segunda-feira, 2 de maio de 2011

Guiné 63/74 - P8203: Estórias do Juvenal Amado (37): Quando macaco passou por gazela

1. Mensagem de Juvenal Amado* (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74), com data de 13 de Abril de 2011:

Caro Luís, Carlos, Magalhães, Briote e restante Tabanca Grande.
É uma estória que já esteve várias vezes para ser contada, mas porque os factos me incomodam hoje um bocadinho, tem ficado para trás no sótão da minha memória.
E incomoda-me porquê? Porque o que fizemos foi só por malandragem. Galomaro não sendo um hotel com estrelas, comia-se relativamente bem e com abundância, pois o nosso Coronel era bastante exigente em tudo e nesse caso particular também.
Fica aqui a estória em que num dia comemos um parente afastado.


Estórias do Juvenal (37)

QUANDO MACACO PASSOU POR GAZELA

- Um dos alferes periquito é moço do bairro e já lhe prometi uma patuscada daquelas que não se esquecem.

Quem falava assim era o Caramba, dando logo a entender que uma partida bem pregada vinha a calhar.

Na Guiné durante aquele tempo comi coisas que possivelmente nunca comeria noutra situação. Cogumelos do tamanho de pratos, que eram parecidos com os de cá mas várias vezes maiores, cobra, crocodilo (comi em Bambadinca), carne de porco do mato ou gazela, cheias de larvas da mosca varejeira, que depois de lavada, era cozinhada sem mais e despachada a acompanhar umas cervejas.

Quando comemos a primeira vez os cogumelos, ninguém tinha a certeza se eles eram bons. O Lourenço dizia que eram iguais e lá arriscámos. O Aljustrel ainda disse em jeito de gozo:

- Amanhã acordamos todos mortos.

Esse mau pressagio não se confirmou felizmente e nos dias a seguir, o Lourenço e o Caramba que eram os que conheciam fizeram uma razia nos ditos cujos.

Juvenal e um primo afastado

Mas voltemos à patuscada, com que íamos honrar os oficiais piras. Em Assembleia Geral da Sacanagem, resolvemos fazer um petisco à base de macaco. Assim foi combinado, quando fôssemos à lenha, suficientemente afastado do quartel, mataríamos um macaco, com que confeccionaríamos o pitéu . O Caramba ficou encarregue de combinar com o Alferes Esperança e ele que estivesse à vontade para convidar os camaradas dele, que é bom de ver, ficavam com a bebida ao seu encargo, sim porque a velhice era um posto.

Assim foi, na padaria cozinhou-se o macaco dizendo que era gazela. Cheirava bem e estava bom que se fartava. A cerveja corria a jorros, e estávamos já todos muito bem bebidos quando um dos piras presente perguntou como é que nós arranjávamos aquela carne? A risota foi geral e quando dissemos o que era, alguns empalideceram e ficaram notoriamente enojados, incomodados a olhar para os restos nos pratos.

Bem, a festa continuou no Regala onde os nossos convidados continuaram a pagar as bebidas, o que não lhes ficou barato pois nós não éramos gente de meias medidas. Nós bebíamos como de costume muito e alguns deles já bebiam para esquecer o que tinham comido.

Passada uma semana ou mais, estávamos a petiscar umas galinhas quando passa o Alferes Esperança. O Caramba diz-lhe:

- Oh meu alferes não vai um bocadinho de galinha?

A resposta o alferes não se fez esperar:

- Porra! Porra! Não quero nada, vocês são capazes de estar a comer abutre.

Pois é foi giro, mas quis repetir. Fiquei com algum sentimento de culpa em relação aos macacos, que não desapareceu, e é talvez uma das coisas, que me arrependo de ter feito.

Um abraço
Juvenal
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8159: 7º aniversário do nosso blogue: 23 de Abril de 2011 (16): Que a História não esqueça o que o blogue Luís Graça manteve vivo (Juvenal Amado)

Vd. último poste da série de 1 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8027: Estórias do Juvenal Amado (36): Um domingo de futebol em Galomaro

8 comentários:

Anónimo disse...

Camarada Juvenal
Também eu fui alvo de uma brincadeira desse género. Comi macaco cão por cabrito, em Canquelifá, no decorrer duma coluna de reabastecimento. Era para comer ração de combate e o meu amigo Fur.Mil.Cav.MA Luís Encarnação, convidou-me para ir almoçar com eles à Messe de Sargentos, é claro entre Cabrito e Ração de Combate, não havia escolha.
No final do repasto, o Encarnação com um risinho de orelha a orelha perguntou-me " Então o macaquinho estava bom ?".
E estava mesmo. Saboroso, bem condimentado...e se ele estava à espera que eu me agoniasse...enganou-se.
Ainda há minutos comentámos este episódio ao telefone...
Mantenhas
Luís Borrega

Hélder Valério disse...

Caro Juvenal

O que o nosso amigo Borrêga esquece é que o Luís Encarnação e eu estivemos juntos na recruta em Santarém, no mesmo Esquadrão e no mesmo Pelotão....

Essa mania de tentar 'envolver' o Borrêga já é antiga. A seguir vai ser com os pombos... ai vai, vai!

Abraço
Hélder

Anónimo disse...

Meu caro amigo Juvenal,

...Tubo num bem bom.

Fizemos brincadeira semelhante ao comandante da nossa companhia. Só que para nós também era a primeira vez.

Deixa-me dizer que o macaquinho, assadinho com batatas no formo teve muitas dificuldades em passar às "cancelas" da garganta.

Quando passou às ditas, bem regadinho com tinto,até parecia gazela.

Que o diga o capitão Alves que nunca acreditou que fossemos capazes de lhe pregar tamanha partinha.

Um dia contarei a história.

Um abraço amigo,
José Câmara

Anónimo disse...

Também eu-- fui alvo do mesmo, só que em Gadamael comia-se durante semanas inteiras "papa de arroz com estilhaços".
No fim quando me informaram do que tinha comido e se preparavam para a galhofa geral, engoliram em sêco, porque perguntei se não havia mais.
A verdade é que fiquei "enojado", mas quando estava a comer soube-me bem.
C. Martins

Joaquim Mexia Alves disse...

Bela história Juvenal

Também comi várias vezes macaco sem problemas.

Deixei de comer num dua em que vi um macaco esfolado!!!

Grande abraço

Torcato Mendonca disse...

Olá Juvenal

Mais uma boa estória ou história...de que gostei....

Com tanta fominha parece-me que macaco ou macaca...ia tudo.

Tantos dias a feijão frade com feijão...frade!

##Ter memória, disto e muito mais, é preciso##

Abraço do T.

manuelmaia disse...

Juvenal,

A mim coube-me comer abutre por galinha da india e aguia...
Essas praxes eram castiças.
abraço
manuelmaia

Luís Dias disse...

Caro Juvenal

Segundo se dizia, a malta de Galomaro que frequentava o "restaurante" do Regala, comia carne de macaco cão, como se fossem bifanas. É claro que não sabiam...mas ao que parece era verdade. Por sorte, nunca lá fui...mas no Dulombi e nos diversos petiscos que se faziam não tenho a certeza de que não tenha comido carne de macaco. Como diz o Joaquim Mexia Alves senão o víssemos esfolado....e partido aos bocadinhos...e com a fominha que havia!!!!
Boa história.
Um abraço
Luís Dias