Foto nº 1 A > Inauguração pelo Gen Spínola de uma nova escola em Nova Lamego: Adelaide Barata Carrelo é a menina branca que segurava a fita numa ponta (enquanto uma menina negra segurava a outra ponta)
Foto nº 1 > Spínola, em primeiro plano, enquanto a menina branca olha, muito atenta, para ele...
Foto nº 2A > Tenente Barata
Foto nº 2 > Tenente Barata
Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova Lamego > 1970
Fotos: © Adelaide Barata Carrêlo (2016). Todos os direitos reservados.
1. Mensagem de Adelaide Carrêlo, nossa leitora, filha do tenente Barata que, presumimos, pertencia à CCS do batalhão que estava em Nova Lamego em 1970, o BCAÇ 2893 (1969/71) (e que sofreu uma forte flagelação em 15/11/1970)
De: Adelaide Carrelo
Data: 8 de julho de 2016 às 14:16
Assunto: Guiné Bissau - Nova Lamego
Boa tarde,
Tendo tido conhecimento do vosso blog, é com grande satisfação que gostaria de partilhar convosco a minha vivência nesta terra que me acompanhou durante mais de 40 anos.
Em 1970 aterrámos em Bissau onde o meu pai nos esperava ansiosamente, seguimos alguns dias depois para Nova Lamego onde ele estava colocado.
Eu tinha 7 anos, sou gémea com uma irmã e tenho um irmão mais velho 1 ano. Somos a família Barata.
Quando chegou a hora dos meus pais decidirem juntar-se naquela terra, não conseguiram convencer-nos de que poderíamos separar-nos, não, fomos também. E até hoje agradeço por ter conhecido gente tão bonita, tão pura.
As primeiras letras da cartilha, foram-me desenhadas pelo Prof. José Gomes, na Escola que hoje se chama Caetano Semedo.
Aquele cheiro, a natureza comandada pelo calor húmido que sufoca e a chuva que cai como uma cascata sobre a pele e o cabelo que teima em não se infiltrar...cheguei a pedir à minha mãe para me deixar correr como aqueles meninos que se ensaboavam no meio da rua e com um chuveiro gigante que deitava tanta água de pingos grossos e doces.
Também me lembro de quem lá ficou para sempre, não éramos muitos.
Tantas lembranças que me acompanharam toda a minha vida e eis que em 2015 o meu filho, foi trabalhar para a Tese em Bafatá, uma ONGD (energias renováveis) e eu voltei lá, agora com a possibilidade de visitar tudo, foi a viagem da minha vida.
O reencontro com gente que parece ter ficado à nossa espera este tempo todo.
É com amor que falo desta terra, desta gente e aqui fica o que sinto:
"As mãos de deus
Estas mãos escavam afectos,
que nos prendem o coração,
são as mesmas que aparam as crianças que nascem e vivem nuas,
Numa nudez de bens, mas uma capacidade infinita de sofrer, sorrir e amar.
Uma mão que se ergue no meio da terra vermelha
e acena até ao dia em que nos encontramos.
Esta capacidade infinita de sonhar que há uma terra melhor e um sonho maior.
Terra vermelha quente e de paz,
lugar onde tive medo, fui feliz e vivi
amar-te-ei sempre,
minha Guiné menina velha encantada."
Adelaide Barata Carrêlo
PS -E como não podia deixar de ser, anexo uma fotografia do meu pai, na altura Tenente Barata (foto nº 2) e uma foto minha (foto nº 1) na inauguração de outra escola em Nova Lamego (na qual eu fui a menina branca a pegar na fita segura do outro lado por uma menina preta, que se vê perto de mim) para o Gen António Spínola cortar, como era habitual!!!
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Nota do editor:
10 comentários:
Adelaide, foi das coisas mais lindas que temos editado nos últimos tempos. Essa capacidade de maravilhamento só pode ser de quem guarda, numa caixinha especial da memória, todas as cores, sabores e cheiros da Guiné, do tempo da infância. Fica deste já convidade para se sentar à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande. Trataremos depois dos pormenores!... Um abraço fratermo.LÇuis Graça
Amiga Adelaide,
Obrigado pelas bonitas palavras dirigidas a nossa sofrida Guine, que Deus te proteja e guarde por muitos anos para poderes voltar a pisar esta terra vermelha da tua infancia feliz e motivo de todas as saudades que engrandecem o teu grande coracao de mulher.
O sentimento que tenho agora, como homem maduro e que acompanhou as vicissitudes e peripecias desta terra desde a infancia, eh que o Gen. Spinola queria fazer na Guine o mesmo que, mais tarde, o Nelson Mandela fez na Africa de Sul, isto eh uma nacao arco-iris, onde o mais importante nao seria a origem das pessoas nem a cor da pele. Por diversas, que agora nao interessa invocar, nao resultou, paciencia.
Um fraterno abraco para ti e a todos os amigos da Guine.
Cherno AB
Um dia tinha que ser.
Estava escrito, só não tinha sido ainda a altura certa.
Obrigado.
BS
'...meninos que se ensaboavam no meio da rua e com um chuveiro gigante que deitava tanta água de pingos grossos e doces.'
Que maravilhosa descrição, amiga Adelaide.
Abraço fraterno
Valdemar Queiroz
Amiga Adelaide
O seu testemunho é LINDO...
A minha filha Luísa faz hoje 45 anos...
Que prenda tão forte para o pai... Obrigado.
Jorge Rosales (farda amarela)
*recisava que alguém me comfirmasse se conheceu o tenente Barata e se ele pertencia à CCS do batalhão que estava em Nova Lamego em 1970, o BCAÇ 2893 (1969/71). Se sim, a nossa Adelaide (e irmãos) devem ter tido o seu "baptismo de fogo" na nouite de 15/11/1970, quanod Nova Lamgeo soufreu uma flagelação de 35 minutos em que morreram diversos miloiatres e civis:
(...) GRUPO INIMIGO, CONSTITUÍDO APROXIMADAMENTE POR 150 ELEMENTOS, FLAGELOU NOVA LAMEGO DURANTE 35 MINUTOS, COM FOGO DE 4 MORTEIROS 82 (CERCA DE 122 GRANADAS) E ARMAS LIGEIRAS, CAUSANDO ÀS NT 3 MORTOS (1 SARG.), 4 FERIDOS GRAVES (1 MILÍCIA) E 8 LIGEIROS; A POPULAÇÃO SOFREU 8 MORTOS, 50 FERIDOS GRAVES, 30 LIGEIROS. AS NT REAGIRAM COM FOGO DE MORTEIRO 81 E DE CAN / S / R, MANOBRA DE ENVOLVIMENTO E PERSEGUIÇÃO, APOIADAS PELA FAP, CAUSANDO AO IN BAIXAS PROVÁVEIS; ARTª CABUCA E PICHE BATERAM COM FOGO DE OBUS PROVÁVEIS ITINERÁRIOS DE RETIRADA DO IN. (...)
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2006/10/guin-6374-p1160-lembranas-de-nova.html
Quem pode descrever bem esse dia/noite, é o meu camarada F.Mil. Aurélio Duarte, que esteve no meio dessa total confusão, e ainda teve um processo disciplinar em cima
Felizmente safou-se militarmente e disciplinarmente, mas o cagaço, não foi pequeno.em Maio no nosso almoço anual, ele relembrou aquelas horas, pois estava emboscado na estrada, de Nova Lamego para Piche, e segundo ele turra era mato.
Adelaide Carrelo
11 mjul 2016 14:43
Boa tarde,
Agradeço de coração todas as palavras que me foram dirigidas.
Em relação ao que escrevi, na parte " (...)Também me lembro de quem lá ficou para sempre, não éramos muitos" e " Lugar onde tive medo, fui feliz e vivi(...), referíamos à trágica noite de 15 de Novembro de 1970. Ficou também por contar; e que se me permite; o farei brevemente.
Obrigada mais uma vez, pelo convite para me sentar convosco à sombra do poilão da vossa querida Tabanca Grande.
Um abraço apertado
Adelaide
Sou o Constantino Neves, mais conhecido na Tabanca como Tino Neves.
Era o 1º Cabo Escriturário do Comandante da CCS/BCaç. 2893, por esse facto confirmo que conheci, aliás tive o enorme prazer de conhecer o NOSSO Tenente BARATA, que era o Oficial da Secretaria do Batalhão, que mais tarde foi substituído por outro Oficial, devido a doença.
Organizei 8 Encontros/Convivio ao nivel do Batalhão, e comecei do ZERO nas pesquisas dos contactos e nunca consegui o seu contacto, e por essa razão aproveito a oportunidade para lhe pedir o contacto, para futuros Convívios.
E estive também nesse dia/noite fatídico em que celebrava-mos um ano de comissão
Quero também expressar-lhe a minha gratidão, porque é para mim uma grande satisfação saber de alguém da família de um camarada da minha Companhia (CCS) de quem gostava-mos muito era uma jóia de pessoa todo o mundo o adorava.
Bem aja
Um Abraço
Tino Neves
Adelaide Carrelo
13 jul 2016 10:52
Bom dia Constantino,
A gratidão é toda minha por saber que fez parte da vida do meu pai e pelas palavras com que o descreveu, claro que a minha alegria só se podia manifestar em lágrimas, lágrimas de alegria, orgulho e saudade.
Obrigada, muito Obrigada Constantino.
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