De 8 de Agosto a 5 de Setembro de 2009, está aberta ao público, no Seixal, freguesia e concelho de Lourinhã, no clube local, uma exposição documental evocativa da participação dos jovens da terra na guerra colonial – Angola, Guiné e Moçambique (1961-1974).
A ideia original da exposição foi do meu amigo, da adolescência e juventude, Jaime Bonifácio Marques da Silva, natural do Seixal, licenciado em ciências do desporto, professor de educação física reformado, antigo vereador da cultura da Câmara Municipal de Fafe, ex-Alf Mil Pára-quedista, BCP 21 (Angola, 1970/72), grande dinamizador de iniciativas ligadas à preservação da memória dos antigos combatentes da guerra colonial (nomeadamente, em Fafe e na Lourinhã).
O Jaime, que vive em Fafe onde é casado com a minha amiga Dina, professora do ensino básico reformada, diz-me que a ideia surgiu aquando de um das suas periódicas visitas à sua terra natal, Seixal. Há alguns meses atrás, encontrou casualmente, no clube local, alguns ex-combatentes da guerra colonial, seus conterrâneos. Não se viam há muitos anos, nomeadamente os que saíram para fora da terra, incluindo para o estrangeiro (França, Alemanha, Canadá, etc.).
"Na verdade, cada de um de nós, após o final da comissão de serviço militar em África, ‘fez-se à vida´ " - palavras do Jaime, no folheto explicativo da exposição.
E explicita melhor o seu ponto de vista:
"Uns emigraram para o estrangeiro, outros organizaram as suas vidas aqui na terra ou noutras zonas do país. Agora, por força do efeito inexorável do tempo que nos está a empurrar para o final da vida, aqui estamos de novo a regressar à terra que nos viu nascer e crescer e a relembrar os tempos de escola, do campo, do Largo da Festa onde jogávamos ao pião, ao botão, onde jogávamos à bola com uma bexiga de porco ou ainda onde saltávamos à fogueira na noite de São João, etc., etc.
A comissão organizadora do evento é constituída pelo Jaime e pelo Arménio Pereira (que recolheram os depoimentos orais e seleccionaram o material fotográfico), bem como pelo José Maria Malaquias (responsável pelo apoio logístico).
A exposição é constituída por 33 posters, sendo o primeiro de apresentação e de enquadramento, incluindo o contexto histórico da guerra colonial, e a lista do pessoal.
Cada um dos restantes 32 posters é dedicado a cada um dos 32 seixalenses que combateram na guerra colonial, alguns integrados na Marinha ou na Força Aérea, mas a maioria no Exército. Para pagamento da execução gráfica dos posters cada um dos ‘biografados’ contribuiu com 20 euros. No final da exposição, cada participante ficará com o respectivo poster. A Junta de Freguesia da Lourinhã fez uma pequena doação de 250 euros….
Ao todo foram 39 os ex-combatentes seixalenses, mas há 7 que não foi possível contactar em tempo útil, por viverem no fora da terra ou no estrangeiro. A exposição teve um triplo objectivo, segundo os seus organizadores:
(i) “Lutar contra a cultura do esquecimento que se instalou em Portugal após o final da guerra colonial”… Directa ou indirectamente todas as famílias foram afectadas pela guerra colonial. Ora, segundo a comissão organizadora, se há algo mais condenável do que a guerra, é o silêncio sobre ela, é o fazer de conta que a guerra nunca existiu…
(ii) Relembrar e homenagear aqueles que fizeram a guerra, obrigados ou não, que derem o melhor de si à sua Pátria, independentemente da legitimidade daquela guerra, e do regime político que a promoveu, manteve e conduziu, levando-a a um beco sem saída.
“Para nós, seixalenses, foi assim: Fomos 39 para a África. Um dós, o Arsénio [Marques Bonifácio da Silva, primo do Jaime], deixou lá a vida [, em Angola]. Outro, o Carlos [Alberto Seixas], regressou ferido e ficou incapacitado para realizar uma vida normal. Alguns trouxeram gravada na memória as imagens dos momentos trágicos vividos em combate, nas emboscadas ou em acidentes”…
(iii) Por último, “juntar num salutar convívio e em torno de um programa social e religioso os jovens o Seixal que lutaram em África, desde 4 de Junho de 1961” [data em que partiu o primeiro para Angola, o João Matias] até ao dia 6 de Novembro de 1975, data do regresso do último, o Mário João, também de Angola. (No dia 9 deste mês, houve missa por alma do Arsénio Bonifácio, e deposição de um coroa de flores, na Lourinhã, no monumento aos mortos da guerra do ultramar, seguida de almoço-convívio, no Clube do Seixal).
No concelho da Lourinhã, a guerra colonial fez 20 baixas mortais, 9 em Angola, 6 na Guiné e 5 em Moçambique.
Tive o privilégio de visitar esta exposição na companhia dos meus amigos Jaime Bonifácio Marques da Silva (ex-Alf Mil Pára-quedista, BCP 21, Angola, 1970/72) e Estêvão Alexandre Henriques (ex-Fur Mil Mecânico Rádio-Montador, CCS/BCAÇ 1858, Bissau, Teixeira Pinto, Catió, 1965/67) (Vd. foto acima)
Dos camaradas que estiveram na Guiné, tomei nota dos seguintes (mas havia mais nomes):
fez parte da CCS/BCAÇ 1888 (Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68). Da sua ficha, consta que durante a sua comissão esteve destacado nos aquartelamentos de Fá e Bambadinca (vd. foto à esquerda, o Joaquim num abrigo em Bambadinca), onde actuou como operacional em inúmeras operações de combate, de reconhecimento e de apoio às operações dos fuzileiros”. Felizmente, a sua companhia não sofreu baixas. Esteve 14 anos emigrado em França. Vive hoje no Seixal.
(ii) José Maria Malaquias:
(iii) Adão Cipriano Andrade: foi ajudante de cozinha no Quartel Geral Adidos, em Bissau (1965/67). Diz que foi uma “rica vida”, tendo lá passado “o melhor tempo de tropa”. Após a “peluda”, trabalhou na agricultura e na reparação automóvel. Está hoje reformado.
(iv) Alexandre M. Santos: Sol Atirador Inf, fez parte da CCAÇ 3461 / BCAÇ 3863 (Carenque e Texeira Pinto, 1971/73). Vive no Seixal, segundo creio.
(v) Deixam-me acrescentar que o ex-Fur Mil Estêvão Alexandre Henriques era amigo do Sold José Henriques Mateus, da CCAÇ 1423/BCAÇ 1859 (Bolama, Empada, Cachil, 1965/67), um camarada de que já aqui falámos e que desapareceu misteriosamente, em Outubro de 1966, na travessia de um rio; era natural da Areia Branca, povoação vizinha do Seixal.
Devido à sua especialidade, o Estêvão nunca participou em operações de combate. É hoje empresário rádio técnico em Peniche. E é também um famosíssimo coleccionador de instrumentos de bordo de navios de pesca (bússolas, sonares, rádios, além de miniaturas de barcos).
Lourinhã > Seixal > Clube local > 12 de Agosto de 2009 > Cartaz anunciando a exposição do Estêvão Alexandre Henriques, a decorrer em Peniche até 29 de Novembro de 2009: "Pesca em Peniche,50 anos de rádios, sondas e sonares"...
Fotos: © Luís Graça (2009). Direitos reservados
Aqui ficam os nomes de todos os 39 seixalenses que fizeram a guerra colonial, entre 1961 e 1974 (os últimos sete da lista não têm posters na exposição):
- Emídio Francisco Baltazar
- Carlos Alberto Seixas
- Jaime Bonifácio Marques da Silva
- José Marques Bonifácio da Silva
- Luís Malaquias Marques
- Adão Cipriano Marques
- Quereano Ministro Baptista
- José Maria Malaquias
- Estêvão Alexandre Henriques
- Arménio Pereira
- Arménio Marques Bonifácio da Silva
- Mário João
- António José Pereira Calçada
- Duarte Inácio Cláudio
- Joaquim Damião da Costa
- Elíseo Ferreira Henriques
- Luís Manuel dos Santos Rufino
- Arménio Rasteiro
- Joaquim Pereira Marques
- Inocêncio José Baptista
- José João Camilo da Costa
- José António Costa
- Manuel Mateus Baltazar
- António Luís da Costa Santos
- Fernando dos Santos Baltazar
- Alexandre M. Santos
- José António Bernardo de Oliveira
- Luís Abílio dos Santos Baltazar
- José Luís Marques
- Joaquim Custódio dos Santos
- João Matias Antunes
- António da Silva Inácio
- Arsénio Bonifácio (filho de Joaquim Bonifácio)
- José Mateus
- Carlos Henriques
- Carlos Alberto
- Sebastião Marques
- Luís António
- Domingos Elias
O Seixal na altura (1961/74) era uma terra que vivia sobretudo da agricultura, da exloração das riquíssimas terras, roubadas ao mar, conhecidas justamente como a Várzea do Seixal. Muitos dos jovens que foram para a guerra colonial eram agricultores ou trabalhadores agrícolas. E nem todos tinham, no mínimo, os quatro anos de escolaridade que eram obrigatórios por lei…
Segundo a análise dos dados biográficos dos 32, cerca de um terço terá frequentado, no Ultramar, as escolas militares…. A malta que esteve na Força Aérea e na Marinha, tem as melhores recordações desse tempo da sua vida (por exemplo, o meu amigo Luís Malaquias Marques, que esteve na Marinha). Há bastantes condutores auto entre a malta do Exército. Há apenas um oficial miliciano e dois furriéis milicianos. Uma boa parte do pessoal emigrou para o estrangeiro, depois da sua passagem à disponibilidade.
Em boa verdade, o Seixal poderia ser tomado como uma amostra do país que de 1961 para cá mudou imenso. Mesmo durante os 13 anos que durou a guerra colonial, houve profundas mudanças (demográficas, económicas, sociais, políticas, culturais…). Os organizadores da exposição fazem questão de mostrar os números do conflito:
(i) Foram mobilizados, para os três teatros de operações, mais de 800 mil jovens;
(ii) Cerca de 120 mil foram feridos ou ficaram doentes;
(iii) Cerca de 4 mil ficaram estropiados;
(iv) E estima-se que cerca de 100 mil ficaram a sofrer de stresse pós-traumático de guerra…
Luís Graça
1 comentário:
Uma iniciativa original a servir de exemplo para outras localidades do País e uma forma de homenagear os ex-combatentes da Guerra Colonial. Afinal, o cada um contribuir com o seu poster, é uma forma de se evitar o não por motivos orçamentais.
Parabéns camaradas (da Várzea) do Seixal, Lourinhã.
Vinhal
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