segunda-feira, 13 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14873: Notas de leitura (736): “Guerra d’África, 1961-1974, Estava a guerra perdida?”, por Humberto Nuno de Oliveira e João José Brandão Ferreira, Fronteira do Caos, 2015 (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Julho de 2015:

Queridos amigos,
O nacionalismo radical trata o fim do Império como um processo de traição, de abandono, o zénite da derrisão dos valores da nação. Neste livreco, feito de um amontoado de considerações sem consistência histórica e de respostas de valor muito desequilibrado, o leitor tem oportunidade de ver como se procura o sensacionalismo publicando textos que vêm em todos os blogues, nunca se consentindo no contraditório, nunca se confrontando o cenário internacional com os ideários do regime deposto.
Há para ali uma enorme saudade do tempo em que Henrique Galvão, a propósito da I Exposição Colonial, se realizou em 1934 no Porto, publicou o mapa "Portugal não é um país pequeno", em que se enchia a Europa com Angola, Moçambique e outros espaços coloniais. Enfim, a "questão fraturante" permanece mas já não se pode esconder o vazio ideológico de quem promove a sustentabilidade da guerra como a suprema nostalgia do império que desapareceu.

Um abraço do
Mário


Mitos e enganos sobre o fim do Império Colonial português (2)

Beja Santos

É preciso ler do princípio ao fim “Guerra d’África, 1961-1974, Estava a guerra perdida?”, com prefácio de Jaime Nogueira Pinto, por Humberto Nuno de Oliveira e João José Brandão Ferreira, Fronteira do Caos, 2015, para se perceber a orfandade ideológica destes expoentes do nacionalismo radical que brandem a argumentação de que a guerra de África estava ali para durar, não havia qualquer inevitabilidade de derrota, o que houve foi um certo desfalecimento de alguns oficiais a que se juntou o envenenamento ideológico trazido pelos oficiais milicianos, daí o desastre do fim do Império e as suas tremendas sequelas.

É um livro mal alinhavado, para dar um ar de seriedade resolveram lançar uma pergunta em mau português a uma série de oficiais e dois civis, nestes termos: “Na sua perspetiva, considera que as operações anti-subversivas e de contraguerrilha desenvolvidas em Angola, Guiné e Moçambique, em defesa da soberania portuguesa sobre aqueles territórios e populações que viviam há seculos debaixo da bandeira das Quinas, estava militarmente perdida?”.

Nas respostas há de tudo, como na botica. Não estava perdida nem estava ganha, o importante era que o poder político encontrasse uma solução política (não se diz qual, aduz-se que servisse para terminar o conflito, sabe-se lá se incorporando todo o corpo de guerrilha nas forças armadas locais…) dizem uns. Há respondentes que não confundiram a nuvem com a floresta, equacionaram a evolução da guerra com o contexto internacional e a mentalidade da sociedade portuguesa. O Coronel Moura Calheiros recorda que também havia um cenário interno e elenca as suas razões: o entusiasmo inicial da população pela defesa do Ultramar foi-se desvanecendo; esta falta de entusiasmo, mesmo de fadiga, teve consequências nos quadros das Forças Armadas; a preparação das tropas que partiam para África era cada vez mais deficiente; o caso mais influente era o que ocorria nas universidades, aqui o ambiente era de intensa e permanente propaganda contra a guerra em África e a favor da “independência para as colónias”. E conclui: “Não vejo como seria possível manter, a partir de 10 a 15 anos da nossa data de referência, a política relativa ao Ultramar seguida pelo governo de então. É que não haveria cidadãos com capacidade para a governação do país que não estivessem afetados e bem doutrinados pelas lutas estudantis. Toda ou, no mínimo, a esmagadora maioria da população portuguesa com formação académica estava doutrinada contra a guerra no Ultramar”.
Nesta mesma linha discorre Adriano Moreira quando diz: “Da minha observação, e não de escutar outros, a guerra, em 74, como tal não estava perdida: mas estava ultrapassado pela população o conhecimento histórico do Ultramar pelo conhecimento adquirido da realidade ultramarina, acrescendo o cansaço da juventude, a fadiga das tropas incluindo a articulação dos estatutos entre profissionais e milicianos; por isso, em relação ao Ultramar, o movimento que assumiu o controlo das forças militares, pôs um ponto final na guerra, porque o ambicionado e prometido tempo para encontrar soluções políticas, que foram desencadeadas e interrompidas, foi por ele dado por esgotado. Não teve programa de descolonização”.

Há respondentes que pretendem trazer originalidades históricas. É o caso do Tenente-General José Vizela Cardoso que nos vem falar das orientações acordadas no Pacto de Paris (subscrito por Álvaro Cunhal e Mário Soares, numa quinta-feira, a 27 de Setembro de 1973, e que não estavam preconizadas no programa do MFA. Fico absolutamente seguro que esta descoberta irá revolucionar toda a investigação sobre as origens do 25 de Abril e o processo de descolonização.
O Coronel Caçorino Dias também traz revelações que poderão levar a estudos edificantes. Por exemplo, quando diz: “A maioria dos cozinheiros das unidades militares eram autóctones, mas nunca se registou um caso de envenenamento; não há memória de um soldado ter sido assassinado, ou de ter ocorrido um rapto de um familiar de um militar. Os militares movimentavam-se por todo o lado, à vontade, mesmo nos bairros tidos por mais problemáticos. Nem lhes passava pela cabeça que se lhes fizessem mal”.
Um outro respondente, o Tenente-General José Francisco Nico, apresenta nas suas conclusões o seguinte: “Não se pode afirmar que a derrota de Portugal, concretizada internamente no 25 de Abril foi uma vitória dos movimentos de libertação como é voz da opinião pouco informada e esclarecida. Os movimentos de libertação sem todo o apoio político, militar, financeiro, de espaço e em material que foram recebendo dos outros subsistemas nunca teriam alcançado o seu objetivo. No entanto, é preciso reconhecer que o sistema adversário necessitava da ação dos movimentos de libertação para conferir dinâmica ao processo e dar-lhe visibilidade na opinião pública”. Branco é, galinha o põe.

O Coronel Raúl Folques, experimentado combatente, e que comandou o Batalhão de Comandos da Guiné, sobretudo na operação “Neve Gelada”, em que se capturou ao PAIGC uma bateria de morteiros 120, afirma o seguinte: “Considero que o PAIGC, em 1973/74, tinha muita dificuldade em recrutar combatentes, sendo certo que muitos dos guerrilheiro capturados ou abatidos eram já veteranos, homens calejados na guerra e muito experientes. Pelas razões apontadas, é minha opinião que a guerra estava longe de se poder considerar, em termos militares, perdida. O fator principal que jogava contra nós e que era significativo era a desmotivação que grassava nalguns quadros e o facto do poder executivo não ter conseguido revitalizar o esforço de guerra”.

Os ultranacionalistas continuam apegados a fórmulas fanatizadas, com especial relevo para a existência de um Império multisecular, para a agressão dos terroristas, etc. Louvam encomiasticamente o comportamento do soldado português como se alguma vez o seu denodo tivesse sido posto em causa. Nunca utilizam o contraditório, citam os seus autores de confiança, promovem a efabulação da sustentabilidade da guerra desviando o olhar de cruéis realidades como a própria crise económica que se instalara em Portugal e que se saldava numa inflação superior a 30% no primeiro trimestre de 1974. É possível que nunca venhamos a saber as motivações de fundo que levaram Caetano à mesa das negociações com o PAIGC e a incitar Santos e Castro e Jorge Jardim a promoverem independências brancas. É dentro desta indigência ideológica que os nacionalistas radicais se comprazem, exultantes, promovendo falsa História com o pretexto de que predomina a historiografia dos vitoriosos do 25 de Abril, o que eles chamam uma historiografia vesga que insiste em glorificar desertores…
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Nota do editor

Último poste da série de 10 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14859: Notas de leitura (735): “Guerra d’África, 1961-1974, Estava a guerra perdida?”, por Humberto Nuno de Oliveira e João José Brandão Ferreira, Fronteira do Caos, 2015 (1) (Mário Beja Santos)

3 comentários:

Anónimo disse...

Pois é Uns mais portugueses do que os outros.Uns mais amigos do povo da Guiné do que os outros.E assim por diante.O "juiz" Mário reduz o livro a livreco e a um amontoado de dichotes e mete todos os intervenientes no mesmo cesto.Quer tenham dado
o corpo ao manifesto nos teatros de operações ou não.Mesmo que tb tenham arriscado a
vida numa "geringonça voadora" ao serviço dos seus camaradas.Porque felizmente parece-me que dada a sua superioridade física e intelectual, nunca precisou de tais serviços.Ainda bem.E espero não ser julgado por este pequeno comentário porventura falho de virgulas ou outros(Mas o Saramago também falhava algumas).Carlos Gaspar

Carlos Vinhal disse...

Foram eliminados dois comentários anónimos.
Carlos Vinhal
Co-editor

Antº Rosinha disse...

Todos os africanos brancos pretos ou mestiços queriam a sua independência.

Mas em nenhuma colónia queriam qualquer daqueles movimentos.

Havia apenas minorias extremamente divididas a lutarem separadamente e até tribalmente e regionalmente.

E estes mobilizaram ajudas "anti-colonialistas" estranhas ao seus problemas. (ONU, URSS, CUBA,USA e outros amiguinhos dos africanos.

Enfim até desistirmos, contra vontade de muitos daqueles povos africanos que nunca pensaram que desistíssemos tão facilmente. (perguntem aos velhos africanos dos poucos que ainda restam, como eu perguntei e verão a opinião deles, que é essa que interessava)

Foram-se os aneis, ficaram aquelas fronteiras, e já não foi mau de todo.

Esperemos que Bissau nunca se venha "acasamansebar"

Talvez se pudesse ter resolvido o nosso problema, sem qualquer luta, não o dos africanos, se Salazar tem organizado uma ponte aérea e marítima Luanda-Lisboa em 1961, "para o puto e em força".

Mas o botas de Santa Comba, até o dinheiro angolar decretou sem qualquer valor para a malta branca não dar corda aos sapatos.

Mas porque não desistimos quando ele caíu da cadeira?