segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16829: Facebook...ando (42): Almoço de Natal do Bando... Em Crestuma e apresentação do livro "MEMÓRIAS BOAS DA MINHA GUERRA" do Bandalho Zé Ferreira (Jorge Teixeira)



ALMOÇO DE NATAL DO BANDO... EM CRESTUMA

E APRESENTAÇÃO DO LIVRO "MEMÓRIAS BOAS DA MINHA GUERRA" DO BANDALHO ZÉ FERREIRA

Vai acontecer no próximo dia 17, sábado. em Crestuma o nosso "Almoço de Natal", precedido da apresentação do livro do Zé Ferreira. 

Era bom que os Bandalhos se apresentassem em número significativo a fim de provocar a bandalheira habitual nestas circunstâncias, não só em homenagem ao Zé, mas também... e porque é Natal dia de paz, amor e... bandalheira. 

Há um autocarro no Parque das Camélias que sai às 10:00 horas
Façam as vossas inscrições rapidamente porque o Zé quer saber quem vai, para matar a mesa e marcar o porco!... 

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Nota do editor

Esta é uma organização do Bando do Café Progresso, mais conhecido pelos Bandalhos, que tem como Bandalho Presidente o nosso camarada Jorge Teixeira. Deste Grupo fazem ainda parte, entre outros: José Ferreira, Jorge Portojo, António Tavares, Joaquim Carlos Peixoto, Eduardo Campos e José Manuel Cancela.

De salientar o espírito de amizade reinante neste grupo que vai levar a efeito o seu Almoço de Natal em Crestuma, aproveitando para ali apresentar o livro "Memórias Boas da Minha Guerra", e homenagear assim o autor, José Ferreira, na sua própria terra.

A apresentação do livro será às 11 horas da manhã, seguindo-se a operação "Leitão".
As inscrições estão abertas, tendo como limite a lotação da sala.


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real (Termas de Monte Real) > XI Encontro Nacional da Tabanca Grande > 16 de abril de 2016 > O bando mais famoso do Porto,  "O Bando do Café Progresso". Da esquerda para a direita: o (i) Jorge Teixeira, o chefe do bando; (ii)  o senhor escritor José Ferreira (também conhecido como o Zé Ferreira de Catió), o Jorge Teixeira (Portojo) e o David Guimarães, todos em primeiro plano. Atrás o Jorge Peixoto.

Foto: © Juvenal Amado (2016). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16606: Facebook...ando (41): No lançamento do livro "Memórias boas da minha guerra", do camarada José Ferreira da Silva, no passado dia 14, no quartel da Serra do Pilar (Francisco Baptista)

Guiné 63/74 - P16828: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (6): o destacamento de Mato Cão - Parte II


Foto nº 1 > Metralhadora Breda m/938, de calibre 12.7 [De origem italiana, foi adotada como metralhadora pesada padrão do Exército Português em 1938; usava carregadores ("lâminas") de 20 munições, em vez de  fita; tinha um alcance efetivo de 400 metros; no chão vê-se a "capa" que protegia a metralhadora, feita de fibra de amianto, um material comprovadamente cancerígeno...].



Foto nº 2 >  O precário  e tosco "abrigo" da Breda.... De resto, tudo aqui era tosco e precário: pro exemplo, não havia instalações sanitárias...



Foto nº 2 A > Junto ao arame farpado, os "tugas" jogam à bola... O destacamento não estava armadilhado à volta, assegura-nos o comandante.. Mas, ao fundo, à direita,  depois de amplaida a foto, parece-nos ver, reconhecer ou adivinhar uma tabuleta com triângulo vermelho e os conhecidos dizeres "Perigo Minas!"... (Devia tratar-se de um placa quialquer, humorística, uma brincadeira da rapaziada, diz-me o  Luís Mourato Oliveira, ao telefone)...



Foto nº 3 > O impacto de uma granada de morteiro do IN no capim, nas imediações do destacamento. (A partir de janeiro, o capim começava a abater e a secar, e tanto as NT como o IN procediam a queimadas...).


Foto nº 4 >  Marcas, numa árvores, de uma flagelação ao destacamento, com morteiro 82. [Não sabemos em que data: aqui o capim ainda está verde; sabe-se que em 9/1/1974, às 16h45, houve uma flagelação, de 5 minutos,  sem consequências. O Pel Caç Nat 52 respondeu com o morteiro 81. Em fevereiro de 1974, no dia 25, às 13h55 houve outra fllagelação, de 12 m, por um grupo de 20 elementos, usando 3 bases de fogos, também sem consequências. O 20º Pel Art, do Xime (obus 10.5) deu apoio ao destacamento, o GEMIL do Enxalé foi no encalce dos atacantes].



Foto nº 5 > O furriel mil Santos


Fotop nº  6 > Os cozinheiros improvisados


Foto nº 7 > O Unimog 411, o popular "burrinho"


Foto nº 8 > Uma aula de condução


Foto nº 9 > Um aspeto geral do destacamento, visto de norte para sul


Foto nº 10 > O destacamento visto do ângulo oposto (de sul para norte)


Foto nº 11 > Uma embarcação , ao serviço das NT, vinda de Bissau, a caminho de Bambadinca, carregada de munições, foi destruída pelo PAIGC num ataque, no Rio Geba Estreito, possivelmente já em data posterior a março de 1974, quando o BCAÇ 4616/73 rendeu o BART 3873, no setor L1. Em geral, e depois que foi cionstruído o destacamento do Mato Cão, os ataques às embarcações eram efetuados mais a montante, em São Belchior, entre o Mato Cão e Finete. (O Luís Mourato Oliveira diz que este ataque terá sido logo no início de 1974,. mas nós não encontrámos qualquer referência a esta ação do IN na história do BART 3873, que termina em março,,,

Na foto, vê-se, de perfil, à esquerda, inspecionando os restos do barco, o comandante do Pel Caç Nat 52. Esta foto não foi, portanto, tirada por ele, e apesar da sua má qualidade tem interesse documental.

Foto nº 12 > Um patrulhamento ofensivo na véspera do Natal de 73, antes de emboscada (1) (Não sabemos a que emboscada se refere o autor das fotos).


Foto nº 13 > Um patrulhamento ofensivo na véspera do Natal de 73, antes de emboscada (2). O  alf mil Luís Mourato Olievira está no meio do grupo de gorro castanho, na cabeça.O grupo não chega a etr 30 elementos, que era composição nornal de um Gr Comb.


Guiné >Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Mato Cão > Pel Caç Nat 52 (1973/74) > O nosso destacamento


Fotos (e legendas): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico
 do Luis Mourato Oliveira, nosso grãtabanqueiro, que foi alf mil da CCAÇ 4740 (Cufar, 1972/73) e do Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, 1973/74). (*)

O Luís Mourato Oliveira era de rendição individual... Veio de Cufar, no sul, região de Tombali, para o CIM de Bolama, por volta de julho de 1973, para fazer formação antes de ir comandanr o Pel Caç Nat 52, no setor L1, zona leste (Bambadinca), região de Bafatá. 

É aí que ele irá terminar a sua comissão e extinguir o pelotão, em agosto de 1974, mas já em Missirá, depois do Pel Caç Nat 63 (ou o 54 ?) substituir o Pel Caç Nat 52 no Mato Cão. Em julho de 1973, era ainda o Pel Caç Nat 54 que estava a guarnecer o destacamento de Mato Cão, de acordo com a história da unidade (BART 3873, Bambadinca, 1972774).

Eis algumas fotos do tempo em que o alf mil Luís Mourato Oliveira passou no destacamento de Mato Cão, cuja principal missão era proteger as embarcações que circulavam no Rio Geba Estreito, entre o Xime e Bambadinca. Além do morteiro 81, o destacamento possu+ia uma metralhadora pesada Breda, e tinha a cobertura de artilharia, o 20º Pel Art do Xime (obus 10.5).

Sobre o Mato Cão, que era um lugar mítico, temos cerca de 70 referências... Pertencia ao subsetor do Xime. Por lá passaram diversos camaradas nossos, membros da Tabanca Grande... O Oliveira não foi o último... Foi, sim, o último comandante do Pel Caç Nat 52.

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Guiné 63/74 - P16827: Notas de leitura (910): “Guiné-Bissau: Nação Africana Forjada na Luta", por Amílcar Cabral, Publicações Nova Aurora, 1974 (Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Outubro de 2015:

Queridos amigos,
Não é de mais realçar que ao longo de 1974, pós 25 de Abril, o pensamento de Cabral foi alvo de antologias em catadupa, vê-se claramente que era este o líder revolucionário que grupos oposicionistas e anticoloniais melhor conheciam, Cabral era a referência. Escapara-me esta edição das Publicações Nova Aurora que organizou um conjunto de textos onde eram obrigatórios o discurso de Havana, os primeiros diagnósticos que ele apresentou na arena internacional, incluindo a ONU, até se chegar à sua alocução conhecida pelo seu testamento político. É curioso como ao estudarmos hoje todos estes discursos, intervenções, conferências, textos improvisados e mensagens, ressalta em permanência a coesão entre o pensador e o homem de ação, com uma capacidade organizativa sem paralelo. Mas estudando todo este pensamento também avulta o que nele era frágil, a pouca convicção como ele impunha o conceito de unidade Guiné-Cabo Verde. E o que era muitíssimo forte, a aliança entre os combatentes guineenses e os quadros cabo-verdianos acabou no colapso, e quem perdeu foi a Guiné-Bissau, conforme está à vista de todos.

Um abraço do
Mário


Guiné-Bissau: nação africana forjada na luta, por Amílcar Cabral

Beja Santos

Julgava ter compendiado todas as edições surgidas depois do 25 de Abril acerca do pensamento de Cabral, não deixa de impressionar tudo quanto se publicou e como o seu pensamento não teve concorrência com qualquer outro líder revolucionário de qualquer outro movimento de libertação, só dele se aproximou, no escopo teórico, o angolano Mário de Andrade. Mas acabo de descobrir uma nova edição de textos de Cabral, desta feita nas Publicações Nova Aurora, seguramente uma editora que estava ligada aos maoistas.

Encontramos, como nas outras antologias, estratos com significado sobre a luta anticolonial, a análise de Cabral sobre a estrutura social da Guiné Portuguesa, o famoso discurso proferido em Havana e conhecido por “A Arma da Teoria”, que tanta celeuma provocou. Julgarão alguns que todo este pensamento já perdeu sentido. Enganam-se. Quanto se pretende estudar onde o pensamento de Cabral se foi arredando da ação dos seus seguidores, é indispensável voltar aos seus textos para entender como aquela força revolucionária se veio a acomodar e a distanciar das formulações teóricas e da capacidade organizativa de Cabral.

Veja-se, a título exemplificativo, o que ele respondeu à Revista Tricontinental, em 1969, quando foi questionado sobre o exercício da direção político-militar da luta:

“A direção político-militar da luta é única: é a direção política da luta. Nós, na nossa luta, evitamos criar o que quer que seja de militar. Somos políticos e o nosso Partido, que é uma organização política, dirige a luta no plano civil, político, administrativo, técnico e portanto militar. Os nossos combatentes definem-se como militantes armados. É o Bureau Político do Partido que dirige a luta armada e a vida, tanto nas regiões libertadas como nas que o não são, e onde temos os nossos militantes. Ao nível de cada frente existe um comando de frente. Ao nível de cada setor, existe um comando de setor e cada unidade do nosso exército regular tem também o seu comando”.

A que se deve esta citação? Cabral tinha a perfeita noção de que o seu movimento revolucionário só podia progredir com a estrita dependência dos militares face ao poder político. O seu sucessor, Luís Cabral, ainda manteve as Forças Armadas na estrita dependência do poder político. Com o golpe de 1980, os militares entraram de roldão na arena política e conseguiram subverter a natureza do PAIGC.

Todas estas antologias deixam ressaltar como era frágil o conceito da unidade Guiné-Cabo Verde. Ao longo da luta, Cabral foi-se apercebendo de que havia tensões em aprofundamento entre os militares guineenses e os quadros cabo-verdianos, séculos de desconfiança, de ressentimento e mesmo de ódio pelo facto do cabo-verdiano administrar, ter o pulso forte, ser tão assimilado como o branco, entre outros fatores, engendrara um sentimento de tácita rejeição, estavam os dois povos no mesmo barco, mas havia que mostrar a distância. 

O pretexto foi a Constituição de Cabo Verde, a elite guineense incitou os militares à separação. Conhecedor desta realidade, e a pretexto de que havia planos para ele ser liquidado, Cabral compôs uma peça que ele julgava suscetível de emparedar a sublevação do lado guineense. Sobre o alegado plano português, ele escreveu:

“O objetivo principal do inimigo é destruir o nosso partido. Ele está convencido de que a prisão ou a morte do principal dirigente significaria o fim do Partido e da nossa luta. O plano inimigo far-se-á em três fases:

Primeira fase:

Atualmente, muitos compatriotas abandonam Bissau e outros centros urbanos para se juntarem às nossas fileiras. Nesta ocasião, Spínola espera poder introduzir agentes (antigos ou novos membros do Partido) nas nossas fileiras. A sua tarefa: estudar as fraquezas do nosso Partido e tentar provocações apoiando-se no racismo, no tribalismo, opondo os muçulmanos aos não-muçulmanos, etc.

Segunda fase:

1. Criar uma rede clandestina;
2. Criar uma direção paralela;
3. Desacreditar o secretário-geral;
4. Preparar a nova “direção” para fazer dela o verdadeiro organismo dirigente do PAIGC;
5. Paralelamente, lançar uma grande ofensiva para aterrorizar as populações dos territórios libertados.

Terceira fase:

a. No caso de falhar a segunda fase, tentar um golpe contra a direção do Partido, fazendo assassinar o seu secretário-geral;
b. Formar uma nova direção baseada no racismo e opondo guineenses e cabo-verdianos;
c. Impedir a luta no interior do país, liquidar os que permanecem fiéis à linha do partido;
d. Entrar em contacto com o governo português. Falsa negociação, autonomia interna, criação de um governo-fantoche na Guiné-Bissau, que faria parte da comunidade portuguesa;
e. Postos importantes estão prometidos pelo General Spínola a todos os que executarem o plano.

Conclusão – devemos reforçar a nossa vigilância para desmascarar e eliminar os agentes do inimigo, para defender o Partido e encorajar a luta armada. Assim poderemos frustrar todos os planos criminosos dos colonialistas portugueses.

O inimigo tentou corromper os nossos homens, mas a esmagadora maioria dos responsáveis contactados não aceitou vender-se, comportaram-se como dignos militantes do nosso partido e contribuíram mesmo para castigar severamente os portugueses que tentavam comprá-los, como foi o caso dos quatro oficiais, próximos colaboradores de Spínola”.

Argumentação mais genérica nas acusações subtis e apelos à vigilância não era possível fazer. O plano não se passou assim, só por puro delírio se pode imaginar Momo Turé a arregimentar sublevados às centenas em Conacri e mesmo em território guineense, liquidado Cabral foram presos exclusivamente cabo-verdianos e ameaçados de morte.

A fórmula mágica da unidade Guiné-Cabo Verde foi indispensável para alcançar a vitória da libertação mas era a taça envenenada para o futuro, como aconteceu.
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de Dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16816: Notas de leitura (909): “Conhecimento do Inferno", por António Lobo Antunes, Editorial Vega - O Chão da Palavra, 1980 (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P16826: Parabéns a você (1174): Francisco Palma, ex-Soldado Condutor Auto da CCAV 2748 (Guiné, 1970/72) e Luís Dias, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 3491 (Guiné, 1971/74)


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Nota do editor

Último poste da série de 10 de Dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16819: Parabéns a você (1173): Fernando Barata, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2700 (Guiné, 1970/72)

domingo, 11 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16825: In Memoriam (272): dra. Clara Schwarz da Silva (1915-2016), mãe dos nossos amigos Henrique, João e Pepito (1949-2014), cofundadora e professora do Liceu Honório Barreto, em Bissau, decana da Tabanca Grande. Dia 14, 4ª feira, haverá uma pequena cerimónia de despedida, no crematório de Barcarena, Oeiras


Clara Schwarz da Silva (1915-2016) > Por volta dos. anos 40 do séc. XX > Pintura (pormenor) de Luciano Santos (com ateliê em Alcobaça). Clara Schwarz casara em 14 de outubro de 1940 com o advogado Artur Augusto Silva (1912-1983), natural da Brava, Cabo Verde. O casal foi viver em Alcobaça, e mais tarde,no final da década, em Bissau (até 1966). Em São Martinho do Porto, a Clara Scchwarz já tinha uma casa de praia, do tempo de solteira.

Morreu hoje, de manhã,  na véspera dos seus 102 anos, que iria perfazer em 14/2/2017. (*)


Cortesia de João Schwarz da Silva > Des gents intéressants > Artur Augusto da Silva



Guiné > s/d > "Durante a estadia na Guiné [, 1948-1966], Artur [Augusto Silva] viveu feliz tanto em Bissau onde trabalhava como em Varela onde ia em geral passar as férias do Natal".  [Foto da página do filho do casal, João Schwarz da Silva, que vive em Paris: Des Gens Interessants],

[Artur Augusto Silva, advogado, e Clara Schwarz da Silva, professora, pais do nosso saudoso amigo Pepito (1949-2014),  foram dois dos fundadores do Colégio Liceu de Bissau (mais tarde, Liceu Honório Barreto). Eram amigos de Amícal Cabral e de Maria Helena, casal com quem conviveram em Bissau, na primeira metade da década de 1950. Sobre Artur Augusto Silva temos duas dezenas e meia e meia de referências no blogue]

Foto (e legenda): © João Schwarz da Silva (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG, com a devida vénia]




Portugal > Lisboa > s/d > Anos 50 > Clara Schwarz com os filhos, da esquerda para a direita, João, Carlos (1949-2014)  (**) e Iko [Henrique] .

Foto: © João Schwarz da Silva (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] [com a devida vénia]



Alcobaça > São Martinho do Porto > 21 de Agosto de 2010 > "Casa do Cruzeiro", no Facho  > A nossa anfitriã, numa casa cheia de memórias, de que rapidamente nos apropriávamos, um dia por ano, nas férias de praia da família, passando a ser a Tabanca de São  Martinho do Porto.

Foto: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados


1. A notíca chegou-nos por mensagem da sua neta  Catarina Schwarz, de hoje, às 13h02 (A Catarina, membro da nossa Tabanca Grande, filha do Pepito e da Isabel Levy Ribeiro, foi mãe pela primeira vez há poucos meses: "a pequenita é a Lara que veio a tempo de dar alguns miminhos à bisavó"]

Olá,  Luís

Venho trazer uma triste notícia. A minha avó, mãe do meu pai, [Carlos Schwarz da Silva, 'Pepito', 1949-2014],  deixou-nos esta manhã.

Dia 14 de dezembro,  às 15h30,  faremos uma pequena cerimónia de despedida no crematório de Barcarena, Oeiras.

Beijinhos, Catarina Schwarz  [Página no Facebook, disponível aqui, com uma lindíssima foto de despedida da avó, de quem era muito próxima]


2. Comentário do nosso editor LG:

Catarina, as notícias tristes vêm "a cavalo" (como a doença, parafraseando um advérbio popular) e vão "a pé" (leia-se: as nossas reações, os nossos sentimentos de tristeza e de pesar, as manifestações do nosso luto quando se trata da notícia da morte de  alguém que amávamos)...

Clara Schwarz da Silva é nossa grã-tabanqueira desde 2010 e tem mais de 40 referências no nosso blogue... Entrou para a Tabanca Grande, mais precisamente, em, 14 de fevereiro de 2010, aos 95 anos. Passou então a ser a "Mulher Grande" da nossa Tabanca Grande, com o nº de entrada 397. Depois dela, ingressaram na nossa comunidade virtual  mais 334 amigos/as e camaradas da Guiné...  

Pepito, Guileje, 1/3/2008. Foto: LG
Durante estes anos todos  em que com ela tivemos o prazer de conviver de tempos a tempos, ela foi a nossa decana, e também a "mulher grande" da Tabanca de São Martinho do Porto (que se reunia todos os anos em agosto, quando o Pepito vinha de férias, de 2008 a 2012). Alguns de nós tiveram  o privilégio de a conhecer um pouco melhor  e de ter privado com ela e a sua família, na famosa "casa do Cruzeiro", em São Martinho do Porto, uma casa que o seu pai lhe comprara quando ainda solteira...

Foi sempre um mulher independente, inteligente, culta, frontal  e cosmopolita. Fez a licenciatura em letras na Universidade de Lisboa e estudou violino no conservatório nacional de música de Lisboa, Até tarde era muito autónoma, usando com desenvoltura o telefone, o skype, o mail, a internet, e visitando o nosso blogue…  Ainda conduzia aos 90 anos. Tinha uma memória prodigiosa,  era poliglota, e nutria  um grande orgulho das suas origens, da sua família, dos seus filhos e netos, do seu marido, e claro de seu pai, engenheiro de minas, de origem polaca e judaica,

É da mais elementar justiça invocar aqui o seu papel como cofundadora, juntamenete com o marido e outros, do Liceu Honório Barreto, hoje Liceu Nacional Kwame N' Krumah. Mais: foi professora de francês (e creio que também de português) de inúmeros guineenses, incluindo dirigentes do PAIGC...Era um gosto ouvi-la falar das qualidades e defeitos dos seus antigos alunos, muitos dos quais ela lembrava-se, de cor,  do seu nom...

Falava, sempre, com muita ternura do seu marido, Artur, como um homem que "conhecia e amava a África" como poucos...  A sua perda, em 1983, e depois a perda do seu filho mais novo, Pepito, em 2014, foram dois golpes bem duros para ela...Teve ainda a alegria de conhecer a sua bisneta mais nova, a filha da Catarina.

Tabanca de S. Martinho do Porto, 11/8/2012 >
Clara Schwarz com um CD dos Melech Mechaya,
ofertda do João Graça
 Porcasião dos 100 anos (que ela não quis festejar, por estar ainda a fazer o luto da morte recente do seu filho Carlos), escrevemos aqui que a nossa amiga e grã-tabanqueira Clara  não cabia  apenas numa vida, ela viveu e representou várias vidas, atravessando dois séculos e muitos lugares do mundo... Mais de metade da sua família, da Europa de leste, que ela  visitara,  na Polónia,  em 1938,  viria a desaparecer com a II Guerra Mundial..

A Clara Schwarz era, por todas as razões,  uma mãe coragem. E foi, seguramente para alguns de nós, seus amigos, um exemplo de vida, inspirador.   Era um daqueles seres humanos que honravam a humanidade, e cuja amizade era para nós uma honra e um motivo de orgulho... Apesar dos inevitáveis problemas de saúde que a idade lhe vinha trazendo,  sempre manifestou um grande interesse e carinho pelo nosso blogue. E gostava de falar com a gente mais nova...

Cá em casa, eu, a Alice, a Joana e o João sentimos a sua morte como a de alguém por quem tínhamos uma grande ternura e admiração, por ser quem era e não apenas por ser a mãe do Pepito.

Chega agora ao fim a sua caminhada pela dura "picada da vida"... Recordo-me de ela uma vez de me dizer ao telefone que "já não tinha idade para fazer anos" (sic)...Era uma pessoa com sentido de humor... Espero que tenha morrido em paz consigo, com os seus e com o seu passado, Fiz-lhe uns versinhos, por ocasião do 101º aniversário, que rezavam assim, a última quadra:

Nesta terra querida,
Tive mundo, e tive amor,
Não me posso queixar da vida,
Tive tudo, e também dor.


... Dor que hoje partilhamos, em nome de toda a Tabanca Grande,  com os seus filhos Henrique e João, e demais família, sem esquecer os filhos (Catarina, Ivan, Cristina), os  netos e a viúva, Isabel Levy Ribeiro,  do nosso querido Pepito (1949-2014).  Estamos todos mais pobres, a sua família, os seus amigos e  a nossa Tabanca Grande.

Mais fotos: Ver aqui Google > Imagens = "Tabanca de São Martinho do Porto"
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:



14 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15747: Manuscrito(s) (Luís Graça) (77): "Nesta terra querida, / Tive mundo, e tive amor, / Não me posso queixar da vida, / Tive tudo, e também dor"... Viva a nossa decana, a dona Clara Schwarz da Silva


(...) Fazer anos, que maçada,
Já não tenho, p’ra isso, idade,
Mas estou-vos muito obrigada,
P'los votos… de eternidade!

Decana, eu ? Ah, pois sou,
Com muita honra e prazer!
E ao blogue ainda vou,
Mesmo sem poder escrever.

Nesta terra querida,
Tive mundo, e tive amor,
Não me posso queixar da vida,
Tive tudo, e também dor. (...)



14 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14256: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (8): Mensagens da Tertúlia


(**) Vd. postes de:


18 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12738: In Memoriam (178): Carlos Schwarz da Silva (1949-2014)... Pepito ca mori! (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P16824: Agenda cultural (530): Colóquio "A Cidade, o Mosteiro, os Afetos" e Lançamento do livro "Arco de Memórias", de José Eduardo Oliveira (JERO), Luci Pais e Rui Rasquilho, dia 18 de Dezembro de 2016, pelas 16 horas, na Cooperativa Agrícola - Alcobaça (José Eduardo Oliveira)



Colóquio "A Cidade, o Mosteiro, os Afetos" e Lançamento do livro "Arco de Memórias", de José Eduardo Oliveira (JERO) - Contador de histórias; Luci Pais, Jornalista e Rui Rasquilho - Historiador

Dia 18 de Dezembro de 2016, pelas 16 horas

Sala da Debulhadora - Cooperativa Agrícola - Alcobaça
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16817: Agenda cultural (529): Integrado no 16.º Ciclo das Tertúlias Fim do Império, apresentação do livro "TEN.GENERAL ALÍPIO TOMÉ PINTO, O Capitão do quadrado", dia 13 de Dezembro de 2016, pelas 15 horas, na Livraria-Galeria Municipal Verney/Colecção Neves e Sousa, Oeiras (Manuel Barão da Cunha)

Guiné 63/74 - P16823: O início da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) - Parte III (José Teixeira)


Guiné > Região de Quínara > Carta de Tite > Escala 1/50  mil (1955) > Posição relativa de Tite, Enxudé e Jabadá... Dizem que foi aqui que a guerra começou...

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2016)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 2 de Março de 2008 > O Zé Teixeira, o Esquilo Sorridente, um homem solidário mas também bendito, entre as mulheres.. ..É nosso grã-tabanqueiro da primeira hora, tem mais de 300 referências no nosso blogue; foi 1.º cabo aux enf, CCAÇ 2381, "Os Maiorais", Buba, QueboMampatá e Empada, 1968/70; é um dos profundos conhecedores da Guiné-Bissau e das suas gentes.

Foto: © Luís Graça (2008). Todo os Direitos reservados.


O inicio da Guerra Colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam Mané (1945-2004) -Parte III (José Teixeira) (*)
 

1. Preâmbulo

Todos nós, os que passamos pela guerra, temos vindo com o tempo, a tentar passar aos vindouros as situações vivenciadas no ambiente agressivo da guerra. É o nosso ponto de vista. Com mais ou menos romantismo; com mais ou menos realismo, vamos escrevendo o que a nossa memória registou. E seguramente colocámos em "cacifos" diferentes as boas e as más recordações...

É comum ouvirmos camaradas nossos contar testemunhos de situações que vivemos em conjunto e encontrarmos diferenças, ou pormenores que desconhecíamos. Foram vividas em comum, mas analisadas por outro ponto de vista. Alguém com outra base académica ou cultural, ou até com outra visão politica e militar da situação. O local e angulo de onde se está a vivenciar o acontecimento, afeta a informação registada na memória.

Neste caso concreto, estamos a tomar conhecimento de um testemunho de alguém que vivenciou o ataque a Tite. Mais; alguém que coamdou esse ataque, um jovem então com 17/18 anos, Arafam Mané...Estando do  "outro lado da barricada",  o relato dos acontecimentos que viveu e a visão global do ataque são à partida diferentes (mas  respeitáveis). 

Foi um período de terror e contraterror. Mas são estes conjuntos de pontos de vista, diferentes entre si, dos acontecimentos que vão permitir escrever a História.

Estranhamente (ou não), ainda há pouca investigação de arquivo sobre este acontecimento tão marcante, o 23 de janeiro de 1963, que terá sido a "bola de neve" que levou ao desenvolvimento da luta armada e à escalada da guerra na Guiné.

Os nossos editores têm, entretanto, um documento completo do nosso falecido camarada Gabriel Moura sobre este período, enviado pela sua filha para publicação, a título póstumo. Desse texto, em pdf, já se publicaram, em tempos alguns postes, graças à preciosa colaboração do nosso camarada Carlos Silva, amigo e conterrâneo do Gabriel Moura...

Gabriel Moura, natural de Gondomar, foi mobilizado pelo Regimento de Infantaria nº 6, do Porto, para o Pelotão de Morteiros nº 19, tendo sido "o primeiro militar português, quando se encontrava de guarda ao aquartemanento, a responder ao fogo da força que atacou as instalações de Tite". Reagindo instintivamente ao fogo de que foi alvo, "consumiu todas as munições de que dispunha, provavelmente três carragadores, assim como utilizou as duas granadas que lhe estavam distribuídas para o serviço". (**)

O seu testemunho é uma "peça histórica". Estranha coincidência, faleceu em 2004, dois anos após ter editado o depoimento  sobre o acontecimento, e no mesmo ano da morte de Arafan Mané (**).

 
II. Sinopse da entrevista – Parte III

O entrevistado continua a falar do capitão Curto e da forma como este oficial do exército português
atuava com os nativos em busca de possíveis militantes do PAIGC infiltrados nas tabancas do Sul. « Na altura ele era o comandante da CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63), tinha oi posto de capitão e estava em vias de regressar à metrópole para frequentar o curso de oficiais superiores.

Segundo Arafam Mané, as relações entre as tropas portuguesas (que tentavam manter "a lei e a ordem") e as populações da região, eram caracterizadas por grande desconfiança e violência (prisões arbitrárias,  interragatórios,  etc.). Os presumíveis terroristas que escapavam à “chapa” eram conduzidos para a prisão do quartel em Tite, onde à data do ataque estaria um grupo numeroso de prisioneiros (uma centena, segundo o testemunho do Gabriel Moura), suspeitos de simpatias ou colaboração com o PAIGC.. Portanto, pode-se dizer que Tite, na altura, era um  verdadeiro "barril de pólvora",

Da parte do PAIGC, não havia ainda nenhuma estrutura militar  organizada, mas já havia uma forte consciência da necessidade de fazerem guerrilha para se oporem aos alegados abusos e arbitrariedades sobre a população indefesa.

É fácil concluir que o grupo atacante partiu do ponto zero, dispondo apenas de algumas armas e munições, sem apoio logístico, sem transportes ou enfermeiro. Eram animados apenas de uma grande vontade de mostrar que estavam dispostos a ir para a luta e fazer frente ao capitão Curto, o "tuga" mas temido na altura nas regiões de Quínara e de Tombali (e que até há uns anos atrás estava no "imaginário"  daquela guerra e das populações do sul).

Creio não exagerar ao afirmar que havia um certo "romantismo" por parte destes jovens, com pouca prepação e fraca escolaridade. A certo ponto da entrevista ao ser-lhe perguntado como conseguiram entrar dentro do quartel, Arafam Mané  diz:  “Foi num passeio normal, mas durante o qual evitamos fazer barulhos”.

Note-se nesta frase da entrevista a contradição com a informação da sentinela que estava de serviço no exterior do arame farpado, o falecido camarada Gabriel Moura, (vidé P 3294; P 3298 e P 3308 de 11/11/2008; 12/10/2008 e 13/10/2008 respetivamente).onde se se pode ler: 

(...)"Até que, bem ao fundo das primeiras palhotas de Tite, começaram a ladrar alguns cães… …À medida que os cães começavam mais a ladrar, em mais quantidade e mais perto donde estava, eu caminhava sem deixar, jamais, de olhar para trás na direção do mato [que nada via, pois eu é que estava a ser iluminado, logo é que era visto. …Eu nada via, e nada sabia! ... Seriam pescadores, bêbados de qualquer batuque ou manifestação nocturna?!" (...)

O próprio Arafam Mané, em 2001, com o posto de coronel das FARP,   também se contradiz ao afirmar na entrevista, quase 40 anos depois:

“Ia connosco um 'djidiu', [tocador] de cora (músico tradicional) para cantar, animar e elogiar os camaradas, enquanto combatiam no interior da unidade”. 

Só que o “djidiu” deu ás de “vila diogo” e o combate ficou sem música, que não fosse a das espingardas e os gritos de dor.

Em resumo; foi uma aventura mal calculada, à revelia de Amílcar Cabral e da cadeia de comando do PAIGC,  e que poderia ter redundado num verdadeiro massacre, no caso do jovem Arafam Mané e seus companheiros terem conseguido chegar às instalações onde estava uma centena de presos da população, a aguardar interrogatório, e que eram guardadas pelo Armando Silva, camarada do Gabriel Moura.

III. Entrevista com o coronel Arafam Mané - Parte III


Esta entrevista foi concedida em 2001 ao jornal “O Defensor”, órgão, de periodicidade mensal, das FARP - Forças Armadas Revolucionárias do Povo, Guiné-Bissau, no quadro da recolha de depoimentos dos Combatentes da Liberdade da Pátria sobre os acontecimentos históricos que marcaram a luta armada de libertação nacional, entrevista essa reproduzida no sítio das FARP, em novembro de 2015. 

Excertos transcritos com a devida vénia.(A entrevista completa pode ser lida aqui. no sítio das FARP, Guiné-Bissau.)

(Continuação) 

No texto anterior o entrevistado dizia, continuando a responder à pergunta "Mas porque decidiram atacar o quartel de Tite quando não tinham meios bélicos suficientes e adequados?"

A “chapa” era um emblema que se entregava secretamente aos militantes do partido na clandestinidade. Porque no seio da população daquela área, havia pessoas que estavam contra o PAIGC, algumas delas denunciavam junto dos tugas os compatriotas que tinham ligações com o partido e possuíam o emblema conhecido por “chapa”.
E continuava

Então para descobrir os militantes do partido naquela zona sul do país, o capitão Curto, em certos dias agrupava os habitantes de uma aldeia num local público, e a presença de todos era obrigatória. Quando os habitantes chegavam no local do encontro, eram imediatamente rodeados por militares coloniais armados que os ordenavam a ficarem de pé e com as mãos na cabeça. Depois o capitão Curto dizia: “o que poderá salvar-vos aqui é a entrega de “chapa” (emblema). Caso contrário, serão mortos por fuzilamento.” Pois de forma irónica ele dizia assim: “Chapa ou Fogo.”

Essa era a estratégia que sempre usava para descobrir os militantes do partido. Então, quem tivesse medo das ameaças e entregasse o emblema era imediatamente preso e torturado. E quem ousava resistir contra as ameaças era fuzilado publicamente no local.

Portanto, o retrato de todas estas práticas revela que as relações entre os "tugas" e as populações locais do sul eram relações de terror, marcadas por torturas, menosprezo, matança e humilhações. Com esse tipo de comportamento as populações viviam sempre amedrontadas.

Então, do meu ponto de vista, para tranquilizar os espíritos e manter a nossa confiança no seio das populações que sofriam por causa do partido, pensei que era de facto imperativo desencadear a operação contra o quartel de Tite. Com a realização da primeira acção as populações ganharam a confiança no partido e juntaram-se a nós.


O Defensor – Qual foi a impressão dos "tugas" 
sobre este ataque?

Coronel ADM - Foi uma grande surpresa para os "tugas". Eles não sabiam, nem podiam imaginar que nós tínhamos armas e que um dia os atacaríamos. Por outro, esse acontecimento foi uma coincidência histórica, com o que aconteceu em Angola e em Moçambique.

No que diz respeito as dificuldades encontradas antes da operação, elas eram de ordem logística, porque não tínhamos munições nem enfermeiro e nem transportes. Não tínhamos nada. Realizamos a operação graças a nossa coragem e patriotismo. 


Por outro lado, devido a falta de experiência, a operação foi feita sem que tivesse havido reconhecimento prévio do terreno. Somente uma mulher grande de Quínara que foi até o interior do quartel observar os movimentos dos militares coloniais.

O Defensor - Mas como é que conseguiram 
penetrar facilmente no interior do quartel?

Coronel ADM - Foi num passeio normal mas durante o qual evitamos fazer barulhos. Uma vez no interior das instalações coloniais, eu fui encostar-me no ângulo de uma das casernas, enquanto o camarada Quemo Mané foi emboscar-se em frente da porta da residência do Major [Pina], Comandante da unidade [, com o objetiovo de o assassinar].

A nossa missão podia ter maior sucesso se um dos nossos companheiros não tivesse falhado no cumprimento da ordem. Não obstante tudo, a operação planeada para esse dia não podia ser adiada, cust[ass]e o que custasse. 


Considero que o ato foi uma aventura que serviu de alerta para os "tugas"; porque queríamos que soubessem que voltá[va]mos com força para a zona. Foi uma guerra psicológica porque, na realidade, nós não tínhamos uma força palpável. Mas essa ação desorientou as tropas coloniais que a partir daquele momento receavam sair do quartel para fazer patrulhas.

Continua

[Introdução, seleção, notas, inckluindo parênteses retos, revisão e fixação de texto: Zé Teixeira]
_________________

Notas do editor:

(*) Vd. postes anteriores:

8 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16812: O inicio da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) - Parte II (José Teixeira)

3 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16794: O inicio da guerra colonial no CTIG, contada pelo outro lado: entrevista, de 2001, com o homem que liderou o ataque a Tite, Arafam 'N’djamba' Mané (1945-2004) - Parte I (José Teixeira)

(**) Vd. poste de 23 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10990: Efemérides (116): 50 anos anos da guerra colonial no CTIG ? 23 de janeiro de 1963, o fim do princípio ou o princípio do fim (José Martins / Carlos Silva)

Vd. também:

11 de outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3294: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte I) (Carlos Silva / Gabriel Moura )

Gabriel Moura: (,,,) "De facto, desde o primeiro minuto da minha vigia, senti, como se diz na gíria, 'um arrepio pelas costas abaixo', que me causou uma desagradável sensação e um pressentimento deveras esquisito, face ao aparentemente, e de acordo com o zero de informação de que os responsáveis davam às tropas, nada havia a recear!

Como de costume, naquela noite [de 22 +ara 23 de janeiro de 1963}, éramos três militares em vigia: eu, como referi, na frente do aquartelamento, percorrendo para baixo e para cima com as luzes a 'bater-me nas costas' e do lado do mato, negro como carvão. Outro colega, [ver excerto do Diário cedido por Armando Silva (...).] fazia a vigia na porta da prisão, [dentro do aquartelamento] onde estavam mais de cem pretos presos. Outro ainda, fazia a vigia do lado do Calino mas pela parte de dentro do arame farpado. Somente eu é que fazia a vigia pela parte de fora do arame farpado." (...) 


12 de outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3298: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte II) (Carlos Silva / Gabriel Moura)

Gabriel Moura: (...) "Nestes minutos de início, todas as reacções do interior do aquartelamento, perante os atacantes que conseguiram entrar no aquartelamento foi lento e há medida que cada um dos militares ia acordando e saltava da " tarimba " [cama], em cuecas, para ver o que se passava.

Uns pensavam que era mais um dos casos " banais " da tentativa de fuga de um preto da "cerca " [prisão do aquartelamento] e que o militar de guarda à prisão o tinha abatido ou disparado para o intimidar a não fugir. Estas situações faziam com que, sempre que se ouvissem tiros ou até rajadas, já ninguém se punha a pé para ver e normalmente, a exclamação era: "Filho da p... que me acordaste" - " mais um que não faz mal a ninguém..." ou expressões próximas, conforme a interpretação e o aborrecimento de cada.

Por estas e outras razões, a maior parte dos militares, quer soldados ou mais graduados, todos em geral [chateados com este baralho], lá vieram cá para fora das "casernas" ver o que se passava. Salvo os colegas da "casa da guarda", talvez imbuídos pelo "subconsciente" do dever a cumprir, pois estavam de serviço e guarda, tendo as metralhadoras à mão, o instinto os impeliu para lançar mão da arma e, com ela, vir cá para fora, mais rapidamente se apercebendo do que se passava." (...)


13 de outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3308: O ataque a Tite, em 23 de Janeiro de 1963 (Parte III) (Carlos Silva / Gabriel Moura)

Gabriel Moura: (...) "[Nas horas a seguir], eram apanhados às dezenas, escondidos no capim ou na palhota. Foi uma caça que se prolongou até de manhã, onde o nascer do dia permitiu seguir rastos de sangue e localizar os atacantes feridos e outros que foram capturados e levados para a prisão de Tite, que 'encheu até ao tecto', só aos poucos foram "despachados" para Bissau e outros destinos, ilha das Galinhas [era o que constava lá por Tite], no Arquipélago de Bijagós ou, quem sabe, nem lá chegaram! [é a vida! quando há guerra!!!]

Foi uma desorganização que 'organizou'0 o maior e mais eficaz 'contra-ataque' jamais pensado e daí ter-se conseguido dar uma 'reviravolta à situação inicial'  [que se não fosse eu ter aguentado os atacantes durante aquele tempo todo, não permitindo a concretização dos seus intentos, até à reacção destempada de alguns meus colegas, nada disto era possível. Teríamos sido, na maior parte mortos ou capturados com a maior das facilidades do mundo. Disto não tenham dúvida, e podem 'puxar' por qualquer fio da meada que irá dar ao mesmo... sorte ou intervenção divina? medo? coragem? heroísmo? penso eu que!...].

Durante toda a manhã, a confusão foi grande, onde o Major Pina, nas suas funções de Comandante, começava a amealhar os 'louros', pois era esta a sua grande preocupação, preparar terreno para justificar e arranjar todo o conjunto de situações que lhe dessem dividendos [a ele e a seus pares: capitão Barreiros, capitão Morgado, alguns tenentes, alferes e sargentos, furriéis e alguns "pinga amores", soldados, que na ajuda a 'vestir as calças dos superiores' - que estavam muito transtornados, iriam receber também algumas benesses]." (...)

Guiné 63/74 - P16822: Blogpoesia (484): "Travo seco e amargo..."; "Chamam pelo sol..." e "Como embondeiros...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. O nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) vai-nos enviando ao longo da semana belíssimos poemas da sua autoria, dos quais publicamos estes, ao acaso, com prazer:


Travo seco e amargo…

Vem do fundo.
Cortante.
Abrasivo.
Não há suco.
Favo ou mel
Que o adoce.
Pior que fel.

Não tem cor.
Se tivesse, só breu
O pintaria.

Borbota. Faz espuma.
Tem escamas duras.
Quartezianas.

Suplício.
Só um sol em brasa o queima
E, de novo, purifica…

Berlim, 10 de Dezembro de 2016
10h6m
Jlmg

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Clamam pelo sol...

Clamam pelo sol,
desfraldadas ao vento,
as bandeiras molhadas
que convidam paragem.

Um luminoso café,
cheio de gente,
acolhe quem chega,
se come e se bebe
do bom e melhor.

Não falta a alegria
de gente madura.
Reina a fartura,
por fora e por dentro.

O espírito se espraia,
esquecendo negrumes.
O corpo descansa sentado,
esperando as ordens do dono.

Lá fora,
não importa que chova
ou que neve
e o tempo não conta,
mesmo que as bandeiras
clamem por sol...

Bar dos motocas, arredores de Berlim,
11 de Dezembro de 2016
11h2m
JLMG

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Como embondeiros…

Fiquem de pé, estáticos,
Braços abertos,
Pedestais sem estátua.
Raízes cravadas.
Latadas de sombra,
Como embondeiros.

Dispam-lhe as folhas,
Queimem-lhe as vestes,
Fiquem os ramos,
Carregados de ninhos
E as nervuras do tronco.

Resistem a tudo.
Sejam valentes.

Se finjam eternos.

Arrostem tisnados
Ameaças e brados.
O calor e tornados.

Nunca desanimem.
Sejam ferozes.
Os princípios estão certos.
Resistiram aos séculos.

Ergueram castelos.
Pirâmides,
Muralhas da China.

A Terra voando,
Pode tremer.

Embondeiro não cai!...

Berlim, 7 de Dezembro de 2016
16h17m
____________

Nota do editor

Último poste da série de 4 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16798: Blogpoesia (483): "Aldeias da serra..."; "Lânguidos e plangentes..." e "Não consigo devassar...", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Guiné 63/74 - P16797: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-al mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (4): A nosso Natal de 1973, onde não faltou nada, a não ser o cartão de boas festas dos nossos vizinhos de Madina / Belel


Foto nº 1 > Vista do destacamento do Mato Cão para o Rio Geba Estreito e a bolanha de Nhabijões


Foto nº 2 >  A gestão (complexa) de um destacamento, isolado da civilização


Foto nº 3 > Natal de 1973: João Santos e o cmdt Luís Mourato Oliveira: "Hoje há leitão ! Roubado ao turra ? Não, criado na nossa horta"


Foto nº 4 > Natal de 1973 > A farta garrafeira...


Foto nº 5 A > Natal de 1973: em primeiro plano, o cmdt do destacamento, alf mil Luís Mourato Oliveira e o fur mil João Santos


Foto nº 5 > Natal de 1973: o alegre convivío dos "tugas" do Mato Cão, eram poucos, contavam,-se pelos dedos




Foto nº 6 > Natal de 1973: apesar de muçulmanos, os nossos soldados também se associaram à festa cristã...do comes & bebes...



Foto nº 7 > Natal de 1973 > A doçaria... Não faltou nada, a não ser o cartão de  boas festas e feliz ano novo dos nossos vizinhos de Madina / Belel


Guiné >Zona leste > Setor L1 (Bambadinca)  > Mato Cão > Pel Caç Nast 52  (1973/74) > Natal de 1973


Fotos (e legendas): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Luis Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro, que foi alf mil da CCAÇ 4740 (Cufar, 1972/73) e do Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, 1973/74). (*)


De rendição individual, o Luís Oliveira veio de Cufar, para o CIM de Bolama, por volta de julho de 1973, antes de ir comandanr o Pel Caç Nat 52, no setor L1, zona leste (Bambadinca). É aí que ele irá terminar a sua comissão e extinguir o pelotão.

Entretanto, fez férias em novembro/dezembro de 1973, e regressou ainda tempo de passar o Natal com os seus homens. no destacamento do Mato Cão, na margem direita do Rio Geba Estreito, no   regulado do Cuor.  Lembra-se de ter trazido de Lisboa, com muito carinho, o famosao pão de ló de Miragaia, feito pelo mãezinha, natural da Marteleira, Lourinhã.

Eis algumas fotos desse tempo... heróico e festivo, que eram os nossos Natais passados no mato...

 _________________

Nota do editor:

Guiné 63/74 - P16821:(De)Caras (58): António Duarte Silva apresentou, no passado dia 6, em Lisboa, o novo livro de Mário Beja Santos, "História(s) da Guiné-Bissau"


Vídeo 3' 22''. Alojado em You Tube > Luís Graça


Lisboa, auditório da Associação Nacional das Farmácias, 6 de dezembro de 2016, sssão de lançamento, do novo livro de Mário Beja Santos, "História(s) da Guiné-Bissau" (Edições Húmus, Vila Nova de Famalicão, 2015, 380 pp.)... Vídeo de Luís Graça

Apresentação a cargo de António Duarte Silva [, autor de “Invenção e Construção da Guiné-Bissau” (Edições Almedina, 2010)].  O  outro apresentador foi o antropólogo, professor e investigador do ISCTE-IUL, Eduardo Costa Dias (por deficiência no som do auditório, não apresentamos aqui nenhum excerto da sua intervenção; o ficheiro que temos é inaudível).



Vídeo  0' 35''. Alojado em You Tube > Luís Graça


Lisboa, auditório da Associação Nacional das Farmácias, 6 de dezembro de 2016, sssão de lançamento, do novo livro de Mário Beja Santos, "História(s) da Guiné-Bissau" (Edições Húmus, Vila Nova de Famalicão, 2016)... Vídeo de Luís Graça (2016)

Palavras finais de agradecimento por parte do autror.


Ficha técnica:

História(s) da Guiné Portuguesa, de Mário Beja Santos
ISBN: 9789897551796 
Edição: novembro de 2015
Editor: Editora Húmus
Idioma: Português
Dimensões: 161 x 226 x 20 mm
Encadernação: Capa mole
Páginas: 380
Tipo de Produto: Livro
Coleção: Varia

Classificação Temática: Livros em Português > História > História da África


Sinopse:


Ainda hoje não se sabe a origem da palavra Guiné. E quando se aportou na região, usaram-se as designações mais díspares: Guiné do Cabo Verde, Etiópia Menor, Senegâmbia Portuguesa, Terra dos Negros, Rios da Guiné de Cabo Verde… Presença espúria em praças, feitorias e presídios, ao longo dos séculos. Território apetecível para o tráfico negreiro, palco de alguns dos textos mais luminosos da nossa literatura de viagens. Com muito mistério e exotismo à mistura: o Império do Gana, o Império do Mali, o Mandemansa, o Kaabunké, Tombuctu, os judeus portugueses na Senegâmbia, os mercadores e navegadores cabo-verdianos, a babel negra, as companhias majestáticas. A Convenção Luso-Francesa de 1886 faz surgir as fronteiras da atual Guiné, é já o que resta da Grande Senegâmbia. Vive-se o tempo das campanhas de pacificação que se irão prolongar até 1936, custarão rios de sangue. 

No fim da II Guerra Mundial, um distinto oficial da Marinha, Sarmento Rodrigues, põe a Guiné no mapa, torna-a uma colónia modelo. E vem o nacionalismo. Um guineense com sangue cabo-verdiano, Amílcar Lopes Cabral, chega à colónia em fins de 1952, encontra ali a motivação para a luta que conduzirá a uma guerra de imensa ferocidade, a partir de 1963 e que culminará com a independência de facto em 1974. Foi na Guiné que medraram os anseios do 25 de Abril, a Guiné marca o princípio da descolonização. Aqui ficam algumas histórias sobre esta presença tumultuosa. Era uma vez…


[Fonte: Wook] (Com a devida vénia...)
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