sábado, 18 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20868: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (7): Op. Confinamento, retrato do estado psicológico dos Bandalhos

1. Em mensagem do dia 9 de Abril de 2020, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta Boa memória da sua paz, dedicada à senhora sua Mãe, uma centenária que parece ter vencido o terrível Coronavírus.


BOAS MEMÓRIAS DA MINHA PAZ

6 - Op. Confinamento

Todos nós, incluindo, talvez, as nossas autoridades sanitárias, estávamos convencidos de que este novo “coronavírus” não chegaria a Portugal. Quem acreditava que esta “peste chinesa” se viesse a deslocar até cá?
Com muito respeito pelos “chinocas”, os tais que estão, pacificamente, a tomar o Mundo, só quando “il nostri fratelli italiani” foram invadidos, é que acreditámos que aquilo se poderia alargar até aqui.
Todavia, essa fatalidade era atribuída mais ao descuido dos italianos do que à sua imparável evolução. E fomos acreditando que ela não nos apoquentaria. Porém, a sua implantação foi-se alargando pela Europa e pelo Mundo.

O último dia de convívio do “Bando” (11.Março.2020)

Enquanto isto acontecia, nós, os do “Bando”, mantínhamos os nossos contactos, as rotinas e as nossas brincadeiras.
De repente, a coisa agravou-se aqui mesmo ao lado, em Espanha, e começou a invadir-nos sorrateiramente.

Foi já em plena pandemia da Covid -19 que, no final de mais um excelente convívio – Op. Sarrabulho - que o nosso Presidente assumiu, com mais rigor, a devida orientação comportamental do nosso “Bando”.


E foi na taverna do S. Tomé que, quando se apercebeu que o presunto havia sido devorado sofregamente, como causa evidente do acumulado stress e ansiedade, deu um murro na mesa e decretou:
- Vamos entrar todos de quarentena!

Desde então, são casos e casos de inadaptação caseira; de trabalhos, abusos e conflitos; de manifesta falta de calma e evidente ausência de jeito. Se, fora de portas, não valíamos grande coisa, agora, internados, mostramos que não valemos um chouriço (para não dizer: um caralho).
Mas, por outro lado, temos de louvar o esforço de alguns e, acima de tudo, enaltecer as nossas mulheres (as legítimas, claro!) que, decepcionadas com a possibilidade de segunda lua-de-mel, vêm heroicamente resistindo a tudo de mau e do pior que um velho lhes possa dar.

Para fazermos uma ideia da situação actual dos nossos “Bandalhos”, aprisionados nos seus lares, vamos referir os abandalhados casos, cujos verdadeiros nomes, como é óbvio, não vamos poder apontar (porque apontar é… feio).

- Mal chegou o primeiro fim-de-semana, uma série de “Bandalhos” procurou saber se o Zé dos Fados continuava nessa vida de pataniscas e binho berde. É que ele deixou a malta muito apreensiva devido ao seu contacto durante a Op. Sarrabulho. Só aliviámos a ansiedade depois de decorridos os tais 14 dias.

- Ao fim de 5 dias de confinamento, já havia chamadas telefónicas entre mulheres amigas que desesperavam com o comportamento de seus maridos, mais agarrados ao álcool e isolamento do que aos seus deveres do amor e do acasalamento. Um deles foi recuperado pelo INEM, de garrafão na mão, já sobre a Ponte da Régua e outro a dormir, quase em coma, num tasco perto das Termas de S. Vicente. Este justifica-se porque, como de costume, andava aos cabritos; o outro já não diz coisa com coisa (Será excesso de inspiração poética?).

- Outro, querendo mostrar as suas capacidades de eterna juventude, encheu um saco de produtos de fumeiro e uma “bag-in-box” de 20 litros de vinho barato, agarrou no gato e fugiu para a parte alta do concelho de Gondomar.


Subiu a uma árvore e lá se instalou. De tempos a tempos, dá gritos a imitar o Tarzan. É fácil localizá-lo, porque ele assumiu que agora vive nos 1.ºs Galhos da 3.ª Árvore da Rua dos Loureiros, em Medas.

- Outro Bandalho, dali dos lados do S. Domingos da Serra (já perto da China), agarrado ao instrumento, não faz outra coisa. A mulher é que já não o aguenta. Ele, muito criativo, inventa posições, mexe com as mãos, trabalha com os dedos e murmura alguns sons, mas… pouco consegue.

- O Rapaz da Foz, está tão obcecado por ver o mar a bater no farol, que não sai do muro da Foz, nem por nada. Já não usa telemóvel, não ouve ninguém, nem a mulher a chamá-lo para ir comer. Vive perto de outro “Bandalho”, o “Sorridente”, que não larga a neta, nem para a mãe lhe dar de mamar. Nos intervalos, vai ter com o primo, para emborcar digestivos, num dos bares clandestinos.


- O Senhor de Rio Tinto, também se isolou. Não comenta no facebook e não vem à janela, porque tem vergonha do bigode, já mal-amanhado. É que anda desesperado porque o barbeiro fechou e ele, que andava sempre aparadinho, tornou-se num “Bandalho” de aspecto reles.

- O Mesquita também está sem contactos. É pena, porque ouvi-lo defender a pureza das cores Azul e Branco é uma maravilha. Esperemos que não se tenha zangado com as insinuações infames lançadas pelo tresmalhado duriense, na Op Lampreia.

- O Frade, tão reservado nos seus comentários, desapareceu da malta. Há quem diga que saiu de casa e anda focado na procura de um gajo, seu conhecido, a quem demos um chapéu do Bando em troca de um porco (que ainda não entregou).

Entre Bandalhos as promessas são para cumprir

- Chocante é o caso do Bandalho que já não pode ir para Cinfães tratar das coisas do campo, e que ficou preso nas encostas de Coimbrões. Não se cansa de mandar fotos para o facebook, dizendo para onde está a olhar e o que está a fazer. Passa a vida a contar os comboios que passam. Dizem que, da janela, armado em Chefe de Estação, faz sinais com uma bandeira, sempre que um comboio passa. A mulher, coitada, de manhã cedo, leva-o, com o cão, ao relvado da rotunda do Morango, para fazerem exercício e aliviarem… as tripas.

Ainda mais simples que a açorda alentejana

Também já mostrou que está a pão e água. E que, mesmo assim, faz petiscos.

- O Isolino está cada vez mais isolado. Quer entregar a pasta de Presidente da Casa dos Lampiões, e ninguém aceita. Dizem que foi apanhado pela Polícia, na zona de Campanhã, a bater de porta em porta nas casas de Super Dragões a fim de lhes entregar a referida casa abandonada.

O Súcio em Mato Grosso

- Do Súcio ninguém sabe nada. Faz tudo em segredo. Tanto pode estar na Terra Santa a ver o que fazem ao Cristo, como na Praia Copacabana a apreciar o bamboleio das bundas gostozonas. Para mim, ele deve estar retirado em Amazonas, para onde se tem direccionado muito ultimamente. Esperemos que se cuide das perigosas coronas e das covids traiçoeiras.

- De referir também, que o nosso Presidente tem passado um mau bocado. A mulher, que sempre teve por casa alguns cães em trânsito para o abrigo da sua Associação Protectora da Póvoa de Varzim, está inactiva e acusa stress pela ausência do barulho dos habituais inquilinos. Pediu-me para eu arranjar umas cassetes de cães a ladrar, para a ajudar a acalmar e a adormecer.
Por outro lado, ele não suporta a fome (está a engordar que é uma coisa abismal). Foge de casa, procura tascos e confeitarias que ainda estejam abertos. Há dias, caiu de cama, cansado, porque tinha ido lá para junto do Quartel do Carmo, pensando que as “pastelinhas de Chaves” estavam disponíveis (abertas). Não as encontrou abertas e, desfalecido, levaram-no para casa numa carrinha de apoio aos “sem-abrigo” da zona dos Clérigos.

- O Valdemar de Paredes, que andava sempre fora, foi enjaulado num Lar. Saturado com aquele ambiente de velhotas, fugiu para casa, prometendo que passaria a acatar todas as ordens familiares.

- Quem está, também, a atravessar um mau bocado é o Mano Velho. Passados os primeiros 15 dias, já com a arca em baixo e os talhos fechados, virou-se para as “nhecas”, coelhos e gatos, que anda a tentar apanhar. Dizem que está a emagrecer mais de quilo e meio por dia. Se a DGS não mandar abrir os talhos, vai ter problemas sérios com os vizinhos, caso tenha sucesso na “apanha”.

- O João Caladinho, agora que está fechado, tornou-se numa rela insuportável. Dizem os de Massarelos que vêem, lá no alto de Gaia, uma senhora loira a fazer sinais de fumos escuros, perigosamente perceptíveis por Índios da Ribeira, Vagabundos da Foz e Pistoleiros da Afurada.

- No Zoológico da Maia, já foram vistos “Bandalhos” em fuga. Não sabemos se estarão a fugir dos humanos. O certo é que um deles foi apanhado no terraço do Isqueiro, de malas aviadas, à espera de algum Ovni. Há quem diga que isso se deve mais a uma questão de desafecto com um afim familiar.

Foi lá em cima, no terraço do “Isqueiro”, que surpreenderam o Maiato preparado para fugir.

- Lamentável foi saber que o Arturinho do Bonjardim, famoso pela sua perspicácia no “negócio das carnes”, apanhou um enxerto de porrada ao tentar levar donzelas ao domicílio.


- Ao “Bandalho” de Crestuma, muito habituado a sair ao encontro dos primos, foi-lhe escondida a chave do carro e, quando queria fugir de bicicleta, tiraram-lhe as rodas. Agora, só lhe resta comer e dormir, olhar o desleixado quintal ou sentar-se a escrever umas merdas. Sem barbeiro, mais parece um animal.

- Salve-se o caso do Zé Ricardo, que se instalou na sua mansão de férias. Anda ocupado a recriar o seu passado ligado a Cabuca. Ele reactivou a Rádio “Nô Tera”, de onde tem transmitido poesia, palestras culturais e, até, a tal missa em crioulo.
Todavia, nem tudo lhe tem corrido pelo melhor. Tem sido incansável a mostrar à enclausurada namorada as suas habilidades gastronómicas. Algumas foram transmitidas em directo nas redes sociais e hoje, já constam na “Play List” dos vídeos sobre essa matéria.

A satisfação depois da limpeza na zona das suites dos cães.

Claro que ninguém come o que ele cozinha. Nem os cães. Um deles, o famoso Orelhas, comeu, tentando agradar ao patrão, mas a diarreia que apanhou foi tal que o obrigou a uma desinfestação monumental da suite dos cães.

Este é o tal Orelhas que goza de privilégios irritantes. Desta vez, gritou comigo, escaqueirou-me o chapéu e peidou-se descaradamente à nossa frente.

- O Chico do Mogadouro, apanhado pelo Estado de Emergência, teve que ficar em Brunhoso. Está hospedado em rigoroso isolamento sanitário, na casa do Zeca Diabo. Só lá entram os habitantes de Brunhoso e os emigrantes que vão chegando. Pensa-se que esta aldeia ficou vacinada com o desmesurado consumo de vinho caseiro de alta graduação (16/17 Graus) e com a bosta do gado acumulada nas ruas ao longo dos séculos, como pavimentação. Confiamos que com essa tal imunidade local, mais as mesinhas e dietas dessa unidade hoteleira, ele venha de lá carregadinho de energia para nos motivar, que a gente bem precisa.

******

Vamos acreditar que tudo correrá pelo melhor. Perante os primeiros resultados, confirma-se que os ex-Combatentes, acusados de “peste grisalha”, se estão a defender bem do coronavírus. Será das vacinas de cavalo que tomaram?

José Ferreira
(Silva da CART 1689)
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Nota do editor

Último poste da série de 10 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20839: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (6): Bó Coelha, uma força da natureza, com 100 anos, está a resisitir ao Coronavírus

7 comentários:

Zé Manel Cancela... disse...

"Esbalhardeime" a rir com esta situação
do isolamento obrigatório.No que respeita
do tal que vai as tascas das Termas de S. Vicente,
está errado.Eu sei de fonte segura,que não sai de casa
á mais de um mês…..
Um abração amigo.E continua…….Com as historias da tua paz.

Ricardo Figueiredo disse...

.Bem , Zé Ferreira , não sei bem como começar , se começo por ti ou pela extensa e tão verídica quanto imaginária reportagem que ousaste publicar .
Quanto à reportagem ela está ,mais uma vez , digna de um repórter-jornalista "free lancer" , daqueles muito mal pagos , que conseguem inventar coisas diabólicas , para encher páginas da revista que os contratou e que acabam por ser lidas sofregamente pelos seus leitores,transformando as notícias em factos fidedignos.
Consegues ser muito,mas muito melhor ,que todos os "free lancer`s que conheço e muito melhor ainda que qualquer profissional pago a peso de ouro, das nossas televisões pública ou privadas.
Como escritor , também consegues cativar os leitores ,com estórias sui generis , que no final do livro ,se interrogam muitas vezes da sua veracidade narrativa ou , pelo contrário , se transformam nas personagens e lhes dão vida.
Mas voltando a esta reportagem,reparei que de ti , só falaste ou melhor , só publicaste uma fotografia numa bicicleta estática , de roupão e em pijama e de chinelos de quarto !
Deixaste-me pois a obrigação de completar esse quadro de movimento fictício , o que passo a fazer, com a devida vénia:
O Zé Ferreira , após a Operação Sarrabulho, regressou ao seu domicilio , sito no "Cu" do Mundo ,vestiu o pijama,sobreposto por um robe às riscas , tipo presidiário,calçou os chinelos, montou uma bicicleta estática e até hoje não parou de pedalar , julgando que se estava a afastar do Covid19 . Na sua fuga constante ,pirou e desatou a vestir o papel de free lancer , passando a reportar o que a sua imaginação ditava.
Mas a verdade é que apesar de tudo, acertou em algumas coisas !
Por falar no Zé Ferreira , alguém mais lhe pôs a vista em cima ? É que acabo de receber uma chamada da sua sempre amada esposa ,que me comunica que já não o vê na varanda,nem a ele ,nem à bicicleta, será que de tanto pedalar a bicicleta andou mesmo ?
Um grande abraço Zé Ferreira e muito obrigado por mais este teu belíssimo e oportuno texto.

Manuel Passos disse...

Boa tarde a todos e um forte abraço.
Zé obrigado por estes poucos minutos que me deste de "lazer" sim poucos minutos porque a idade já não nos dá a resistência de tanto rir. HIHIHIHI!!!
Mas como diz o ditado ,que depois da tempestade vem a bonança, e quem sabe depois da quarentena não vem uma quarentona, aguardemos...
Um grande abraço "velho" Periquito...

jteix disse...

Foi o COVID izer...
O Zé Ferreira foi dado como um caso perdido...  
Mas afinal ainda anda muito pró-activo e ainda bem. Já todos pensávamos que estava che-che (que é ali prós lados da Guiné) e estávamos na disposição de o tornar incapaz, não fosse ele capaz de minar o Bando no sentido de tomar de assalto o poder e então sim, era prá desgraça. Mas afinal, para nosso alivio, o sacana, continua a "inventar estórias" de tal maneira que já pensa editar o seu 1º vol da nova série ".BOAS MEMÓRIAS DA MINHA PAZ", só para não nos deixar em paz. Como ele é bom rapaz (ele o diz), a gente perdoa-lhe o mal que nos faz, pelo bem que nos sabe... fazer rir!...
Até o desgraçado do afilhado, o Xina, que eu muito admiro e prezo, (não por saber usar o instrumento, nem por lhe dar bom uso com as mãos), escapou  aos laivos do Zé. 
Zé, não precisas de te preocupar com as kasse7es para a mulher do Presidente, as amigas encarregam-se disso na sua página do face, não tem lá outra coisa... e ela retribui com o mesmo.
Apesar desta extensa lista de factos (ou fatos?) que o Zé relata, esqueceu-se de dizer que além do Presidente ser visto atrás dos pastelinhos, ele também foi visto, ali para os lados da Serra do Pilar, à procura das covinhas por 25 tostões, mas também dos cachorros da Vânia, de que ele tantas saudades tem, na tal fuga com o primo.
Um abraço Zé e... não te preocupes.
Estamos imunes com a tal vacina de cavalo, mas tu duplamente, porque tás apanhado do clima.
cumprim/jteix  

Valdemar Silva disse...

'Foi o COVID izer...'

Será a frase do dia.

Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

Caro Zé Ferreira

Belíssima esta tua subjectiva e objectiva reportagem, digna de quem tem qualidade para mais altos voos, aliás, têm sido tantos os exemplos da tua capacidade de configurar cenários à volta das pessoas que fizeram e fazem parte do teu círculo de camaradas e amigos, que nada me espanta. Dessa tua capacidade singular para brincar com as coisas sérias da vida resulta alegria e felicidade para todos nós.
Obrigado, grande camarada.

Carvalho de Mampatá

José Freire disse...

Amigo Zé Ferreira,
Parabéns e obrigado por mais esta belíssima reportagem que li e reli com muito agrado. Desejo que este e outros textos que tens publicado, sejam compilados em novo livro de boas histórias em tempo de boas bandalheiras.
O meu desaparecimento é motivado por ser um bandalho bem comportado, quando não me porto mal, e manifestar alguma resistência à era da internet.
Quanto às ofertas do chapéu e do animal, acredito que foram genuínas e penso que ainda não se concretizou por falta de contacto. Voltaremos a falar do assunto no próximo convívio presencial.
Um abraço,
José Freire