Há sobejas razões para dizer que esta imagem é o ícone máximo da Guiné Portuguesa e da Guiné-Bissau. Ninguém que por ali passou resistiu ao assombro daquelas linhas ondulantes, teve que questionar que esforço da raça ali era motivo de préstito. Chegada a independência, na euforia cega de sapar pela raiz toda a simbólica da presença colonial, tentou-se dinamitar o monumento, não tugiu nem mugiu, aquela tonelagem de pedra aguentou todos os assaltos. Este monumento faz ligação com o passado, como um dia, esgotados todos os ressentimentos do colonialismo, se perceberá que Honório Pereira Barreto é um dos pais na nação e que aqueles colonizadores que aqui arribaram lançaram as bases de uma nova identidade que durante séculos se esfumou no conceito da Senegâmbia Portuguesa.
© Imagem que se recuperou do nosso blogue, com a devida vénia
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 11 de Janeiro de 2018:
Queridos amigos,
Estamos agora na presença de um gerente que tem a noção precisa de que é necessário transmitir para Lisboa informações úteis sobre a evolução agrícola. Na indústria ninguém investe, e fica comprovado que durante o período da governação de Arnaldo Schulz se trabalhou afincadamente para que, a despeito da ferocidade da guerra, se incrementassem projetos para melhoria de sementes e a atração de novas culturas. Tudo isso o gerente conta e numa linguagem neutral e assética a guerra está no pano de fundo.
Vai chegar o ano de 1969 e surge uma referência a de que pode aparecer um novo banco, o gerente presta as informações de tudo quanto ouviu.
Um abraço do
Mário
Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (41)
Beja Santos
No relatório de 1966, o gerente entende continuar a detalhar a situação das colheitas, mas desta vez usa uma assinalável contenção verbal. Fala no escasso número de produtos exportáveis, sem referir explicitamente a guerra diz que se mantêm as circunstâncias impeditivas ao maior desenvolvimento agrícola. Quanto aos principais produtos (mancarra, coconote e óleo de palma) diz não haver estimativas oficiais que avaliem o grau da sua produção anual. É sofisticado, contorna de novo o impacto da luta armada dizendo que não se consegue da população autónoma o manifesto das suas produções. Mas não esconde as razões da quebra da produção de arroz:
“O arroz, que em anos não muito recuados chegou a atingir um volume de produção apreciável, desapareceu praticamente do rol do já minguado número das principais culturas.
Esta quebra de produção deve-se ao facto do chamado celeiro da Província – o Sul – se situar precisamente na zona mais afectada pelo terrorismo e que impede as populações de se dedicarem com regularidade aos trabalhos agrícolas”.
E recorda a ação do governo no campo da agricultura: intensificação da cultura da mandioca, empreendimento levado a cabo em Bolama; intensificação da cultura do caju, durante o ano de 1966 já tinham sido exportadas 766 toneladas; melhoramentos e renovação de sementes, com escolha de campos para a adubação de mancarra, introdução de uma nova variedade de arroz vinda das Filipinas, semeada uma faixa-terreno com sementes de Kenafe, fornecidas pela Companhia Têxtil do Pungué, de Moçambique; dava-se continuidade ao trabalho de utilização em terrenos recuperados na região de Empada. Mais adiante, o gerente relevava o que se fazia no centro-piloto de Prábis, efetuara-se um ensaio experimental de fertilização numa cultura de arroz, ao mesmo tempo que se preparava o arrozal tinham sido estabelecidos viveiros e instalara-se uma horta com parte destinada à multiplicação de sementes e outra com objetivo comercial; fora igualmente instalado um apiário; começara a derruba do palmar natural que iria ser substituído por palmeiras melhoradas.
E é pormenorizado no fomento da palmeira, escrevendo o seguinte:
“Para o triénio 1965/1967 fora estabelecida a seguinte meta: plantação de 5 mil hectares de palmeiras melhoradas. Conjugando este objectivo com os meios naturais e humanos à disposição da Brigada de Estudos Agronómicos, concluiu-se pela impossibilidade de material de cumprir aquele programa”.
Mas ainda havia trabalhos realizados durante o ano em curso como produção de sementes híbridas no Posto Agrícola do Pessubé, onde também se mantinha um pequeno viveiro de ensaio com o fim de industriar o pessoal nas técnicas próprias, fora instalado na ilha de Bubaque um centro de fomento de palmeiras melhoradas e transferira-se dos viveiros Teixeira Pinto para o centro-piloto de Prábis por estarem mal localizados. Conclui esta relação sobre a situação agrícola informando que se continua a desenvolver o fomento do caju.
Nunca aludindo às contingências da guerra, escreve que durante o período ficara concluído o cais de Bambadinca, tendo sido encomendada uma grua para o mesmo e que estavam em reparação os cais de Binta, Bigene, Cacheu e Buba.
Já em 1967, escreve que se pode considerar satisfatório o ano agrícola, “pois que as colheitas de amendoim e de arroz, nalgumas localidades, excederam todas as expectativas, alcançando, não obstante o condicionalismo da presente conjuntura, um volume realmente considerável. Apesar de se ter trabalhado com uma elevada dose de improvisação, algo de válido resultou dos ensaios levados a efeito na campanha agrícola de 1967. Em presença do ineditismo de muitos trabalhos realizados, não restam dúvidas que a primeira conclusão é a de que foi dado um primeiro passo para a resolução do problema. Efectivamente, tanto no campo das plantas industriais, como alimentares e forrageiras, introduziram-se espécies e variedades novas, cuja adaptação se pode considerar, para a maioria dos casos, de elevado interesse. Estão neste caso o tabaco escuro seco ao ar, as leguminosas forrageiras e siderantes, a soja, o feijão nhemba e o girassol, além das indicações valiosas sobre a cultura do milho e ensilagem”.
Acrescenta referências ao trabalho da Brigada da Guiné da Missão de Estudos Agronómicos do Ultramar, em Pessubé, quanto ao fomento da palmeira, bananeira e do caju.
O texto referente a 1968 é bastante lacónico:
“Persiste a insuficiência da produção agrícola na Província e, em consequência, o declínio nas exportações, no poder de compra do autóctone e no movimento comercial nos locais onde não estacionam efectivos militares, porque naqueles em que eles permanecem mais tempo, como é natural, mormente em Bissau, vê-se que os negócios têm progredido sensivelmente, dado que eles e suas famílias são, sem dúvida, os principais consumidores e constituem, por isso, um forte sustentáculo de momento ao comércio dessa área, que, assim, consegue cumprir com pontualidade os seus compromissos, vivendo, até, certo modo, algo desafogadamente.
Temos portanto que a Balança Comercial, por força da diminuta exportação e do aumento da importação que se verificou, continua desequilibrada, outro tanto não sucedendo à Balança de Pagamentos, cuja posição é boa, mostrando considerável salto positivo, o qual proveio, em grande parte, dos pagamentos que, de conta da Metrópole, aí se vêm fazendo”.
Aumentara, portanto, graças ao desenvolvimento do setor comercial, o número de operações e a melhorias dos lucros do BNU na Guiné.
Em 1969, a situação da praça não conhece alterações profundas, como se escreve:
“Mais um ao se passou sem que fosse possível conseguir o restabelecimento da vida ordeira e pacífica desta parcela do território nacional, apesar dos enormes esforços materiais e humanos que têm sido empregados nesse sentido e ainda no do seu desenvolvimento socioeconómico.
Verificou-se um ligeiro aumento na produção agrícola, a que não foram estranhas as melhores condições climatéricas e a protecção dada pelas nossas tropas às populações rurais, que puderam intensificar as suas culturas tradicionais, em especial a mancarra e o arroz.
Desta melhoria conseguida no sector agrícola também beneficiariam as actividades comerciais de toda a Província, que continuaram a poder solver satisfatoriamente os seus compromissos, não só no que respeita ao crédito concedido directamente pelo banco mas ainda às suas responsabilidades provenientes das mercadorias importadas.
Na indústria não houve praticamente investimentos.
Em face do baixo nível ainda verificado na produção agrícola, em relação às reais possibilidades da província, e ao seu insignificante poder industrial, continuou a ser necessário importar quase todos os bens de consumo destinados aos efectivos militares e à população civil.
Contudo, os meios de pagamento sobre o exterior não foram de forma alguma afectados. Esta solidez da balança de pagamentos deve-se às transferências da Metrópole, destinadas às Forças Armadas”.
Mas em 1969 surgia uma ameaça ao BNU na Guiné. Em 14 de Maio desse ano, o gerente informava o governador em Lisboa, a título confidencial da possibilidade de se estabelecer um banco comercial na Província.
(Continua)
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Notas do editor:
Poste anterior de 22 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18766: Notas de leitura (1077): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (40) (Mário Beja Santos)
Último poste da série de 25 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18776: Notas de leitura (1078): História das Missões Católicas na Guiné, por Henrique Pinto Rema; Editorial Franciscana, Braga, 1982 (6) (Mário Beja Santos)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sexta-feira, 29 de junho de 2018
Guiné 61/74 - P18789: Parabéns a você (1462): José Firmino, ex-Soldado At Inf da CCAÇ 2585 (Guiné, 1969/71) e Santos Oliveira, ex-2.º Sarg Mil, Pel Mort Ind 912 (Guiné, 1964/66)
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Nota do editor
Último poste da série de 27 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18783: Parabéns a você (1461): Fernando Maria Neves Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2404 (Guiné, 1968/70) e Vítor Caseiro, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 4641 (Guiné, 1973/74)
quinta-feira, 28 de junho de 2018
Guiné 61/74 - P18788: Álbum fotográfico de António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71) - Parte V: Ponta Consolação, na margem esquerda do rio de Caleco ou de Bula, afluente do rio Mansoa
Foto nº 35 > Guiné > Região do Cacheu > Bula > Ponta Consolação > Posto de vigia mais eficiente que o de Tancos!
Foto nº 33A > Guiné > Região do Cacheu > Bula > Ponta Consolação > Com um grupo de camaradas de armas (I).
Foto nº 33 > Guiné > Região do Cacheu > Bula > Ponta Consolação > Com um grupo de camaradas de armas (II).
Forto nº 32 > Guiné > Região do Cacheu > Bula > Ponta Consolação > Carapaus fritos com arroz_ eu ao meio, com os Fur Mil Zé Lagoa e Norberto Gonçalves.
Foto nº 31 > Guiné > Região do Cacheu > Bula > Ponta Consolação > O nosso chalé
Ontem... |
1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), natural da Vila de Fernando, Elvas, e novo membro da Tabanca Grande, com o nº 757:
... hoje |
Guiné > Região Cacheu > Bula > CCAV 2639 (1969/71) > Legendas das fotos (de 31 a 35 de u m total de 55)
31. Ponta Consolação > Chalé da distinta classe!
32. Ponta Consolação > Carapaus fritos com arroz com os Fur Mil Zé Lagoa e Norberto Gonçalves.
33. Ponta Consolação > Com um grupo de camaradas de armas.
34. Ponta Consolação > A nossa horta.
35. Ponta Consolação > Posto de vigia mais eficiente que o de Tancos!
31. Ponta Consolação > Chalé da distinta classe!
32. Ponta Consolação > Carapaus fritos com arroz com os Fur Mil Zé Lagoa e Norberto Gonçalves.
33. Ponta Consolação > Com um grupo de camaradas de armas.
34. Ponta Consolação > A nossa horta.
35. Ponta Consolação > Posto de vigia mais eficiente que o de Tancos!
Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)
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Nota do editor:
Guiné 61/74 - P18787: Memórias de Gabú (José Saúde) (68): As minhas memórias de Gabu: A antiga Nova Lamego (José Saúde)
1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua série.
Histórias e memórias de Gabu
A antiga Nova Lamego
Denominada então como Nova Lamego, sobretudo ao longo da guerra colonial, Gabu é uma região cujas fronteiras confinam a norte com o Senegal, a leste e a sul com as regiões de Tombali e a oeste com Bafatá.
Recorrendo a dados históricos contemplados na Wikipédia, enciclopédia livre, Gabu foi a capital do Império Kaabu, um reino Mandinga que existiu entre os anos de 1537 e 1867 e que se chamava Senegâmbia. Antes, fora uma província do Império Mali. No século XIX a etnia fula impôs, em força, a sua verdadeira supremacia na região e colocou ponto final no domínio de Kaabu.
Recorde-se, simultaneamente, que sendo Gabu a pátria do chão fula (79,6%), existe também a etnia mandiga (14,2%) que se espalha por toda a zona mas numa menor escala. Foi-me dado a oportunidade em conhecer alguns dos princípios éticos de uma população que prima pela honra de uma herança que assumem como um indeclinável direito.
Territorialmente Gabu possui uma área de 9.150 kms2 e tinha no ano de 2004 uma população que se estimava em 178.318 almas, sendo, por isso, considerada uma das maiores, senão a maior, das regiões do país.
Como nota de rodapé, que entendo como credível, após a independência do país Gabu recuperou o seu nome tradicional existindo, atualmente, um pequeno núcleo urbano de inspiração colonial.
Detentora de clima tropical, quente e húmido, a região de Gabu é composta por uma população em que a doutrina praticada aponta como alvo principal a religião muçulmana (77,1%).
Os usos e costumes das gentes de Gabu derrapam para primórdios éticos onde é visível uma hierarquia humana que não abdica do erário transmitido de gerações para gerações.
Redijo este tema sobre um “estágio” no qual me foi proporcionado observar algo mais ao longo da minha comissão em solo guineense, embora encurtada devido à Revolução de Abril de 1974, uma vez que fui um dos cerca de 40 mil militares dos três ramos das Forças Armadas – Exército, Força Aérea e Marinha – quando ali prestava serviço. Conheci, portanto, a guerra e a paz.
Num trivial conhecimento com os nativos que muito me estimulou, gentes simples que viviam no interior de um adensado mato e entre as duas frentes da guerra, usufrui da possibilidade em conhecer alguns dos seus expeditos hábitos.
Assevero que um dos seus tradicionais costumes seculares era o fanado, uma festa tradicional nalgumas etnias indígenas, sendo comum deparámo-nos com grupos de jovens no mato que foram submetidos a um rito de passagem, um processo cultural nativo que passava, e passa, pela iniciação dos rapazes e das raparigas à idade adulta.
A ideia possuída por todos nós sobre o fanado era de que se tratava de uma espécie de operação primária, feita por métodos obsoletos utilizados pelos homens e mulheres grandes aos jovens que se preparavam para despontar para a transição da puberdade para a vida sexual.
Sabíamos que a cerimónia era secreta e que os órgãos genitais, pénis e vagina, sofriam pequenos cortes focais, sendo a finalidade manter a tradição dos seus antepassados. A pequena cirurgia era dolorosa, segundo confessavam aqueles que conheceram o sofrimento.
Numa análise minuciosa feita ao conteúdo dessa velha tradição, existe o conhecimento que no caso dos rapazes a microcirurgia resume-se ao corte do prepúcio e no caso das raparigas trata-se de uma autêntica Mutilação Genital Feminina.
Sabe-se que a excisão do clítoris e dos grandes lábios nas meninas, era, e é, uma prática inaceitável à luz dos direitos humanos e como tal um crime penalizado pela lei dos Estados modernos.
Porém, a lei, concretamente neste caso, está longe de ser rigorosamente cumprida na Guiné-Bissau, face ao atavismo desta prática secular e ao secretismo das cerimónias que são realizadas em separado (rapazes e raparigas).
Por outro lado, as fanatecas (mulheres que fazem a excisão feminina) têm ainda, em termos simbólicos e materiais, um grande peso nas comunidades mais tradicionais (em geral islamizadas). É, no fundo, uma prática para a qual é necessário encontrar alternativas, embora saibamos que esses princípios são há muito alvos denunciados e combatidos pela Organização Mundial de Saúde.
Num périplo feito aos reflexos futuros que implicam intrinsecamente com o estado de saúde sexual reprodutiva das mulheres que são submetidas ao fanado tradicional, é normal que existam problemas numa fase adulta.
O método, segundo dados recolhidos na altura em que por lá prestámos serviço, era, e é, rude, feito com ortodoxas facas de mato entre outros apetrechos caquéticos e as feridas curadas com mesinhos caseiros, asseguravam os antigos sofredores.
Camaradas, o texto que vos deixo aponta sobretudo para recordar Gabu em memórias históricas e trazer à estampa um tema que me deixava de facto perplexo quando me deparava com jovens em pleno mato a contas com o sofrimento do fanado.
Termino a narrativa passando ao lado de um cenário de guerra onde o cheiro a pólvora era atroz, mas com a infalibilidade sobre um fenómeno acerca das tradições na Guiné as quais permanecem irrefutáveis em populações que convivem com reações filantrópicas que o evoluir do tempo teima em preservar.
Madina - Crianças
Um abraço, camaradas
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
7 DE ABRIL DE 2017 > Guiné 61/74 - P17220: Memórias de Gabú (José Saúde) (67): As minhas memórias de Gabu: A morte de um camarada (José Saúde)
Guiné 61/74 - P18786: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXVII: um efeméride: faz hoje 50 anos que vim de férias, pela primeira vez, à Metrópole... A família foi-me esperar ao aeroporto da Portela, passámos por Fátima, Alcobaça e Nazaré, a caminho de casa, no Porto...
Foto nº 1 > Guiné > Bissau > Bissalanca > 28 de junho de 1968 > O avião da TAP estacionado na placa
Foto nº 2 > 28 de junho de 1968 > A bordo do avião da TAP, Boeing 727 100, nos céus da costa de África, a caminho de casa, para gozar umas merecidas férias.
Foto nº 3 > 28 de junho de 1968 > Vista geral dentro do avião TAP, Boeing 727-100, os passageiros, não muitos, as malas de bordo quase não havia nada, aguardando a chegada.
Foto nº 4 > 28 de junho de 1968 > Foto aérea da primeira vista de Portugal, a costa algarvia.
Foto nº 5 > 28 de junho de 1968 > Foto aérea da primeira vista de Lisboa, talvez a pista da Portela, o Rio Tejo, e a asa do avião. Preparação para a aterragem.
[Salvo melhor opinião..., a vista parece-me ser a da margem esquerda do estuário do Tejo, e da pista da base aérea nº 6, do Montijo, com a serra da Arrábida ao fundo... Ou seria alguma estrada em construção, de acesso à ponte ?] (LG).
Foto nº 6 > 28 de junho de 1968 > Foto aérea do rio Tejo, Lisboa e Almada, com vistas da Ponte Salazar.
Foto nº 8 > Fátima > 28 de junho de 1968 > No Santuário , os meus pais a caminho da capelinha das aparições.
Foto nº 9 > Alcobaça > 28 de junho de 1968 > Mosteiro de Alcobaça, o meu irmão mais novo, Sérgio, o meu pai e a seguir a minha mãe, num dia de muito calor. Íamos a caminho do Porto.
Foto nº 10 > Alcobaça > 28 de junho de 1968 > Na porta do Mosteiro, os meus pais a saírem, sentada na beira do muro a minha irmã Filomena, e de lado a minha namorada, Manuela.
Foto nº 11 > Nazaré > 28 de junho de 1968 > Na praia, depois de um almoço inesquecível, a Manuela, a minha mãe, o Sérgio, e a Filomena. Ainda não se falava do canhão... da Nazaré nem nas ondas gigantes...
Foto nº 12 > Porto >Julho de 1968 > Na praia da Foz no Porto, com a minha namorada, e sempre seguido pelo meu irmão Sérgio, como vigilante, a mando da minha futura sogra...
Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira (*), ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem já mais de 6 dezenas de referências no nosso blogue.
Guiné 1967/69 - Álbum de Temas: T 1000 – A primeira viagem de férias à metrópole
Anotações e Introdução ao tema:
(i) INTRODUÇÃO:
Trata-se de parte do álbum de fotos e "slides" digitalizados, captados em Junho/Julho 1968, onde estiveram em Lisboa a esperar-me, os meus pais, os meus irmãos, Mena e Sérgio, e a minha namorada, Manuela.
Depois da chegada em 28 e Junho de 1968, fomos primeiro a Fátima, depois a Alcobaça e seguidamente para a Nazaré – ainda não havia lá o ‘canhão’.
Seleccionei algumas das fotos, para assinalar os 50 anos da minha primeira viagem num avião da TAP, e as minhas "férias de luxo" no Porto e arredores.
(ii) LEGENDAS:
F01 – O avião da TAP estacionado na pista de Bissalanca. Bissau, 28Jun68.
F02 – Dentro do avião da TAP, Boeing 727 100, nos céus da costa de África. Estou cheio de "roncos", já vinha meio marado, com barrete fula vermelho, pulseiras, anéis, colares, e a minha primeira polo Fred Perry, bebendo um copo. Ao lado um furriel do meu batalhão. 28Jun68.
F03 – Vista Geral dentro do avião TAP, Boeing 727-100, os passageiros, não muitos, as malas de bordo quase não havia nada, aguardando a chegada. Céus do mundo, 28Jun68.
F04 – Foto aérea da primeira vista de Portugal, a costa algarvia. Céus de Portugal, 28Jun68.
F05 – Foto aérea da primeira vista de Lisboa, talvez a pista da Portela, o Rio Tejo, e a asa do avião. Preparação para a aterragem. Céu de Lisboa, 28Jun68. [O nosso editor, LG. diz que não, que a vista é a da margem esquerda do estuário do Tejo, e a pista não é da Portela, mas da base aérea do Montijo, com a serra da Arrábida ao fundo...].
F06 – Foto aérea do rio Tejo e Lisboa, com vistas da Ponte Salazar. Céu de Lisboa, 28Jun68.
F07 – Chegada e saída no aeroporto da Portela. A minha família. Eu levo uma grande mala, ao lado a minha mãe com um saco de documentos da TAP, atrás a minha irmã Filomena, a Mena, com uma mala branca, e no final de tudo a minha namorada Manuela, ainda com um pequeno saco que não se vê. Trazia manga de "roncos" para todos. A foto foi tirada pelo meu pai com uma máquina tipo caixote, mas que ficou marcada a imagem.
Curiosidade que todos devem ter passado por isso. Depois de o avião parar, a malta levanta-se e vai-se chegando para a porta, e entra um indivíduo com um instrumento tipo mata-moscas, borrifando tudo e todos com um produto qualquer, todos se riram, mas devia ser um antisséptico por causa da mazelas e bicharada que trazíamos connosco no corpo.
Nunca fiquei esclarecido, mas da 2ª vez, em 1969, já não aconteceu este estranho episódio. Lisboa, aeroporto da Portela, 28Jun68.
F08 – No Santuário de Fátima, os meus pais a caminho da capelinha das aparições. Fátima, 28Jun68.
F09 – No Mosteiro de Alcobaça, o meu irmão mais novo, Sérgio, o meu pai e a seguir a minha mãe, num dia de muito calor. Alcobaça, 28Jun68.
F10 – Na porta do Mosteiro, os meus pais a saírem, sentada na beira do muro a minha irmã Filomena, e de lado a minha namorada, Manuela. Alcobaça, 28Jun68.
F11 – Na praia da Nazaré, depois de um almoço inesquecível, a Manuela, a minha mãe, o Sérgio, e a Filomena. Ainda não havia o "canhão"! Nazaré, 28Jun68.
F12 – Mais tarde, já na praia da Foz no Porto, com a minha namorada, e sempre seguido pelo meu irmão Sérgio, como vigilante, a mando da minha futura sogra. Porto, Julho 68.
Em 2018-06-26
Virgílio Teixeira
«Propriedade, Autoria, Reserva e Direitos, de Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano do SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BCAÇ 1933/RI15/Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SET67 a 04AGO69».
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Nota do editor:
Último poste da série > 19 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18758: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXVI: História e imagens de São Domingos: fotos de 1 a 8
Último poste da série > 19 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18758: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXVI: História e imagens de São Domingos: fotos de 1 a 8
quarta-feira, 27 de junho de 2018
Guiné 61/74 - P18785: Historiografia da presença portuguesa em África (122): A Guiné nas duas guerras mundiais, dois curtos episódios (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Fevereiro de 2018:
Meus queridos amigos,
Temos alguns esparsos quanto ao impacto que os dois conflitos mundiais tiveram na Guiné. Os relatórios do BNU e a documentação avulsa que é possível consultar falam sobretudo dos aspetos económicos, da vigilância britânica, pretendiam a todo o transe travar quaisquer transações que chegassem à Alemanha, tinham sobejos motivos para se inquietar, a presença alemã até ao fim da I Guerra Mundial foi relevante.
Há qualquer coisa de pitoresco no documento referente à reunião secreta promovida em agosto de 1942 pelo Governador Ricardo Vaz Monteiro, fala-se numa invasão iminente e olhando à volta não se encontra, nem de longe nem de perto, uma potência com capacidade invasora, naquele momento, o exemplo de Timor era muito mal escolhido para aquele cenário.
Com isto chama-se a atenção para continuar a investigar o que se passou na Guiné, no tempo destes dois conflitos.
Um abraço do
Mário
A Guiné nas duas guerras mundiais, dois curtos episódios
Beja Santos
A participação da Guiné nos eventos dos dois conflitos mundiais tem sido alvo de investigações fragmentadas, o que é compreensível na ausência de uma obra histórica abrangente. Dois documentos encontrados no Arquivo Histórico do BNU, um de 1916 e outro de 1942, permitem uma certa aproximação ao que se viveu. Recorde-se que só há relatórios de execução do BNU na Guiné a partir de 1917, não se iludem as dificuldades criadas pelo primeiro conflito mundial, designadamente o que tinha a ver com a atividade das empresas alemãs na colónia e também as relacionadas com o período de carência, inflação e dificuldades na exportação. A II Guerra Mundial tem mais holofotes a iluminar a cena, e a documentação depositada no Arquivo Histórico do BNU é de consulta obrigatória. Aquela porção da África Ocidental francesa não obedeceu ao governo de Vichy, com quem Salazar procurou prezar um relacionamento diplomático cordial, pelo menos nas aparências. As dificuldades aumentaram com o contrabando, que era praticamente incontrolável, pela perda de divisas, os orçamentos da colónia, neste período, eram extremamente austeros, procurou-se exportar o que interessa aos beligerantes, caso da borracha, as importações eram dificílimas.
Vejamos o primeiro documento, é expedido de Bolama em 9 de julho de 1916 para Lisboa. Refere que tinha vindo da sede a autorização para um crédito de vinte contos a favor de Joaquim António Pereira, antigo gerente da firma Salomão Pereira Neves & Ca. O gerente de Bolama é perentório, tal senhor era acusado de negociar com alemães, Bolama preparava-se para cortar o crédito.
E importante é o que se escreve a seguir:
“Ultimamente disseram-nos que negociava com dinheiro emprestado por Rodolf Titzch & Ca. e por isso achamos prudente não lhe dar aviso de crédito sem primeiramente ouvir V. Exas. Nós não temos nenhuma denúncia por escrito mas estamos convencidos ser verdadeiro o que dizem. De uma lancha soubemos nós que foi carregada em Bafatá, saindo o coconote dos armazéns do Titzch, apesar do coconote ser comprado a um cabo-verdiano que fingiu ser intermediário. Não estando V. Exas. de acordo connosco, sirvam-se telegrafar a receção desta”.
Convém notar que os gerentes informavam sistematicamente a criação de empresas, a natureza das suas hipotecas, as falências, as chegadas e partidas notáveis, etc. Um exemplo curioso foi o dossiê que li sobre a empresa Bambay States Limited, que pretendia implantar-se nos Bijagós, enviara um inglês de pele escura, Burmester Ellis Bull, e na informação para Lisboa logo se dizia que tal senhor não era pessoa de confiança, havia mesmo quem dissesse que tinha cadastro. Falamos do pai de James Pinto Bull, deputado da Assembleia Nacional que faleceu em 1970 num acidente de helicóptero no rio Mansoa, que vitimou outros deputados, para além do piloto. A carta confidencial de 7 de agosto enviada de Bissau para Lisboa tem um tom muito mais dramático, o gerente refere que mandara um telegrama cifrado, procurara fugir à vigilância inglesa.
Atenda-se ao que escreve:
“Em 29 do mês findo (julho), o Senhor Governador Vaz Monteiro convocou os chefes de serviço para uma reunião secreta a que nos convidou a ir.
Em curtas palavras, indicou o caminho que cada um devia seguir caso se desse aqui uma invasão estrangeira como a que se verificou em Timor e informou que ele, governador, em tal emergência, se encontraria onde se encontrassem as forças militares da colónia.
Aos que não tinham funções militares, recomendou que, houvesse o que houvesse, não saíssem dos seus lugares e aconselhassem a mesma atitude aos seus subordinados e às demais pessoas que porventura estivessem à sua volta, para que se evitassem dificuldades ao movimento das tropas.
Das suas palavras e talvez, mais ainda, do modo como as pronunciou, ficou-me a impressão e aos outros também de que estava iminente qualquer agressão à colónia, não se dizendo, ou não se sabendo, de que lado vinha.
Mais me convenci que assim era quando o Senhor Governador, já a sós comigo, me perguntou que destino daria eu aos valores do Banco, principalmente ao ouro; se conviria retirar com tudo para o mato; se enterrar o ouro em qualquer parte do interior.
Respondi que não tinha ordens especiais a tal respeito mas que ia pedir imediatamente a V. Ex.ª. e foi daqui que nasceu o telegrama de 30, feito em termos a que deu acordo o Senhor Governador. O ouro foi imediatamente colocado em sólidas caixas e o peso dividido de modo a facilitar o transporte.
As notas podem ser ensacadas com relativa rapidez, se não foi mais rápida ainda a acção que parece temer-se contra a colónia.
O que se tornará mais difícil é obter transporte rápido que tudo carregue, pois a falta de gasolina é cada vez maior.
Suponho que V. Ex.ª. me dará depressa as instruções que pedi.
Caso as não receba, considero-me na obrigação absoluta de defender os valores à minha guarda. Caso V. Ex.ª. me dê ordens tendentes a não saírem do lugar em que estão os valores do Banco e se verificar que, para honra da nossa terra é preciso responder a qualquer agressão pela força, eu peço a V. Ex.ª. que me julgue bem quando lhe constar que eu fui um dos primeiros a enquadrar nos da primeira linha. A nossa força aqui, pelo lado material é tão pequena que, se for preciso utilizá-la, todos têm de dar o seu máximo esforço”.
Não se atina, na ausência de outros elementos, quem seria a potência invasora. Algo mudara, é certo nos acontecimentos do Norte de África. Em 21 de junho desse ano, Rommel conquistara Tobruk, suponha-se que estava aberto o caminho para que as tropas alemãs atingissem rapidamente o Cairo e sufocassem o canal de Suez. Mas não se consegue descortinar um avanço impetuoso alemão sobre a África Ocidental. Também não se descortina a possibilidade dos britânicos irem em socorro da Gâmbia, não podiam hipotecar meios navais para tal operação. E os norte-americanos estavam ainda a formar um corpo de exército destinado a desembarcar no Norte de África. A hipótese que se pode pôr era de que o governador recebera instruções para proceder a simulações de defesa, de modo a que as populações ganhassem sensibilidade para a guerra avassaladora na Europa, África, Ásia e Oceânia. Mas tudo isto não passa de especulação, seria necessário consultar a documentação referente a este período da governação no Arquivo Histórico Ultramarino.
Imagem da receção à Tuna Académica em Bissau, onde deu espetáculo, retirada da obra “Uma Apoteose - duas visitas - uma despedida”, obra relacionada com a partida do Governador Raimundo Serrão, 1953.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 26 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18782: Historiografia da presença portuguesa em África (119): O primeiro voo, ligando Lisboa a Bolama, em 1925, e a primeira tentativa de usar a aviação com fins militares naquele território (Armando Tavares da Silva) (Parte II)
Meus queridos amigos,
Temos alguns esparsos quanto ao impacto que os dois conflitos mundiais tiveram na Guiné. Os relatórios do BNU e a documentação avulsa que é possível consultar falam sobretudo dos aspetos económicos, da vigilância britânica, pretendiam a todo o transe travar quaisquer transações que chegassem à Alemanha, tinham sobejos motivos para se inquietar, a presença alemã até ao fim da I Guerra Mundial foi relevante.
Há qualquer coisa de pitoresco no documento referente à reunião secreta promovida em agosto de 1942 pelo Governador Ricardo Vaz Monteiro, fala-se numa invasão iminente e olhando à volta não se encontra, nem de longe nem de perto, uma potência com capacidade invasora, naquele momento, o exemplo de Timor era muito mal escolhido para aquele cenário.
Com isto chama-se a atenção para continuar a investigar o que se passou na Guiné, no tempo destes dois conflitos.
Um abraço do
Mário
Ricardo Vaz Monteiro, 1891-1975
A Guiné nas duas guerras mundiais, dois curtos episódios
Beja Santos
A participação da Guiné nos eventos dos dois conflitos mundiais tem sido alvo de investigações fragmentadas, o que é compreensível na ausência de uma obra histórica abrangente. Dois documentos encontrados no Arquivo Histórico do BNU, um de 1916 e outro de 1942, permitem uma certa aproximação ao que se viveu. Recorde-se que só há relatórios de execução do BNU na Guiné a partir de 1917, não se iludem as dificuldades criadas pelo primeiro conflito mundial, designadamente o que tinha a ver com a atividade das empresas alemãs na colónia e também as relacionadas com o período de carência, inflação e dificuldades na exportação. A II Guerra Mundial tem mais holofotes a iluminar a cena, e a documentação depositada no Arquivo Histórico do BNU é de consulta obrigatória. Aquela porção da África Ocidental francesa não obedeceu ao governo de Vichy, com quem Salazar procurou prezar um relacionamento diplomático cordial, pelo menos nas aparências. As dificuldades aumentaram com o contrabando, que era praticamente incontrolável, pela perda de divisas, os orçamentos da colónia, neste período, eram extremamente austeros, procurou-se exportar o que interessa aos beligerantes, caso da borracha, as importações eram dificílimas.
Vejamos o primeiro documento, é expedido de Bolama em 9 de julho de 1916 para Lisboa. Refere que tinha vindo da sede a autorização para um crédito de vinte contos a favor de Joaquim António Pereira, antigo gerente da firma Salomão Pereira Neves & Ca. O gerente de Bolama é perentório, tal senhor era acusado de negociar com alemães, Bolama preparava-se para cortar o crédito.
E importante é o que se escreve a seguir:
“Ultimamente disseram-nos que negociava com dinheiro emprestado por Rodolf Titzch & Ca. e por isso achamos prudente não lhe dar aviso de crédito sem primeiramente ouvir V. Exas. Nós não temos nenhuma denúncia por escrito mas estamos convencidos ser verdadeiro o que dizem. De uma lancha soubemos nós que foi carregada em Bafatá, saindo o coconote dos armazéns do Titzch, apesar do coconote ser comprado a um cabo-verdiano que fingiu ser intermediário. Não estando V. Exas. de acordo connosco, sirvam-se telegrafar a receção desta”.
Convém notar que os gerentes informavam sistematicamente a criação de empresas, a natureza das suas hipotecas, as falências, as chegadas e partidas notáveis, etc. Um exemplo curioso foi o dossiê que li sobre a empresa Bambay States Limited, que pretendia implantar-se nos Bijagós, enviara um inglês de pele escura, Burmester Ellis Bull, e na informação para Lisboa logo se dizia que tal senhor não era pessoa de confiança, havia mesmo quem dissesse que tinha cadastro. Falamos do pai de James Pinto Bull, deputado da Assembleia Nacional que faleceu em 1970 num acidente de helicóptero no rio Mansoa, que vitimou outros deputados, para além do piloto. A carta confidencial de 7 de agosto enviada de Bissau para Lisboa tem um tom muito mais dramático, o gerente refere que mandara um telegrama cifrado, procurara fugir à vigilância inglesa.
Atenda-se ao que escreve:
“Em 29 do mês findo (julho), o Senhor Governador Vaz Monteiro convocou os chefes de serviço para uma reunião secreta a que nos convidou a ir.
Em curtas palavras, indicou o caminho que cada um devia seguir caso se desse aqui uma invasão estrangeira como a que se verificou em Timor e informou que ele, governador, em tal emergência, se encontraria onde se encontrassem as forças militares da colónia.
Aos que não tinham funções militares, recomendou que, houvesse o que houvesse, não saíssem dos seus lugares e aconselhassem a mesma atitude aos seus subordinados e às demais pessoas que porventura estivessem à sua volta, para que se evitassem dificuldades ao movimento das tropas.
Das suas palavras e talvez, mais ainda, do modo como as pronunciou, ficou-me a impressão e aos outros também de que estava iminente qualquer agressão à colónia, não se dizendo, ou não se sabendo, de que lado vinha.
Mais me convenci que assim era quando o Senhor Governador, já a sós comigo, me perguntou que destino daria eu aos valores do Banco, principalmente ao ouro; se conviria retirar com tudo para o mato; se enterrar o ouro em qualquer parte do interior.
Respondi que não tinha ordens especiais a tal respeito mas que ia pedir imediatamente a V. Ex.ª. e foi daqui que nasceu o telegrama de 30, feito em termos a que deu acordo o Senhor Governador. O ouro foi imediatamente colocado em sólidas caixas e o peso dividido de modo a facilitar o transporte.
As notas podem ser ensacadas com relativa rapidez, se não foi mais rápida ainda a acção que parece temer-se contra a colónia.
O que se tornará mais difícil é obter transporte rápido que tudo carregue, pois a falta de gasolina é cada vez maior.
Suponho que V. Ex.ª. me dará depressa as instruções que pedi.
Caso as não receba, considero-me na obrigação absoluta de defender os valores à minha guarda. Caso V. Ex.ª. me dê ordens tendentes a não saírem do lugar em que estão os valores do Banco e se verificar que, para honra da nossa terra é preciso responder a qualquer agressão pela força, eu peço a V. Ex.ª. que me julgue bem quando lhe constar que eu fui um dos primeiros a enquadrar nos da primeira linha. A nossa força aqui, pelo lado material é tão pequena que, se for preciso utilizá-la, todos têm de dar o seu máximo esforço”.
Não se atina, na ausência de outros elementos, quem seria a potência invasora. Algo mudara, é certo nos acontecimentos do Norte de África. Em 21 de junho desse ano, Rommel conquistara Tobruk, suponha-se que estava aberto o caminho para que as tropas alemãs atingissem rapidamente o Cairo e sufocassem o canal de Suez. Mas não se consegue descortinar um avanço impetuoso alemão sobre a África Ocidental. Também não se descortina a possibilidade dos britânicos irem em socorro da Gâmbia, não podiam hipotecar meios navais para tal operação. E os norte-americanos estavam ainda a formar um corpo de exército destinado a desembarcar no Norte de África. A hipótese que se pode pôr era de que o governador recebera instruções para proceder a simulações de defesa, de modo a que as populações ganhassem sensibilidade para a guerra avassaladora na Europa, África, Ásia e Oceânia. Mas tudo isto não passa de especulação, seria necessário consultar a documentação referente a este período da governação no Arquivo Histórico Ultramarino.
Imagem da receção à Tuna Académica em Bissau, onde deu espetáculo, retirada da obra “Uma Apoteose - duas visitas - uma despedida”, obra relacionada com a partida do Governador Raimundo Serrão, 1953.
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Nota do editor
Último poste da série de 26 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18782: Historiografia da presença portuguesa em África (119): O primeiro voo, ligando Lisboa a Bolama, em 1925, e a primeira tentativa de usar a aviação com fins militares naquele território (Armando Tavares da Silva) (Parte II)
Guiné 61/74 - P18784: Ser solidário (213): Petição, urgentíssima (até 3 de julho), ao sr Presidente da Republica, para instruir os seus serviços a apresentarem, na próxima reunião cimeira da CPLP em Julho próximo, em Cabo Verde, uma proposta visando a implementação dum plano extraordinário para os próximos dez anos no campo da educação em Timor Leste (João Crisóstomo, Nova Iorque)
1. Mensagem do nosso camarada da diáspora (Nova Iorque), ativista social e grã-tabanqueiro João Crisóstomo:
Data: 26 de junho de 2018 às 14:50
Assunto: nossas conversas ..
Caríssimo,
Aqui está o que estou a tentar enviar aos orgãos de informação, na esperança de que façam eco e motivem muita gente a enviar E mails ( ou o que acharem bem ) ao nosso Presidente da República. Tem de ser ASAP, please!… [, o mais rápido possível!]
Se puseres no teu blogue isso vai ajudar e se puderes convencer alguém no jornal Público , onde neste momento não tenho nenhum contacto, seria óptimo. Falamos mais, muito brevemente, OK?
Um grande abraço .
A Vilma, (na cozinha a lavar os pratos do pequeno almoço) quando percebeu que estava a falar contigo, berrou-me que mandasse um beijinho para vocês dois.
Saudades e até breve.
2. Campanha: Por Timor Leste e pela língua portuguesa: Apelo aos portugueses (dentro ou fora de Portugal) onde quer que se encontrem.
POR FAVOR AJUDE!
Obrigado
João Crisóstomo
__________________
Nota do editor:
Último poste da série > 7 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18719: Ser solidário (212): Gostaria de saber as companhias que passaram e estiveram sediadas em Candamã e quando é que costumam celebrar o convívio anual (Luís Branquinho Crespo)
Data: 26 de junho de 2018 às 14:50
Assunto: nossas conversas ..
Caríssimo,
Aqui está o que estou a tentar enviar aos orgãos de informação, na esperança de que façam eco e motivem muita gente a enviar E mails ( ou o que acharem bem ) ao nosso Presidente da República. Tem de ser ASAP, please!… [, o mais rápido possível!]
Se puseres no teu blogue isso vai ajudar e se puderes convencer alguém no jornal Público , onde neste momento não tenho nenhum contacto, seria óptimo. Falamos mais, muito brevemente, OK?
Um grande abraço .
A Vilma, (na cozinha a lavar os pratos do pequeno almoço) quando percebeu que estava a falar contigo, berrou-me que mandasse um beijinho para vocês dois.
Saudades e até breve.
João
2. Campanha: Por Timor Leste e pela língua portuguesa: Apelo aos portugueses (dentro ou fora de Portugal) onde quer que se encontrem.
Estive em Timor Leste no ano passado. E de novo este ano. Fiquei encantado, mas preocupado por muitas coisas que constatei. A língua portuguesa e a fé cristã foram os alicerces-base que possibilitaram a Independência de Timor Leste. Mas a situação está muito débil ainda. Outros têm verificado o mesmo. Rui Chamusco e Gaspar Sobral por exemplo, que de seu bolso tinham já dado os primeiros passos para uma escola para as crianças esquecidas nas montanhas remotas de Timor. Juntei-me a eles. Preocupado fui mesmo ao Vaticano, onde consegui um encontro com o Sr.Cardeal Parolin, secretário de Sua Santidade, e de quem obtive o apoio moral que procurava, que eu sabia imprescindível para eu poder falar a outras pessoas sobre esta situação em Timor Leste. Uma escola, uma primeira gota de água, foi inaugurada em Março passado.
É absolutamente necessário fazer algo de extraordinário e com toda a urgência para salvar a língua portuguesa. Senão… imagine o que quiser, mas parece-me que será um futuro e uma situação muito triste. Algo tem que ser feito imediatamente.
Tenho falado nisto a muita gente, inclusive aos dirigentes timorenses – e todos concordam comigo. Mas concordar só não chega: impõe-se fazer algo de concreto, e já. Portugal – crédito seja dado a Portugal e aos portugueses – tem feito e está fazendo um esforço a todos os títulos admirável. Mas muito mais precisa de ser feito em Timor Leste . Com toda a urgência.
E Portugal sozinho não pode. Em Nova Iorque no passado dia 5 de Maio, "Dia da Língua Portuguesa nas Nações Unidas", consegui falar com a Sra Dra Maria do Carmo Silveira, Secretária Executiva da CPLP, a quem pedi/propus o seguinte:
Uma vez que a promoção da Língua Portuguesa é um dos objectivos para que a CPLP foi criada e dada a necessidade e urgência dum impulso no ensino desta língua no jovem país de Timor Leste, impõe-se um programa extraordinário da CPLP na promoção da língua portuguesa nos próximos anos em Timor Leste, com o objectivo de que, no 25º aniversário deste país (em 2027), o acesso à educação esteja já ao alcance de toda a juventude e o uso da língua portuguesa esteja mais generalizado. O envolvimento interessado e a implementação dum programa extraordinário por parte da CPLP pode fazer a diferença que urgentemente se impõe.
Fiquei contente com a maneira positiva como a Sra Dra Maria do Carmo Silveira me ouviu, concordando comigo que seria pertinente e relevante que esta proposta fosse apresentada para consideração na próxima cimeira da CPLP que vai ter lugar a 17 e 18 de Julho em Cabo Verde, na Ilha do Sal.
Foi em Portugal – em Julho de 1996 que – teve lugar o acto official da criação da CPLP: Portugal tem sido desde sempre o grande impulsionador desta organização e tem autoridade moral para apresentar, com muitas boas probabilidades de ser ouvido, esta proposta. Vamos pedir ao nosso Presidente Marcelo Rebelo de Sousa e ao nosso Primeiro Ministro António Costa que vão estar presentes nessa cimeira em Cabo Verde para apresentarem ou darem o primeiro passo para que esta proposta seja apresentada à CPLP.
Esta poderá ser apresentada por eles mesmos ou em conjunto com a delegação de Timor Leste, aí chefiada pelo seu presidente Francisco Guterres. Não tive oportunidade de contactar sobre isto o Senhor Presidente de Timor Leste, quando lá estive, mas não tenho dúvidas de que será bem recebida, pela resposta que tive de outros líderes timorenses, entres eles Xanana Gusmão . Numa resposta que recebi ( de Timor Leste, já depois de ter voltado a Nova Iorque ) foi-me dito: "dei conhecimento do seu e-mail a S.Exa. Xanana Gusmão, como aliás solicitado, o qual ficou muito grato e naturalmente satisfeito pela sua amizade e carinho a Timor-Leste. Pediu-me ainda que lhe transmitisse o seu 'agradecimento pela dedicação por uma causa nobre, que é a educação!' ".
A mensagem que segue pode servir como guia/modelo para mensagens a serem enviadas – por E mail com a máxima urgência os – próximos dias (sem falta antes de 3 de julho) para o Senhor Presidente . O endereço é: belem@presidencia.pt
POR FAVOR AJUDE!
Obrigado
João Crisóstomo
_______________
3. Mensagem por email a enviar à Presidência da República (até 3 de julho de 2018)
Exmo Senhor Presidente Marcelo Rebelo de Sousa,
Senhor Presidente,
A situação da educação em Timor Leste, especialmente para todos os que seguimos e partilhamos os anseios deste país, é de muita preocupação. É com muita confiança e esperança que viemos pedir o favor da sua ajuda para o que segue:
Uma vez que a promoção da Língua Portuguesa é um dos objectivos para que a CPLP foi criada e dada a necessidade e urgência dum esforço extraordinário no ensino da língua portuguesa no jovem país de Timor Leste, venho pedir ao Senhor Presidente o seguinte: que instrua os seus assistentes para prepararem uma proposta a ser apresentada na próxima reunião cimeira da CPLP em Julho próximo em Cabo Verde, visando a implementação dum plano extraordinário para os próximos dez anos no campo da educação em Timor Leste.
O fim deste é de que no 25º aniversário deste país (em 2027) o acesso à educação esteja já ao alcance de toda a juventude e o uso da língua portuguesa seja mais generalizado, no seguimento da premissa de que a língua portuguesa e a religião católica foram os grandes pilares na luta pela reaquisição da Independência de Timor Leste.
Portugueses, e todos para quem Timor Leste e a língua portuguesa estão no coração – e porque sabemos que podemos contar com a sua ajuda –, estamos desde já antecipadamente muito gratos.
Com muita confiança aceite, Senhor Presidente, os meus respeitosos cumprimentos.
Local, Data, Nome (e mais algum dado, se achar bem incluir como ID: Nº de BI, Cidadão, Passaporte, Profissão... )
Nota do editor:
Último poste da série > 7 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18719: Ser solidário (212): Gostaria de saber as companhias que passaram e estiveram sediadas em Candamã e quando é que costumam celebrar o convívio anual (Luís Branquinho Crespo)
Guiné 61/74 - P18783: Parabéns a você (1461): Fernando Maria Neves Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2404 (Guiné, 1968/70) e Vítor Caseiro, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 4641 (Guiné, 1973/74)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 24 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18772: Parabéns a você (1460): António Branco, ex-1.º Cabo Reab Material da CCAÇ 16 (Guiné, 1972/74) e Vasco Joaquim, ex-1.º Cabo Escriturário do BCAÇ 2912 (Guiné, 1970/72)
terça-feira, 26 de junho de 2018
Guiné 61/74 - P18782: Historiografia da presença portuguesa em África (121): O primeiro voo, ligando Lisboa a Bolama, em 1925, e a primeira tentativa de usar a aviação com fins militares naquele território (Armando Tavares da Silva) (Parte II)
Foto nº 1 > Da esquerda para a direita, Tenente Sérgio da Silva, Capitão Pinheiro Correia e 1.º Sargento António Manuel, antes da segunda partida, no campo de aviação da Amadora, em 1925
Foto nº 2 > A tripulação do Santa Filomena: tenente Sérgio da Silva, capitão Pinheiro Correia e 1.º sargento António Manuel.
Foto nº 3 > Bolama > 2 de abril de 1925 > de Chegada dos aviadores a Bolama , onde aterraram no Campo de Aviação Sacadura Cabral
Foto nº 4 > Vista aérea de Bolama, tirada a partir do “Santa Filomena”
Foto nº 5 > Vôos realizados na
Guiné pelo Breguet n.º 15: Bisssau_Bor, Bissau - Bolama, Bolama - ILha das Galinhas - Ilha de Canhanbaque...
Página dedicada ao coronel Pinheiro Corrêa (1892-1973), um dos nossos "gloriosos malucos das máquinas voadoras". O editor, ATR, deve um dos seus descendentes.
Referência: “Lisboa-Bolama- A primeira viagem aérea a uma colónia de África”, 1Sar. Pedro Manuel Ferreira, Mais Alto, pg 4-15, Mar/Abr 2005.
Fotos: AHFA - Arquivo Histórico da Força Aérea (Textos amavelmente cedidos pela Revista “Mais Alto” )
Fotos (de 1 a 5): retiradas, com a devida vénia, da página acima, foram também publicadas na Revista “Mais Alto”, de mar / abr 2005.
Raide Lisboa-Bolama (1925)
Armando Tavares da Silva |
por Armando Tavares da Silva,
historiador (*)
(i) As tentativas de aquisição de hidroaviões para a Guiné
Passados cerca de ano e meio desde que Portugal entrara na Primeira Grande-Guerra, conflito em que hidroaviões desempenharam papel importante na luta anti-submarina, em meados de 1917, o governador interino da Guiné, major Carlos Ivo de Sá Ferreira, enquanto decorriam as perturbações na ilha de Canhanbaque, e face à dificuldade de se poder dispor de espingardas e cartuchame, lembra ao ministro a compra de um hidroavião ou monoplano, despesa com que a Província “bem pod[ia]”, a ser utilizado para pôr fim à “má situação” que lá se vivia.
Em Outubro de 1917 Ivo Ferreira volta a esta questão, entendendo que a existência na Guiné de um hidroavião, “máquina de guerra”, acabaria com as revoltas de “certos elementos maus em extremo” e diminuiria os custos com a guarnição militar que mais proveito teriam se fossem para obras de fomento “de que se caresse (sic) por completo”.
Face a este pedido de Ivo Ferreira são consultados o chefe da Aviação Marítima, Artur de Sacadura Cabral, e o tenente Pedro Ferreira Rosado, que tinha o brevet de hidroaviões e conhecia a província, tendo estes concluído que os hidroaviões podiam prestar serviço na Guiné. Porém, a impossibilidade de despender 200.000 francos para a aquisição de dois aparelhos, leva a que seja apenas considerada o emprego transitório “mais tarde” de um dos aparelhos a adquirir para Angola.
Em Janeiro de 1918, Ivo Ferreira insiste na compra do hidroavião, pedindo autorização para a província o adquirir directamente. Contudo esta solicitação não terá sido concedida.
(ii) O primeiro voo para a Guiné
Vai ser apenas em 1925 que, pela primeira vez, e por uma coincidência, a aviação é utilizada na Guiné com fins militares.
Sucedeu que neste ano se realizou o primeiro raide Lisboa-Bolama, e a presença na Guiné de um avião foi aproveitada pelo governador Vellez Caroço para efectuar algumas acções ofensivas igualmente em Canhanbaque, a mesma ilha dos Bijagós em que decorriam confrontos com os povos locais.
A realização deste voo resultou de uma proposta de Outubro de 1924 do capitão José Pedro Pinheiro Correia e do tenente Joaquim Sérgio da Silva, tendo o avião escolhido sido um Berguet XVI com o n.º 15. Este, depois de sofrer várias reparações e revisão do motor, é baptizado de “Santa Filomena”, ostentando na fuselagem uma Cruz de Ourique da antiga Ordem dos Templários.
A viagem era considerada fácil, pois se dispunha em rota de um elevado número de campos de aterragem para as necessárias escalas técnicas e eventuais emergências. Quanto aos propósitos da viagem “apenas” se pretendia “demonstrar, que a aviação portuguesa tem uma compreensão nítida da sua missão, acompanhando todos os progressos dessa arma dentro e fora do país, e podendo, pois, ser aproveitado com fins absolutamente utilitários e práticos.”
A ideia inicial de implantar flutuadores no avião foi abandonada, não só pelo custo que isso representava, como, sobretudo, por se temer que o avião mal se aguentasse em mar revolto.
Uma primeira partida tem lugar no dia 7 de Fevereiro de 1925, mas que é mal sucedida por o avião ter sido forçado a aterrar de emergência em Quarteira, devido a mau tempo e ter ficado danificado. Após as necessárias reparações, a 27 de Março o Berguet parte novamente para o projectado raide, seguindo a bordo o chefe da missão, capitão José Pedro Pinheiro Correia, nas funções de observador, o tenente Joaquim Sérgio da Silva como piloto e como mecânico o primeiro-sargento Manuel António.
A viagem até Bolama vai ser acompanhada de várias contrariedades e dificuldades que foi preciso vencer, tendo o Breguet aterrado em Bolama a 2 de Abril, num campo que entretanto fora aí improvisado.
Para facilitar a aterragem fora pedido que, logo que se avistasse o avião fossem acendidas quatro fogueiras produzindo bastante fumo nos extremos do campo. Haviam sido gastas 31 horas e 31 minutos de voo, e percorrida a distância de 4.070 km.
Esta viagem vem extensamente relatada em Coronel Pinheiro Corrêa (1892-1973) > Aviador > Viagem Lisboa-Bolama (de 27 de março a 2 de abril de 1925), relato que nos dá conta de todas aquelas contrariedades e que o raide decorreu em 7 etapas: Amadora – Casablanca; Casablanca – Agadir; Agadir – Cabo Juby; Cabo Juby – Vila Cisneros; Vila Cisneros – S. Luís do Senegal; S. Luís do Senegal – Dakar e, finalmente, Dakar – Bolama.
(iii) Os bombardeamentos de Canhanbaque
Em apoio à acção do governador, que procurava submeter os indígenas que recusavam o pagamento do imposto de palhota, aqueles oficiais realizaram, em dois dias seguidos (21 e 22 de Abril), missões de bombardeamento sobre os rebeldes, lançando 65 granadas de artilharia, do tipo “Schneider”, que depois de adaptadas de forma rudimentar nas oficinas navais de Bolama, foram transformadas em bombas de avião. O seu lançamento, à mão, foi efectuado “por um oficial-bombardeiro cuja indumentária se limitava a um pijama…tal era o calor (…)”.
Para a primeira missão, com a duração de 1h40, o Breguet descolou às 6 horas e 55 minutos (locais) tendo sobrevoado a ilha das Galinhas e voado próximo da ilha de Bubaque até atingir o posto de Bine, na ponta sul da ilha de Canhanbaque. Aí foram largadas duas mensagens do governador, tendo a artilharia do posto saudado com alguns tiros.
O bombardeamento das tabancas foi feito a 300 metros com granadas de 7mm. Descendo a 100 metros, é atingida uma palhota, tendo sido lançadas algumas granadas dentro da povoação, e notando-se que uma tabanca fora incendiada. Na tabanca mais próxima do posto foi arvorada uma bandeira nacional, depois de lhe terem caído próximo algumas granadas.
Na segunda operação de bombardeamento os indígenas, “refeitos do susto da véspera, já encaravam com mais ousadia as evoluções do avião” e reagiram com alguns tiros de longa, “felizmente sem resultado”.
Pinheiro Correia e Sérgio da Silva seriam louvados pelo Governo da Província pela sua actuação na Campanha de Canhanbaque, em virtude da sua “abnegação, dedicação patriótica e valentia (…), apesar de o avião sofrer de grave avaria no motor”.
Depois dos voos de Gago Coutinho e Sacadura Cabral de 1922, e de Brito Pais, Sarmento de Beires e Manuel Gouveia de 1924, ligando o continente com Macau, acabava de ser realizado o primeiro voo ligando Lisboa com uma colónia de África, neste caso a Guiné.
Amadora, concelho de Oeiras > 1928 > Campo de aviação. Foto, reproduzida com a devida vénia, da página do Facebook Amadora Antiga.
2. Comentário do editor LG:
O que muitos "camaradas e amigos da Guiné" não sabem é que a Amadora (a antiga Porcalhota, até 1907) foi durante um quarto de século, entre 1913 e 1938 o "berço" dos "gloriosos malucos das máquinas voadores"... Ou melhor, a "campo de aviação" que ficava no "campo do Borel", onde são hoje as instalações da Academia Militar...
Sabe-se, por exemplo, que a 18 de março de 1917, a “Liga dos Melhoramentos da Amadora” organiza um Festival Aéreo, nos terrenos onde está actualmente a Academia Militar, o campo do Borel, na Amadora, onde aterram o tenente António Caseiro e Sacadura Cabral. Pode imaginar-se a "loucura" que foi este evento, a avaliar pelo número dos que assistiram ao festival (50 mil pessoas), o que equivalia a doze vezes a população daquela povoação na época (c. 4 mil).
Terá sido o primeiro campo de aviação do país, ou a primeira unidade militar aérea: em 1919 o “Grupo de Esquadrilhas de Aviação República” (GEAR) instala-se nos terrenos junto ao campo de futebol dos “Recreios Desportivos da Amadora”, ou seja, nos terrenos da futura Academia Militar. A história da aviação portuguesa passa, pois, inevitavelmente por aqui. Foi da Amadora (freguesia em 916, vila em 1937...) que partiram algumas das mais importantes viagens da aviação nacional, nas décadas de 1920 e 1930:
(i) tentativa de ligação à ilha da Madeira, por Sarmento Beires e Brito Pais (1920);
(ii) raide Lisboa-Macau no «Pátria», com Brito Pais, Sarmento Beires e Manuel Gouveia (1924);
(iv) voo a Goa, com Moreira Cardoso e Sarmento Pimentel (1930):
(v) voo de Carlos Bleck e Humberto da Cruz à Guiné e Angola (1931);
(vi) viagem de ida e volta, no «Dili», a Timor, com Humberto da Cruz e António Lobato (1934);
(vii) em 1938, é extinto o campo de aviação e transferido para Tancos...
Por fim, não esquecer é que na Amadora, e mais exatamente em Alfragide, que está sediado o Estado Maior da Força Aérea, E a Academia Militar tem também o seu campus, o Campus da Amadora, na freguesia da Reboleira.
Fonte: Página de Abílio Coelho > Os meus olhares > Campo de aviação da Amadora (Adapt. com a devida vénia...)
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Nota do editor:
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