segunda-feira, 28 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22323: Notas de leitura (1363): “As Voltas do Passado, a Guerra Colonial e as Lutas de Libertação”, organização de Manuel Cardina e de Bruno Sena Martins; Edições Tinta-da-China, 2018 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Setembro de 2018:

Queridos amigos,
Trata-se de um projeto científico pertinente e não hesito em dizê-lo original, pelas opções temáticas que foram tidas em conta: a partir das datas marcantes da luta anticolonial, dezenas de autores de diferentes áreas de conhecimento puseram-se a questionar a História e o legado desses tempos de mudança. Denunciam-se mitologias e o mais importante é que aqui se esboça um outro modo de contar a memória de uma guerra que se viveu em muitos teatros e que ainda hoje nos contagia pelo cotejo de críticas ideológicas. É por isso uma leitura a que não nos devemos furtar.

Um abraço do
Mário



As voltas do passado, a guerra colonial e as lutas de libertação

Beja Santos


“As Voltas do Passado, a Guerra Colonial e as Lutas de Libertação”, organização de Manuel Cardina e de Bruno Sena Martins, Edições Tinta-da-China, 2018, é uma detalhada evocação, em voz plural, de acontecimentos influentes, eventos selecionados que, como justificam os coordenadores, “têm em comum o facto de terem produzido um lastro memorial presente em discursos e monumentos públicos, em mobilizações sociais, em apropriações políticas. Escolhemos 47 eventos que, tomados em conjunto, podem ser vistos como partes de um caleidoscópio ainda vivo”

É uma tentativa historiográfica para ler um outro modo de contar Portugal e as diferentes nações africanas emergentes da luta anticolonial. Daí o leitor ter oportunidade de recordar em sequência cronológica eventos como o Massacre de Batepá, em São Tomé e Príncipe (1953), o início da vaga de prisões de militantes nacionalistas em Angola e o Massacre do Pidjiquiti, em Bissau (1959), o Massacre do Mueda, Moçambique (1960), a revolta camponesa na baixa de Kasanje, Angola (1961), até ao 25 de Abril, onde terão peso acontecimentos como a libertação dos presos políticos do Tarrafal, a fundação da Associação dos Deficientes das Forças Armadas, o fim do exercício Alcora, as independências de Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Angola e a ponte aérea da TAP, em 1975. 

Obviamente que há textos de bom quilate e outros que não deixarão memória, escritos em água chilra, acontece. Michel Cahen deixa-nos um texto muitíssimo bem elaborado sobre o Massacre do Mueda, em 16 de junho de 1960. É cortante e denunciador da muita mistificação sobre a propaganda de Mueda. O governador de Cabo Delgado não atinou com as razões de fundo que traziam de volta os Macondes à região, eles voltavam para Moçambique porque a independência do Tanganhica os inquietava, na medida em que os fazendeiros europeus do sisal, sob pressão dos sindicatos, tinham aumentado os salários e já não necessitavam de mão-de-obra estrangeira. E escreve Michel Cahen: 

“Não vinham para pedir com clareza a independência, e ainda menos a independência de Moçambique, mas a liberdade para voltarem livremente à sua terra. Pode-se perfeitamente chamar a isto nacionalismo, mas não era nacionalismo moçambicano”

Referindo-se à tese de outra investigação baseada na memória oral, ele trabalhou principalmente com fontes arquivistas coloniais e fontes orais portuguesas. E termina o seu texto de forma primorosa, lembrando que há equívocos que bem retorcidos ganham foro de lenda ao serviço dos poderes do dia:

“Os arquivos coloniais veiculam a narrativa do colonizador. Mas têm uma vantagem: não mudam. Além disso, os atores coloniais que entrevistei nos anos 1980, um após outro, nunca mais tinham vivido em Mueda. Encontrei obviamente várias contradições nas suas narrativas, mas pude confrontá-las. E também utilizei fontes orais africanas.

Não é uma questão de saber ‘quem tem razão’. Este debate é muitíssimo interessante e deverá ser aprofundado. Trata-se, no fundo, de conhecer as condições de produção da memória. Condensarei essas linhas citando este pequeno debate que tive, em 2000, com uma testemunha africana da tragédia de 16 de junho de 1960:
- Houve muitos mortos?
- Sim, muitos! Foram 16!
- Ah! Pensava que eram 600…
- Sim, depois recebemos a orientação de que eram 600.


Marcelo Bittencourt, relativamente aos ataques em Luanda, em 4 de fevereiro de 1961, também adota uma versão que procura remover a poalha da propaganda e a apropriação da aura dourada de quem vem invocar que é o personificador do evento:

“O fator mais importante na vinculação do 4 de fevereiro ao MPLA é o ingresso dos principais protagonistas da ação na legenda, após a detenção destes, como consequência da contraofensiva colonial que se instala em Luanda. Não tiveram de fazê-lo antes da ação que inaugura a luta de libertação angolana. O MPLA havia começado o processo de estruturação da sua rede clandestina em Luanda, no início do ano de 1960, mas passados alguns meses uma nova onda de prisões iria encarcerar seus líderes, como Agostinho Neto e Joaquim Pinto de Andrade.

Desta forma, o 4 de fevereiro é o primeiro e último ato insurrecional, violento e anticolonial a refletir essa constelação de organizações clandestinas ainda muito ligadas aos seus vínculos elementares de solidariedade, fossem eles o bairro, a profissão, a família, a escola ou a associação cultural aos quais estavam ligados. Ou seja, a luta no terreno da história e da memória entre as duas principais forças políticas do nacionalismo angolano nos anos de 1960 parece ser o melhor caminho para entender a gestação e o posterior embate pela paternidade do 4 de fevereiro”
.

O leitor passa a dispor de um conjunto de referências sequencialmente cronológicas, conhecer a criação do Movimento Nacional Feminino, a fuga de cem estudantes das colónias, a revogação do Estatuto do Indigenato, a criação dos Comandos, a Operação Tridente, o início da luta armada em Moçambique, o encerramento em Lisboa da Casa dos Estudantes do Império, Cabral na Conferência da Tricontinental em Havana, em janeiro de 1966, o I Congresso da UNITA, a criação em Cuba das Forças Armadas de Cabo-Verde, que acabarão por ser desviadas para a luta armada na Guiné, o assassinato de Eduardo Mondlane, a Operação Mar Verde, a morte de Josina Machel, o Massacre de Wiriamu, o assassinato de Amílcar Cabral (que o autor erradamente fixa pelas 20h30 de 20 de janeiro), a tomada do quartel de Guilege, a proclamação unilateral da independência da Guiné-Bissau, o fim do exercício Alcora, a independência de Moçambique, de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe e depois de Angola.

De leitura obrigatória para quem pretenda aprofundar o conhecimento do período correspondente à guerra colonial. Haverá textos que vão ficar como referência.
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Nota do editor

Último poste da série de 21 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22303: Notas de leitura (1362): “Itinerários de Amílcar Cabral”, organização de Ana Maria Cabral, Filinto Elísio e Márcia Souto; Rosa de Porcelana Editora, 2018 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22322: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte X: Op Garrote, 23 de maio de 1966, golpe de mão na região de Madina / Belel



João Crisóstomo (Nova Iorque)


1. Continuação da publicação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)



CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé,
Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história”
como eu a lembro e vivi
(João Crisóstomo, luso-americano,
ex-alf mil, Nova Iorque) (*)


Parte X: Dia 23  de Maio de 1966, Operação Garrote: golpe de mão na região de Madina /Belel

 

Como não tenho qualquer memória  desta Operação Garrote , excepto pelo que depois ouvi falar dela, acredito que não participei nesta operação.   Por este motivo vou transcrever  o que me parece mais relevante, tal  como  consta no “relatório”.

(...) A CCAÇ 1439  realizou uma  importante operação, de nome  Garroye  na região de Madina /  Belel. Golpe  de mão da CCaç 1439:  (...) para os bons resultados desta Operação muito contribuiu o guia utilizado, Pedro Pina. 

As NF  divididas em dois escalões, actuaram da seguinte forma: O 1º  escalão desenvolveu um cerco  seguido de assalto tendo apanhado de surpresa o IN. Com o movimento e forças das NT,  o IN não conseguiu reagir imediatamente. Em virtude do acampamento IN estar bastante disperso , o cerco não pode efectuar-se com perfeição tendo parte do IN conseguido esquivar-se à acção das NF. Feito o assalto fizeram-se as baixas  e capturou-se o material que abaixo  se descrimina.

Organizou-se uma força de perseguição dos elementos que conseguiram esquivar-se à acção das NT. Depois de batida toda a zona, iniciou-se o regresso ao quartel  tendo o IN emboscado as NF na região de Madina. Novo  grupo de perseguição  tentou cercar os elementos do IN emboscantes,  tendo-se os mesmos esquivado ao contacto." (...)

Segue-se uma descrição bastante exaustiva dos “resultados”, os quais  se resumem como segue:

(i) destruição do Acampamento IN; baixas infligidas ao IN: 4 mortos confirmados  e feridos confirmados em número não estimado. Foram  capturadas duas mulheres 

(ii) material capturado:  6 espingardas mauser; 3 pistolas metralhadoras de  diversas marcas ; 13 granadas de diversos tipos ;15 carregadores de diversos tipos; 356 munições de varios tipos; 2 livros de escola da PAIGC.

Durante  a emboscada foram atingidos ligeiramente os soldados da CCaç 1439,   Francisco Assis de Freitas,  nº 334/65, e o soldado de 2ª classe ,da provímciaa, Calubus Pago. nº 218/63l

Pessoal que foi distinguido durante esta Operação:

Alf mil Luís Manuel Zagalo de Matos;

2o Sargento António Manuel Azevedo;

Furriel Mil Eduardo José Ferreira de Oliveira;

1º cabo  276/65 Manuel Fernandes

soldado 607/63Manuel Rosa de Oliveira

Caç nativo Quemó Nanquin

Caç nativo Queba Soncó

1º cabo da P.A. 236/64 Bonco Sanhá

1º cabo da P. A. 240/ 64 -Sori Baldé

Refe5ência elogiosa  à Operação  Garrote  feita pelo Comando de Agrupamento nº 24 (Bafatá, 1965/67):

"Apraz a este comando registar a boa concepção  dos planos estabelecidos, e dentro dos condicionamentos impostos mais pelo terreno  do que pelo IN, o acertado desenrolar da acção  e comportamento da NT bem secundadas  senão igualado ultrapassado  pelos actos individuais de caçadores nativos e elementos da Polícia Administrativa".

Dia 30 de Maio de 1966

 No dia 30 de Maio a CCaç 1439 escoltou o Exmo Cmdt  do BCaç 1888 e official de operações do mesmo de Enxalé a Porto Gole.

As NT sofreram duas emboscadas na região de Besmunha. As NT reagiram convenientemente gtentando um envolvimento e e posteriormente um assalto às posições IN. O IN foi desalojado das suas posições e perseguido, furtando-se ao combate.

O official de operações do BCaç 1888,  foi atingido por rebentamento de uma Granada ofensiva, supõe-se que lançada com dispositivo, pois o IN encontrava-se instalado a mais de 100 metros da Estrada.

(Continua)

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 6 de junho de 2021 > Guiné 61/74 - P22258: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte IXb: Porto Gole: 3 de março de 1966, ataque IN, e visita da "Cilinha"

domingo, 27 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22321: In Memoriam: Cadetes da Escola do Exército e da Escola de Guerra (actual Academia Militar), mortos em combate na 1ª Guerra Mundial (França, Angola e Moçambique, 1914-1918) (cor art ref António Carlos Morais Silva) - Parte V: José Afonso Palla, maj art (Sabugal, 1861 - Angola, 1915)



José  Afonso Palla (1861-1915)


Nome: José Afonso Palla

Posto: Major de Artilharia

Naturalidade: Sabugal - Guarda

Data de nascimento: 24 de Fevereiro de 1861

Incorporação;  1886 na Escola do Exército (nº ? do Corpo de Alunos)

Unidade:  Estado-Maior de Artilharia

Condecorações:

Cavaleiro da Real Ordem Militar de S. Bento de Aviz

Medalha de Valor Militar, Prata

Oficial da Ordem Militar da Torre e Espada de Valor, Lealdade e Mérito

TO da morte em combate: Angola

Data de Embarque:  10 de Março de 1915

Data da morte: 18 de Setembro de 1915

Sepultura:  Cemitério do Alto de S. João - Lisboa

Circunstâncias da morte:

 No dia 18 de Agosto de 1915 o destacamento de Cuanhama, de que o Major Palla era o

comandante da artilharia, foi atacado por cerca de 12 mil  guerreiros nativos que foram

repelidos com baixas. Neste combate foi gravemente ferido. Evacuado para o Lubango

veio a falecer em 18 de Setembro de 1915.




António Carlos Morais da Silva, hoje e ontem


1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um oficiais oriundos da Escola do Exército e da Escola de Guerra que morreram em combate, na I Guerra Mundial, nos teatros de operações de Angola, Moçambique e França (*).

Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva, cadete-aluno nº 45/63 do Corpo de Alunos da Academia Militar e depois professor da AM, durante cerca de 3 décadas; é membro da nossa Tabanca Grande, tendo sido, no CTIG, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972.

Há mais referências à figura de José AfonsoPalla na Net: vd. por exemplo aqui o Almanaque Republicano. Vd. também Assembleia da República.

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 19 de junho de 2021 > Guiné 61/74 - P22296: In Memoriam: Cadetes da Escola do Exército e da Escola de Guerra (actual Academia Militar), mortos em combate na 1ª Guerra Mundial (França, Angola e Moçambique, 1914-1918) (cor art ref António Carlos Morais Silva) - Parte IV: Augusto Valdez de Passos e Sousa (Elvas, 1886 - Angola, 1915), ten inf

sábado, 26 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22320: Efemérides (348 ): Foi há 50 anos, a partida da CCAÇ 3398 / BCAÇ 3852 (Buba, 1971/73) (Pinto Carvalho, ex-alf mil, poeta, músico e régulo da Tabanca do Atira-te ao Mar)


 


Belíssima evocação da partida para Guiné, há 50 anos anos, da CCAÇ 3398 / BCAÇ 3853. Texto da autoria de Joaquim António Pinto Carvalho, natural do Cadaval, a viver na Lourinhã. Depois da CCAÇ 3398, como alf mil at inf, foi transferido em 1972 para a CCAÇ 6, Bedanda, em rendição individual . Tem mais de 4 dezenas de referências no blogue. Poeta e músico, é o régulo da Tabanca do Atira-te ao Mar.


Fichas  de Undades: CCAÇ 3398 / BCAÇ 3852

Batalhão de Caçadores n.º  3852

Identificação;  BCaç 3852
Unidade Mob: BC 10 - Chaves
Cmdt: 
TCor Inf António Afonso Fernandes Barata
TCor Inf José Fernando de Oliveira Barros Basto
Maj Inf José Fernando de Oliveira Barros Basto
Maj lnf Raul Pereira da Cruz Silva
OInfOp/Adj: Maj Inf Raul Pereira da Cruz Silva (acumulava)

Cmdts Comp:
CCS: Cap SGE Augusto Ferreira
CCaç 3398: Cap Inf Filipe Ferreira Lopes
CCaç 3399: Cap Inf Horácio José Gomes Teixeira Malheiro
CCaç 3400: Cap Inf Gastão Manuel Santos Correia e Silva
Cap Mil Inf Manuel de Sousa Moreira

Divisa: "Viver-Lutar- Vencer"
Partida: Embarque em 26Jun7l; desembarque em 2Jul71 |  Regresso: Embarque em 1Set73 (CCaç 3398), 2Set73 (CCaç 3399), 6Set73 (Cmd e CCS) e 8Set73 (CCaç 3400)

Síntese da Actividade Operacional

Após realização da lAO, de 5 a 31Jul71, no CMl, em Cumeré, seguiu com as suas subunidades para a região de Aldeia Formosa em 1 e 2Ag071, a fim de efectuar o treino operacional e sobreposição com o BCaç 2892.

Em 26Ag071, assumiu a responsabilidade do Sector S2, com sede em Aldeia Formosa e abrangendo os subsectores de Empada, Mampatá, Buba, Nhala e Aldeia Formosa. 

De 14Jun72 a 08Dez72, a área da península do Cubisseco foi atribuída ao CDMG para actuação operacional das suas forças.

Em 22Jan73, o subsector de Empada foi transferido para a zona de acção do BCaç 4510/72. De 13Mai73 a 26Jun73, foi reforçado pelo BCaç 4513/72 e suas subunidades, com vistas à intensificação do esforço de contrapenetração no sector. 

A partir de 27Jun73 até 10Ag073, a área de Cumbijã-Colibuia-Nhacobá foi atribuída temporariamente ao BCaç 4513/72. As suas subunidades mantiveram-se sempre integradas no dispositivo e manobra do batalhão.

Com as subunidades que lhe foram atribuídas na sua zona de acção, desenvolveu intensa actividade operacional de patrulhamento, reconhecimento e de vigilância e controlo da fronteira e das linhas de infiltração do inimigo, particularmente do corredor de Missirã e das passagens do rio Grande de Buba.

Impulsionou e coordenou a execução dos trabalhos de realojamentos das populações recuperadas e da sua promoção sócioeconómica, em particular em Colibuia e Afiá, garantindo ainda a segurança, protecção e apoio da construção e reparação dos itinerários logísticos, com especial destaque para as reacções a fortes e frequentes flagelações a aquartelamentos e aldeamentos situados junto da fronteira.

Dentre o material capturado mais significativo, salienta-se: 1 morteiro, 1 metralhadora ligeira, 4 pistolas-metralhadoras, 6 espingardas, 2 lança-granadas foguete, 172 granadas de armas pesadas e a detecção e levantamento de 34 minas.

Em 10Ag073, foi rendido no Sector S2 pelo BCaç 4513/72 e recolheu, em 14Ag073, a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.
 
***

A CCaç 3398, após o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 2616 desde 1Ag071, assumiu a responsabilidade do subsector de Buba em 26Ag071.

Em 15Ag073, foi rendida pela 1ª Comp/BCaç 4513/72 e recolheu, em 19A9073, a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***
 A CCaç 3399, após treino operacional e sobreposição com a CCaç 2614 desde 3Ag071, assumiu a responsabilidade do subsector de Aldeia Formosa em 26Ag071.

Em 13Ag073, foi rendida pela 3ª Comp/BCaç 4513/72 e recolheu, em 15Ag073, a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

***
A CCaç 3400, após treino operacional e sobreposição com a CCaç 2615 desde 3Ag071, assumiu a responsabilidade do subsector de Nhala em 26Ag071, tendo destacado pelotões para reforço das guarnições locais de Buba, de finais de Set72 a finais de Nov72, de Mampatá, de finais de Jan73 a meados de Jun73 e de Colibuia, a partir de meados de Jun73.

Em 18Ag073, foi rendida pela 2ª  Comp/BCaç 4513/72, seguindo para Buba e no dia seguinte para Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações -  Tem História da Unidade (Caixa n." 94 - 2." Div/4." Sec, do AHM).


Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas das Unidades: Tomo II - Guiné -  1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002, pp. 155/ 156.

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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P22319: Estórias avulsas (107): Nem sempre aquilo que parece, é (António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo CAR da CART 3493/BART 3873)

1. Mensagem do nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga e Bissau, 1972/74) com data de 23 de Junho de 2021:


Nem sempre aquilo que parece é!

Nos tempos que correm, não raramente somos confrontados com certas informações em que a dúvida quanto à sua autenticidade leva muita gente não só a duvidar, mas a julgar ter a certeza que aquilo não passa de uma mentira. É verdade que existem certas notícias que aparecem um pouco por todo lado que apenas tem em vista gerar confusão, ou obter proveitos para os seus promotores. Mas isso não nos pode levar a pensar que estamos perante uma fraude sempre que somos confrontados com tais situações.

Já lá vão muitos anos que esteve para acontecer comigo algo, que se não tenho conseguido evitar, e não foi fácil, provavelmente algumas pessoas apesar de já ter passado muito tempo, ainda hoje guardavam na mente que aquilo teria sido, mentira, uma invenção minha. Isso passou-se na véspera do dia da minha partida para a guerra, para a então província da Guiné, que teve lugar no já longínquo dia 24 de janeiro de 1972.

Eram três horas da tarde quando me apresentei no Quartel dos Adidos, em Lisboa, onde depois de cumpridas as formalidades indispensáveis fui informado que só sairíamos por volta das quatro horas da manhã para o aeroporto de Figo Maduro onde íamos apanhar o avião que nos iria levar. Até a essa hora, se quisesse, podia ir passear pela cidade.

Eu tinha umas pessoas de família que moravam na rua Dr. Gama Barros… fui ter com eles onde estive até próximo da meia noite. Uma dessas pessoas tinha um irmão, enfermeiro, a prestar serviço no Hospital Militar em Bissau, pediu-me se eu lhe levava dois frangos assados para lhe entregar quando lá chegasse. Eu disse-lhe que sim, ele foi mandar assar os frangos a uma casa que existia lá próximo.

Chegada a hora de voltar para os adidos, era ainda cedo… decidi ir algum tempo a pé, quando caminhava na avenida João XXI estava muito frio, com temperatura negativa. Não havia por ali nenhum movimento, nem pessoas nem veículos, outros tempos. Ao passar junto a um prédio que tinha a porta aberta saiu de lá um cão enorme, um pastor alemão a ladrar e a aproximar-se de mim, eu parava e ele parava também mas sempre muito perto, eu começava a andar e ele voltava a aproximar-se e a ladrar de forma ameaçadora, foram três as vezes que ele teve tal comportamento, e eu cheio de medo sem saber o que fazer, sempre que ele se aproximava eu sentia uma vontade enorme de lhe dar os frangos, se fossem meus não tinha hesitado… talvez assim me deixasse seguir enquanto ficava entretido a comer. Mas ao mesmo tempo pensava, quando disser a alguém que dei os frangos a um cão ninguém vai acreditar. Foram momentos de enorme confusão e medo à mistura aqueles porque passei.

Como se já não bastasse a situação que estava a viver! Quando decidi que lhe ia dar os frangos se continuasse a não me deixar andar, o pastor alemão calou-se e voltou para casa enquanto eu suspirava de alívio, e assim com alguma sorte, o enfermeiro, o primeiro-sargento Canha, lá recebeu os frangos pouco tempo depois da aeronave em que viajei ter aterrado no aeroporto de Bissalanca.

Ainda hoje, algumas vezes, dou comigo a pensar… se eu tivesse dado os frangos ao cão, como foi naquele momento a minha vontade, seriam poucos os que teriam acreditado que isso era verdade.
Em situações assim, embora possa parecer mentira, é sempre bom pensar que existem coisas por demasiado duvidosas e estranhas que possam parecer, podem ser verdade.
E aquela, teria sido uma dessas!

António Eduardo Ferreira

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Nota do editor

Último poste da série de 4 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22253: Estórias avulsas (106): O Aspirante Carvalho e a nossa (in)sanidade mental (Fernando de Sousa Ribeiro, ex-alf mil at inf, CCAÇ 3535/BCAÇ 3880, Zemba e Ponte do Zádi, Angola, 1972/74)

Guiné 61/74 - P22318: Os nossos seres, saberes e lazeres (457): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (4): As Necessidades, a olhar o Palácio e a percorrer em júbilo a Tapada (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Maio de 2021:

Queridos amigos,
Nas alegrias do desconfinamento dá gosto ver os jardins pejados de visitantes. A Tapada das Necessidades é um espaço maravilhosos, está aliás num perímetro onde quem gosta de visitar a oásis lisboeta tem por onde se movimentar: os jardins de Belém, incluindo o Jardim Tropical, subir ao jardim da Tapada da Ajuda e não esquecer a sua ligação ao Jardim Botânico da Ajuda e lá mais em cima Monsanto. O que timbra e singulariza a tapada é a sua história multissecular que vem dos tempos conventuais, e os Bragança não se pouparam a incluir neste espaço de refrigério espécies arbóreas do maior interesse, há catos de todas as variedades, espaço para crianças, aos poucos sente-se que património edificado parecia ao abandono retoma à vida, e o jardim ganha mais história, ainda por cima a beijar os muros do único ministério instalado num palácio (não esquecendo os departamentos da Cultura dentro do Palácio Nacional da Ajuda). Certas decisões como aquela que tomou Jorge Sampaio em ter o seu escritório no que fora o ateliê da rainha D. Amélia, e que estava num estado de completa degradação, permite olhar a Casa do Regalo como uma recuperação feliz, como algumas outras que estão em curso no interior da Tapada, e que tanto a valorizam. Nada como confirmar com os vossos próprios olhos o que aqui se mostra, e que é muitíssimo pouco.

Um abraço do
Mário


As Necessidades, a olhar o palácio e a percorrer em júbilo a Tapada

Mário Beja Santos

A Tapada das Necessidades tem a sua existência associada a um convento que veio dar lugar a um palácio, tudo começou nos tempos da corte do magnífico D. João V, depois sonhou-se num palácio real, quando a família Bragança se transferiu para a Ajuda, aqui ficaram os recém-casados Carlos e Amélia, como aqui vivera D. Maria II e D. Fernando II e a sua ranchada de filhos, e a altas horas da noite D. Pedro V esperava o seu pai para o censurar discretamente, o rei enviuvara e metera-se de amores com uma cantora de ópera, mais tarde sua mulher, a condessa d’Edla. Em 1 de fevereiro de 1908, aqui deram entrada os cadáveres de D. Carlos e do Príncipe Real. Daqui saiu apressadamente D. Manuel II em 3 de outubro de 1910, oferecera-se um jantar de gala ao presidente do Brasil, a marinhagem para aqui lançou uns tiros de canhão, o rei partiu para Sintra, depois Mafra, onde se juntou à família, e da Praia da Ericeira partiu para o exílio. Nunca houve a pretensão de imitar Versalhes, é gracioso na adaptação conventual e a Tapada era refrigério para muita gente, investiu-se a sério na plantação de árvores, é um espaço gracioso e no desconfinamento volta a encher-se de gente, tem entrada gratuita. Anda por aí uma polémica se se deve abrir espaço de hotelaria e restauração, correm abaixo-assinados, a procissão ainda vai no adro. Aqui se vai não para protestar, mas única e exclusivamente para aliciar quem vive em Lisboa ou arredores ou visita a capital encontra aqui um oásis que carece de reparações permanentes e acentuada manutenção pelas espécies raras que conserva e até por fazer ligação com o departamento de Estado que se dissemina pelas instalações palacianas. Hoje só se vê o palácio por fora, a tapada é o fulcro das nossas atenções.
Fachada do Palácio das Necessidades, entrada da capela, com o fontanário em primeiro plano
O largo, o fontanário e vista sobre o Tejo com a Ponte 25 de Abril ao fundo
Entra-se na Tapada e este magnífico dragoeiro dá-nos as boas-vindas
Na Tapada, ao visitante é permitido captar certos ângulos do Ministério dos Negócios Estrangeiros
Um lago e o seu idílio na Tapada das Necessidades
Não há catos como os da Tapada das Necessidades
O jardim dos catos visto de um ângulo que não permite ainda perceber a imensa variedade que nos espera
Mais catos exuberantes
Casa do Regalo, antiga ateliê da rainha D. Amélia, hoje escritório do ex-Presidente da República Jorge Sampaio
Casa portuguesa estilo Raúl Lino, felizmente restaurada e espera-se que com uso
Outra fonte perto de uma cascata e também perto da Casa do Regalo
Aproveitando a chegada da Primavera, um belo espaço de lazer
Entrada da estufa
Pormenor escultórico
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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22297: Os nossos seres, saberes e lazeres (456): De visita obrigatória: exposição Representações do Povo, Museu do Neo-Realismo (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22317: Tabancas da Tabanca Grande (6): O régulo vitalício, José Belo, da sempre saudosa Tabanda da Lapónia, de regresso de Key West, traz-nos uma história da espionagem russa e sueca durante a guerra fria, em 1982, ao tempo ainda de Olof Palm

1. Mensagem de José Belo que acaba de ultrapassar as duas centenas de referências no nosso blogue... 

Para quem não sabe, ele foi (e continua a ser) um "Maioral", ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70) e é hoje cap inf ref do Exército Português... 

Temos  um especial carinho por ele por ser o único exemplar que conhecemos, vivo, de uma espécie que nunca chegou a existir ou que pura e simplesmemte  desapareceu há muito: os luso-lapões... A ser verdade que ele é um exemplar único, então é porque é ou foi "desenhado" como um protótipo... Se  o não fosse, hoje seria coronel de infantaria reformado e andaria pela linha do Estoril a mostrar as mazelas e as sequelas de guerras passadas... Felizmente para ele a Pátria / Mátria / Fátria mandou-o para longe... ou não fez nada para o trazer de volta... Vive na Suécia há 4 décadas. Mas nunca se sabe por onde pára...

Por acaso, soubemos, pelo blogue da Tabanca do Centro, em poste de 14 junho último, que o José Belo tinha acabado de regressar "depois de uma muito interessante estadia em Key West, Florida,  com muito jazz e não só".... E esclareceu: "Voltei à Suécia para participar num encontro de antigos juristas de Direito Internacional tanto americanos como suecos"... Coisa que poucos sabem, ele é também jurista, especializado nesta área, a do direito internacional...

Há dias fez "prova de vida" (, como convém nas nossas idades...), perante a Tabanca Grande,  e veio relembrar-nos então um episódio, já esquecido por todos nós,  de um grave incidente, ocorrido em outubro de 1982, há quase 40 anos, com um submarino atómico russo que "encalhou" em águas territoriais suecas. Era então primeiro ministro Olof Palme (1982-1986) (já o tinha sido em 1969-1976). 

Como é sabido, a Suécia é uma país neutral ... com uma relação especial com a NATO (a que não pertence nem nunca pertenceu). O que não a impediu de ser uma potência regional, crítica da política externa imperialista tanto dos EUA como a URSS.

Porque todos fomos filhos e vítimas da "guerra fria" que opôs uma metade do mundo contra outra metade, faz-nos bem recordar estas histórias de modo a aumentarmos a nossa capacidade de resistência e resiliênca face à guerra, a todas as guerras, frias ou quentes (de que Deus nos livre!).  Bem vistas as coisas, a nossa geração nasceu e viveu, uma grande parte da sua vida, em plena guerra fria, o período de grande tensão geopolítica que opôs dois blocos militares, a NATO e o Pacto de Varsóvia, durante quase meio sécul0, de 1947 a 1991 (, ano da dissolução da URSS). Houve alturas, gravíssiamas, em que estivemos quase à beira da III Guerra Mundial.

Em suma, bem vindo de regresso a casa, Zé Belo! (LG)

 
Date: terça, 22/06/2021 à(s) 11:44
Subject: Ainda a espionagem russa e sueca durante a guerra fria 


Durante um considerável período de tempo os soviéticos usaram os seus submarinos estacionados no Báltico para tentar infiltrações nas numerosas defesas marítimas suecas.

Tendo em conta existirem numerosos arquipélagos ao longo das costas suecas (só o arquipélago de Estocolmo é formado por mais de 40 mil(!) ilhas ) esta tarefa de defesa é complicada.

Os incidentes eram frequentes e levavam ao uso de cargas de profundidade  por parte da marinha sueca.
Um caso extremo sucedeu a 27 de Outubro 1981.

O submarino soviético U-137 encalhou nuns rochedos junto de Thorhamnkär, na entrada do estreito que conduz à maior e mais secreta base naval sueca de grande importância estratégica.
Esta base está rodeada de um vasto perímetro de segurança onde é proibida a estadia de cidadãos não suecos.

Dispõe de profundos túneis cavados na rocha onde tanto barcos como instalações de radar e artilharia de costa se encontram resguardados.

O submarino, navegando à superfície aproveitando condições meteorológicas extremas, conseguiu infiltrar-se até cerca de dois mil metros da base na altura em que  encalhou. Dispunha de modernos  mísseis de carga atómica.

De imediato, e temendo represálias aquando do regresso à União Soviética, o comandante do submarino e grande parte da tripulação pediram exílio político às autoridades suecas.

O primeiro ministro sueco na altura era Olof Palme (1927-1987) que de imediato procurou soluções políticas para o incidente. Os soviéticos no entanto não aceitaram negociar.

Apresentaram um ultimato de muito curto prazo no qual exigiam a devolução do submarino com a totalidade da tripulação. Caso tal não viesse a suceder no prazo estipulado,  eles viriam buscar o submarino usando todos os meios para tal necessários.

Ao mesmo tempo em que grande parte da esquadra soviética do Báltico estacionava no limite das águas territoriais suecas precisamente frente à base naval. Os suecos deslocaram reforços marítimos, aéreos  e terrestres para a zona.

Veementemente aconselhados internacionacionalmente, acabaram por aceitar o ultimato rebocando o submarino, com a totalidade da tripulação, até junto da armada soviética.

Como seria de esperar, aquando do regresso à União Soviética, a história terminou "menos bem" para o Comandante e alguns membros da tripulação.

E incidentes mútuos continuam nos nossos dias com uma Rússia pós-soviética.

Um abraço, J. Belo
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Nota do editor:

Último poste da série > 30  de maiode 2021 > Guiné 61/74 - P22239: Tabancas da Tabanca Grande (5): Convívio de 4 tabancas (Sra da Graça, Matosinhos, Candoz e Atira-te ao Mar) na terra das 3 pontes, Peso da Régua

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22316: (In)citações (186): As várias idades ou "Estar vivo é o contrário de estar morto" (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR da CCS/BCAÇ 3872)

O descanso dos guerreiros

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 24 de Junho de 2021:


AS VÁRIAS IDADES

É natural quando nos dói perna ou braço, dizermos com um ar mais ao menos no gozo, que é da idade.

Mas isto da idade tem que se lhe diga pois há uma idade para tudo. Assim há a idade de gatinhar, andar, ir para a escola, trabalhar, ir para a tropa, casar, ser pai, ser avô e também haverá o momento que nos dizem que temos idade para descansar.

Recordo-me quando jovem não me portar dentro dos cânones considerados correctos ter a desculpa de que era da idade e também me lembro da minha mãe já ser mais pequena que eu e dizer, que eu tinha idade de levar uma bofetada se me armasse em parvo.

Como dizia o meu sócio e amigo Henrique (cordoeiro) que herdou a alcunha do pai, que foi ao seu tempo um industrial de cordoaria numa terra sem luz eléctrica e em que os fontenários só deitavam água (estrategicamente vertida de um regador) no momento, que Sua Exa abria a torneia no dia da inauguração, dizia então que lhe doía a perna do lado da Charneca e não era da idade, pois a outra tinha a mesma idade e não lhe doía nada.

Acabei de fazer 71 anos e dizem os animadores que é uma idade bonita. Concordo, e passados estes anos que a vida tanto me ensinou, já não conta a quantidade mas qualidade, o certo é que ela boa de se viver em todas as idades.

Todo este palavreado vem ao fim ao cabo como forma de agradecimento a todos que me endereçaram os parabéns no passado 17 de Junho. Para o ano cá estarei novamente, porque como diz a “grande” Lili Caneças num rasgo de filosofia “QUE ESTAR VIVO É O CONTRÁRIO DE ESTAR MORTO”.

“Caturreira!” que é verdade.

Um abraço a todos os camaradas

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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22248: (In)citações (185): A escrita da vida, poema breve (Joaquim Pinto de Carvalho, régulo da Tabanca do Atira-te ao Mar, Lourinhã / Cadaval)

Guiné 61/74 - P22315: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (58): A funda que arremessa para o fundo da memória

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Junho de 2021:

Queridos amigos,
Se é lícito recapitular o que se vai passando na vida deste Paulo Guilherme, ele tem um ganha-pão como técnico, é professor contratado, colabora com a imprensa, nunca o vemos gemer sob o peso das obrigações diárias, tem várias bocas a ajudar, são riscos que corre por conta própria, aceitou vários tipos de representação, a que mais lhe apraz é representar a Confederação Europeia dos Sindicatos nas políticas de Saúde e do Consumo junto das instituições europeias. Vai cimentando amizades, e daí pedir conselho a quem coliga uma estima fraternal, é o caso de Gilles Jacquemain, começaram por aceitar conjuntamente elaborarem documentos para o Conselho Consultivo de Consumidores, encontram-se regularmente em Bruxelas, e Paulo começa a viver situações tempestuosas com os seus colegas europeus, a Comissão Europeia torce o nariz, é preciso manobrar com delicadeza em várias direções. Mas Gilles não só conhece o romance amoroso de Paulo com Annette Cantinaux como ele próprio deve saber mais coisas sobre a Guiné, esta carta é uma entre muitas demonstrações em que Paulo pede conselho e satisfaz a curiosidade desse belga que de guerra colonial só retém na memória a saída precipitada do Congo e a catástrofe subsequente, pois congoleses e descendência é coisa que não falta na Bélgica, em pleno século XXI.

Um abraço do
Mário


Rua do Eclipse (58): A funda que arremessa para o fundo da memória

Mário Beja Santos

Mon cher Gilles, mon frère en Bruxelles, dentro de dias tens-me aí, organizei com Annette uma viagem a Ypres e a Pas de Calais, imagina tu para visitar sobretudo cemitérios. Já estive em Ypres e confesso-te que aquele cenário alegórico das batalhas me quebrou o coração, aquelas centenas de milhares de mortos para coisa nenhuma. Não esperava integrar nestes dias motivos de trabalho, mas algo de surpreendente aconteceu e tenho que te contar, pois há que agir prontamente.

Mal chegado daquela viagem relâmpago em que fui fazer a conferência no Espaço Senghor, e onde tive o prazer de te rever, recebi um telefonema de um funcionário superior do Serviço de Política de Consumidores, Jean-Marie Courtois. Deixou-me alarmado. Começou por me informar que se tratava de matéria delicada e dava a seguinte informação em privado. Como tu te recordas, o meu colega catalão da Associação Europeia de Consumidores, Javier Pardos Guzmán, comprometera-se a fazer para a Comissão um trabalho sobre o impacto nos consumidores dos dois primeiros anos do Euro. O trabalho foi entregue e pago. Acontece que Javier fez chegar à Associação um trabalho que era dado como original e que fazia parte do contrato que assumíramos com a Comissão Europeia no âmbito do nosso programa de atividades por ela financiada. Obviamente que a Françoise Maniet, a nossa secretária e representante permanente, nos enviou cópia para lermos antes de seguir aos serviços da Comissão, pareceu-me trabalho decente, telefonei a Bengt Ingerstam para Estocolmo, concordou comigo. Acontece, disse-me Courtois, que este trabalho já fora divulgado no Ministério de Saúde e Consumo de Espanha como original, como original chegou à Comissão Europeia, a título de encomenda aos catalães, e tínhamos agora um texto mal maquilhado em nome da Associação de Consumidores, pedia-me insistentemente que descalçássemos a bota um quanto antes. Podes imaginar o estado de espírito com que telefonei a Javier, começou por negar perentoriamente qualquer mixórdia, seguramente era um problema de má tradução, às tantas confessou que havia repetição de capítulos em ambos os trabalhos e mais adiante pediu-me para eu mandar retirar o trabalho atribuído à associação, seria em dois meses substituído por um estudo original referente à evolução do crédito hipotecário na Catalunha nos últimos cinco anos.

Sei muito bem que estes assuntos te escapam, não tens nenhum envolvimento com a nossa associação de consumidores, socorro-me da tua amizade e da tua competência para me dares conselho. Na próxima reunião da Direção o assunto tem que ser posto em cima da mesa, acresce que também temos alguns problemas de rebelião com os franceses que se recusam a subordinar o nosso programa de atividades financiado pela Comissão às matérias que esta propõe para estudo em função do seu próprio programa, acham tratar-se de uma ingerência, de uma maneira de nos dificultar a desenvolver a especificidade da nossa organização que se timbra por ser um associativismo da vida quotidiana, em estreita ligação com o consumo responsável e solidário, visando modos de consumo e de produção mais sustentáveis. Ora nós aceitámos apresentar uma radiografia das nossas 16 organizações sobre estudos efetuados quanto ao consumo responsável e solidário, eles teimam num programa diferenciado, não querem responder sem insistir que as associações de consumidores de caráter europeu não têm qualquer dever de subordinação às prioridades da Comissão, parece-me uma rematada agressividade com quem connosco contratualizou de boa fé e nos está a financiar o nosso trabalho coletivo. Perdoa-me o incómodo, preciso que reflitas sobre a situação em que estamos a viver, peço-te muito que conversemos em Bruxelas dentro em breve. Obrigado por tudo.

Agradeço-te igualmente a manifesta curiosidade com que tu acompanhas a história ficcionada da Rua do Eclipse. A Annette embrenhou-se de tal modo nesta minha comissão na Guiné que faz perguntas a toda a hora. Por exemplo, não percebe bem o quadro depressivo que eu descrevo naqueles meses em que transitei do Cuor para Bambadinca, acha surpreendente eu não me sentir melhor correndo menos riscos, eu e os meus homens. Consegui juntar algumas folhas sobre o meu dia-a-dia de autêntico distribuidor, pronto-socorro e vigilante. Descrevo-lhe que saio às seis da manhã e vou buscar população a Samba Juli, a última tabanca na estrada que leva de Bambadinca a Mansambo, população que vem ao médico, como a seguir marcho para ir buscar alimentos e correio a Bafatá, outro levará os doentes tratados a Samba Juli; regresso de Bafatá, a viatura segue com almoço para a Ponte Undunduma e cabe-me analisar correio e tratar de assuntos da justiça militar; depois de almoço na messe, tenho direito a uma pausa, pelas 15 horas, com outro pelotão, seguimos de Amedalai para Demba Paco, alguém já picou a estrada, seguimos com presteza para levar munições e sacos de arroz, trazendo eventualmente civis adoentados, estamos de regresso pelas 17 horas; tenho permissão para me refrescar e acompanhar as aulas dos meus soldados; pode acontecer que seja necessário jantar mais cedo para montar a emboscada ou seguir para os Nhabijões. Quando há folga, tudo pode acontecer desde leituras a jogos de cartas ou ir conversar com a professora primária, Dona Violete, ainda não tive oportunidade de te contar mas quando cheguei a Bambadinca, em novembro de 1969, resolveram praxar-me, isto é, inventaram uma responsabilidade totalmente inexistente, que eu ficaria como ajudante às ordens da professora, lá me apresentei, com cara de caso, quando lhe falei da missão ela desatou a rir, era uma senhora muito bem-disposta, de idade indefinida, com muito sangue cabo-verdiano e cabelo oxigenado, com uma maquilhagem muito contida e que recebia à inglesa, havia sempre na sala um bolo fumegante. Propusera-lhe inicialmente vários temas de conversa, já que ela tinha sido professora no Cuor: onde se teria situado Sambel Nhantá, que tipo de indústrias e empreendimentos agrícolas houvera no Cuor, como efetivamente se tinha desencadeado a subversão naquele regulado. Foram serões deliciosos, fiquei a saber que Sambel Nhantá fora nome de régulo e de uma povoação que mais tarde deu pelo nome de Sansão; falou-me daquela Sociedade Agrícola do Gambiel de que ainda restava uma formidável construção em pedra; que sempre viveu em Bambadinca e que um barco de manhãzinha cedo a deixava em Gã Gémeos, seguia de burro para Missirá, à tarde regressava; que a área mais próspera do Cuor era Canturé; a população, no passado, era maioritariamente islamizada, mas nunca puseram problemas a que as crianças fossem à escola. E dessas conversas retive o tom quase magoado como me foi referindo a chegada da luta armada, logo nos inícios de 1963, um verdadeiro tremor de terra que levou ao desaparecimento de todas as localidades com exceção de Missirá e Finete, esta parecia que ia morrer, mas em 1965 apareceram tropas de milícia e a bolanha é tão fértil que as populações se sentiram protegidas e regressaram, Mandingas e Balantas. Falava emotivamente das belezas do Cuor. Quando me despedia, dizia-me sempre: “Que tema quer tratar a seguir, senhor alferes?”. Eu dava uma sugestão, beijava-lhe a mão e agradecia-lhe sempre o saboroso chá preto, tudo isto decorria numa atmosfera que parecia completamente fora de um cenário bélico.

Não te incomodo mais, estou a trabalhar a mata-cavalos para deixar as avaliações dos meus alunos, ainda tenho que expedir uma carta para a Françoise Maniet, felizmente tu estás a preparar a tomada de posição do documento que nos pediram para o Conselho Consultivo de Consumidores, senão já nem tinha tempo para dormir. Esqueci-me de perguntar pela tua mulher e mais família, espero que todos estejam bem. Pensa no pedido que te fiz, quero procurar agir com o melhor bom-senso possível com estas situações do colega catalão e do grupo francês. Não te esqueças que te ofereci a minha casa em julho, quando estiver para passar férias em Bruxelas. Depois volto com a Annette para Lisboa. À bientôt, une énorme amitié, Mário
Alguém me sugerira que lesse cuidadosamente um famoso álbum de Schuiten e Peeters, uma crítica devastadora que faz destruições provocadas no centro da cidade pela ganância dos promotores e mobiliários: a destruição do centro medieval para canalizar e abobadar o rio Sena; o delírio do Palácio da Justiça, construção megalómana, sempre que sujeita a trabalhos intermináveis; a destruição da Casa do Povo, do arquiteto Victor Horta para dar lugar a uma insípida fachada encurvada, quase sem graça nenhuma; a Bruxelas que se transformou em Brüsel, o delírio do fachadismo, derruba-se o antigo mantendo a sua fachada, criando cenografia para construções que fingem o antigo.
A Cité du Logis, em Watermael-Boitsfort, é um caso ímpar de construção social entre as duas grandes guerras é de tal modo paradigmático este equipamento urbano que está classificado, deverá manter-se intocável. Aqui muito perto, Gilles Jacquemain encontrou um novo escritório para a Associação Europeia de Consumidores, melhor notícia eu não podia ter tido, a centenas de metros vivem queridos amigos, os transportes para o centro da cidade de Bruxelas são acessíveis e a floresta de Soignes, a deslumbrante floresta de Soignes faz fronteira.
Jamais em tempo algum regressei de Bruxelas sem vitualhas para a família. Eram os pedidos dos filhos pequenos, eram as novidades em queijaria e charcutaria, por vezes arranjando situações delicadas de fedor dentro do avião, quando me esquecia de pedir para que aqueles queijos de odor intenso fossem hermeticamente fechados. O que aqui se mostra é o mercado dominical em Boisfort, é aqui que eu compro uns pedacinhos de queijo. Especialidades que vêm de França, comos os queijos Comté du Jura, o Cantal, e outras sumidades. Madame Germaine recebe sempre com um belo sorriso o cliente português.
Sou um caçador que não resiste ao cheiro da pólvora – metáfora mal-amanhada para referir que assim que vejo uma banca com livros vou farejar caça. Inesperadamente, perto da Praça Real, em Bruxelas, dei com uma Feira do Livro da banda-desenhada, irresistível, os anos passam e cada vez mais gosto da BD francesa e belga.
Bozar é o diminutivo do Palácio das Belas-Artes, uma casa de cultura onde aconteceram exposições lendárias e funciona um auditório onde têm subido ao palco alguns dos maiores intérpretes mundiais. Aqui vi um recital memorável da Maria João Pires, selecionou sonatas de Mozart e Beethoven, concluiu retumbantemente com improvisos de Schubert. Esta porta é de uma grande beleza, todo o edifício mantém a traça Arte Deco, tudo bem dimensionado, sensibiliza-me esta ligação entre a estética e o funcional, entrosamento perfeito.
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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22294: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (57): A funda que arremessa para o fundo da memória

Guiné 61/74 - P22314: Ser solidário (238): Ainda é possível fazer, até ao fim do mês, a consignação do IRS a favor da ONGD "Ajuda Amiga", NIPC 508617910, de que é presidente da direção o nosso camarada e amigo Carlos Fortunato, ajudando assim a finalizar a contrução da escola de Nhenque, Bissorã, que deve entrar em funcionamento no ano lectivo de 2021/22


 Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > Nhenque > 31 de março de 2019 > Esta e outras  crianças contam com a solidariedade dos amigos e camaradas da Guiné...

Foto (e legenda): © Carlos Fortunato (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Caros/as leitores/as, amigos/as e camaradas:  

Aqueles que ainda não entregaram a declaração modelo 3 do IRS, ainda podem (e devem...) fazê-lo até ao fim do corrente mês. E na altura podem (e devem) pensar nas crianças de Nhenque, em Bissorã, região do Oio, Guiné-Bissau, que estão ansiosas por ver a sua escolinha inaugurada, e pronta a funcionar já no início do ano lectivo de 2021/22.

O projecto é da ONGD portugesa "Ajuda Amiga", fundada e dirigida por camaradas nossos.
Uma das suas caras mais conhecidas  é  o Carlos Fortunato (, ex-.fur mil arm pes inf, CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71; por erro sistemático no nosso blogue, tem passado estes anos todos por furriel de transmissões;  como ele nos corrigiu amavelmente,  sempre foi, no CTIG um operacional da G3...
). 



Em 2021 ficará construída uma sala polivalente, com uma pequena arrecadação que servirá de secretaria, biblioteca, sala de reuniões, etc., duas salas de aulas e duas latrinas, uma para as meninas, outra para os meninos.

Amigo/a, camarada: se quiseres (e puderes) ajudar, basta, no preenchimento da folha de rosto, da declarção modelo 3 de IRS,  no Quadro 11 (Consignação de 0,5% do IRS), pôr uma cruzinha no campo 1101 (Instituições particulares de solidariedade social) , e escrever o NIF da Ajuda Amiga, 508617910, assinalando a seguir a consignação   que pretendes fazer (IRS e/ou IVA)




2. Podes também ajudar a "Ajuda Amiga" (e mais concretamente este projeto da Escola de Nhenque), fazendo uma transferência, em dinheiro,  para a Conta da Ajuda Amiga:

NIB 0036 0133 99100025138 26

IBAN PT50 0036 0133 99100025138 26

BIC MPIOPTP


Para saber mais, vê aqui o sítio da ONGD Ajuda Amiga: 


A Ajuda  Amiga tem cerca de 4 dezenas de referências no nosso blogue.


3. Recorde-se aqui o apelo desta portuguesíssima ONGD:


(...) As crianças têm que atravessar uma bolanha com mais de um quilometro com crocodilos para irem à escola


O Complexo Escolar está a ser construído por módulos à medida que se conseguirem os recursos necessários.

O primeiro módulo está a decorrer e será finalizado em 2021, é constituído por duas salas de aulas, uma sala polivalente (biblioteca, sala de reuniões) com um pequeno armazém para guardar material escolar, duas latrinas (uma para meninas, outra para meninos), dois depósitos de 10.000 litros cada para água e colocação de um contentor para armazenagem de materiais de construção, isto irá permitir dar aulas até à 4ª classe e assim os mais pequeninos não terão que atravessar a bolanha com crocodilos, para irem à escola.

Esta escola irá resolver uma uma situação dramática, pois as crianças têm que atravessar uma bolanha com mais de um quilometro com crocodilos para irem à escola de Bera que fica do outro lado, devido à falta de escolas nesta zona. As crianças para conseguirem passar pelos crocodilos atravessam acompanhadas por familiares mais velhos, que levam paus para afastarem os crocodilos e as defenderem dos seus ataques.  (...)

Os membros da Ajuda Amiga que se deslocam para apoiar os nossos projetos suportam eles próprios as suas despesas, e as despesas de funcionamento da Ajuda Amiga são pagas com as quotas dos sócios.(...) 


A Ajuda Amiga também tem página no Facebook. Aqui pode ver-se melhor os progressos feitos na construção da Escola, que está em fase de acabamentos.

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Nota do editor: