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Mensagem do nosso camarada António Dâmaso (Sargento-Mor Pára-quedista do BCP 12, na situação de Reforma Extraordinária) com data de 23 de Maio de
2012:
Aos Camaradas Luís Graça CO-EDITORES, envio as minhas saudações.
Desde há 39 anos que a data 23 de Maio tem sido uma muito
difícil para mim. Significou morte e um trauma muito grande, tão
grande que tenho muita dificuldade de falar sobre o assunto, isto
apesar de ter uma neta que há 14 anos nasceu a 23 de Maio, o que
representa vida.
Tenho alguns apontamentos, muitos com mais de 30 anos que peço para
analisarem, editarem e publicarem se entenderem.
Um Ab
A. Dâmaso
OPERAÇÃO AMETISTA REAL
Em 17MAI73 cerca das 17H00, a minha Companhia - CCP 121 -, juntamente com o BAT Comandos Africanos, embarcou no cais de Bissau na LDG (Lancha de desembarque grande) 201 BOMBARDA, com destino a Bigene. Esta lancha tinha um tripulante conterrâneo que não ma deixou “passar sede”, íamos como sardinha em lata, fui para a ponte estendi o colchão pneumático, mas não consegui dormir por causa do ruído das máquinas e da trepidação. Nesta operação a minha função foi de Comandante interino do 3.º GComb e nunca me passou pela cabeça, que uma Operação aparentemente simples de 3 ou 4 dias se ia tornar nos 15 dias que foram o maior tormento da minha vida.
Levámos a noite toda e parte do dia seguinte a navegar, estivemos a fazer um compasso de espera na foz do rio Cacheu, não me apercebi se tinha a ver com marés, ou se foi para só chegar a Bigene perto do anoitecer, abicámos no porto de Ganturé ao meio da tarde e dirigimo-nos a pé até ao aquartelamento de Bigene. No caminho cruzámo-nos com elementos da CCP 123, que se dirigiam ao porto depois terem andado em operação na zona. Chegámos a Bigene perto do pôr do sol.
Os Comandos Africanos seguiram em frente em direcção ao Senegal e nós ficámos na parada de Bigene, comemos a ração de combate da ordem e preparámo-nos para passar a noite ali, ao meu pelotão calhou ali mesmo num canto da Parada em terreno limpo, liso e descoberto.
Depois de anoitecer, não posso precisar a hora, rebenta uma violenta flagelação ao aquartelamento com armas pesadas, e lá estávamos nós, alapados ao chão, rezando para que nenhuma granada nos caísse em cima, foi por pouco, uma caiu a escassos metros do meu pelotão espalhando uma saraivada de terra e pedras para cima de nós.
Sempre que pernoitava em operações, colocava o equipamento à frente da cabeça, o que me protegeu porque no dia seguinte descobri vários furos nas cartucheiras
No dia 19 quando começou a clarear, seguimos em direcção à fronteira que ficava a cerca de 6Km. Chegados a esta, virámos à esquerda, seguimos pela picada da mesma, passando pelo marco de fronteira 129, mais um pouco à frente virámos novamente à esquerda, caminhámos nessa direcção entre 200 e 800 metros, e emboscámos no cumprimento da missão que nos estava reservada que era manter um
Corredor de segurança para uma possível evacuação sanitária via Héli, entre Neneco e Bigene.
Cerca das oito horas ouvimos do outro lado da fronteira os bombardeamentos dos Fiat G 91, assim como os rebentamentos dos combates que se prolongaram até meio da tarde. Perto do pôr do sol regressámos a Bigene, nesse dia tivemos direito a uma refeição quente.
De novo preparámo-nos para passar a noite na parada e mais ou menos à mesma hora do dia anterior, mais uma violenta flagelação com armas pesadas, desta vez não caiu nenhuma perto de nós.
Havia um oficial do Exército que andava num jipe de luzes acesas, em alta velocidade de um lado para outro, fiquei sem saber qual a lógica de tal atitude, mas não interessava porque naquela guerra, o que mais se via eram coisas ilógicas, como já tinha visto em 1969 em Galomaro um Tenente andar de pistola em punho a atirar aos cães para os assustar.
Dali para a frente, os ataques/flagelações iriam fazer parte do nosso dia-a-dia.
No dia 20 fizemos o mesmo trajecto do dia anterior, fomos emboscar mais ou menos no mesmo sítio, à tarde regressamos e seguimos em viaturas para o porto de Ganturé onde embarcámos juntamente com alguns Comandos Africanos num navio patrulha, vim a saber no mesmo que se destinava a Binta.
Um Ab
A. Dâmaso
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 23 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9937: Efemérides (58): Guidaje foi há 39 anos... Alguns pequenos reparos e a minha homenagem a Amílcar Mendes, Daniel Matos e Victor Tavares (Manuel Marinho)
Sore a Op Ametista Real ver aqui mais postes.
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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