domingo, 5 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 – P22783: Agenda cultural (793): Aldeia Nova de São Bento - Memórias, Estórias e Gentes, 10º livro do José Saúde: sessão de lançamento, 11/12/2021, 15h00, Vila Nova de São Bento. Apresentação do prof David Monge da Silva.

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem: 

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Aldeia Nova de São Bento - Memórias, Estórias e Gentes 

Camaradas,

A vida é, no fundo, uma encruzilhada de eternas emoções. Palmilhamos um caminho, que já vai longo, e dele recolhemos eternas e saudosas recordações. Não pretendo, e muito menos desejo entrar para um campo armadilhado onde o imprevisto era uma constante nos nossos recuados tempos de uma Guiné a ferro e fogo. Mas, reviver memórias que passam simplesmente pelo trilho de uma terra que um dia me viu nascer e que mais tarde me consumirá na eternidade.


Vou lançar o meu décimo livro no próximo dia 11 de dezembro, 15h00, no Cine Teatro Municipal Maria Lamas, Avenida da Liberdade, na minha terra e cujo título é: “Aldeia Nova de São Bento – Memórias, Estórias e Gentes”. Uma obra que cruza gerações e onde explanei-o temáticas diversificadas.

Aliás, nesta obra, que se estende pelas suas 299 páginas, relato a origem da localidade e os povos que lhe deram o nome em plena guerra da Restauração de 1640 (que durou 60 anos) aquando a dinastia dos Filipes se apoderou no nosso reino, das suas festividades mais marcantes (Festa do Círio e das Santas Cruzes, nomeadamente), assim como da sua originalidade, ou a forma que a história as relata, a antiga feira anual, em setembro (1, 2 e 3), gentes que marcaram a localidade, as antigas profissões, de pessoas simples que ficarão memorizadas na terra, os costumes da aldeia, as virtualidades dos mestres, o início do seu futebol, 1923 e o seu processo evolutivo, enfim, um conjunto de situações que nos leva a viajar no tempo, onde ressalta o êxodo rural para os grandes centros populacionais, Lisboa e os seus arredores assumindo-se como ponto fulcral, as “carradas” de famílias que diariamente deixavam a terra que os vira nascer em procura de uma vida melhor, da emigração, conterrâneos que partiam a salto para países que lhe proporcionavam um futuro mais risonho, o contrabando, ou do uivar dos lobos, as lutas politicas dos trabalhadores rurais, o Cante Alentejano elevado ao ponto mais alto, Património Cultural Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) a 27 de novembro de 2014 numa reunião do Comité em Paris, os jogos da minha infância, os amigos, as conversas dos mais velhos, mulheres e homens sábios que profetizavam o tempo e as culturas no campo, os petiscos, o tempo da miséria, o tempo das crianças com os pés descalços, enfim, um quase interminável número de circunstância a que propus e deixarei escrito para o meu povo.

E eis que a obra relata, também, os mortos nas três frentes na antiga guerra Colonial – Angola, Moçambique e Guiné – oriundos de Aldeia Nova de São Bento. Deixo-vos, pois, um curto texto sobre os moços que faleceram na guerra ultramarina.

XIII 
Mortos na guerra colonial originários da aldeia

Curvo-me perante a sensibilidade que me vai na alma, porque foi uma evidente e indesmentível realidade, que nos três palcos de guerra – Angola, Moçambique e Guiné – foram muitos os conterrâneos que pisaram o palco da peleja africana. Uma guerra que teve o seu começo em Angola, em 1961, e terminou com o 25 de Abril de 1974. Um acontecimento estigmatizado que, aliás, terá sido o mais marcante da sociedade portuguesa no Séc. XX e que atravessou várias gerações. Eu, tal como muitos amigos da aldeia, fui combatente na Guiné e conheci os horrores da guerra e o tempo de paz. Aliás, no meu livro, o nono, “Um Ranger na Guerra Colonial Guiné-Bissau 1973/74”, fica explícito a dimensão de uma peleja que não deu tréguas.

……………………………………………

Desse lote de “miúdos” que um dia partiram para um palco deveras adverso e que para eles lhes era de todo desconhecido dado que não possuindo o mínimo de saberes sobre o fatídico conflito, “carne para canhão” como se alcunhavam os antigos combatentes, centralizo esta curta descrição naqueles moços, então nossos amigos e companheiros, alguns dos bancos da escola, que encontraram a morte na azarenta guerra do Ultramar: António Inácio Guerreiro, Bento Rebocho da Silva, Bento Valente Pica, Francisco Laneiro Rodrigues, João Pica Monteiro, Joaquim Soares dos Reis, José Francisco Vitória (A-do-Pinto), José Luís Evaristo, José Valente Morais e Luís Batista Gomes.

II 
Recordando as nossas reminiscências de menino 
Memórias dos anos de 1950 
Pequeno texto que refere a época em que vivemos: o Natal

Na época de Natal, faziam-se os presépios. Os rapazes iam ao musgo das árvores e preparavam o seu presépio. Uma prata formava o lago. E lá estavam os Reis Magos, a Sagrada Família, os pastores com os seus rebanhos, o moinho, o regato de água e o algodão para simula a queda de neve.
As noites invernosas não eram nada convidativas. A família reunia-se em volta da lareira. Um lume feito no chão aconchegava a totalidade dos elementos familiares. Depois lá vinham as histórias mirabolantes contadas para a imaginação das crianças tentarem desdenhar. Noutros casos, surgia uma anedota ou uma brincadeira de ocasião.
Pelo meio do imprevisto, e de uma amena cavaqueira, a chuva batia compulsivamente num constrangido teto feito de telhas de barro assentes em canas vindas de um barranco próximo, ou de um local húmido das redondezas do povoado. Valia o calor emanado das labaredas e o sempre sonhado colo da mãe. E quando as noitadas se prolongavam para horas que iam para além do comum, eu, docilmente, adormecia no regaço de minha mãe.
Meu pai era um homem do campo. Conhecia os adágios populares. Vivia permanentemente na sombra dos ditos que diziam comandar a lida dos trabalhos futuros que a própria natureza decidia. Tudo em prol da labuta seguinte. Os sinais emanados da lua, ou do astro, assim como as mudanças do vento, ditavam afazeres futuros. O cheiro do enxofre trazido pelo vento do minério arrancado às entranhas da terra proveniente da Mina de São Domingos, aglomerado populacional próximo da aldeia, trazia odores que intrinsecamente se associavam às eventuais calamidades, a chuva que estava para chegar, ou a temperatura no quente verão que ia subir. Conhecer os sinais do tempo era uma prioridade para o homem desenhar as suas tarefas seguintes.

Camaradas, e é neste permanente deambular pelo mundo da escrita, a minha praia, que a memória, já usada, continua a vaguear, mas até um dia que a mente o permita.


Um abraço, camaradas
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
___________

Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em: 

 3 DE DEZEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22777: Agenda cultural (792): Apresentação do livro "Cartas de Amor e de Dor", de Marta Martins Silva, a cargo do Gen Pedro Pezarat Correia, dia 7 de Dezembro, às 18h30 na FNAC Colombo

3 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O Zé Saúde escreveu, no "Diário do Alentejo, de 25/9/2020, o seguinte sobre o prof David Manuel Monge da Silva (que, no dia 11 do corrente, vai apresentar o seu, do Zé, 10º
livro, na terra de ambos):

Opinião > Monge da Silva

José Saúde, jornalista
25 de setembro 2020 - 10:15

Diário do Alentejo
https://diariodoalentejo.pt/pt/10675/monge-da-silva.aspx


No rol de dificuldades com que o escriba amiúde se confronta, e as voltas que a lei da vida lhe permite dar, insistimos em arquitetar textos que facultam enaltecer nobres personagens que o mundo do desporto coloca na sua cúpula. Da nossa cândida região, Baixo Alentejo, têm saído individualidades que o cosmos desportivo perpetuamente recordará. Falo, com elevação e dignidade, de David Manuel Monge da Silva, nascido em Aldeia Nova de São Bento a 18 de novembro de 1947.

O seu currículo é, de facto, invejável. Recordo, quando éramos jovens estudantes, passarmos as chamadas férias grandes na nossa aldeia e as tardes dos futebóis no Rossio, lugar onde se realizava a então feira anual de setembro. Recordo-me dos desafios, sim desafios porque se tratava de jogos particulares em que o Atlético convidava, ou era convidado para defrontar equipas de localidades vizinhas. Recordo-me de, aquando de uma espontânea visita à terra que me vira nascer, assistir aos jogos no campeonato distrital de Beja da antiga FNAT, hoje Inatel, e o David apresentar-se seguro na função de capitão de equipa.

Mais tarde, finais de setembro de 1974, organizámos um dérbi em Ficalho e essa foi, inesquecivelmente, a essência para colocar o Atlético Aldenovense nas competições seniores da Associação de Futebol de Beja. Expor-me em trazer à ribalta o percurso de Monge da Silva é, quiçá, um risco elevado. Licenciado em Educação Física pelo INEF, Lisboa, curso que terminou em 1970, Monge da Silva exercitou a sua arte em estabelecimentos de ensino oficiais, transitando, ‘a posteriori’, para o futebol profissional.

Selecionou no Instituto Superior de Educação Física a teoria da metodologia do treino, desempenhando, ainda, o cargo de coordenador do Gabinete de Metodologia do Instituto Nacional de Desporto. A 21 de janeiro de 1980, a direção do Sport Lisboa e Benfica contratou-o como preparador físico da equipa. Iniciou-se no Estádio da Luz com o treinador Mário Wilson, seguindo-se Lajos Baroti, numa época em que o Benfica conquistou o campeonato, a Taça de Portugal e a supertaça. Estudioso do treino desportivo, bem como de todo o caráter metodológico, o professor ganhou fama, sendo que a sua exímia experiência regista passagens pelo Vitória de Setúbal, Portimonense, Belenenses e Estrela da Amadora.

Foi professor universitário de história de desporto da Universidade Autónoma de Lisboa, para além de passagens por outras modalidades, designadamente nas seleções de futebol, judo, andebol, halterofilismo e hóquei em patins, sendo autor de várias obras e palestras na área desportiva.

Monge da Silva foi, é e será uma personalidade muito estimada, não só a nível nacional como internacional e requisitado para opinar profundos conhecimentos pelos “quatro cantos” do mundo. O nome de Monge da Silva ficará, exclusivamente, ligado à evolução do treino em Portugal, sendo também o autor do prefácio do livro “Aldenovense Foot-Ball Club ao Aldenovense Atlético Clube 1923/2016”, da autoria deste já usado contador de histórias desportivas.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Grande ronco, Zé. Tenho pena de não te poder fazer companhia no dia 11. Jogas, como sempre em casa, o que faz alguma diferença, como sabes, sendo tu também um homem da bola... Boa festa, e bom Natal de 2021!... Para ti, todos os teus, e demais amigos e conterrâneos.

Valdemar Silva disse...

Zé Saúde sempre a presentear-nos com os seus textos "rendilhados" que fazem lembrar peças de filigrana Vianense.
Em tempos, quando falei com o meu amigo Manel Macias ex-fur.mil. do meu Pelotão e natural, também, de Aldeia Nova de São Bento, coloquei-lhe a questão de terem mudado o nome da terra, apenas por a mesma ter subido a Vila e por isso passou a Vila Nova de São Bento.
Foram os de lá que assim quiseram, respondeu-me o Macias.
Neste caso, que não é único, trata-se de um topónimo no seu conjunto e não propriamente duma localidade com pouca população, que até quando passou a Vila tinha menos habitantes de quando durante anos foi Aldeia. e bem podia ter mudado para Vila de São Bento, que de "Nova" já não se tratava propriamente.
Mas os seus habitantes é que sabem e eu não tenho nada a ver com isso.
Com o andar dos tempos qualquer dia será Cidade Nova de São Bento, sabe-se lá, pese embora o gentílico continue a ser Aldenovenses ou Aldeanovenses e a moda (adaptada) a ser
"Lá vai Serpa, lá vai Moura
E as Pias ficam no meio
Em chegando a Aldeia Nova
Não há que havera receio"

Abraço e saúde
Valdemar Queiroz