1. Mensagem de António G. Matos, ex-Alf Mil MA da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, com data de 7 de Junho de 2009:
A panóplia de reflexões que se consubstanciam em posts, comentários e (in)confidências que temos com o nosso travesseiro, têm, de algum modo, contribuído indelevelmente para uma melhor percepção da guerra que travámos no ultramar e muito especialmente na Guiné.
Temos relembrado ocasiões que nos marcaram o corpo e o espírito e temo-las transposto para os dias de hoje com um restyling desenvolvido em ateliers mentais, nos quais vamos misturando as cores da nossa vida, retocando aqui ou ali uma imagem que se começou a desbotar, mas que insistimos em preservar.
Relembramos camaradas desaparecidos na voragem da luta e debatemo-nos em perceber os deuses que os não protegeram.
Trazemos à memória os inimigos da altura.
Assina-se uma paz e decreta-se uma vivência irmanada.
Posteriormente percebe-se que a vida não se decreta!
Vamo-nos reunindo para expelirmos algumas confissões inconfessáveis enquanto viverem os protagonistas.
Mas temo-nos esquecido de estudar com profundidade e saber sociológico, uma peça importante na compreensão da complexidade da guerra: o porquê, o como, a corda-bamba das suas vidas, os entretantos, as saudades, os medos, a clandestinidade, os outros que fizeram o quotidiano dos desertores.
Não se tirem conclusões precipitadas a esta minha reflexão!
Tenho amigos que foram desertores e eu próprio fui altamente assediado a fazê-lo.
Não vou explanar sobre o meu caso (já o abordei em antigo post) pois interessa-me saber dos que o consumaram e não dos outros.
Considero que, para uma boa compreensão dos contextos social, político, económico, das relações de causalidade da acção aos resultados, e das novas maneiras de ver estas problemáticas, os então desertores poderão contribuir para o enriquecimento cultural deste blog.
Dentro dos voyeurs desta tabanca haverá, com certeza, quem tenha optado por essa via e, aceitando-lhes a liberdade de o terem feito, desafio-os a tornarem claros os conceitos atrás mencionados.
Aguardemos as contribuições.
António Matos
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 12 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4513: Comentários que merecem ser postes (7): Encontros imprevistos... na latrina (António G. Matos)
Vd. último poste da série de 13 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4515: Controvérsias (17): A César o que é de César! (Mário Fitas)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
13 comentários:
Caros camaradas
A fim evitar malentendidos, vim aqui fazer o meu comentário, para que fique claro que o estou a fazer a nível estritamente pessoal.
Já em tempos e a propósito do assunto desertores, dei a minha opinião. Para os que estão connosco há pouco tempo, deixo-a de novo.
Considero este blogue um repositório de experiências dos antigos combatentes da Guiné. Nele podem colaborar todas e quaisquer pessoas que de algum modo sintam alguma afinidade com a Guiné do nosso tempo ou com a actual Guiné-Bissau.
Parece-me que aqui não cabe outro tipo de pessoas. Se eu fosse desertor, de certeza não tinha coragem de vir aqui debitar experiências do meu tempo de exílio, diria mais, tinha vergonha.
À consideração da tertúlia, respeitando toda e qualquer opinião diferente da minha.
Um abraço aos meus camaradas que sujaram as botas com aquela terra vermelha.
Vinhal
Caro A Matos
Não encontro qualquer sentido de enriquecimento para o Blogue, que serve e é utilizado por quantos Lutaram (a bem ou a mal) na Guiné. Entendo, mesmo, penalizante (para não referir injurioso) para quem, de nós, em crenças e sobretudo em descrenças, foram tomados por instrumentos do Estado que então nos regia. Quem não cumpriu a lei e se insurgiu ( é dos Livros) é insurrecto.Aos que se colocaram voluntariamente fora dos caminhos da Lei vigente carregam esse epíteto particular de desertores, como nós-outros o temos de Combatentes.
Pelo menos tenhamos dignidade sofrida e não se confundam as coisas.
Dar voz a tais pessoas é garantir, como foi dito a 16Nov64, QUE ESTAMOS TODOS MORTOS. Eu, não!
Abraços
Santos Oliveira
Esse assunto já foi aqui de batido;o blogue é um espaço com determinada finalidade e,quanto a mim, não sendo sociólogo...não sendo historiador...não sendo ou sendo um simples e velho combatente na Guiné, um cidadão que um dia lhe disseram haver este espaço e ele veio ver. Pensava ter a guerra, para ele, há muito acabado. Enganou-se. Alinha letras em contos de memórias nessa terra vivida. Quando lhe dá na bolha.
Como cidadão opina; como cidadão dá o direito a TODOS opinarem de modo diverso do seu. Mas, no caso vertente subscreve o que o Carlos Vinhal e O Santos Oliveira escreveram. Para esse peditório já dei...Abraços Torcato Mendonça, Cidadão,Ex Muitas "Coisas",64 anos de idade e, quer devido a isso quer a outros entretantos, está onde quer.Haja saúde...
Subscrevo e faço minhas as opiniões dos "oradores"/comentadores anteriores.
Abraço camarigo.
Os desertores quer se concorde ou não com a sua opção, penso que não acrescentavam nada ao nosso passado nas picadas, matas, bolanhas,canais estreitos do rios, ou cidades da Guiné.
Subscrevo as palavras do C. Vinhal, Mexia Alves e S. Oliveira ou eu sou um dos mortos de 16/11/64.
Um abraço Colaço.
Camaradas
Eu não sou tão redutor, apesar de achar que essa discussão poderia ser limitada aos desertores que estavam no "teatro". Afinal p blogue é da malta da Guiné.
Todos nós passámos por pressões diversas. Sofremos da prpotência. Sofremos penas, cuja justiça ficava muito a desejar, e decorria dos poderes absurdos que alguns usavam indiscriminadamente.
Não sofri qualquer porrada. Mas a certa altura do campeonato, houve uma despudorada "perseguição" pelas "forças vivas" da C.Caç, os chicos.
Adiante contarei um episódio em que o capitão fez queixinhas ao TenCoronel de N.Lamego. Já perto do fim, cheguei a pedir transferência por incompatibilidade com o comando. Por diferentes vezes trcámos mimos.
E cheguei a pensar que, se alguma vez me intimassem à prisão militar, eu rumaria ao Senegal.
Portanto, não perfilho da ideia anterior de que quem é contra a lei... porque isto de leis, e da sua aplicação, como estamos fartos de saber, é conforme.
Abraços fraternos
José Dinis
No meu ponto de vista, parece-me que este assunto não traz nada de útil ao blogue, assim como não o levariam comentários das nossas experiências num site de objectores de consciência. E suponho que aeriam até repudiados de imediato. Miguel Pessoa
Imagem a desbotar!
Insistência em preservar!
Não estudei Psicologia, mas!... Vou entendendo!
Meu caro António G. Matos, o que acima transcrevo e cito, já dava para muita coisa. No entanto para não alongar, fico belo "desbotar"!
Ainda não! Plenos conhecimentos racionais!...
DESERTOR:Etimologicamente «o que abandona, que deixa, que deserta».
Na língua Portuguesa: militar que comete o "CRIME" de deserção.
Que virá dizer um desertor a esta Tabanca Grande: LuísGraça&CAMARADASdaGuiné?
Ele foi embora "perhaps in the other side"!
Quando os Lassas passavam pra o outro lado do Cumbijã, eram alertados para um especialista na basuca!
Não!
Prefiro assinar por baixo do comentário do Carlos Vinhal.
Um Abraço,
Mário Fitas
Manuel Reis disse:
Amigos e camaradas é a 1ª vez que vejo este tema abordado no blogue,talvez por ter iniciado a minha participação no blogue há pouco tempo. Não deixará de ser interessante debatê-lo com uma certa racionalidade e com um espírito de tolerância e respeito pela opinião de outros, que tomaram opções diferentes das nossas. Esses outros, são gente da nossa geração e que sofreram na pele o dilema da guerra.Ir ou não ir, eis a questão. Quantos de nós hesitámos na hora da partida? Quantos de nós, a meio do percurso, hesitámos em abandonar?
Eles merecem o nosso respeito, não os poderemos tratar como se de uma casta diferente se tratasse.
O problema, para mim, situa-se apenas no patamar da sua intervenção no blogue, no valor acrescido que podem trazer. Se nada vem acrescentar torna-se vazia a sua participação e não há motivo justificativo para o fazer, caso contrário seriam benvindos.
Por outro lado se a participação no blogue se limita a ex-combatentes da Guiné, a sua exclusão está justificada.Se a participação é alargarda a todos os que, com o seu contributo, nos ajudem a perceber melhor o que foi a guerra colonial, por que não dar-lhes voz?
O José Dinis deu um exemplo pessoal, bem elucidativo, de como um combatente se pode transformar num desertor. Muitos outros, tiveram motivos diversificados para o fazer.
Recordo a situação de um camarada, meu amigo, que perante a iminência de embarcar para Angola, optou por desertar para França, única maneira de sustentar os pais já incapacitados.
Com o devido respeito por todas as opiniões divergentes vai um abraço amigo,
Manuel Reis
Caro António Matos,
Acabo de ler este teu trabalho(o outro da semana ficará para depois)e curiosamente,coincidência das coincidências,enviei um escrito assente numa sátira,meio séria,porquanto assente na verdade,onde afirmei a minha qualidade de desertor já depois de ter regressado de uma comissão de 25 meses...
Concordo piamente quando dizes: trazemos à memória o inimigo da altura.
Assina-se uma paz e decreta-se uma vivência irmanada.
Posterirmente percebe-se que a vida não se decreta.
Pensar é um exercício de liberdade.
Agir,é para além disso, um livre arbítrio...
Quanto ao porquê das deserções,o emaranhado de situações conducentes
a essa atitude terminal,foi concerteza uma atitude amadurecida,pensada e raramente gerada por impulsos.
Os p´rós e contras foram pesados
e repesados, mas...
há sempre um mas...
Foi uma opção e como tal essa atitude terá de sentir o ónus equacionado antes do acto.
É evidente que surgiriam novas maneiras de ver esta problemática,como dizes, e a polémica que ora lançaste irá,concerteza fazer correr um rio de tinta pela delicadeza que encerra e pela forma frontal( COMO SEMPRE, honra te seja feita...)com que a colocas.
A perspectiva sociológica seria deveras interessante e para isso há neste blog gente concerteza capaz de emprestar a argumentação
que se requer a polémica desta envergadura.
Pela minha parte,tenho opinião formada há muito sobre o tema desertores e refractários e nunca conseguiria aceitar grandes divergências relativamente a esta
visão de que a decisão conducente ao acto é sempre do seu fautor e como tal à partida ele sabia já das hipotéticas consequências...
O medo esteve sempre por trás da decisão, da nossa e da deles.
Um medo que tolhia.
O deles,provavelmente maior do que nos empurrou a todos para áfrica...
mas sempre um medo.
Seria o nosso mais irresponsável por arriscarmos a vida?
Não acreditem nas convicções políticas como razão subjacente ao acto,da deserção.
Sei bem da existência duma franja, necessáriamente muito curta, que à altura dos vinte anos tinha uma sustentação política sólida, mas como razão invocadora estava, sempre,o medo.
Um medo que paralizava,que gelava as veias...
Um medo muito maior que o teu, o meu e o dos muitos milhares que
"paralizados",gelados,fizemos a opção, certa ou errada isso não é questionável agora.
Optamos, foi o livre arbítrio.
Agimos em consonância com o lado da balança que mais nos aconselhava.
Eles,os outros ,fizeram-no de outra forma. A balança deles,pesou mais naquele prato.
Foi o livre arbítrio!
A 19/4 no Público, josé Pacheco Pereira veio defender a ideia da necesssária coragem do refractário e,ou,desertor,ao largarem tudo, sujeitando-se a trabalhos menores(?)(desta tirada francamente não gostei...)quando emigrava.
Curiosamente foi-me negado pelo referido jornal um escrito a contestar, e não vi quem de direito,os senhores da guerra a sair a terreiro,(andam todos entretidos a alimentar-se da mesma"gamela da prebendas"...)
Entendo que quem não serviu,não deveria servir-se sob pena disto se transformar na republica das bananas em que caiu.
Vejam por exemplo a possibilidade em aberto de podermos vir a ter como chefe de estado um desertor...
Tudo se encaminha para aí...
Que pensarão disto os militares do quadro e todos os ex-combatentes?
A mim restar-me-ão duas hipóteses.
A emigração,sabendo de antemão que já não estou em idade para isso, e o pedido do estatuto de apátrida.
Como de costume estás de parabéns,pela qualidade que pões no que escreves e sobretudo pela forma como obrigas a malta a pensar. obrigado António.
O assunto já foi discutido na nossa Tabanca.Na altura foi construído um amplo consenso.
Salvo o devido respeito não
vislumbro qualquer interesse
em retomar a questão.Por mim
dispenso-me de repetir o que
então escrevi.
Abraços
Jorge Cabral
Pelo respeito que me mereceram os comentários já publicados ( e outros que eventualmente venham a sê-lo ) optei por abordar a "defesa da dama" num comentário ao P4532 do Vasco da Gama.
Para quem estiver interessado, endosso-vos, pois, essa leitura.
Abraços,
António Matos
Para os menos atentos às especificações do blog, aqui deixo um mero copy-paste da margem esquerda
"Deixa o teu comentário, dá tua opinião...
Amigo ou camarada da Guiné (ou simples leitor e visitante)"
Enviar um comentário