domingo, 25 de novembro de 2012

Guiné 63/74 - P10723: Como estive tão próximo de ter ido para a 38.ª CComandos (Henrique Cerqueira)

1. Mensagem do nosso camarada Henrique Cerqueira* (ex-Fur Mil da 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4610/72, Biambe e Bissorã, 1972/74), com data de 21 de Novembro de 2012:

Olá Camarada Carlos Vinhal
Hoje resolvi contar uma estória relacionada com a minha recruta nas Caldas da Rainha.
Esta estória poderá não dizer muito à nossa tertúlia, no entanto e como sempre fica ao teu critério publicar ou não.
Por agora é tudo.

Um abraço e saudações meus e da NI.
Henrique Cerqueira


Como estive tão próximo de ter ido para a 38ª de Companhia de Comandos 

Caros camaradas da Guiné e em especial todos os Comandos da 38ª, este texto pretende apenas e só ser mais um relato da minha passagem pela vida militar. Serve ainda para prestar aqui a minha homenagem a todas as tropas especiais e muito particularmente aos Comandos da 38ª que estiveram na Guiné entre 1972/74.

Pois é, eu estive quase, quase a fazer parte dessa valorosa Companhia de Comandos. Quer dizer, primeiro teria que provar durante a formação que seria merecedor da "Famosa Boina e Crachá", mas o que é certo é que essa situação não estava nos meus planos e eu explico o porquê.

Durante a recruta nas Caldas da Rainha, RI5, era frequente se comentar em "jornal da caserna" que a malta iria ser selecionada para os Comandos e quem fosse escolhido iria para Lamego e após a recruta seria incorporado numa companhia (que mais tarde se veio a saber ser a 38ª) que iria primeiro fazer o IAO numa província Ultramarina e só depois seria enviada para a Guiné. É então que num belo dia lá apareceu uma equipa de Comandos vestidos a rigor, nas suas fardas de camuflado, e com aquele aspeto altivo que todos nós conhecemos das tropas especiais. Confesso que me senti atraído por tal postura militar.

Foi dado inicio às provas de seleção e lá fomos executando aqueles percursos que toda a malta conhece que é a famosa pista de obstáculos. Conforme iam decorrendo as provas eu ia magicando como era que havia de me safar de ser selecionado, pois que os meus planos para o futuro eram bem diferentes daqueles que se estavam a "desenhar " naquela manhã de 1971. Foi então que quando nos aproximamos do famoso Pórtico eu arrisquei falar com o oficial (penso que era um Tenente). Perfilei-me todo e pedi licença para falar com ele. O oficial disse logo:
- Se pensas que te safas do pórtico tira lá o cavalinho da chuva que tens mesmo que ir lá para cima.

Eu respondi :
- Não meu Tenente, eu não quero é ir para os Comandos. Ele então mirou-me de cima a baixo e questionou porquê e se tinha medo de ser Comando ou de subir ao pórtico e que me deixasse de "mariquices".

Então arrisquei mais uma vez e disse :
- Meu Tenente eu não tenho medo de nada, só que já sou casado e o meu filho nasceu há três semanas e como tal eu pretendo fazer a recruta e depois a especialidade que me tocar e de imediato ir para o Ultramar, pois é esse o destino quase certo de todos nós e assim abrevio no tempo que me está de certeza destinado.

O que é certo é que o Tenente olhou para mim e disse :
- Tens cinco minutos para subir a corda, percorrer o pórtico a correr e saltar para a areia e depois se vê se serás Comando ou não.

Seu dito, meu feito, até parecia que já tinha feito aquilo milhares de vezes e logo que terminei o Tenente vaticinou :
- Boa, serás um excelente Comando e virou-me as costas.

Caí de "cu", mas que fazer?
Lá fui fazendo o resto dos obstáculos, mentalizando-me que iria mesmo para os Comandos.
No final do dia, o meu comandante de pelotão, que era um Alferes já em segunda comissão (era readmitido, segundo ele para continuar a estudar), disse-me que não sabia o que tinha acontecido mas que a minha estratégia tinha resultado, o Tenente dos Comandos não me tinha selecionado, de acordo com a minha vontade. Claro que fiquei satisfeito e lá segui o percurso que me foi destinado, ou seja Caldas da Rainha, Tavira, Elvas, Évora e depois Guiné. Felizmente cá estou hoje a contar esta estória que possivelmente só é importante para mim.

Abro um parenteses para homenagear aquele meu comandante de pelotão, porque nunca encontrei um superior tão cheio de humanidade e compreensão como ele. Lamentavelmente não me lembro do seu nome mas guardo o momento feliz de, no final da recruta, o pelotão se juntar e comprar um volante de competição para o seu carro que era um MINI.

Quanto  Famosa 38ª, tive dois encontros com eles no mato e uma outra vez com alguns em Bolama aquando da minha formação para as companhias Africanas numa das quais vim a ingressar, a CCAÇ 13, em Bissorã.

Quero dizer que eu sempre tive a perceção que nunca iria ser um grande militar e muito menos um militar de tropas especiais. No entanto sempre senti orgulho em ser amigo de antigos Camaradas de tropas especiais. Senti ainda grande orgulho quando o meu filho Miguel (que até nasceu aquando do episódio contado) foi para a tropa e ingressou na Policia Militar, sendo colocado em Oeiras na sede da Nato. No entanto, tal como eu, e mesmo com convite para continuar, ele não se sentiu atraído pela vida militar.

Só me resta dedicar aqui um abraço a todos os Comandos, e em especial aos Comandos da 38ª.

Henrique Cerqueira
____________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 23 de Agosto de 2012 > Guiné 63/74 - P10292: Blogoterapia (214): A minha Praia (Henrique Cerqueira)

7 comentários:

jpscandeias disse...

Tivemos um percurso semelhante. Estive no RI 5 e em Setembro de 1971 fiz as provas para operacões especiais. Para comando, como só iam voluntários e reconheço que não me revia naquela tropa de elite, por issso fui peremtório em recusar. Quando fui informado que iria para Lamego tirar a especialidade OE, pedi, durante o exame médico ao médico para me chumbar, pois se fosse para Lamego isso representava que raramemte poderia ir a casa, no Alentejo. Foi sensivel, e, sem alarido, disse, está bem. Depois Tavira, especialidade At. de Infantaria. Janeiro, Beja RI 3. Março, finais, Adidos. Abril, Bissau de seguida Cabuca, Ccav 3404. Estagio em Bolama em Novembro, 1972. Janeiro 1973, Ccac 12, Xime e Bambadinca. Bolama o regresso em junho de 1973até Maio de 1974.
joao silva ex-furriel mil

Anónimo disse...

De: Augusto Silva Santos
Para: Henrique Cerqueira

Camarada e amigo,
Essa situação que referes do "voluntário obrigado" para os Comandos, julgo que era muito comum na nossa época, dada a dificuldade em arranjarem verdadeiros voluntários.Sendo eu do 1º turno de 71, e tirado a recruta na EPC em Santarém, também passei por esse processo de pré-selecção. Se realmente tivesse ido para os Comandos, não sei ao certo para que Companhia iria, de qualquer forma acabei por lidar na Guiné muito de perto, primeiro com a 35ª e depois com a 38ª. Não foi fácil fazer acreditar os "recrutadores" de então que realmente não queria ir para os Comandos, tropa que muito respeito e admiro, mas na altura estava plenamente convicto que, sendo da arma de Cavalaria, o meu destino seria a PM (disso me fizeram convencer), pois com 1,82 de altura e 80 quilos de peso, teria a "planta" apropriada para isso. Só que o oficial dos Comandos também dizia o mesmo no que respeitava às suas intenções. Nem uma coisa nem outra, tal como tu, acabei por ir parar ao CISMI em Tavira, para tirar a especialidade de Atirador de Infantaria. Antes de ser mobilizado para a Guiné, ainda passei pelo CTSC na Carregueira e pelo CMEFED em Mafra, mas tinha Jolmete à minha espera (BCaç.3833 /CCaç.3306).
Um grande e forte abraço.

Dálio Carvalho disse...

Eu estive também nessa seleção!!! Caldas da Rainha.

Henrique Cerqueira disse...

Na realidade caros camaradas se analizarmos bem todas as estórias que vamos aqui escrevendo neste blogue.Estórias essas narradas por uma geração inteira.Elas são tão coincidentes e tão iguais!
Sempre que estou a ler os postes no blogue ou os comentários da malta,eu sinto muito sinceramente que temos sempre alguem que nos "pertence"como se tratasse de um familiar.Mesmo quando se lê comentários mais ou menos de desagrado...Olhem eu sinto este blogue como uma família.Um abraço a todos e um Bom Dia.
Henrique Cerqueira

A, Mendes disse...

Amigo Henrique Cerqueira .respeitando as razões que te fizeram querer ficar fora da familia COMANDO ,penso que terás perdido a verdadeira emoção de teres pertencido a uma élite de combantentes que unidos em torno de um ideal tramsportaram para os dias de hoje todo o capital de união e que nos faz sentir como irmãos ! obrigado pelo elogio á 38COMNDOS e modestia á parte penso que são justos! Aproveito o comnts para elucidar o Augusto Silva Santos que nimguem era obrigado a ficar nos COMANDOS pois na ceromónia final só ficava quem queria! Não havia volunt´rios á força.Abraço amigo Cerqueira e se quiseres mnda contacto para eu te convidar a estar presente num próximo encomtro da 38COMANDOS! Amilcar Mendes 1cabo da 38Comandos

A, Mendes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Henrique Cerqueira disse...

Caro Camrada A.Mendes.
Grato pela tua observação em relação a ter perdido a verdadeira emoção de ter pertencido á familia dos Comandos.Não meu camarada de certeza que não estou nem estarei arrependido e sabes porquê?
1ºEu tinha mesmo objetivos defenidos quanto á minha participação na vida militar.
2º- Eu se não me tivesse apaixonado pela minha NI ao ponto de decidir casar com 20 anos te garanto que muito provávelmente teria faltado ao serviço militar obrigatório e como tenho dito eu fui sempre um mau militar,mas atenção que sempre cumpri com toda a minha obrigação durante o periúdo militar.Tentei ser um "bom soldado"mas tentei sempre pôr a minha sobrevivência como objetivo principal(mas não descurei a subrevivência de meus camaradas).Como vês e só por isso nunca teria sido um bom Comando.Mas sempre vos admirei assim como outras tropas especiais.
Espero que entendas tu e outros camaradas estas minhas palavras,mas mentir nunca foi muito o meu forte e muito menos agora nesta altura da nossa vida.
Muito grato pelo convite para o vosso encontro e o meu contacto está na listagem que o nosso camarada C.Vinhal manda para todos os tabanqueiros e se me for possível terei muito gosto em participar nesse encontro.
Camarada Mendes um abraço amigo.
Henrique Cerqueira