Aconteceu: ouvíamos Beethoven - a quinta (por acaso?!); eram cerca das oito da noite. Preparava-me para sair com o meu grupo de combate; ao longe, o batuque de festa: seria casamento, seria chur, seria certamente uma festa. Batuque e Beethoven...Contraste? Só quem não estivesse (e esteja) com atenção às coisas... os homens exprimem as suas emoções de forma semelhante, com intensidade, com carinho, com receio, com esperança!Ali, no Olossato, Beethovem e Batuque. Que emoções!
Agora, em 2006, quase trinta seis anos depois, ouço a moda: Mozart, e, ali ao lado, bem perto, um batuque no bairro de Belém, onde fica a Universidade de Amílcar Cabral (UAC). Podeis acreditar: naquela noite saí para o mato, e naquela noite de breu (nem sei como resistíamos) ribombou o tiroteio...
Hoje estou aqui: ouvindo Mozart, enquanto a Maria da Conceição lê a Mistida, de Abdulai Silá, entusiasmada - e eu metido comigo mesmo a repensar o passado, a ver os meus companheiros (tão jovens!) em fila indiana, cheios de medo como eu... que raio de coisa esta, eu para aqui a falar enquanto o Mozart me traz calma... e eu aqui ao computador escrevinhando que bom seria rever os meus companheiros sãos - eles que acreditavam em mim (acreditariam, verdadeiramente?!).
Que raiva, Mozart! Que tristeza me invade. Leva-me nos braços. Deixa-me esquecer.
Paulo Salgado
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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