sábado, 18 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24152: Os nossos seres, saberes e lazeres (561): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (94): Da bela Tavira a uma exposição sobre a Ordem de Cristo em Castro Marim, com José Cutileiro em pano de fundo (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Março de 2023:

Queridos amigos,
Devido a uma colaboração permanente que levo no jornal "O Templário", de Tomar, procuro inteirar-me da história da Ordem de Cristo, sucessora da do Templo. D. Dinis foi de uma grande habilidade diplomática, estabeleceu acordos com os outros Estados ibéricos no sentido de não permitir quaisquer desvios dos bens patrimoniais templários. Alegou a Roma que necessitava de uma Ordem de guerreiros monges destinados a travar, a fazer recuar e mesmo a erradicar inimigos da Cristandade, justificando os permanentes assédios sarracenos e magrebinos nas costas algarvias, e a existência do Reino de Granada, marcadamente hostil. A nova ordem foi aprovada e sediou-se por mais de três décadas em Castro Marim, em meados do século já estava implantada em Tomar, será aqui, na Administração do Infante D. Henrique, que a Ordem e os seus bens terão um papel chave na primeira etapa dos Descobrimentos. Como veremos adiante, Castro Marim tem muito para contar sobre o seu primeiro período da existência, como esta interessantíssima exposição revela.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (94):
Da bela Tavira a uma exposição sobre a Ordem de Cristo em Castro Marim, com José Cutileiro em pano de fundo (1)


Mário Beja Santos

É bom ter amigos em Tavira e que nos acolhem admiravelmente, sempre solícitos a mostrar as mudanças, algumas que nos enternecem muito, há para ali intervenções patrimoniais que nos merecem muito respeito, outras não tanto, derrubou-se o velho cinema e alterando completamente a escala está a erguer-se mais um daqueles centros culturais para encher o olho, cirandando à volta das muralhas (Tavira vista do jardim do castelo é um desafogo panorâmico, por ali se pode ver o ADN de um lugar por onde se cruzaram tais e tantas civilizações) fiquei de boca aberta a ver junto a um belo pano de muralha um calhamaço que seguramente vai ser hotel ou apartamento luxuoso, continuo a não entender os maltratos à volta de monumentos nacionais, é-me inexplicável esta ganância, este gosto pela ostentação, roubando aos munícipes e aos visitantes vistas de alto valor histórico – e chamam a isto progresso.
É bom caminhar por estas ruas antigas, indo conversando com amigos quanto aos propósitos desta visita que incluem Castro Marim, lá no castelo, dentro de um templo religioso, que já deixou de o ser, consta uma exposição sobre a história da Ordem de Cristo naquele ponto no então Reino do Algarve, lá iremos seguidamente, primeiro matar saudades de Tavira, visitar inclusivamente aquelas lojas de ajuda humanitária a que se entregam sobretudo os ingleses, metem para ali objetos que nas suas casas perderam préstimo, quem compra, compra barato, e as receitas do mealheiro são para ajudar quem precisa, dali saio alegre e feliz com um bom número de discos de música clássica comprado à pataco.
Pois bem, vamos subir ao jardim do castelo, é um dos pontos mais aprazíveis para ver o que se passa em Tavira e arredores.

Um dos aspetos que mais me atraem é esta circunvizinhança habitacional, paredes meias com o castelo, não sei se os historiadores se arrepiam com esta vista, sinto-me bem com este edificado, estes telhados de quatro águas, esta intimidade que não consigo ver como intrusão, embora admita que nos dias de hoje que por razão de tal plano levaria à queda de uma idealidade…
É inverno, mas há para aqui uma planta a enfeitar a pérgola, ninguém me disse exatamente o seu nome, facto é que quem anda por este jardim se delicia com a vista de tal florescência em tempos de flora adormecida. Que encanto para os olhos!
Uma vista de Tavira e logo nos ocorre a civilização árabe, o olhar espraia-se até ao fundo, ali espreita o oceano e bem perto podemo-nos encantar com o que oferece a Ria Formosa.
Há um hotel em Tavira que tem no subterrâneo vestígios de um bairro almóada, imagine-se, tudo agora bem preservado, pede-se licença na receção e lá ingressamos no mundo árabe, ou suas reminiscências (há aqui vestígios de trocas comerciais posteriores), o que há para ver é frugal, mas está altamente preservado. Aqui está a memória do trabalho arqueológico, depois de concluído deu-se vida ao hotel.
O que temos aqui são os achados arqueológicos e a organização do espaço, o que resta de um lugar que foi habitado por gente almóada, sabe-se lá o que depois aconteceu, ficaram estas estruturas e algumas lembranças daquilo a que nós pomposamente chamamos a civilização árabe e o que depois dela sobreviveu.
De Castro Marim olhando as salinas e a agricultura na orla do barrocal
Era um dia claro, temperatura amena, mas, de súbito, apareceram nuvens encasteladas no horizonte, a luz perdeu um certo brilho, mas aquele céu um tanto atemorizante prendeu a atenção de quem o fotografou… e o produto final não o desiludiu.
O Forte de S. Sebastião (ponto culminante da vigilância contra eventuais intrusões espanholas, na Guerra da Restauração) e um pormenor do centro da vila de Castro Marim, imagem tirada do castelo.
Uma vitrina do Núcleo Arqueológico do Castelo de Castro Marim
Outro pormenor das salinas entre o castelo e a garridice das cores do casario à sua beira
Já estou no Castelo de Castro Marim, é um ponto alto de uma colina que é sobranceira ao Guadiana, aqui em 1319 houve sede da Ordem de Cristo, graças aos esforços diplomáticos de D. Dinis, socorreu-se de alianças ibéricas para não deixar de sair o rico património da Ordem do Templo, depois daquele miserável processo movido aos monges guerreiros que tinham fortunas, que emprestavam dinheiro a reis e que pagaram bem caro o serviço que prestaram à Cristandade no seu tempo. O monarca justificou a razão de ser desta Ordem aqui em Castro Marim dando razões compreensíveis, o Reino de Granada na vizinhança e a pirataria magrebina a encher de pânico a costa algarvia. Foi sede durante décadas (até 1356), depois seguiu para Tomar. Frente a este castelo está o Forte de S. Sebastião, desempenhou o seu papel na Guerra da Restauração. Diga-se em abono da verdade que Castro Marim merece uma cuidada visita, está cercada de belíssimo de património cultural, faz parte da Rede Nacional das Áreas Protegidas e a Rede Natura 2000, permite passeios pedestres muito belos, os amantes da natureza têm ali ao seu dispor belos troços da Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António, os amantes da praia também não se sentem desiludidos e convém recordar que as salinas ocupam mais de 580 hectares da Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António.
Vamos visitar a exposição e andar por aí, já pedi a quem me acompanha para ir ver a estátua do Marquês de Pombal, de José Cutileiro, em Vila Real de Santo António.

(continua)

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Nota do editor

Último poste da série de > Guiné 61/74 - P24136: Os nossos seres, saberes e lazeres (560): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (93): Regresso à Academia Militar, ao Palácio da Bemposta (2) (Mário Beja Santos)

3 comentários:

Eduardo Estrela disse...

Não obstante alguns atentados arquitetónicos que têm sido praticados, aqui no Sotavento algarvio tem havido o cuidado de manter e preservar aquilo que enriquece o legado cultural das gentes que por cá têm passado.
Tavira é para mim a mais bela cidade do Algarve.
Eduardo Estrela - Vila Nova de Cacela.

Abraço e obrigado pela partilha.

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas
Estudei as fortificações e a vila e Castro Marim.
Depois escrevi um livro que a CMCastro Marim publicou. "Dos Fortes Reza a História"
Creio que se pode comprar na biblioteca municipal.
O Prof Rosa Mendes, já falecido, deu-me um grande apoio.
Aqui fica uma boa referência.
Um Ab.
António J. P. Costa

Eduardo Estrela disse...

O saudoso Prof. António Rosa Mendes era meu familiar. A mãe dele infelizmente também já falecida, era prima do meu pai.
Estão ambos ( mãe e filho ) descansando no cemitério de Vila Nova de Cacela.
Abraço
Eduardo Estrela