Guiné > Zona Leste > Geba > CART 1690 > Destacamento de Cantacunda > 1968 > As precárias condições em que se vivia no destacamento ou melhor nos "bu...rakos" que a gente construía para "desenrascar" que os engenheiros de Bissau, o BENG 447, não chegavam a todo o lado... Digam-me lá se o A. Marques Lopes se parece mais com um oficial do e«ército português ou com um mineiro ?
Para além de soldado, na vedade, o tuga, o portuga, o Zé , o Zé Povo também foi engenhocas, carpinteiro, marceneiro, trolha, caboqueiro, picheleiro, funileiro, canalisador, construtor de pontes, caçador, pescador, ama-seca, parteiro, professor, missionário, enfermeiro, carteiro, cronista, descascador dor de batatas, auxiliar de cozinheiro, hortelão, arrebenta-minas, picador, cangalheiro, animador cultural, mediador cultural, psicólogo, conselheiro, juiz de paz, casamenteiro, e sei lá que mais...
O Zé Povo no TO da Guiné foi mais do que o três em um... Foi o homem dos sete oficios... O "desenrascanço" fazia parte do seu ADN e a verdade é que conseguiu transmitir esse gene aos seus filhos e netos espalhados por esse mundo de Deus e do Diabo (que ninguém, se ofenda, que isto é apenas uma metáfora, uma figura de estilo literário!)...
Foto: © A. Marques Lopes (2005). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]
Guiné > Zona leste > CART 11 (Nova Lamego, Paunca, 1969/1970) > S/l [ Paunca ?] > O fur mil Abílio Duarte fazendo o papel de ama seca, ou como ele escreve, na legenda, no verso da foto: "eu, dentro do possível, fazendo psico"...
Guiné > Zona leste > CART 11 (Nova Lamego, Paunca, 1969/1970) > O fur mil Abílio Duarte refrescando-me no "resort" de Paunca, perto da fronteira com o Senegal: Casa de banho à moda dos fulas... O depósito de água é um bidão de gasolina da SACOR, Bissau, a que foi adaptada uma torneira... A água (doce) era já então um bem precioso no TO da Guiné... As próximas guerras terão seguramente como móbil este recurso cada vez mais escasso (e indispensável à sobrevivência do planeta)...
Fotos (e legendas): © Abílio Duarte (2013). Todos os direitos reservados.
A. Eis os primeiros resultados (n=80) da nossa sondagem (*)
1. Totalmente falso >1 (1%)
2. Falso > 5 (6%)
3. Nem falso nem verdadeiro > 2 (2%)
4. Verdadeiro > 20 (25%)
5. Totalmente verdadeiro > 51 (63%)
6. Não sei / não tenho opinião > 1 (1%)
Votos apurados (até a meio da tarde de hoje) > 80
Dias que restam para votar > 4
B. Comentários que nos chegam de camaradas nossos (*)
(i) Valdemar Queiroz [ou Valdemar Silva]
[, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]
Nós, os PORTUGUESES, somos extraordinários.
Vejamos pequenos exemplos da rapaziada, na guerra, na Guiné.
E, então, aquela de fazer furos com a ponta duma bala (à mão, não exageremos), no fundo duma lata de coca-cola para, depois, adaptada a uma torneira, que tinha sido adaptada a um bidão de gasolina, servir de chuveiro numa banhoca ?!
E, então, aquela de (re)encher uma garrafa de cerveja (bebida muitas vezes quente) com petróleo e, depois, furar a carica para passar uma torcida que acesa dava luz pra ler, comer e, até, quando colocada dentro duma lata de compota de fruta vazia, com a tampa levantada para fazer reflexo, agarrada ao arame farpado servia de holofote pra escuridão da mata ?!
E, então, aquela do Spínola cortar as meias-mangas e, depois, adaptar uma falsa dobra no camuflado ?!
E, muito mais. Valdemar Queiroz
(ii) Helder Sousa [, ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72]
"Desenrascanço", "Imaginação", "Criatividade"....etc., o que quiserem.
Realmente essa capacidade de 'inventar', de encontrar uma solução para um problema, qualquer que fosse, foi, tem sido, uma espécie de 'marca distintiva' do que se pode entender por 'ser português'.
É claro que isso, parecendo (e sendo, muitas vezes) uma 'coisa boa', tem por detrás a outra face, ou seja, não se gastou tempo anteriormente a preparar, a estudar, a prevenir. Então sai 'improviso' e por sorte, por sapiência e/ou por 'protecção divina' muitas vezes 'deu certo'.
No entanto é possível que essa capacidade esteja a correr o risco de desaparecimento, com a 'uniformização' de critérios que tendem a dissipar as diferenças (culturais, regionais, até civilizacionais, etc.) que nos têm distinguido e que, em boa verdade, são o 'motor' dessa criatividade.
Como achega para a 'utlização imaginativa' do que íamos tendo à mão e que poderia, numa sociedade como a de agora, ser simplesmente desperdício ou, quando muito, colocado no 'amarelão', temos o aproveitamento das latas de coca-cola que, por sinal, não era comercializada na Metrópole...
O Valdemar já falou do aproveitamento para 'espalhador de chuveiro'. Também, pontualmente, serviram como elemento para colocação no chão a fim de o tornar mais transitável, à entrada dos quartos. Serviram de cinzeiro: de parede, colocadas deitadas, abertas longitudinalmente, ou ao alto com a 'boca' aberta. Também a utilizei como pequeno fogão para aquecimento: posicionada ao alto, com buraco lateral para colocação do álcool no fundo e servir de arejamento.
Abraço
Hélder S.
(iii) Anónimo J. Pereira da Costa
[Coronel de Art.ª Ref, ex-Alferes de Art.ª na CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-Capitão de Art.ª e CMDT das CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74]
Olá, camaradas
Antes de mais nada: o desenrascanço, o improviso são óptimoas mas elogiar o improviso em desprimor do que devia ser feito é estupidez e pobreza.
Por outras palavras:quem não tem cão caça com gato, mas o cão é que serve para caçar e por isso temos de o ter.
Infelizmente na Guiné nunca passámos da primeira parte e por isso, os improvisos tornaram-se cronicamente provisórios.
O "desenrascanço" implica várias qualidades: vontade de resolver sem esperar que a solução seja fornecida; imaginação; inteligência; leitura rápida das dificuldades e a certeza de que estamos sós na resolução das dificuldades.
Parece-me que os portugueses têm todas estas qualidades e é isso que faz deles exemplos a seguir.
Um Ab.
António J. P. Costa
(iv) José Botelho Colaço [ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65]
Inventar: Na vida civil a minha profissão foi técnico de máquinas e afinar as mesmas, então para os que trabalhavam mais directamente comigo a mina alcunha era o engenhocas... E por causa disso ficavam muito satisfeitos quando eu atendia os seus pedidos. Eu dizia-lhes: o problema não é meu isso. é com o mecânico de turno... Rresposta: não, vem tu ver por favor.
(v) Carlos Pinheiro [, ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro
de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70]
O desenrascatez-vous está no sangue dos portugueses e nós, naquela altura, éramos mesmo obrigados a desenrascarmo-nos.
Eu fui para a Guiné sozinho – em rendição individual – mas muito bem acompanhado. Era o BCAÇ 2856, era uma CPM, era um Pelotão não sei de quê e uma série de malta em rendição individual que tinha os seus destinos. Mas o meu era incerto. O Batalhão para onde eu ia, estava já a fazer as malas para regressar. Então mandaram-me aguardar, não sei o quê, nos Adidos. Nem uma cama tinha quanto mais um mosquiteiro. Passados três dias tinha uma cama, emprestada é certo, mas uma cama, na Companhia de Transportes aquartelada no QG. Desenrasquei-me, pronto.
Depois, porque também queria fazer alguma coisa, porque andar sempre desenfiado não dava jeito, apresentei-me ao Comandante do Destacamento do STM a oferecer-me para desempenhar funções da minha especialidade no Centro de Mensagens visto que já tinha alguma experiência adquirida em cerca de seis meses no QG da II RM – Tomar. A minha oferta foi aceite e passados poucos dias já ali estava a fazer o que tinha aprendido no RTm do Porto. Desenrasquei-me, pronto.
Nas viagens de cruzeiro, aí é que não me consegui desenrascar. Tive que gramar aquelas camas de suma a pau nos porões, tanto no UIGE para lá como no Carvalho Araújo para cá. Mas na viagem de regresso, sabendo antecipadamente que o Carvalho Araújo não tinha água nem para lavar o prato que nos deram quando subimos a bordo, quanto mais para tomarmos banho, desenrasquei-me no Depósito de Fardamento da Companhia onde consegui uma dúzia de camisas e de calções, visto que meias e roupa interior tinha suficiente, e todos os dias, às vezes mais do que uma vez, vestia roupa lavada num corpo suado, transpirado, seboso, mas vestia roupa lavada. Se isto não foi um desenrascanço, nem sei o que dizer.
Aliás, a malta dizia, vulgarmente, que a tropa mandava desenrascar e era isso que fazia sempre que era necessário. Nem mais nem menos.
Contar pormenores de desenrascanço no serviço, nem pensar. Era preciso tempo e paciência para contar a forma como se resolveu sempre tudo a tempo e horas.
_____________
Nota do editor:
(*) Vd. poste de 28 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13659: Sondagem: "Desenrascanço é uma qualidade nossa. Na Guiné demos boas provas disso"... Falso ou verdadeiro ? Totalmente falso ou totalmente verdadeiro ?
4 comentários:
Olá Camaradas
Esqueci-me de referir que este desenrascanço tinha como base um naipe de operários com boas qualificações profissionais obtidas na experiência da vida, nas oficinas e fábricas, onde só se podia começar a trabalhar aos 14 anos, mas que se se tivesse 13, com 12 já se começava a varrer a oficina e a levar calduços dos chefes e dos mais velhos.
Além das 4.ª classes bem tiradas...
Enfim, a "escola da vida" que muitos conheceram bem.
Foi assim que apareceu aquela viatura que não lembrava ao careca e que anda num destes últimos posts.
Era desta forma que se formaram os mecânicos da CArt.ª 1692 que, mesmo no "mato-malandro", receberam e montaram correctamente dois motores em dois unimogs 404. Os motores ainda vinham na caixa de madeira com o emblema da Mercedes e as viaturas ficaram a andar impecavelmente.
Coisas que hoje eram impossíveis...
Um Ab.
António J. P. Costa
Pois é.
António JP Costa tem inteira razão quando refere o tipo de escolaridade que se tinha naquela época e também a formação evolutiva da 'aprendizagem profissional'.
O exemplo dado com a questão da montagem dos motores é certíssimo.
É também por isto, pela forma como o ensino está hoje e pelo facto de não haver formação profissional (o que há é 'treta'), que também acho que a nossa 'capacidade intrínseca' para o desenrascanço está em dissipação.
Na verdade, a programações séria será sempre uma meta a atingir, mas.... se não houver 'desenrascanço', 'improviso' ou 'experimentação', não há criatividade, não há invenção.
Abraço
Hélder S.
Olá Camarada
Vou atirar-me para fora de pé.
Tenho para mim que a passagem do sistema de ensino para a mão das mulheres, quase em exclusivo, teve más consequências.
As escolas passaram a ser geridas por grupos de professora que estavam muito preocupadas em "modernizar" o ensino adoptando métodos e procedimentos burocrático-tecnológicos moderníssimos e evoluidíssimos que levaram a um "amaricar" do ensino.
É por isso que os putos sabem cada vez menos, a indisciplina é cada vez maior e a burocracia é uma das queixas dos(as) professores...
O resto foi consequência da evolução da sociedade.
Um Ab.
António J. P. Costa
PS: Oh Luís não aproveites para fazer um inquérito!
Sobre o desenrascanso o que me parece é que não está na cultura geral mas sim na cultura popular, na nossa geração saímos da escola outros nem à escola iam, e aqueles que não iam guardar gado, (como se dizia na altura ser ajuda do pastor) iam aprender um oficio desde pedreiro a carpinteiros mecânicos etc, e daí também se formaram alguns técnicos e engenheiros de alto gabarito a trabalhar de dia e estudar à noite.
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