Capa da revista Domingo, suplemento do Correio da Manhã, edição nº 10 782, de 7 de Dezembro de 2008. Tema: Derrota à vista na Guiné. Reportagem do jornalista José Carlos Marques, o único jornalista da imprensa escrita portuguesa que acompanhou os trabalhos do Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1-7 de Março de 2008), incluindo a visita dos participantes ao Cantanhez, no sul, na Região de Tombali (1 a 3 de Março de 2008) (*).
Imagem (digitalizada e editada por L.G.): Correio da Manhã (2008) (com a devida vénia...)
1. Eis alguns dos excertos do trabalho jornalístico do José Carlos Marques:
"Em 1973, a guerra na Guiné atinge um ponto crítico. A acta da reunião de Comandos de 15 de Maio mostra a descrença de Spínola e dos seus militares na hipótese de vitória.
"Encontramo-nos, indiscutivelmente, na entrada de um novo patamar da guerra. Bissau, 15 de Maio de 1973. O general Spínola, comandante militar e político da Guiné, fala perante os comandos militares, numa reunião convocada por si. A reunião de Comandos tinha por objectivo fazer o ponto de situação da guerra da Guiné. Spínola ouviu os seus homens repetir o que já sabia – o inimigo estava cada vez mais forte e as tropas portuguesas sentiam dificuldades crescentes em travar o avanço do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
(...) "Na acta da reunião, que recebeu o carimbo 'muito secreto', pode ler-se o diagnóstico do homem que liderava as tropas portuguesas na Guiné: 'Afiguram-se-nos manifestamente insuficientes os meios actuais face à evolução verificada, pois considero demonstrada à evidência a impossibilidade de alterar a manobra para economizar meios, sem grave compromisso da missão'.
"A 15 de Maio, o Norte da Guiné está a ferro e fogo. Desde o dia 8 desse mês que o quartel de Guidaje fica cercado pelo PAIGC, que fustiga a base militar com uma violência nunca vista. Os 200 homens da guarnição defendem-se de 700 guerrilheiros bem armados. O apoio aéreo é limitado pelos ataques com mísseis terra-ar Strella, de fabrico russo – o PAIGC abate aviões FIAT G-91, Dornier e helicópteros. O comando vê-se obrigado a deslocar para a região todos os reforços disponíveis, conseguindo impedir a queda da guarnição ao final de um sangrento mês de combates. Uma vitória provisória, só possível devido à operação ‘Ametista Real’, em que o corpo de comandos atacou a base da guerrilha em Cumbamori, no Senegal, cortando as linhas de abastecimento que possibilitavam o cerco a Guidaje. Mas o pior ainda estaria para vir, com a perda da guarnição de Guileje, no Sul da Guiné, a 22 de Maio.
"Os militares sabiam que não havia já condições para travar o PAIGC. Um dos participantes na reunião de 15 de Maio, o brigadeiro Alberto da Silva Benazol, Comandante Territorial Independente da Guiné, fala das dificuldades de retirar feridos e mortos do teatro de operações. 'Temos de encarar o aumento do número de mortos', diz, avisando ainda que 'há que estar-se preparado para a utilização de cemitérios de unidade e, portanto, haverão os familiares na Metrópole de estar preparados para aceitar que nem sempre será possível receberem os restos mortais dos seus heróis, em prazo curto e na forma em que se tem processado'.
"O brigadeiro Leitão Marques, Comandante Adjunto Operacional, admitia o risco da perda de várias guarnições: 'o inimigo está a preparar as necessárias condições para a conquista e destruição de guarnições menos apoiadas por dificuldades de acesso (Guidaje, Buruntuma, Guileje e Gadamael) (...) isto já está ao alcance das suas possibilidades militares'. O mesmo militar avisa que 'não podemos esquecer que qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa constituir um elemento de pressão psicológica sobre a Nação Portuguesa'.
(...) "Gauldino Moura Pinto, Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné, que já tinha descrito ao pormenor as extremas limitações de voo desde que as aeronaves começaram a ser abatidas por mísseis terra-ar, (...) numa única folha, listou os meios de que precisava: 8 aviões Skyvian, de transporte ligeiro, 5 helicópteros, 12 aviões Mirage ou de tipo semelhante, novos radares e mísseis terra-ar do tipo Red-eye (o PAIGC começava também a usar meios aéreos próprios). Na prática, isto queria dizer que praticamente toda a aviação seria substituída – um pedido que sabiam ser incomportável para Lisboa, agravado pelo facto de ser cada vez mais difícil a Portugal comprar armamento, devido à contestação internacional à guerra.
"O governo de Marcello Caetano estava informado do que se passava na Guiné, mas não foram enviados reforços (...).
"A perda de Guileje marca um ponto de viragem na guerra, mas o único comandante português que abandonou uma guarnição durante a Guerra Colonial não se arrepende de nada: 'Em consciência fiz o que devia ser feito', escreve Coutinho e Lima no livro ‘A Retirada de Guileje’, que vai ser lançado em Lisboa no próximo dia 13 de Dezembro.
"Trinta e cinco anos depois, o coronel de artilharia do Exército conta o que o levou a sair – com 200 soldados e 500 civis – de uma base crucial para cortar as linhas de abastecimento do PAIGC na Guiné-Conacri. A decisão valeu-lhe um ano de prisão preventiva em Bissau, por ordem do general Spínola, e um processo na justiça militar que se extinguiu com o arquivamento, após o 25 de Abril.
(...) "A ARMA QUE MUDOU O CURSO DA GUERRA
"Em 1972, o PAIGC recebeu uma prenda valiosa da União Soviética. O míssel terra-ar Strella acabou com a supremacia aérea dos portugueses. A arma é usada pela primeira vez em Março de 1973. Após dois sustos sem consequências, a 25 de Março o Fiat G-91, pilotado pelo tenente Pessoa, é abatido. Seguem-se uma série de tiros certeiros. O impacto dos Strella é brutal. Os soldados deixam de ter apoio aéreo e as operações helitransportadas ficam em xeque. Sem possibilidades de reabastecimentos e com dificuldades de retirada de mortos e feridos, a moral das tropas cai a pique.
"OFENSIVA EM TRÊS FRENTES DÁ VANTAGEM AO PAIGC
Maio de 1973 foi terrível para os militares portugueses na Guiné. Sedentos de vingar a morte de Amílcar Cabral – assassinado [em Conacri] em Março – os líderes do PAIGC planeiam uma grande operação no Norte e no Sul do território. Soube-se recentemente que os ataques deveriam ter ocorrido ao mesmo tempo, mas o cerco à base de Guidaje, no Norte da Guiné, começou mais cedo por os portugueses terem detectado movimentações da guerrilha. Guidaje esteve cercada entre 8 de Maio e 8 de Junho, obrigando o comandante-chefe a mobilizar para lá todos os reforços de que dispunha. Quando começa o assalto a Guileje, no Sul, não há tropas disponíveis para o apoio. Os ataques são liderados por Nino Vieira, comandante do PAIGC para a zona Sul. A operação Amílcar Cabral – designação escolhida em homenagem ao líder assassinado dois meses antes – começa no dia 18 de Maio e o quartel cai a 22, com dois mortos do lado português. Uma coluna de soldados e civis retira para Gadamael, que fica debaixo de fogo durante vários dias. Entre 31 de Maio e 2 de Junho caíram 700 granadas, fazendo 5 mortos.
"Sem abrigos eficazes, centenas de soldados fogem para a selva, e só a chegada de novos comandantes e, no dia 12, de reforços, salvam Gadamael de sofrer o mesmo destino da guarnição de Guileje.
"As fragilidades das tropas portuguesas são evidentes. Só o 25 de Abril permite evitar uma derrota militar na guerra da Guiné". (...)
Guiné-Bissau > Simpósio Internacional de Guileje > Visita ao sul > Região de Tombali > Cacine > 2 de Março de 2008 > Depois de um excelente almoço, de carne e peixe, na praia piscatória de Cananime, os visitantes deram um salto, de barco a motor, à outra margem do Rio Cacine, justamente para visitar a povoação de Cacine. O jornalista do Correio da Manhã, José Carlos Marques, foi um dos privilegiados elementos desse grupo... Ei-lo aqui de regresso ao barco... Conheci-o nessa altura, da minha viagem de regresso à Guiné. Sempre atento, discreto e afável.
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Simpósio Internacional de Guiledje > 1 de Março de 2008 > Coutinho e Lima, depois de ser homenageado pela antiga população de Guileje (que hoje vive em Mero), deixa-se fotografar no recinto do antigo aquartelamento, com o traje de home sábio, a chabadora, que lhe impuseram...
Segundo ele me confidenciou na altura, a população de Guileje estava relutante em abandonar os seus haveres, a sua tabanca, as suas moranças... A verdade é que, ao fim de cinco dias a viver nos abrigos, a população local (cerca de meio milhar de pessoas) e os militares portugueses (c. 200), sem água, sem transmissões, sem apoio aéreo, com um morto, e com a artilharia a acertar em cheio nas instalações de superfície, dificilmente poderia resistir muito mais tenpo...
Foi talvez uma das decisões mais difíceis da sua vida e, ao tomá-la, o então major, comandante do COP5 , sabia que punha fim à sua carreira militar, como aqui confessa na entrevista ao jornalista do Correio da Manhã. Ao escrever o livro A retirada de Guileje: a verdade dosfactos (que será apresentado no próximo sábado, dia 13, no auditório da Academia Militar, na Amadora), o actual coronel de artilharia reformado seguiu a máxima do nosso blogue, de que é membro: "Não deixes que sejam os outros a contar a tua história por ti"...
Fotos e legendas: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.
2. Entrevista de Coutinho e Lima ao jornalista José Carlos Marques
(...) "O que o levou a escrever um livro sobre a retirada de Guileje? (**)
"A minha prioridade foi dar a conhecer aos meus filhos e netos e a toda a gente o que se passou naquela odisseia de Maio de 1973 em Guileje. Quis que essa história ficasse escrita.
"Guarda algum sentimento de injustiça em relação ao que se passou?
"É evidente que sim. A quente, até posso compreender a decisão do general Spínola de me mandar prender, mas depois não quiseram ter a capacidade de estudar racionalmente a situação e verem que a retirada foi a melhor solução para toda a gente, até para o comandante-chefe, que não tinha possibilidades de resolver o problema.
"Nunca se arrependeu da decisão de abandonar Guileje?
"Não, nunca duvidei. Não havia hipótese de defesa, se tivéssemos lá ficado seríamos todos mortos.
"Sabia das consequências que ia sofrer?
"Quando saí, disse aos meus homens que a minha carreira militar tinha chegado ao fim. Pus a carreira de lado perante as centenas de pessoas que dependiam de mim".
__________
Notas de L.G.:
(*) Vd. postes
23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2674: Recortes de imprensa (3): José Carlos Marques, do Correio da Manhã, em Gandembel e Guileje, embeded nas NT
Vd. últimpo poste desta série > 4 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3404: Recortes de imprensa (9): Em Gandembel - O adeus à Guerra (José Teixeira/César da Silva)
(**) Vd. poste de 27 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3527: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (1): Lançamento do livro, 13/12/08, 17h, na Academia Militar, Amadora
(...)O livro A RETIRADA DE GUILEJE, edição de autor, não estará à venda nas livrarias; Coutinho e Lima está disponível para o enviar, pelo correio, para qualquer parte do Mundo. Aqui ficam os seus contactos:
- Rua TOMÁS FIGUEIREDO, nº. 2 - 2º. Esq. 1500 – 599 LISBOA
- Telefone: 217608243
- Telemóvel: 917931226
- Email: icoutinholima@gmail.com
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
17 comentários:
Aqui está o exemplo de titulos jornalisticos que não correspondem á verdade, que não correspondem ao afirmado no texto.
O que se lê no texto é que Spinola, considera que não tem meios suficientes à data da reunião para ganhar a guerra!
Já se sabe e já se disse que a guerra em Angola estaca praticamente acabada e que muito rapidamente ia ser deslocado o esforço de guerra para a Guiné.
Mas quando se quer demonstrar o "indemonstrável" para se servir sabe-se lá que propósitos!
«Sem possibilidades de reabastecimentos e com dificuldades de retirada de mortos e feridos, a moral das tropas cai a pique.»
Este senhor está a falar de quê? Eu estava na Guiné nessa altura, estive em três unidades operacionais e não vi esta "moral das tropas cai a pique.»
Quanto ao Guileje, façamos apenas a comparação com o que aconteceu em Guidage e Gadamael!
Abraço camarigo
Joaquim Mexia Alves
Camarigo Mexia Alves,
Em primeiro lugar, queira aceitar os meus melhores cumprimentos.
Felicitações pela sua análise. Concordo. Mas se discordasse, também o felicitaria.
Pergunta, com muita pertinência: «Este senhor está a falar de quê?». Presumo que se refira ao senhor José Carlos Marques, jornalista.
Ora, com o respeito devido ao trabalho alheio - no caso, o do autor da citada "reportagem" e condutor da entrevista -, «este senhor» limitou-se a entregar (eficazmente, por sinal), uma cartinha-a-garcia, consubstanciada em fina operação de marketing, aparentemente focada na promoção de um livro, no prelo e já com pré-anúncios lançados neste mesmo weblog, mas cujo enquadramento geral, muito anterior e polifacetado, tem paulatinamente vindo a ser multi-apoiado por alguma da opinião que se publica e cujos intuitos são, como sabe, de muitíssimo maior alcance.
Sim, porque está à vista de qualquer pessoa, mesmo iletrada nestas matérias específicas "da Guiné" e genéricas da guerra "colonial", que o chamariz consistiu na "revelação" de uns mui secretos "ficheiros da Guiné" - tão secretos como o do polichinelo.. -, os quais são há décadas conhecidos de quem seriamente se interesse por "estas coisas da guerra e da política".
Dizia-me bastas vezes um meu amigo tenente do SGE, quando, em serviço num determinado teatro-de-operações, se tratava de falar de (ou executar) alguns "assuntos impopulares": «não sei... e tenho raiva a quem saiba».
E concluo, recordando chiste popular: «quem não sabe, é como quem não vê»...; no caso, não lê... nem assobia para o lado.
Saudações veteranas,
Votos de Boas Festas para todos os Camaradas da Guiné.
Cumprimento os comentadores anteriores, mas não concordo. Em primeiro lugar, para ganhar a guerra, teríamos que ter alguma iniciativa, e com êxito. Ora, quando o fizemos, foi com os resultados desastrosos que todos conhecem, porque nunca conseguimos ter um efectivo controle do território, nem desferir ataques desmobilizadores. Por outro lado, ao contrário do que se passava nas provincias ricas, também não fomentámos actividades de peso económico e social, capazes de contrariar a argumentação contrária. Apesar de ter saído da Guiné em Dez71, o moral não era elevado, nem podia ser. Em Angola a guerra não estava ganha. Estava em banho-maria, embora os quadros e, até a população, estivessem a beneficiar do desenvolvimento e de novas oportunidades. Atingiu o PIB mais alto do período republicano. Pela avaliação da mencionada acta, o poder parecia reconhecer o fim eminente, não ajudadando em suprir necessidades, como o ComChefe parece não ter ajudado em Guilege.
Ou ajudou? Por não poder ser juíz de uma causa desconhecida, vou comprar o livro, e procurar informação adicional
Um abraço para a Tabanca Grande
José Dinis
Caro José Dinis
Como é que numa guerra de guerrilha se tem o controle a todo o tempo de um território?
E afinal quem é que controlava mais território?
O ataque a Cumbamori, foi mal sucedido?
A Operação Mar Verde, foi mal sucedida?
E tantas mais?
Cheguei em Dez. 71 à Guiné e tanto na zona de Bambadinca, Bafatá, Leste, como depois em Mansoa e na sua zona nunca vi moral nenhum em baixo.
Vi sempre pessoas que não queriam lá estar obviamente, como os americanos não queriam estar na Europa, mesmo na Grande Guerra!
Mas isso é com certeza um sentimento que atravessa qualquer pessoa numa guerra, sobretudo numa guerra longe da sua casa.
Quanto a Angola, cheguei lá em Março de 74, dois meses depois de ter saido da Guiné.
Se havia algumas acções de guerra eram da UNITA e mesmo essas eram muito escassas e havia até a informação em voz baixa que a mesma era controlada pelas nossas forças.
Percorria-se Angola de carro ligeiro de uma ponta à outra sem qualquer problema.
Fico-me por aqui.
Abraço camarigo do
Joaquim Mexia Alves
Caro Mexia Alves
Vou tentar ser sucinto:
A primeira ideia, é a de que, por não se ter o o controle do TO, nem o conseguir, perdem-se as guerras de guerrilha;
A segunda, é que nós ocupávamos a maioria das localidades, mas não nos deslocávamos com confiança, como dominadores, o que minava a moral;
A terceira que se refere a acções, não identifico Cundomori, mas a Mar Verde foi, quiçá, a maior vergonha da guerra colonial, um grande fiasco em várias frentes;
A quarta ideia, de que o pessoal não queria lá estar, reflecte o sentimento geral para qualquer guerra. Mas moral é determiinação, e o que apurei com frequência, foi essa falta de determinação, que, como no futebol, consolida-se com golos. E nós, não os marcávamos;
A quinta, sobre Angola, onde cheguei em Maio72, trabalhei vários meses no mato, com autóctones, e mantenho a ideia do banho-maria. É verdade que nos deslocávamos de automóvel, por quase todo o território, e que a Unita estava controlada. Mas o "M" chateava no fim-do-mundo.
Cumprimentos
José Dinis
Caro José Dinis
Queres então dizer que em Angola onde nos deslocávamos, como tu próprio dizes, por todo o território, ou seja, controlávamos o território, a guerra estava em banho maria, mas já na Guiné, onde em tantos sitios nos deslocávamos à vontade, e noutros sim senhor com cuidados redobrados e emboscadas, aí já tinhamos a guerra perdida?
Essa dos golos é interessante, porque ao contrário do que dizes eu acho que "marcámos muitos golos" e também sofremos alguns e também acho que para além do facto normal de ninguém querer estar numa guerra, o moral das tropas era até muito bom atendidas as circunstâncias.
Quanto à operação Mar Verde, dizer que uma operação em que as tropas portuguesas controlam durante algumas horas a capital de outro país, libertam os prisioneiros de guerra e voltam quase sem baixas é a maior vergonha da guerra colonial nem tenho palavras.
E sabemos bem que por alguns acasos a mesma não teve mais êxito como a falta dos aviões que não estavam onde deveriam estar e a deserção de militares mais tarde fuzilados pelo próprio PAIGC ao que consta.
Abraço camarigo
Joaquim Mexia Alves
Sempre o choradinho da "vitória no terreno" dos heróicos guerrilheiros do PAICG.
Assim não se faz a História, com H grande. Assim se falsifica a realidade que todos nós, 40.000 portugueses, 550.000 guineenses vivemos em 1972/74.
Até temos helicópteros abatidos pelos mísseis do PAiCG! Nem um caiu!...
Pois, Coutinho e Lima e Guileje!
Segundo o nosso major, os guerrilheiros só se aperceberam que Guileje tinha sido abandonada três dias depois de as tropas portuguesas terem retirado.
Não foi a guerra do Solnado porque houve muitos mortos que nos merecem saudade e respeito, mas às vezes, com estes jornalistas e outros, parece.
António Graça de Abreu
Lucidez e espírito desapaixonado precisa-se, para historiar !
Sem eles, cai-se sistematicamente na "defesa do bairro" e, de acordo com as circunstâncias, ora damos vivas a nós próprios ora aos outros.
Mais uma vez a velha tese do "quem estava a ganhar a guerra" ?
Os argumentos continuam a parecer muito caseiros tentando demonstrar uma situação com a mera comparação de casos isolados.
Já em posts anteriores tomei a iniciativa de esclarecer a minha opinião sobre este assunto. Não a vou repetir, obviamente.
Direi apenas que também fui combatente ( 1970/72 ), também tive guerra a sério, também andei na "psico" spinolista ( reordenamentos ). Também exerci actividades condizentes com uma guerra de guerrilha e até, atente-se, desenvolvi acções de mera guerra convencional !!
Este último pormenor servirá, julgo, para classificar a impreparação de quem comandava e estava à frente duma estratégia militar desta envergadura.
Se alguém tiver dúvidas sobre o que estou a falar, esclareço que me refiro a um campo de vários milhares de minas instalado ao longo de 12 kms entre Bula e a ponta de S.Vicente.
Só quem não fizer a mínima ideia daquela realidade poderá concluir da eficiência de tal monstruosidade. Aliás, os resultados são por si sós, esclarecedores. Durante o meu tempo de permanência na zona, caíram muitos mais camaradas nossos do que elementos do IN.
Os nossos actuais discursos valem o que valem ! Fomos actores naquela encenação, sofremos as agruras daquela vivência, e hoje transformámo-nos em contadores de estórias e em escritores, de livros uns, de blogs, outros ....
Também não concordo que uma reflexão atenta classifique como perdedor aquele que não tiver o controlo do TO numa guerra de guerrilha.
Por definição, o terrorismo e a guerra de guerrilha define-se pelas actividades de terror lançadas aqui e/ou ali, isoladas, traiçoeiramente, afectando inocentes, criando um clima de insegurança e das duas uma, ou respondemos fazendo contra-terrorismo ( não era, definitivamente o nosso caso ) ou reagimos às acções do inimigo procurando-o na sua toca e dando-lhes luta ( era o nosso caso !) .
A acção do nosso inimigo e o local onde desenvolvia a sua actividade, proporcionava-lhe a volatilidade necessária e suficiente para o bate-e-foge, pois não só conhecia bem o terreno como abandonava os seus mortos e/ou feridos tentando apenas o seu resgate pela calada da noite quando as nossa tropas já tivessem retirado.
Todas estas situações, sem demérito de verdadeiras acções militares levadas a cabo pelo IN, influenciam hoje as nossas apreciações as quais, não garantindo o distanciamento necessário, desvirtuam a realidade dos factos.
Quanto ao não termos encetado acções de peso económico e social, também não concordo e acho que a afirmação reflecte pouco domínio dos verdadeiros factores diferenciadores da política de reordenamento das populações concebidos pelo general Spínola.
Porque o discurso já vai longo, permito-me acabar dizendo apenas que fui testemunha da verdadeira aceitação das nossas tropas por parte da população onde me inseri percebendo, a esta distância, uma ou outra crispação por via de interesses étnicos.
Isto sim, é um verdadeiro sinal de que o IN não estaria a ganhar a guerra !
Meu caro Jozaquim:
Partilho das tuas críticas, não aprecio de resto o estilo de fazer títulos de caixa alta do Correio da Manhã. Como sabes, é uma escola de jornalismo sensacionalista e populista, que privilegia a notícia de faca e alguidar... O título e a 'lead' são quase tudo.
Conheço, há menos de um ano, tanto o Coutinho e Lima como o José Carlos Marques. Com eles tenho apenas a relação afável que mantenho com as pessoas que fazem parte das minhas relações sociais. Em boa verdade, não me parece que nenhum deles seja o tipo de pessoa que faz fretes aos outros...
O Carlos Marques tem-se mostrado interessado pela problemática da guerra da Guiné, desde que foi mandado fazer a cobertura do Simpósio Internacional de Guileje e parece ser um tipo sério, embora novato. Algumas imprecisões no seu texto são reveladres disso: o Amílcar Cabral não foi assassinado no Senegal, como ele escreveu...
Só o conheci na Guiné e nunca mais o voltei a contactar. Há algumas semanas atrás ligou-me a pedir o contacto telefónico do Coutinho e Lima, queria entrevistá-lo, a própósito do livro que vai sair ("A retirada de Guileje: a verdade dos factos")... Fui eu, protanto, que lhe deu o nº de telefone do Coutinho...
Quanto ao Coutinho e Lima, tem material que interessa aos jornalistas... Julgo que o essencial está dito: não há aqui propriamente "ficheiros secretos" da guerra da Guiné, a não ser como título para "vender jornais"...
Convenhamos que Guileje (e o Spínola) ainda pode ser notícia que venda jornais... Tenho dúvidas: tirando nós, os antigos combatentes, a população portuguesa tem mais em que pensar, nos dias que correm... Mas nós temos o dever de não deixa "morrer o dossiê"... Mais: temos o direito de falar e de escrever sobre uma guerra em que fomos actores e testemunhas...
Percebo, todavia, a tua frustração e irritação quando se fala em "ficheiros secretos" do Spínola.... Quem pode trazer algo de novo (daí o título "ficheiros secretos", em itálico, do Coutinho e Lima, no poste publicado no blogue) é, de facto, o antigo comandante do COP5, quer se concorde ou não com a atitude dele, quer se simpatize ou não com o senhor...
Ele tem, pelo menos, o direito de contar a sua versão dos acontecimentos que protagonizou aos seus filhos e netos... Eu, pessoalmente, nunca serei seu juiz... Primeiro vou ler o livro... E depois deixo à História essa incumbência, a de julgá-lo como comandante militar...
Tu, ou alguém por ti, no dia 13, no auditório da Academia Militar, na Amadira, podes legitimamente pôr-lhe a questão:
- Admitamos que Guileje era indefensável... Mas a verdade é que, com outro comandante (e tropas frescas de reforço, os páras), Gandembel aguentou-se... E aguentou-se até ao fim... Tal como Guidaje...
São estas questões que importa pôr aos homens que nos comandaram e que, felizmente, ainda estão vivos. Mas deixemos-los, primeiro, contar a sua história...
Quanto ao Abreu dos Santos, que é um leitor atento, informado, assíduo e apaixonado do nosso blogue, muito embora não faça parte da nossa Tabanca Grande... Não posso aceitar (ou pelo menos deixar passar em branco)a sua insinuação segundo a qual estaria em curso uma sibilina operação de marketing editorial...
Meu caro Abreu dos Santos, é normal que, no nosso blogue, se faça a promoção dos livros dos membros da nossa Tabanca Grande... Não há, juro-lhe, nenhuma operação de marketing por detrás do livro do Coutinho e Lima (que, de resto, é uma edição de autor)... Ele tem o mesmo direito à divulgação do seu livro, que teve o Beja Santos ou o António Graça de Abreu ou qualquer outro: amanhã, o Vitor Junqueira, o Jorge Cabral, o Joaquim Mexia Alves ou eu próprio... Não aceito, por isso, a pquena teoria da conspiração...
Espero manter este princípio de controvérsia (de resto, legítima, saudável...) dentro de limites rqazoáveis, aceitáveis... O problema é que, quando a malta começa a ver bruxas e fantasmas, estamos tramados, pois a seguir começa logo a caça às bruxas e aos fantasmas... Ora, pelo menos o nosso blogue deve estar livre... de bruxas e de fantasmas.
Um Alfa Bravo para todos. Luís
aCABO COM DUAS QUESTÕES:
1 . Ao M.Alves pergunto se teria orgulho de ter congeminado e comandado a operação M.Verde, que não cumpriu 4 dos seus principais 5 objactivos, e que teve destrosas consequências, pois foi considerada acto terrorista, perpretado por Portugal, contra um país independente. Ainda podia ser pior, bastava terem abandonado o M.M.
Ao Matos pergunto o resto da definição de guerrilha, na parte que concerne aos objectivos.
Por mim, termino asta sessão comentarista.
Abraços
José Dinis
[10º comentário, posted 19:01 10-12-2008; re-posted 23:27 10-12-2008]
... ao Luís Manuel da Graça Henriques - muito especialmente, tendo em vista a sua responsabilidade como fundador/autor/editor-principal deste weblog -, e a todos os demais Camaradas da Guiné, bem como aos inúmeros visitantes -
Acabo de ler o que acima está, escrito por LG.
No que comentei, tanto em linhas como em entrelinhas, não existiu nem está nenhuma «insinuação segundo a qual estaria em curso uma sibilina operação de marketing editorial...» neste "foranada", onde desde sempre se trata abertamente, repito, abertamente, de assuntos, do passado e do presente, que interessam a milhares de pessoas (e, se assim não fosse, o blogue não teria - como tem - a merecida projecção).
O que redigo, é que o «enquadramento geral, muito anterior e polifacetado, tem paulatinamente vindo a ser multi-apoiado por alguma da opinião que se publica e cujos intuitos são, como sabe, de muitíssimo maior alcance.»
A mais recente promoção - e apenas a ela me reportei -, está à vista de toda a gente e verificada no «chamariz [que] consistiu na "revelação" de uns mui secretos "ficheiros da Guiné" - tão secretos como o do polichinelo.. -, os quais são há décadas conhecidos de quem seriamente se interesse por "estas coisas da guerra e da política".» Aliás, de pronto manifestei a Mexia Alves, não apenas aqui como também por e-mail, estar em acordo com o seu comentário, designadamente: «Aqui está o exemplo de titulos jornalisticos que não correspondem á verdade, que não correspondem ao afirmado no texto. [...] Mas quando se quer demonstrar o "indemonstrável" para se servir sabe-se lá que propósitos!».
Luís Graça, acaso tenha sido ferido na sua susceptibilidade, queira aceitar as minhas públicas desculpas; extensivas a outrém, que de modo idêntico se houvesse ressentido.
Quanto ao resto, que no caso é o que interessa: o mediatismo da história da "Odisseia de Guileje" teve seu início na noite de 30Mai96, através da SIC, onde o meu amigo Emídio Rangel transmitiu uma reportagem sobre o assunto da guerra " perdida", etc., etc., etc.
Posto o que, não é de "hoje", é de há mais de uma década. Daí, a afirmação - não, não é mais uma "teoria da conspiração" -, ser o respectivo «enquadramento geral, muito anterior e polifacetado, [o qual] tem paulatinamente vindo a ser multi-apoiado por alguma da opinião que se publica»...
Para finalizar, estamos plenamente de acordo: «que, no nosso blogue, se faça a promoção dos livros dos membros da nossa Tabanca Grande»; e que ao senhor coronel de artilharia na reforma Alexandre da Costa Coutinho e Lima, é - muito naturalmente - reconhecido «o mesmo direito à divulgação do seu livro».
Renovo os votos de Boas Festas, para todos os "tertulianos" e respectivas famílias,
Respondo ao José Dinis
Teria todo o orgulho em ter planeado e comandado a Operação Mar Verde.
O tal acto "terrorista" que não teve consequências em relação aos paises que já não nos apoiavam, era igual ao que esses paises independentes praticavam, quando abrigavam e permitiam que dos seus territórios o PAIGC atacasse o território da Guiné.
Houve paises que tiveram operações militares semelhantes, em que não cumpriram todos os objectivos e depois mais tarde até filmes fizeram dessa operações.
Abraço camarigo
Joaquim Mexia Alves
José Dinis, aí vai o meu esclarecimento. Peço, entretanto, desculpa por não ter conseguido ser explícito no texto do meu comentário.
A guerra de guerrilha, não sendo uma guerra do tipo convencional, assenta, por um lado, na enorme mobilidade dos guerrilheiros, e, por outro, na sua ocultação ( julgo ter referenciado isto no tal comentário ).
Com estas bases teóricas, desenvolve-se uma estratégia de conflito de longa duração tendo nos seus pressupostos uma certa escassez de meios que permita o sucesso militar.
Isto obriga ao adversário um dispêndio enorme de esforço e a nossa guerra do ultramar foi o exemplo disso.
A referida escassez de meios leva à tática do fustigamento para manter o conflito activo e daí passa-se à guerrilha.
Chegámos aos objectivos : entre outros, a guerra de guerrilha adapta-se às chamadas guerras de libertação
Um abraço,
António Matos
Companheiros Mexia Alves e António Matos
Parece estarmos quase a juntar as pontas. De facto, devemos ter a noção sistematizada dos acontecimentos, para deles podermos tirar as ilações devidas. Desculpem este ar, mas não é pretencioso.
Sobre a op.M.Verde, andava o ComChefe em negócios secretos com o Senghor e, vai daí, ataca o vizinho. Não dá um ar de credibilidade. E negou todas as boas intenções manifestadas por Portugal, de que só nos interessava o progresso do território das provincias. Com isso, também ficámos mais hipotecados para adquirir material.
Do ponto de vista militar da execução da op., após tanto tempo e verbas dispendidas,não condescendo. Foi demasiado má, e no final, o cmdt ainda veio desculpar-se com um oficial dos comandos (sem concretizar) como fazem os putos embirrentos, apontando o dedo noutras direcções. Alpoim, Spinola e Caetano foram incompetentes.
Foi verdade, que algumas potências fizerão incursões e assassinatos por onde não deviam. Mas essas potências, têm o raio do poder determinante, que levam a que outras, à babuge, lhes reconheçam o mérito, e lhes confiram apoios (vd o apoio de Portugal aos EU na questão iraquiana).
Não era o nosso caso. Estávamos isolados, até se criou a zonz financeira do escudo.
Quanto à guerra de gurrilha ou de libertação, o objectivo assenta na desistência do beligerante "ocupante", pela xaustão que conduz a implusão da sustentabilidade. Todos os prejuízos humanos e materiais, todas as más notícias e manifestações, os constrangimentos financeiros, etc, minam o moral do estado "ocupante", e os exemplos são mais que muitos. E nós fomos interpretes dessas circunstâncias.
Dois abraços para os companheiros da polémica
José Dinis
P.S. Como parte importante da preservação da moral das NT, devo salientar o trabalho magnifico dos S.P.M.
P.P.S. A Pearl Buck faz excelentes descrições sobre as relações entre beligerantes.
Bem José Dinis
A discussão eterniza-se e eu também não condescendo.
Essas são as tuas razões e a tua maneira de ver, eu vejo de outra maneira e continuo a dizer que em termos militares a Op. Mar Verde é uma grande operação.
É sabido quem é que desertou e isso já está escrito neste blogue, por isso pelo menos a falha mais importante está encontrada.
Desculpa mas não me vou dar ao trabalho de procurar no blogue.
Se a operação tivesse corrido a 100% não sei o que poderia ter mudado na Guiné, mas com certeza com um governo favorável a Portugal na Guiné Conakri muita coisa mudaria, o que não quer dizer que eu não desejasse o fim da guerra.
Abraço camarigo
Joaquim Mexia Alves
Mexia Alves,
Aí vai um abraço camarigo:
J.D.
E outro abraço camarigo para ti.
Joaquim Mexia Alves
Enviar um comentário