quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Guiné 63/74 - P2192: O último morto da guerra do ultramar: onde e quando? Guiné, Angola ou Moçambique? (Nuno Mira Vaz)


Angola > 1961 > Desfile de tropas > O António Rosinha, furriel miliciano, aparece aqui em primeiro plano, assinalado com um X (1)... Repare-se no tipo de armamento das NT: pistola-metralhadora FBP, para os graduados; espingarda Mauser, para as praças...Farda: caqui amarelo... Capacete de aço...

A avaliar pelas revelações do 1º episódio da série A Guerra, argumento e realização de Joaquim Furtado, que começou a ser apresentado na RTP 1, no passado dia 16, as NT estavam muito mal preparadas para fazer face à revolta da UPA no Norte de Angola, iniciada em 15 de Março de 1961, com o massacre dos brancos e dos seus aliados negros, nas fazendas de café, postos administrativos e lojas de comércio em povoações mais isoladas. O melhor: segundo a peça televisa do Joaquim Furtado, tudo indica que, devido ao seu autismo, arrogância e incompetência, as autoridades portuguesas, tanto em Lisboa como em Angola, terão sido completamente apanhadas de surpresa pelos acontecimentos em 15 de Março de 1961. Os colonos brancos e os seus serviçais tiveram que se organizar em auto-defesa... e o governador de então é incitado a comprar armas no estrangeiro... Havia então 1500 homens, em armas, de origem metropolitana, e uns escassos milhares, do recrutamento local, para fazer frente aos rebeldes de Holden Roberto, inicialmente apenas armaos de catanas e canhangulos...

O primeiro morto militar português, oriundo da metrópole, na guerra do ultramar, terá sido um pára-quedista, em Abril de 1961, no norte de Angola... E o último morto ? Foi já depois do 25 de Abril de 1974, na Guiné, em Angola ou em Moçambique. Enfim, não é uma questão bizantina, tem um grande carga simbólica... Talvez alguém mais tenha estudado esta questão na nossa Tabanca Grande... (LG)

Foto: © António Rosinha (2006). Direitos reservados


Capa do livro de Nuno Mira Vaz >
Guiné, 1968 e 1973. Soldados uma vez, sempre soldados!
Lisboa: Tribuna da História, 2003.
96 pp.

Foto: Livraria do Guarda-Mor (com a devida vénia...)

1. Mensagem de ontem, 17 de Outubro, enviada pelo coronel pára-quedista e escritor Nuno Mira Vaz (2):

Meu caro Luís Graça:

Sou leitor assíduo do blogue que criou e permita-me que o felicite pela obra entretanto realizada (1). Contacto-o porque uma sua afirmação de hoje está muito longe da realidade (2) . De facto, não foi em Canquelifá, em Abril de 74, que morreram os últimos combatentes dos dois lados. Só para lhe dar um exemplo (porque há muitos mais), foi morto pelos guerrilheiros da Frelimo no dia 4 de Agosto de 1974, na região de Inhamiga (Moçambique) o Major Pára-quedista e meu amigo do peito Manuel Lopes Morais.

Creia que me move apenas a vontade de honrar um blogue que muito prezo, ao qual desejo, bem como ao seu criador e actuais co-responsáveis, as maiores venturas.

O camarada de armas
Nuno Mira Vaz


2. Resposta do editor L.G.:

Caro Nuno: Muito obrigado. É, de facto, um erro factual... Fui induzido em erro pelo trabalho de Joaquim Furtado, que começou a ser divulgado na RTP... Lamento a morte do nosso camarada e seu amigo Manuel Lopes Morais, já tão tardiamente, em Moçambique...

Vou publicar o seu comentário, se mo permite, a bem da verdade e da honra... E já agora sentir-me-ei honrado se você quiser escrever no nosso espaço... O blogue é também seu.

Cordiais saudações.
Luís Graça

3. Resposta do Mira Vaz:

Caro Luís:

Agradeço o amável convite, mas declaro-me impreparado para dar tal passo. Podíamos discorrer a respeito da formatação a que os militares da minha geração foram submetidos, mas o resultado seria sempre o mesmo - ao menos por enquanto. Quem sabe, um dia ...

Cumprimento-o com simpatia e admiração pela obra realizada.

O camarada de armas
Nuno Mira vaz

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Notas de L.G.:

(1) vd. post de 29 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1327: Blogoterapia (7): Furriel Miliciano em Angola, em 1961; topógrafo da TECNIL, em Bissau, em 1979 (António Rosinha)

(2) Vd. post de 16 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2182: Blogoterapia (35): Programa da RTP1, Prós e Contras: Éramos todos bons rapazes (David Guimarães)

(...) Comentário de L.G.:

É miserável que o jornalismo de investigação e de arquivo sobre a guerra do ultramar, guerra colonial ou guerra de libertação (ao gosto do freguês) só chegue à televisão pública 46 anos depois do 15 de Março de 1961 (no norte de Angola) e 33 anos depois dos últimos mortos e feridos em combate, de um lado e de outro, em 27 de Abril de 1974, na zona de Canquelifá (Zona Leste, Guiné)...


________

Notas de L. G.:


(1) Vd. post de 10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1581: O elogio dos pára-quedistas das 121ª e 122ª CCP (Nuno Mira Vaz / Vitor Junqueira)

(2) Nota biográfica:

Nuno Mira Vaz >

(i) Coronel de Cavalaria na reserva;

(ii) Mestre em Estratégia e Doutor em Ciências Sociais na área das Relações Internacionais pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa;

(iii) Fez toda a vida militar nas Tropas Pára-quedistas, tendo cumprido quatro comissões de serviço em África entre 1961 e 1974;

(iv) Entre 1986 e 1989 foi 2º Comandante do Corpo de Tropas Pára-quedistas;

(v) Colocado como assessor no Instituto de Defesa Nacional em 1989, foi responsável editorial da revista Nação e Defesa entre 1997 e 2000 e desempenha funções de coordenador da Área de Relações Internacionais, Estratégia e Geoestratégia desde 1994;

(vi) Professor de Sociologia Militar na Academia Militar desde 1997;

(vii) Autor de diversos livros e colaborador assíduo de publicações que se ocupam de matérias relacionadas com segurança e defesa.

Fonte: Instituto de Defesa Nacional > Divulgação > Publicações > Colecção Atena > Autores(com a devida vénia...)

4 comentários:

Anónimo disse...

... que à pergunta acima formulada, decerto não radicada em mero exercício académico, o frenesim cosmopolita não consente espaço/tempo para analisar e depurar quotidianamente eventuais respostas vindas à NET. Mesmo assim, aqui vai uma série de esclarecimentos possíveis ao repto lançado neste
«P2192: O último morto da guerra do ultramar: onde e quando? Guiné, Angola ou Moçambique? [...] O primeiro morto militar português, oriundo da metrópole, na guerra do ultramar, terá sido um pára-quedista, em Abril de 1961, no norte de Angola... E o último morto ? Foi já depois do 25 de Abril de 1974, na Guiné, em Angola ou em Moçambique. Enfim, não é uma questão bizantina, tem um grande carga simbólica... Talvez alguém mais tenha estudado esta questão na nossa Tabanca Grande...»; (Luís Graça 18-10-2007 19:20)

(Sábado, 20 de Outubro de 2007 - 23:22:44)
1. À questão de, quem foi «o primeiro morto militar português, oriundo da metrópole, na guerra do ultramar», sabe-se – desde há mais de 3 décadas e por informações
várias de domínio público –, que não foi 1, mas os seguintes 2 – mobilizados pelo RI10-Aveiro e integrados na 4ª Companhia de Caçadores Especiais (depois renomeada CCac63), desembarcados do cargueiro "Timor" no porto de Luanda em 02Set60, sob comando do capitão de infantaria Luís Artur Carvalho Teixeira de Morais. Na
madrugada de 04Fev61 aquela 4ªCCE marchou de comboio rumo a Malanje e a meio da manhã de 06Fev61, quando na Baixa do Cassanje procedia a um patrulhamento na
área de Montalegre (Cunda-Riabaza), ao aproximar-se da teca Riaquida foi alvo de emboscada que causou as primeiras baixas militares em combate, na África Portuguesa, desde o termo da Grande Guerra: os 1ºCabos JOÃO MARIA DE ALMEIDA FIGUEIREDO e MANUEL BAPTISTA DA COSTA.

2. Independemente da origem do respectivo recrutamento, o primeiro militar morto em combate, no continente africano após o termo da Grande Guerra, foi de facto: o 1ºCabo de Infantaria JOAQUIM DE OLIVEIRA E SILVA, em serviço na Fortazela de São Francisco do Penedo (subúrbio litoral noroeste de Luanda), morto no seu posto de sentinela, cerca das 04:00 de 04Fev61.

3. Antes de ter morrido «um pára-quedista», já 19 militares haviam «tombado em combate» no noroeste de Angola, nomeadamente os seguintes: em 16Mar61, o Soldado RAUL DA SILVA COELHO; em 02Abr61. o Capitão de Infantaria ABÍLIO EURICO CASTELO DA SILVA, o Tenente de Infantaria JOFRE FERREIRA DOS PRAZERES, e os
Soldados ANÍBAL GONÇALVES ALMEIDA e MANUEL SERAFIM LAVADO; em 03Abr61, o 2ºSargento de Infantaria FRANCISCO JOSÉ RIBEIRO, os 1ºs Cabos FRANCISCO AGOSTINHO LUÍS e JOSÉ MARTINS SILVESTRE, e os Soldados ANTÓNIO JOSÉ CEREJO e MANUEL SANTOS MOREIRA; no mesmo dia 03Abr61 (mas em outro local), os 1ºs Cabos JOAQUIM LOURENÇO SOEIRO CARRAJOLA e MANUEL LUÍS FARIA GEADA; em 06Abr61, o Furriel Miliciano MANUEL FRANCISCO MARTINS e os Soldados ANTÓNIO CÂNDIDO MARTINS DE JESUS e ANTÓNIO DE JESUS PINTO FERREIRA; em 16Abr61, o Soldado Milícia MANUEL OCHOA; e em 20Abr61, os Soldados CAVANTE CHANDE, DOMINGOS ADÃO e ISAAC CHIVERA.

4. No que às tropas pára-quedistas especificamente diz respeito, as primeiras baixas ocorreram cerca das 15:00 de 24Abr61: o Soldado PQ JOAQUIM AFONSO DOMINGUES teve morte imediata e o Soldado PQ ANTÓNIO MANUEL DA COSTA morreu no mesmo local pouco depois; (também dois civis morreram e outros dois
militares ficaram feridos).

5. A memória selectiva de cada qual – seja veterano de guerra, seja familiar de alguém que morreu na guerra (em qualquer guerra) –, naturalmente inclina ao particular
interesse em "fixar-se" no TO onde o respectivo dever de militar foi cumprido, e bem assim na Arma e/ou Especialidade que – "em sorte" (ou por voluntariado) – serviu.
Posto isto, inúmeros critérios podem apresentar-se-nos, não apenas no que respeita ao "primeiro morto" (em combate, ou por qualquer outro motivo), como também ao "último morto": quando, quem... Tudo isto, e muito mais, se sabe – e pertence ao domínio público –, há mais de 3 décadas. Na recente "mostra" televisiva – em «9 episódios», aparente resultado de "jornalismo de investigação" –, também tudo isto é tratado "en passant". Mas, enfim...

– Quanto a Angola: acima fica à consideração, dos visitantes deste weblog, breve resumo de datas e nomes do(s) primeiro(s); já quanto ao «último» militar oriundo do
recrutamento metropolitano morto «em combate» no continente africano, foi 1 (e também em Angola): ANTÓNIO JOAQUIM FERNANDES LOPES, morreu em 04Set75. Mas as últimas mortes registadas naquele TO, referem-se aos Soldados ANTÓNIO CARDOSO FERREIRA e JANUÁRIO AUGUSTO FARIA RIBEIRO, em 18Out75 (em consequência de acidente).

– Quanto a Moçambique: em 12Mar61, o Marinheiro DIOGO ALBERTO CARDOSO (em consequência de "acidente); em 02Out64, o 2ºCabo JOSÉ ANTÓNIO MACAMO, 1ª baixa mortal "em combate" registada naquele TO; e em 30Set74 os 1ºCabos MANUEL ANTÓNIO SOARES FRANCO e MÁRIO CORDEIRO NUNES, e os Soldados DINIS MANUEL DE MELO TEVES, GILBERTO FERREIRA OLIVEIRA, JOÃO LEAL DA SILVEIRA, JOSÉ INÁCIO MENESES e SEBASTIÃO PAMPLONA DAS NEVES, todos os seus óbitos registados como "morte em combate". (Também a a título de "exemplo", o último pára-quedista morto "em combate" no TO-Moçambique, infelizmente não foi o
comandante dos GEP's Major PQ MANUEL ANTÓNIO CASMARRINHO LOPES MORAIS em 04Ago74, foram o 1ºCabo PQ ORLANDO JOSÉ CARVALHO LUDOVINO e o Soldado PQ JAIME BARBOSA SOARES em 21Ago74).

– Quanto à Guiné (aqui fora da cronologia geral... porque este weblog «foranada» é dedicado a "assuntos da Guiné"): em 29Mai62, o Tenente Pilav JOSÉ CABAÇO NEVES e o Furriel Pil MANUEL SOARES DE MATOS; e em 28Set74, o Capitão do Serviço de Material VICTOR MANUEL MENDES FERREIRA, (sendo que em 20Mai74 se
registaram naquele TO-Guiné as últimas mortes, em consequência de "combate" – ocorrido 5 dias antes e no qual resultaram imediatos 2 mortos, 14 feridos ligeiros e 4 feridos graves –, vindo naquela referida data a falecer o Alferes Miliciano LUÍS GABRIEL DO REGO AGUIAR e o 1ºCabo ESMERALDINO ANTÓNIO ESPANHOL CATAMBAS).

Nesta breve resenha ficam deliberadamente omitidas a naturalidade dos militares citados, bem como as unidades onde estavam colocados quando morreram, e bem assim os locais das ocorrências e outros pormenores.

Que as suas almas, e de TODOS os demais camaradas-de-armas «Mortos ao Serviço da Pátria», Descansem em Paz!

Anónimo disse...

Somos a familia do Soldado Antonio Joaquim Fernandes Lopes, combatente na guerra de ultramar, em Angola, falecido a 4 Set 1975, aqui referido como o ultimo soldado morto na guerra de Ultramar. Gostariamos de entrar em contacto com alguem que o conheceu, camaradas, amigos, etc. Deixo aqui o meu email mizlilith@msn.com

AJPM disse...

Como contributo refiro que em Angola no meu Batalhão o ultimo militar que faleceu, devido a acidente, foi: ALFREDO JOSÉ RODRIGUES COSTA da 3ª Companhia/B.Caç5010/74 em 12-09-1975. (Meus Cumprimentos - António Mourato - ex-alferes do BC5010/74)

caç4742/72 disse...

Na nossa C.Caç a única vítima mortal devido à deflagração de uma mina anti-carro ocorreu no dia 15 de Outubro de 1974 na picada Lufico - M'Pála. Curiosamente no mesmo dia em que cessaram oficialmente as hostilidades em Angola. Parabéns pelo excelente blog.
https://companhiacacadores474272.blogspot.pt/