos jovens da CART 2716, o da véspera do regresso a casa (Jorge Silva)


Guiné > Bissau > 25 de Março de 1972  > Cerimónia de despedida da CART 2716 (Xitole, 1970/72), do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), na presença do Com-Chefe General  Spínola.


Foto: © Jorge Silva  (2010). Todos os direitos reservados (Com a devida vénia...)



1. O nosso camarada Jorge Silva, que vive em Ermesinde, Valongo, tem um blogue, Amigos do Xitole, onde já escreveu duas coisinhas... Gostei  muito da primeira... Acho que merece maior divulgação, até por que, tendo sido  ele de rendição individual, faz aqui uma homenagem aos seus camaradas da CART 2716, que comemoraram o seu dia zero em 25 de Março de 1972 (Ele continuaria no BENG até 1973)... Tomo por isso liberdade de reproduzir esse poste na sua totalidade (com excepção das fotos) (*).



2. Memórias das vésperas do dia mais feliz da CART 2716
por Jorge Silva

A CART 2716, enquanto unidade do BART 2917 (Bambadinca), teve a seu cargo a defesa da zona do Xitole, no leste da Guiné, entre 1970 e 1972.

A CART 2716 era uma companhia quase exclusivamete formada por jovens milicianos (na casa dos 20 a 23 anos), incluindo o Capitão [Miliciano de Artilharia] Espinha de Almeida (comandante) [ de seu nome completo,  Francisco Manuel Espinha de Almeida]  que, de entre eles, era o mais velho, apesar de apenas contabilizar três décadas de vida.

[Legenda da foto, à esquerda, Guiné > Zona Leste > Xitole > CART 2716 >1970: Da esquerda para a direita: O Cap Mil Espinha de Almeida, o Fur Mil Guimarães e o Alf Mil ]


Foto: © David J. Guimarães (2005). Todos os direitos reservados


Apenas havia dois elementos do quadro permanente - os sargentos Santos e Pires que, apesar de mais maduros, eram, mesmo assim, homens relativamente jovens, na casa dos quarenta e tal anos.

Como tantos outros da época, no ex-ultramar português os jovens da CART 2716 foram impedidos de viver com normalidade uma fase crucial do seu amadurecimento.  No leste da Guiné, longe de tudo que lembrasse um resquício de civilização, foram prematuramente forçados a trocar:

(i) as convidativas praias estivais pelos perigos do capim e das matas;

(ii) os passeios com as namoradas pelos patrulhamentos e operações na companhia de camaradas de armas;

(iii) o conforto dos lares por toscos abrigos cavados no solo e cobertos de troncos, terra e cascalho, que também serviam de abrigo a cobras e outros répteis;

(iv) a apetecível comida portuguesa por refeições improvisadas à base de arroz, de conservas de cavala e de rações de combate, onde a sobremesa tendia teimosamente a ser goiabada e uma simples refeição com batatas era um luxo festejado;

(v) a promissora (embora amordaçada) rádio portuguesa pelas emissões intencionalmente intimidatórias da rádio PAIGC, enquanto instrumento da vertente psicológica da guerrilha;

(vi) a música melódica e harmoniosa das boites e bares dos anos 70 pelas batidas ruidosas dos morteiros e dos canhões sem recuo, misturadas com solos estridentes das famigeradas e temidas costureirinhas (pistolas metralhadoras);

(vii) a pacata família de origem por uma família de armas adoptiva, onde umas caixas de transporte de bacalhau se transformavam, milagrosamente,  num guarda-fatos, uma lata de coca-cola passava, de repente, a chamar-se copo ou chávena e os objectos que evocavam uma infância ainda bastante próxima tinham sido macabramente substituídos por metralhadoras G3, morteiros, bazucas e granadas;

(viii) os melhores anos e sonhos das suas vidas por um poço sem fundo de incertezas, de incomodidades e de perigos, que alguns nem sequer tiveram o ensejo de evocar no feliz dia do regresso, simplesmente porque a guerra colonial se encarregou de lhes amputar esse elementar direito.

Como tantos outros da época, no ex-ultramar português os jovens da CART 2716 foram impelidos a amadurecer num contexto que, felizmente, nos dias de hoje os seus filhos e netos têm imensas (e compreensíveis) dificuldades em captar e compreender, inclusive nos seus mais simples contornos.

Uma simples rotina da época ajudará, por certo, a ilustrar melhor o que as palavras e as fotografias não conseguem documentar.  Era usual os militares improvisarem uma folha com números inscritos desde 730 até 0, onde cada número ia sendo assinalado (abatido) sempre que passava mais um dia da sua comissão de serviço.

Neste particular, como em tantos outros, os objectivos individuais e colectivos coincidiam com o sonho do glorioso dia zero, o que ajudava a cimentar as relações de camaradagem (e amizade) existentes.

Em 25 de Março de 1972 [, no original, vem 1971, por lapso,] , quando eu ainda apenas assinalava no meu mapa o 401º dia a generalidade dos elementos da CART 2716 marcava, de forma inexorável, merecida e seguramente festiva, o ambicionado dia zero, deixando para trás trilhos que não tinham sido livremente escolhidos para readquirir o direito de passar a procurar os trilhos de reintegração na vida.

As imagens que se seguem (*) ilustram a cerimónia militar (desfile) que decorreu em Bissau, no quartel dos Adidos, antes de a generalidade dos elementos da CART 2716 (e do BART 2917) embarcarem, rumo às terras onde nasceram e aos braços saudosos dos familiares e amigos que emocionadamente os esperavam.

As fotos que figuram adiante são, por isso, uma espécie de hino a um punhado de homens (muito jovens na sua maioria) que se viram privados do direito de amadurecer como é comum os jovens amadurecerem em tempos de paz.

Pela minha parte, sinto a obrigação de, através das fotografias seguintes, lhes prestar esta singela homenagem, inclusive em memória do acolhimento, apoio e camaradagem que deles sempre recebi nos longos meses que partilhámosno Xitole.

Jorge Silva

(ex- Fur Mil At Art.
CART 2716, Xitole 1971/72,
e BENG 447, Bissau 1972/73)

[Revisão / fixação de texto /  título: L.G.] (**)

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Notas de L.G.:

(*) Vd. Blogue do Jorge Silva Amigos do Xitole > 4 de Setembro de 2010 > Memórias das vésperas do dia mais feliz da CART 2716

(**) Último poste da série > 12 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7768: (Ex)citações (131): Saudades de quê ?... Será que sou masoquista ?... E por que é que leio o raio deste blogue e até faço comentários ? (C. Martins)

Guiné 63/74 - P7856: Agenda cultural (111): Apresentação do romance Mulher Grande (Mindjer Garandi) de autoria de Mário Beja Santos, Livraria Bertrand do Chiado, dia 10 de Março de 2011



CONVITE

1. Convidam-se os nossos camaradas e amigos tertulianos a assistirem no próximo dia 10 de Março, pelas 18,30h, na Livraria Bertrand do Chiado, Lisboa, ao lançamento do último livro do nosso camarada Mário Beja Santos, "Mulher Grande" que terá como apresentadora a romancista Lídia Jorge.

Oportunamente voltaremos a falar deste acontecimento com repercussão no nosso blogue, já que o Mário Beja Santos é um dos mais activos tertulianos, alimentando regularmente com as suas recensões a nossa série "Notas de leitura".

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 24 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7853: Agenda cultural (110): Apresentação do livro "A Última Missão", do Cor Moura Calheiros - 26 Fevereiro, Livraria Arquivo, Leiria

Guiné 63/74 - P7855: Parabéns a você (219): Manuel Henrique Quintas de Pinho, marinheiro radiotelegrafista, LDM 301 e LDM 107 (1971/73)


PARABÉNS A VOCÊ

24 DE FEVEREIRO DE 2011





Caro camarada Manuel Henrique , a Tabanca Grande solidariza-se contigo nesta data festiva (*).

Assim, vêm os Editores, em nome de toda a Tertúlia desejar-te um feliz dia de aniversário junto dos teus familiares e amigos.

Que esta data se festeje por muitos anos, repletos de saúde, tendo sempre por perto aqueles que amas e prezas.

Na hora do brinde não esqueças os teus camaradas e amigos do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, que irão erguer também uma taça pela tua saúde e longevidade. (**)

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Notas de CV:

(*) Último poste da série > 23 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7848: Parabéns a você (218): José Ferreira da Silva, ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913 (Tertúlia / Editores)

(**) Vd. poste de 26 de Junho de 2007> Guiné 63/74 - P1885: Tabanca Grande (17): Manuel Henrique Quintas de Pinho, Marinheiro Radiotelegrafista, LDM 301 e 107 (Guiné, 1971/73)


(...) Habito em Chave, uma freguesia do Concelho de Arouca, Distrito de Aveiro. Prestei serviço militar na Marinha de Guerra Portuguesa e estive na antiga província da Guiné desde Setembro de 1971 a Junho de 1973, embarcado nas lanchas de desembarque médio, primeiro na LDM 301 (que foi abatida ao efectivo por ser muito antiga e estar desactualizada, pois teria vindo da América), e depois na LDM 107, de fabrico português.

Durante este período sofremos apenas um ataque directo no Rio Cacheu, perto da clareira de Olossato, a montante de Ganturé, que, embora muito forte, não causou estragos nem vítimas, felizmente. Foi no dia 26 de Janeiro de 1972, às 18.00h.  

Percorri toda a Guiné, via fluvial, desde o Rio Cacine, passando pelo Rio Cumbijã até Bedanda, Tombali, Buba, Rio Geba até Porto Gole, Rio Mansoa até Mansoa, Encheia e Rio Cacheu até norte de Farim. Tenho algumas fotografias mas não consigo enviá-las. Se puder diga-me como hei-de proceder.

De qualquer modo, gosto de navegar por este Blogue, pois traz aquela saudade que ainda hoje se sente pelos bons e até menos bons momentos que lá passe. (...)

Guiné 63/74 - P7854: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (70): Na Kontra Ka Kontra: 34.º episódio




1. Trigésimo quarto episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 23 de Fevereiro de 2011:


NA KONTRA
KA KONTRA


34º EPISÓDIO

Na reunião com o Furriel, para lhe entregar o comando, o Alferes chega a dizer-lhe que lhe tinha passado pela cabeça ignorar a ordem para ir embora e permanecer na tabanca. Além das boas recordações que tinha dos dois meses passados ali, estava sobretudo com muita pena de abandonar toda aquela gente africana que, independentemente da guerra, dentro de dias iria ficar isolada de Galomaro devido às chuvas. Para permanecer na tabanca, bastar-lhe-ia enviar uma mensagem para o Comando de Galomaro, com conhecimento ao Comando de Bafata a perguntar qual ordem cumpria, se a da coluna para o levar, se a que recebera do Coronel quando da sua visita à tabanca dizendo-lhe que o Alferes só sairia dali quando todos tivessem abrigos. Nesta altura dos acontecimentos os abrigos já não seriam suficientes e sobretudo seria necessário abrir valas entre abrigos.

Iria a mensagem, viria a resposta, entretanto a coluna tinha partido e o Alferes tinha ficado, sem contudo praticar qualquer desobediência. Na tropa as coisas podem assim acontecer.

O Alferes não tem coragem para tanto e resolve partir. Despede-se de todos os que ficam, especialmente do Dionildo com quem tinha estabelecido uma relação que ultrapassava o âmbito militar e se transformara numa verdadeira amizade pessoal.

O João Sanhá e alguns milícias prometem visitá-lo quando forem a Bafata.

O nosso Alferes sobe para uma viatura e a coluna põe-se em marcha. A consumação dum KA KONTRA. À frente, pela segunda vez nesta zona, segue uma equipa de picadores.

É então que o Furriel que ia ao lado do Alferes lhe pergunta se tinha gostado de estar na tabanca. O Alferes já possuído de uma profunda tristeza por ter deixado Madina Xaquili e o seu povo desata num choro convulso. Os seus olhos parecem dois chuveiros. O Furriel não compreendendo o porquê da situação fica mudo. Mais à frente o Alferes reage, limpa o rosto e reata a conversa com o furriel, mas não sobre Madina Xaquili.

Chegam a Galomaro e antes de ser levado a Bafata, o Alferes Magalhães ainda tem tempo de conversar com o Capitão, Comandante da Companhia, pondo-o a par dos acontecimentos da noite anterior.

Antes de subir para um Unimog para prosseguir viagem não deixa de perguntar, quer ao Capitão quer a elementos africanos, se não estariam aí a família do Chefe de Tabanca, fugida de Madina Xaquili, pois o Alferes sabia que a Asmau tinha aí um tio. A resposta foi negativa pelo que continuou viagem.

Chega a Bafata e ao Comando de Agrupamento. Põe a bagagem no seu antigo quarto e dá-se um grande NA KONTRA com todo o pessoal do quartel ávido de saber como as coisas tinham corrido lá na longínqua tabanca, incluindo o baptismo de fogo do Alferes. Faz a apresentação formal ao Comandante a quem relata os últimos acontecimentos em Madina Xaquili.

Já sozinho sente uma sensação muito estranha que nunca tinha tido: Esteve dois meses fora mas o que lhe parece é que já há anos não ia a Bafata. Só encontra uma explicação: A intensidade com que tinha vivido em Madina Xaquili. Horas, minutos, segundos tinham-se multiplicado por dias, meses, anos. Tinha visto a guerra de perto pela primeira vez. Tinha namorado. Tinha casado. Tinha-se divorciado. A morte do Samba não lhe saia da ideia. Tinha bem presente o convívio diário com aquela extraordinária gente, pura e sincera. Era pois uma sensação que nunca tinha sentido: Que o mundo tinha ficado para trás e que nada mais havia para fazer. Não via no trabalho insípido que novamente o esperava no quartel, algo que o fosse tirar da melancolia que agora o estava a possuir.

Como sempre acontecia em situações difíceis reage o melhor que pode. Fala com todos os camaradas contando a sua experiência na tabanca. Toma um banho de chuveiro que não deixou de achar estranho, pela “mordomia”. Vai almoçar, como anteriormente era habitual, com os Alferes do Esquadrão, ali ao lado, sentado numa cadeira, debaixo de um tecto e servido pelo inestimável Cabo Marques. Mais “mordomias”.

A seguir ao almoço, enquanto os outros Alferes vão dormir a sesta, o Alferes Magalhães vai rever Bafata. Passa a cumprimentar o Senhor Teófilo, dono do restaurante próximo e continua avenida abaixo, com o Sol a pique, mas não acusando o calor. Revê o café das libanesas e chega ao café-restaurante Transmontana onde toma um café, servido pelo Infali, homem triste mas sempre simpático, com quem o Alferes sempre conversa. Aliás numa das conversas referiu que, como “bom muçulmano” tinha quatro mulheres. O ar triste devia vir daí…

O Alferes Magalhães no café Transmontana, servido pelo Infali.

Tomado o café vai rever o Mercado. Ao lado na Piscina, debruçado na balaustrada sobre o rio Geba, revê os pescadores nas suas canoas.

Os pescadores do rio Geba.

O calor aperta e resolve tornar ao quartel. Não vai pela avenida principal, que a essa hora e a subir é penoso percorrê-la. Vai antes por um caminho totalmente arborizado e plano que conduz à mãe d’água de Bafata, zona muito aprazível onde até há mesas e bancos para piqueniques, local que é conhecido por Sintra de Bafata. Pelo caminho cruza-se com bandos de macacos-cão que estão sempre por ali à espera que se lhe dê qualquer coisa para comer. Da mãe d’água, onde também há um grande chafariz, até ao quartel só tem que subir um pequeno desnível, passando ao lado da casa do Comandante do Esquadrão. Não é raro neste local verem-se uns enormes “lagartos” com mais de um metro de comprimento mas perfeitamente inofensivos.

O Alferes Magalhães no caminho de Sintra de Bafata.

Chegado ao quartel vai deitar-se. O Comandante tinha-lhe atribuído três dias de descanso e portanto aproveita.

Fim deste episódio
Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 23 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7847: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (69): Na Kontra Ka Kontra: 33.º episódio

Guiné 63/74 - P7853: Agenda cultural (110): Apresentação do livro "A Última Missão", do Cor Moura Calheiros - 26 Fevereiro, Livraria Arquivo, Leiria


1. A Sra. Paula Carvalho da Livraria Arquivo, enviou-nos o seguinte convite em 23 de Fevereiro de 2011:

Apresentação do livro "A Última Missão", do Coronel Moura Calheiros, 26 de Fevereiro - sábado -, 18h30
Exmos. Senhores,
Junto enviamos a informação para a qual desde já agradecemos toda a divulgação que vos seja possível fazer.
Com os melhores cumprimentos,
Paula Carvalho

A Livraria Arquivo, em Leiria, tem o prazer de convidar V.ª Ex.ª para a apresentação do livro "A Última Missão", de José de Moura Calheiros.
A apresentação do livro estará a cargo de Jorge Martins.



26 de Fevereiro - sábado - 18h30

Veja aqui entrevista com o autor:

http://www.tvamadora.com/Video.aspx?videoid=1070


ACERCA DO AUTOR:

José Alberto de Moura Calheiros nasceu em 1936, na aldeia do Peso, Covilhã.

Frequentou o Curso de Infantaria da Escola do Exército (1954-1958).

Admitido nas Tropas Pára-Quedistas em 1959, aí passou toda a sua vida militar.

Cumpriu três comissões de serviço no Ultramar - Angola (1963-1965) e Moçambique (1967-1969) como comandante de Companhia de Pára-quedistas e Guiné (1071-1973) como 2.º Comandante e Oficial de Operações do BCP12, COp4 e COP5 e ainda como comandante do COP3.

Em Tancos, foi Comandante do Batalhão de Instrução, Comandante do Regimento de Caçadores Pára-quedistas e Comandante da Escola de Tropas Pára-quedistas.

Nos seu quatros últimos anos de actividade como militar (1977-1981) desempenhou funções de Chefe do Estado-Maior do Corpo de Tropas Pára-quedistas.

Passou à situação de Reserva em Fevereiro de 1981.

Licenciado em Finanças pelo ISCEF - Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, passou então a desempenhar funções de técnico economista no Ministério da Indústria, IPE - Instituto de participações do Estado e na direcção financeira de empresas.

Hoje está reformado e afastado de qualquer actividade profissional.

ACERCA DO LIVRO:

Em 1973 o autor, José Moura Calheiros, prestava serviço no Batalhão de Caçadores Pára-quedistas 21, de Bissalanca (Guiné).

Em 23 de Maio desse ano, numa operação por si comandada e tendo como missão atingir e reforçar a guarnição de Guidage, cercada pelo PAIGC, a Companhia de Caçadores Pára-quedistas 121 sofreu quatro mortos, dos quais três tiveram que ser inumados num cemitério localizado na cerca do aquartelamento daquela localidade.

Trinta e cinco anos depois, em Março de 2008, o autor regressa à Guiné integrado numa Missão da Liga dos Combatentes destinada a exumar, em Guidage, os cadáveres daqueles três militares pára-quedistas e de outros sete do Exército.

No livro o autor conta-nos toda a problemática relacionada com a expedição: os antecedentes, a preparação e o seu desenrolar, Simultaneamente descreve o ambiente da Guiné de hoje comparando-o com o do tempo da guerra; os usos, costumes e religiões da região de Farim e Guidage; o sentimento da população em relação ao antigo colonizador; as mágoas dos guineenses antigos militares portugueses por Portugal os ter enganado e abandonado; conversas com velhos guerrilheiros.

Ao longo da missão ocorrem situações que lhe fazem recordar o passado, o tempo da guerra. Nestes momentos de rebuscar das memórias “assistimos” à evolução da guerra, bem como à do pensamento do autor sobre ela. Pela ordem temporal das sucessivas comissões, ele descreve e caracteriza os três Teatros de Operações: a primeira comissão em Angola, a segunda comissão em Moçambique e a terceira comissão na Guiné.

Neste livro, o leitor pode identificar-se com a forma como actuavam os pára-quedistas, bem como conhecer os sentimentos de que eles eram possuídos antes, durante e depois dos combates. E também como actuavam e eram coordenados os seus apoios de combate: os Fiat´s, o PCA, os helicópteros de manobra ou sanitários, os heli-canhões, as lanchas de desembarque, a artilharia, todos eles indispensáveis ao seu sucesso e segurança.

Para além dos sentimentos dos militares durante as operações, o livro descreve-nos também os dos seus Comandantes em algumas das situações mais críticas, responsáveis como são pelo cumprimento das missões, mas também pela vida dos seus subordinados. Este livro é, em grande parte, sobre os sentimentos dos combatentes na guerra do Ultramar, de cada um individualmente e também colectivamente; dos soldados e também dos comandantes nas suas angústias, dúvidas e responsabilidades, enquanto chefes e homens.

Livraria Arquivo
Av. Combatentes da Grande Guerra, 53, 2400 -123 Leiria
Telf. 244 822 225 fax. 244 828 091
De segunda a sábado: 10h00-20h30

Domingos e feriados: 14h30-19h30
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Nota de M.R.:

Vd. o último poste desta série em:

15 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7790: Agenda cultural (109): Lançamento hoje, às 15h00, em Oeiras, o livro Kinda e outras histórias de uma guerra esquecida, de Carlos Acabado, colecção "Fim do Império"