Foto (e legenda): © José Claudino da Silva (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Do livro em pré-publicação, no nosso blogue, do nosso grã-tabanqueiro José Claudino da Silva (*)
25º Capítulo > AS MENSAGENS NATALÍCIAS
Vieram os repórteres fazer as gravações para as mensagens de Natal de 1972 (**). Safa!, ainda estávamos no dia 23 de Outubro. E se morríamos todos antes do Natal? Será que as nossas famílias iriam ouvir as mensagens?
Confesso que não achei muito correcto, mas depois informaram-me que, se eu morresse, me cortavam do filme por isso fiquei mais descansado.
“Alô queridos pais, irmãos, aqui o soldado tal. Encontro-me de boa saúde e feliz por defender a pátria. Um abraço e adeus até ao meu regresso”.
Para mim, essa mensagem não dava. Não tinha pai nem vivia com a minha mãe ou com os meus irmãos. Tive de dizer “querida avó” e mais umas balelas obrigatórias. Nesse dia, estava convencido de que no Natal ia aparecer na televisão.
“Alô, Penafiel. Daqui de Fulacunda na Guiné Portuguesa. Fala o 1º Cabo Condutor Auto Rodas 158532/71 que deseja um bom Natal e um feliz ano novo a todos os seus entes queridos.”
Só no fim é que me lembrei e acrescentei:
“É verdade! Chamo-me José Claudino da Silva. Adeus, até ao meu regresso”.
Ficou assim.
Afinal, por motivos imprevistos, as mensagens só iam ser transmitidas via rádio e os nossos familiares seriam avisados das datas. A minha avó foi informada três dias depois da minha mensagem ter ido para o ar, mas ela tinha-me escutado, pois ouvia todos os dias, em casa dos vizinhos, as mensagens dos soldados. Para ela, cada um que falava era como se fosse o neto. Eu fui o primeiro neto que ela teve na guerra.
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 21 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18118: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capítulo 17: inesperada 'promoção' a 1º cabo de reabastecimentos com direito a jipe e a máquina de escrever HCESAR...
2 comentários:
Caro José Claudino da Silva
Obrigado pela partilha deste pedacinho de história
Um abraço apertado
IC
Quantos de nós não gravámos mensagens natalícias através da RTP na, muitas vezes vã, esperança de que, lá na terra, nos vissem, ouvissem e acenassem!...
Quantos lares, nessa época, tinham um aparelho de televisão ? E um telefone fixo ? E um aparelho de rádio?...
Confesso que nunca fui solicitado (ou convidado ou obrigado...) a gravar mensagens de Natal para a RTP... Desconheço os critérios usados para selecionar as unidades, os locais, os militares...Presumo que, na Guiné, fosse dada prioridade aos locais do interior e às praças...
Confesso que não sei como é que eu teria reagido, na época, se fosse selecionado... Iria deixar falar o coração ? Iria ser "politicamente correto" ? Iria utilizar a ironia, o cinismo ? Iria fazer autocensura ? Iria recusar a entrevista ?
Não sei... Não passei por essa experiência, felizmente para mim... Mas há aqui camaradas que podem dar o seu testemunho...como o fez José Claudino da Silva!...
Bravo, camarada!... Estou a gostar mesmo do teu diário!....
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