1. Mensagem do Juvenal Amado, com data de ontem:
Luis , Carlos, Virginio, Eduardo: escrevi em memória do meu pai mas, não querendo ultrapassar os limites em que cada um preste homenagem aos seus, dedico este texto a todos os nossos ausentes, Juvenal Amado.
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Nesta altura das nossas vidas em que colecionamos retratos do passado, cumpre-se um ritual de ausência e saudade. Hoje é dia dos nossos que já partiram, mas que nunca poderemos esquecer.
Transmitir aos outros os nossos sentimentos, sem pudor e sem reservas, é prolongar as memórias e não permitir que a sua passagem pelas nossas vidas se perca para sempre debaixo dos desafios do futuro.
Ali está para sempre imóvel no meio de nós.
Dezenas de amigos passaram as portas escancaradas,
Transmitir aos outros os nossos sentimentos, sem pudor e sem reservas, é prolongar as memórias e não permitir que a sua passagem pelas nossas vidas se perca para sempre debaixo dos desafios do futuro.
Ali está para sempre imóvel no meio de nós.
Olhamo-nos numa pergunta muda, como é possível?
Esta dor indescritível,
Esta dor indescritível,
esta ausência que se anuncia,
este vazio,
este silêncio quase já sem lágrimas,
era o prelúdio da vida inteira sem ele.
Na casa ainda dele,
Na casa ainda dele,
arrancaram-se as portas dos lemes,
subiram-no a pulso pelas escadas íngremes
para que se cumprisse a sua última vontade.
Velamos o seu corpo,
na sua casa e no meio dos seus.
Dezenas de amigos passaram as portas escancaradas,
subiram as escadas naquela noite fria de Janeiro,
olharam o meu pai
e cada um de nós
como tudo se passasse de forma irreal,
como se fosse uma pantomina trágica,
em que cada um ocupava o lugar deixado vago
com a sua partida desta vida.
Quantas conversas ficaram por acabar?
-Foi melhor assim! -
Quantas conversas ficaram por acabar?
-Foi melhor assim! -
diziam-nos à laia de consolo.
Cada abraço que recebíamos
Cada abraço que recebíamos
era como uma prensa,
esmagava-nos com a realidade,
porque não há, e nunca pode haver,
conforto para o irremediável.
Tínhamos assistido ao último acto heroico daquele homem.
Conhecíamos as lutas,
Tínhamos assistido ao último acto heroico daquele homem.
Conhecíamos as lutas,
os seus sacrifícios,
o seu amor,
o seu profissionalismo,
o seu acreditar inabalável,
a sua enorme capacidade de pôr os outros primeiros,
e acabamos por conhecer a sua capacidade de partir
sem uma queixa,
sem uma revolta,
sereno
e com a altivez de quem sabia há muito
que aquele era um tempo que findava
e sem retorno.
Estava com ele quando o médico desenrolou o verídico.
Estava com ele quando o médico desenrolou o verídico.
Recebeu a terrível notícia como quem já sabia
e, a sós, disse-me “isto fica entre nós”,
como se fosse possível eu calar-me
e carregar sozinho o peso da enorme desgraça
que se abatia sobre nós.
Nós ainda tínhamos esperança,
Nós ainda tínhamos esperança,
ele queria que nós a tivessemos
e nunca estivemos tão unidos.
Ele ensinou-nos a viver a sua ausência,
Ele ensinou-nos a viver a sua ausência,
mas nunca com a saudade que temos dele.
Juvenal Amado
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Nota do editor:
Último poste da série > 2 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12240: Blogpoesia (357): Bendito sejas, meu paizinho (J. L. Mendes Gomes)
10 comentários:
Juvenal:
Tomei a liberdade de pegar no teu texto em prosa, e dar-lhe uma estrutura poética, sem tocar um milímetro no seu conteúdo.
Podemos lê-lo agora em voz alta, à volta da mesa, no seio da família, na roda de irmãos, filhos, netos... Podemos dizê-lo com solenidade, gravidade, comoção e emoção... Como se fora uma oração fúnebre...
Obrigado, é uma texto poético de grande sensibilidade, que pessoalmente muito me tocou, e que tem uma função de catarse, ajudando-nos a superar a angústia deste dia em que nos lembramos de todos os entes queridos, pais, parentes e amigos, que fizeram mais recentemente a sua última viagem, a do "barco de Caronte" (como diziam os gregos da Antiguidade Clássica)...
A posia é, sempre foi, um punho erguido contra a angústia que nos provoca a morte, a separação, a perda...
É bom ver-te por aqui, de tempos a tempos... Por exemplo, neste dia...
Meu amigo Juvenal!
Faço minhas as palavras do Luís Graça!
Faço minhas, as suas palavras!
Podemos e devemos ler o seu poema, porque ele diz o que muitos de nós sentimos, nós, os da nossa geração, que vivemos e assistimos aos sacrifícios, que os nossos pais faziam, para ultrapassar as mais duras provações, mantendo altíssima a dignidade, e transmitindo no amor que nos deram, o tudo que faltáva materialmente.
Obrigada Juvenal! Obrigada!
Um abraço forte e fraterno da amiga
Felismina Mealha
Muito bem, meu caríssimo Juvenal, Homem de Bem, como o teu querido Pai.
Abraço forte,
António Graça de Abreu
CARO JUVENAL,
TENHO A FELICIDADE DE TER VIVOS OS MEUS PAIS,EMBORA JÁ TIVESSE SENTIDO ESSE VAZIO IMENSO QUE NUNCA SERÁ PREENCHIDO MIL ANOS QUE VIVESSE, AQUANDO DA PARTIDA DA MINHA FILHA...
É INEXPLICÁVEL...
COMO EU TE COMPREENDO,MEU AMIGO.
PODERÍAMOS ESCREVER CONTÍNUAMENTE,PROCURANDO REBUSCADAS PALAVRAS DE CONSOLO,CATANDO NO FUNDO DO SER A QUE CONSIDERÁSSEMOS MAIS CERTA,MAIS ADEQUADA, A QUE OBJECTIVAMENTE PUDESSE TER O CONDÃO DE DIMINUIR ESSA DOR QUE SENTES,MAS SABEMOS QUE É IMPOSSÍVEL,PORQUE O VAZIO ESTÁ LÁ.
HÁ PERDAS QUE SÓ QUEM AS SOFRE COMPREENDE...
UM GRANDE ABRAÇO AMIGO.
Caro amigo Juvenal
Diz o Luís que transformou a tua prosa em poesia. Fez bem, porque o que está escrito, em termos de corresponder a uma despedida, ganha bastante ao ser assim embelezada.
As palavras estão lá todas.
O elogio a toda a uma vida de trabalho, de confiança, de acreditar, de solidariedade, de exemplo. Está também o 'sabor do irremediável'. A confissão do peso excessivo da 'carga' do teu conhecimento do que se sabia ser o desfecho.
Mas, escritas assim em estilo de verso, ganham a aura que lhe assenta muito bem.
Juvenal, já que dedicas este trabalho, neste dia de culto aos mortos, a todos os nossos pais, agradeço as tuas palavras e a tua intenção, e peço-te que aceites um forte abraço.
Hélder S.
Joaquim Luís Fernandes
Caro camarigo Juvenal
Na comunhão de sentimentos, manifesto a minha gratidão pela tua partilha deste texto poético, nobre expressão da tua alma.
A dolorosa experiência da definitiva separação física daqueles que mais amamos, deixam-nos no coração uma mágoa, qual fogo que não se extingue.
Consola-nos esta possibilidade de os tornar presentes, neste execício de diálogo interior e profundo, nesta outra nova dimensão da vida, do espaço infinito e intemporal, do mistério da eternidade.
O meu forte e fraterno abraço
J.L.F.
Eu mando-te um abração, meu caro Juvenal.
Gostei do que nos transmites com essa tua sensibilidade de sempre.
Abraço fraterno do, T.
Juvenal,
Deixa-me sómente dar-te um abraço de agradecimento.
José Câmara
Caro Juvenal,
Adoptei a tua prosa transformada no teu poema para uma homenagem aos meus pais.
Perdoa a usurpação e em paga dou-te um grande abraço de solidariedade.
Adriano Moreira
Partilho na integralidade dos teus sentimentos paternos.E, no íntimo, fiquei com as tua belas palavras e dediquei-as a meu pai e minha mãe, que Deus tenha em eterno e merecido descanso. Em breve(?) virá, a nossa barca nos buscando. Apenas desejo para os meus a certeza de que nunca os
esqueci. A certeza de que os levarei para sempre nos meus olhos e no meu sentir.
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