quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11173: Bibliografia de uma guerra (68): Alguns comentários sobre a guerra na Guiné e a sua literatura (2) (René Pélissier / Mário Beja Santos)

1. Lembrando a mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Fevereiro de 2013:

Queridos amigos,
Alguns meses atrás, recebi uma carta do Prof. René Pélissier solicitando-me livros e alguns contactos, ele continua indefetivelmente, infatigavelmente, a fazer recensões de livros em torno dos nossos conflitos coloniais. Daí nasceu a ideia, mais tarde, de sugerir a esta autoridade internacional na historiografia das nossas guerras que pusesse por escrito as suas reflexões sobre escritores e escritos de antigos combatentes.
Penso que este trabalho científico nos deve orgulhar e não escondo uma certa ufania em ter participado neste exclusivo que inclui fotografia inédita do historiador a mostrar leituras onde a Guiné é preponderante.

Um abraço do
Mário



Alguns comentários sobre a guerra na Guiné e a sua literatura (2)

René Pélissier

Um dos erros que um historiador não deve cometer, em absoluto, é o de a partir de uma dada situação num período preciso e generalizar conclusões. Cada mentalidade é uma ilha mais ou menos acolhedora ao leitor. Mário Beja Santos cultiva as relações humanas. É um autor que não nos vai ensinar muito sobre as operações militares. Ele não participa em grandes ofensivas. Não estará mesmo constantemente assediado pelos artilheiros cubanos do PAIGC. Vive num território onde a população não está ferozmente explorada por colonos brancos gananciosos, como em certas zonas de Angola ou Moçambique, o seu sector não é uma Disneylândia mas também não é o planalto dos Macondes nem a selva dos Dembos onde cada um sabe onde está o inimigo. Onde ele vive, há uma certa fluidez. O fator étnico, histórico e mesmo social deve ser sempre tomado em conta e nunca deve ser extrapolado à escala de todo um país em África. Uma das explicações da duração da resistência portuguesa à erosão nacionalista que, finalmente, a levará ao esgotamento, reside, apesar de tudo, no facto da guerra da Guiné ter sido conduzida no terreno por soldados oriundos de meios muito humildes, habituados à dureza da vida, e contra guerrilheiros ainda mais pobres do que eles, mas bem armados, cheios de esperança e bem aconselhados. Quanto aos portugueses, a sua esperança era a de regressar o mais rapidamente possível para junto dos seus entes queridos.

Nós estamos nos antípodas de uma guerra ultratécnica, de um lado, perante camponeses fanatizados (tipo Afeganistão e, mais longinquamente, o Vietname ou a Argélia) sem possibilidade de uma real aproximação humana, ao nível dos combatentes. Os portugueses estão condenados a perder, mas lentamente. E, sobretudo, esse sentimento está mais instalado na mente dos oficiais de carreira do que na superioridade esmagadora dos seus adversários. É uma guerra entre duas paciências.

De qualquer maneira, Mário Beja Santos é o autor que publicou mais livros sobre a Guiné: pelo menos cinco grandes volumes até ao início de 2013. E publicou-os através de editoras capazes de tocar um público numeroso. O mesmo não se pode dizer dos dois livros seguintes, seja qual for o valor literário ou documental destes títulos em apreço. Aqui, nós abordamos sem pudor uma questão delicada para um crítico, mas é preciso que fique claro. Para se vender bem um livro, é preciso que ele seja bem distribuído nas livrarias e que, no mínimo, haja bons contactos na comunicação social que permitam o conhecimento desta produção. Os autores-editores e os autores que pagam a um pequeno editor para que a sua obra seja publicada são, por vezes, bem-sucedidos a ganhar dinheiro quando apresentem um tema dito “do grande público”.

Infelizmente, as memórias da guerra colonial não fazem parte desse grande público, salvo honrosas exceções. O “grande público”, em todos os países, é um público de rebanhos que segue a moda ou em conformidade com o que se vê na televisão. Falar de Timor aquando dos massacres cometidos pelas milícias pró-indonésias era uma garantia de sucesso na época. Agora, seria sopa requentada numa panela velha: impensável! Ora, no contexto português atual, a guerra colonial da Guiné interessa a pouca gente, salvo precisamente os antigos combatentes, as suas famílias e os seus amigos. O que é insuficiente. Acresce, é preciso dizê-lo em muitos casos, os simples autores-editores não fazem nada para se fazerem conhecer, ou não têm meios para isso. Alguns limitam-se a dar algumas conferências em vilas de província, em reuniões de clubes, outros não ultrapassam o nível dos antigos camaradas das suas unidades militares, alguns mencionam um ISBN na ficha técnica mas não indicam o endereço ou as livrarias onde se podem fazer encomendas. Sei isto muito bem porque eu compro – ou muitas vezes procuro comprar – todos os anos dezenas de livros que as livrarias portuguesas não sabem mesmo aonde os encomendar. São livros fantasmas, desconhecidos das melhores bibliotecas estrangeiras e mesmo portuguesas. Ou sabe-se que eles existem, talvez, mas nunca lhes pomos a vista em cima.

O mínimo que devia respeitar um autor-editor seria fornecer nos livros e na publicidade à volta da sua obra, um endereço, seja postal, seja eletrónico, e responder aos potenciais compradores se ele não quer assegurar um serviço de comunicação aos raríssimos críticos que querem divulgar a obra. De igual modo, um jornalista ou um publicista deveria nas suas recensões dizer onde se pode obter a obra de que ele está a falar. Caso contrário, é amadorismo que revela uma ausência de confiança na qualidade do livro ou uma evidente falta de profissionalismo.

Pequeno ou grande, para mim, crítico e historiador, um livro desconhecido com uma tiragem de 300 exemplares tem o mesmo valor que um best-seller, se ele é original e me traz algo de novo, comparativamente ao que já foi publicado. Mas também é preciso saber que são muito raros os antigos combatentes que conhecem aquilo que já foi escrito, vai para uns três, cinco, dez anos antes, por um membro da sua própria unidade militar, a fortiori quando se trata de livros publicados por um autor que pertence a uma outra unidade. Cada um no seu pequeno cantinho faz, por conseguinte, a sua própria “cozinha” memorial, sem ir muitas vezes ao “restaurante” – uma biblioteca especializada, quero eu dizer – para comparar e verificar.

Compreendo que um avô queira deixar aos netos as suas memórias da guerra, dizer-lhes as experiências que teve, contar-lhe as operações nas quais ele talvez tenha participado, os seus estados de alma, as suas alegrias, a sua camaradagem com este ou aquele, mesmo os seus desesperos, a brutalidade do comandante, do inimigo, o seu horror face a crimes, os mortos, os hospitais, a rotina quotidiana, os seus medos, a imbecilidade de certos regulamentos, a sua indignação por o terem obrigado a deixar a sua aldeia ou o seu bairro, a vergonha de se ter sentido impotente ou manipulado, e mesmo – isto existe também nos textos de alguns antigos combatentes das tropas especiais – o seu sentimento de satisfação por terem pertencido a um corpo de elite e de se terem sentido “super-homens” durante alguns anos. Tudo isto é admissível, mas o que se destaca, sobre 10 ou 30 páginas, é a centésima versão da viagem para Bissau, Luanda ou Lourenço Marques, é que este material está muito longe de ser indispensável. Ou então que o autor seja um verdadeiro talento no campo do romanesco.

Entre os livros recentemente recebidos sobre a Guiné, assinalaremos ainda António Lobato, Liberdade ou Evasão. O Mais Longo Cativeiro da Guerra, 4ª edição aumentada, DG Edições, Linda-a-Velha, 2011, 277pp., fotos a preto e branco. Este livro foi inicialmente publicado pela Editora Erasmo, 1995, 214pp. com fotografias, analisei-o longamente (cf. René Pélissier, Angola-Guinées-Mozambique, op.cit, p.372), porque é um livro-documento importante sobre o tratamento dos prisioneiros portugueses e sobre a natureza da guerra praticada pela Força Aérea, Lobato acidentou-se em 22 de Maio de 1963, no regresso de uma operação na Ilha de Como. Como eu então cometi uma imprecisão, retifico-a agora. O autor, sargento da Força Aérea, não foi abatido diretamente pelos guerrilheiros, o seu avião simplesmente foi tocado em pleno voo. Ele pedira a um piloto de um outro T6 para verificar se o seu trem de aterragem não estava destruído, o outro piloto passou sob o seu aparelho. E foi durante esta manobra delicada que o avião do seu camarada colidiu com a hélice do avião de Lobato, este ficou ingovernável, o seu camarada despenhou-se e morreu enquanto Lobato aterrou numa bolanha de Tombali. Perderam-se assim dois aviões no dia 22 de Maio de 1963, Lobato foi feito prisioneiro, espancado, ferido e encarcerado em condições muito duras na Guiné-Conacri. Será libertado em 22 de Novembro de 1970 no decurso da operação Mar Verde, os Comandos Africanos assaltaram a prisão e trouxeram todos os prisioneiros portugueses que ali estavam. Na presente atualização da sua narrativa, em Fevereiro de 1999, Lobato foi convidado pelo Presidente ex-inimigo, “Nino” Vieira recebeu-o em pessoa em Bissau, tinha sido “Nino” Vieira a impedir que ele fosse mais mal tratado do que já tinha sido, no início do seu cativeiro: daí a adição de novas páginas (pp. 247-250) sobre este episódio menor mas sintomático da reconciliação. Assim, é necessário possuir esta 4ª edição.

É igualmente recomendado que se procure um romance histórico que decorre praticamente ao mesmo tempo que A Viagem do Tangomau…, op.cit.

Pensamos que Guilherme Costa Ganança, O Corredor de Lamel, 68 Guiné 69, 2ª edição, Chiado Editora, Lisboa, 2012, 418 pp., fotografias a preto e branco, é um romance autobiográfico que vem na sequência de outro volume, igualmente romanceado, sobre o período imediatamente anterior. Trata-se de um alferes da Madeira, da sua companhia, dos seus problemas com a hierarquia, dos seus amores epistolares e sobretudo das operações em que ele intervém em Contuboel, Bula, Cabedu, Catió e, finalmente, a partir de Farim, o famoso corredor de Lamel, que deve ainda hoje evocar muitas recordações. Uma das diferenças da Guiné relativamente a Angola é que o território sendo pouco extenso e o PAIGC militarmente muito mais ativo que a FNLA e o MPLA (e, acessoriamente, a UNITA) havia poucos sectores onde os portugueses viviam em calma ou segurança, com a exceção de Bissau e quatro ou cinco cidades do interior, nos Bijagós, e nos Felupes, e, de uma maneira mais compacta, na região dos Fulas. Dito de outro modo, à intensidade dos combates, à dureza do clima e à morbidade em geral, seria necessário juntar a raridade de sectores tranquilos para onde se podiam enviar as tropas para recuperação das energias. Na Guiné não havia Sá da Bandeira, Lunda, Bié ou vilegiaturas urbanas. A inquietação era geral e nós ainda não lemos uma só narrativa onde os soldados desmobilizados se tenham vindo a instalar na Guiné, situação que foi frequente em Angola e Moçambique. Era um Purgatório para todos e um Inferno para a maioria. Mesmo os ultrapatriotas ou os super-homens autoproclamados dos comandos, dos páras e dos fuzileiros só tinham em mira um objetivo: a peluda. Como é evidente, com o passar dos anos e com a juventude já no passado longínquo, certos autores não querem mais do que rememorar – seletivamente – os raros momentos em que eles estavam otimistas, mas se dispuséssemos de um corpus completo de todos os livros publicados pelos antigos soldados da Guiné, poder-se-ia estabelecer uma grelha de análise fina onde certamente se poderia constatar que as más recordações são mais frequentes que as reminiscências felizes. E isto ainda mais no Exército, em especial nos açorianos e nos madeirenses que foram enviados para a Guiné nos últimos anos da guerra.

Em última análise, todos estes autores (uma centena) não tiveram nem têm uma memória tão compassiva face aos guineenses como Mário Beja Santos que deve ter sido o alferes (1968 a 1970) mais atento à sorte dos seus homens, velhos e desesperados, vendo em que decrepitude caiu a Guiné, tal como ele a visitou em 1990, 1991 e 2010. Ele resumiu o quadro através de uma expressão fúnebre: “um buraco na escuridão” (p.509).

Tantos mortos, tantas esperanças para ter que ver um antigo coronel do PAIGC mendigar-lhe um saco de arroz.
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Nota do editor

Vd. poste anterior de 26 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11159: Bibliografia de uma guerra (67): Alguns comentários sobre a guerra na Guiné e a sua literatura (1) (René Pélissier / Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P11172: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (9): A praxe da Ivone

1. Mensagem do nosso camarada António José Pereira da Costa (Coronel de Art.ª Ref, ex-Alferes de Art.ª na CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69 e ex-Capitão de Art.ª e CMDT das CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74), com data de 20 de Fevereiro de 2013:

Olá Camaradas
Aqui envio uma cena de praxe de que fui vitima e aceitei bem.
As coisas, como tudo na vida, têm de ser feitas com humor, gosto e classe. De outro modo, não valem a pena...

Um Ab.
Pereira da Costa


A Minha Guerra a Petróleo - 9

A Praxe da Ivone

A Ten. Enf. Pára Ivone Reis era uma militar circunspecta e que levava muito a sério os procedimentos ditados pelas ordens e regulamentos. Era simpática e acessível, mas para ela conhaque era conhaque e serviço era serviço. Mas posso testemunhar que também lhe resvalou o pé para a praxe. Como vão ver a vítima fui eu.

Em 12 Dezembro de 1968 a CArt 1692 estava a terminar o seu tempo em Cacine. A sobreposição com a CCaç 2445 – uma unidade de açorianos – estava a chegar ao fim. Foi montada uma operação lá para os lados de Cacoca levada a cabo pelos “periquitos”, na máxima força e apoiados por heli-canhão, enfermeira-paraquedista e com o controlo aéreo a cargo do meu capitão. O grupo de combate “da velhice” (o do João Almeida, “O Alce”) marchava à retaguarda e constituía a força de reserva, para qualquer situação mais delicada que pudesse surgir. Os “piras” já não eram muito piras pois já tinham tido o baptismo numa acção no Quitafine, mas a área de Sangonhá e Cacoca que havia sido repartida entre as companhias de Cacine e Gadamael não era agora muito conhecida. Fora abandonada havia cerca de seis meses e o inimigo parecia não se interessar muito por ela, limitando-se a intensificar a guerra de minas. Foram accionadas três e levantadas cerca de cem, todas anti-pessoal PMD-6. Era o tempo em que Gandembel estava ao rubro e o In não tinha possibilidade de actuar em força nos dois quartéis mais a Sul.

Os meios aéreos ficaram na pista e nós ficámos aguardando. As coisas estavam muito calmas e a dada altura o Cap. Veiga da Fonseca (“O Foca”) decidiu ir ver como estavam as coisas no terreno e eu tomei lugar na traseira da “avionette” (avião DO-27 para os pilotos). Foi a única vez que vi a “guerra” de cima.

Descolámos e, minutos depois, estávamos às voltas na área onde dois bi-grupos de “piras” progrediam e começámos a procurar o nosso grupo. Respondia às chamadas pela rádio, mas não se deixava ver. Estava bem dissimulado e de súbito…

Quem seriam aqueles gajos? Aquilo era um grupo de turras! Kum karakas! Era preciso avisar os nossos e atacá-los. O avião meteu uma asa em baixo e deu umas duas voltas bem apertadas a tentar ver o que seria “aquilo”. O “Cap.” fez-me sinal com as mãos para que eu visse cerca de 20 “turras” que progrediam lentamente e com muito cuidado. Chamou pela rádio a pedir a entrada do héli-canhão. Porém, Cacine não estava à escuta e, a toda a velocidade, voltámos a Cacine tentando chamar a atenção com sucessivos passes a baixa altitude.

Lá vimos o jeep que se dirigia para a pista com o piloto e o apontador, a grande velocidade, e regressámos ao local da refrega. Mais umas voltas e apareceu o héli que voava bastante baixo e em círculos de canhão apontado ao grupo In. De súbito, uma surpresa. Os inimigos tiravam os quicos e cada um, à sua maneira, saudava o helicóptero.

É entontecedor o movimento do rotor dum héli aos círculos e nós próprios a voar por cima, rodando. Por mim, comecei logo a ficar “almareado”, mas procurei fixar um ponto no infinito para ver se me aguentava.

Regressámos a Cacine satisfeitos por tudo ter acabado bem. Mas para mim o pior estava para vir. A cabeça andava-me à roda e eu ansiava que aquilo acabasse. O avião tocou na pista e eu só tive tempo de abrir aquela janelinha de correr que existia na fuselagem e “deitar a carga ao chão”. Chegámos a Cacine e eu deveria vir com um aspecto deplorável. A Ivone Reis (“A Gazela”) quis saber o que se passava comigo – não fosse enfermeira – e eu contei, na minha boa-fé. Quando esperava solidariedade ela puxou dos galões e deu-me uma ordem seca:
– Patinho, isso foi grave! Vá lavar o avião já e bem. Não vamos voltar assim à base.

Debalde procurei descrever em pormenor o que sucedera e apresentar as minhas razões, mas a Ivone não se comoveu (regulamento é regulamento) e eu de balde e escova, coitado de mim, lá fui lavar o vomitado que pingava da fuselagem. O Cap. (ou “Quepezinho”) que conhecia bem a Ivone de Angola ajudou à festa e só já em Bissau, alguns dias depois num jantar no “Solar do 10”, a minha falta foi relevada, creio que à custa de uma lanterna de Dão Tinto para iluminar a mesa onde se sentavam o Cap, a Ivone, o Comandante da LDG que nos trouxera para Bissau e eu.

Como se vê, pelo menos daquela vez, a Ten Enf. Pára Ivone Reis também praxou, o que não será muito regulamentar. Segue junta a prova do sucedido à qual a Ivone chamou “O Pato e a Estátua” (foto tirada junto ao monumento evocativo da passagem da CArt 1692.

Mem-Martins
18FEV13

Cacine, 12 de Dezembro de 1968 > Ivone Reis e Pereira da Costa
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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 25 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10721: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (8): Você agrediu-me?

Guiné 63/74 - P11171: Memória dos lugares (219): Olossato, anos 60, no princípio era assim (6) (José Augusto Ribeiro)

1. Sexta série de fotos do Olossato que o nosso camarada José Augusto Ribeiro (ex-Fur Mil da CART 566, Cabo Verde (Ilha do Sal,  Outubro de 1963 a Julho de 196464) e Guiné (Olossato) (Julho de 1964 a Outubro de 1965), nos enviou em mensagem do dia 13 de Fevereiro de 2013.


MEMÓRIA DOS LUGARES

OLOSSATO - O princípio (6)


Foto 178 > Sem legenda

Foto 179 > Sem legenda

Foto 180 > Sem legenda

Foto 181 > Sem legenda

Foto 182 > Sem legenda

Foto 183 > Sem legenda

Foto 184 > Sem legenda

Foto 185 > Sem legenda

Foto 186 > Sem legenda

Foto 187 > Numa operação na zona do Olossato

Foto 188 > Sem legenda

Foto 189 > Ao fundo vê-se o quinta do cabo-verdiano

Foto 200 > Assim se vestiam as crianças do Olossato

Foto 201 > Com duas bajudas

Fotos: © José Augusto Ribeiro (2013). Direitos reservados
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Nota do editor:

Vd. poste anterior de 26 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11157: Memória dos lugares (219): Olossato, anos 60, no princípio era assim (5) (José Augusto Ribeiro)

Guiné 63/74 - P11170: VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande (3): Em 90 respondentes à nossa sondagem, mais de 42% já se inscreveu ou vai-se inscrever... Cerca de 28% ainda estão indecisos... 30% não pode ou não pensa comparecer...


O nosso VIII Encontro Nacional já está em marcha e são já 40 e tal  o nº dos  inscritos... Aqui vão os nomes  dos nossos camaradas e amigos que já responderam à chamada, e a quem agradecemos vivamente o seu voto de confiança e de estímulo:

António Estácio + 2 - Mem Martins / Sintra
António Martins de Matos - Lisboa
António Sampaio e Clara - Leça da Palmeira
António Santos, Graciela, filhos e netas - Caneças / Odivelas
Carlos Pinheiro e Maria Manuela - Torres Novas
Carlos Vinhal e Dina Vinhal - Leça da Palmeira / Matosinhos
Delfim Rodrigues - Coimbra
Joaquim Carlos Peixoto e Margarida - Penafiel
Joaquim Mexia Alves - Monte Real / Leiria
Joaquim Sabido e Albertina - Évora
Jorge Canhão e Maria de Lurdes - Oeiras
Jorge Rosales - Monte Estoril / Cascais
José Barros Rocha - Penafiel
José Casimiro Carvalho - Maia
José Fernando Almeida e Suzel - Óbidos
José Manuel Cancela e Carminda - Penafiel
Juvenal Candeias - Lisboa
Luís Graça e Alice Carneiro - Alfragide / Amadora
Manuel Resende e Isaura - S. Domingos de Rana / Cascais
Miguel e Giselda Pessoa - Lisboa
Raul Albino e Rolina - Vila Nogueira de Azeitão / Setúbal

... Recorde-se que este glorioso evento (, em 8ª edição,  ininterrupta, desde 2006) vai realizar-se, mais uma vez, em Monte Real, Leiria,  no Palace Hotel, que é um bunker de 4 estrelas, que fica bem situado (em pleno centro do país, acessível em termos de transportes),  e que nos oferece preços e condições logísticas imbatíveis... 

Sabemos que a vida está pela hora da morte, e que infelizmente há muitos camaradas, a maior parte de nós,  a fazer contas à vida... De qualquer modo, camaradas e amigos, são 30 bazucadas para uma ementa que tem genericamente agradado aos convivas dos anos anteriores: estamos a falar de um tripla ementa, entradas + almoço + lanche ajantarado...

As 30 bazucadas são as mesmas do ano passado... Preço especial do Palace Hotel para pernoitar, sozinho ou bem acompanhado, com direito a pequeno almoço: 50 (single) ou 60 (duplo)...bazucadas... Mas,  atenção, que os quartos disponíveis já não são muitos... 

Contactar a organização: Carlos Vinhal e Joaquim Mexia Alves.. Mails de contacto:
carlos.vinhal@gmail.com
luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P11169: (In)citações (48): Vídeo "A Outra Guiné / The Other Guinea", de Hugo Costa e Francisco Santos, ou o regresso ao passado do Albano Costa, ex-1º cabo, CCAÇ 4150 (Guidaje, Bigene, Binta, 1973/74)





A Outra Guiné (The Other Guinea), legendado em inglês. Vídeo (9' 27''). Cortesia de Albano Costa  e Hugo Costa  (2013)

Ficha técnica: produção: Universidade do Porto, 2012;  realização:  Hugo Costa e Tiago Costa: diretor de fotografia: Hugo Costa; som: Hugo Costa... Duração: 9' 27''.


Sinopse: Albano e um grupo de ex-combatentes voltam à Guiné-Bissau, 26 anos após o fim da guerra. Deslocam-se de jipe pelas diferentes localidades, contactando os locais, ajudando e travando amizades. O objectivo é rever o passado, encerrar um capítulo e conhecer uma outra realidade da Guiné.

(Albano and a group of ex soldiers go back to Guinea-Bissau, 26 years after the war ended. They travel by jeep, visiting different places, and contacting the locals, helping them and making friends. Their purpose is to revisit the past, closing a chapter and discovering a different reality in Guinea.)
— com Albano Costa em Guine-Bissau. (*)



1. O Albano Costa já era fotógrafo (profissional) quando fez a sua comissão de serviço, como 1º cabo, operacional, na CCAÇ 4150 (Guidaje, Bigene, Binta, 1973/74).

A sua paixão pela fotografia fez com que ele seja um dos nossos camaradas com mais e melhor documentação sobre a Guiné, de ontem e de hoje.

Em Novembro de 2000, quebradas as últimas "resistências psicológicas", ele voltou à Guiné, agora como simples turista, revisitando sítios por onde estivera vinte e seis anos antes e conhecendo muitos outros de que só ouvira falar (por exemplo, a zona leste)...

Nessa altura, juntamente com o filho (finalista de um curso de comunicação social), e mais um grupo de camaradas, ex-combatentes (, o Lúcio, Casimiro, Armindo, o Carlos, o Manuel Costa, o Xico Allen, etc.),  o Albano fez um verdadeiro safari turístico-sentimental,  durante 15 dias, de 11 a 26 de Novembro de 2000, percorrendo a Guiné-Bissau, de lés a lés, em dois jipes. Dessa aventura ficou um extenso registo, em vídeo de que me chegou, em 2005,  uma cópia, em 4 DVD, por mão do Sousa de Castro, o nosso grã-tabanqueiro nº 2. É um excelente  trabalho de seis horas, sendo a realização, a insonorização e a montagem do Hugo Costa.

Nessa viagem o Albano tirou muitas e ótimas fotografias, que eu tive o privilégio de ver, em Guifões, Matosinhos, no seu estabelecimento comercial... Na altura ele explicou-me por onde andou:

(...) "Eu tive o prazer de poder ir 15 dias à Guiné, como já sabes, e conhecer localidades que só conhecia de nome quando me encontrava com colegas que diziam aonde tinham estado, e eu agora passei por muitas delas: Mansoa, Jugudul, Bambadinca, Xime, Mansambo, Xitole, Saltinho, Aldeia Formosa, a famosa ponte Balana, Buba, Guilege, Gadamael Porto, Chogué, Empada, Catió Canjabari, Jumbembem, Farim e muitas, muitas mais". (...)

Conheci o Albano, o "fotógrafo de Guifões", no Natal de 2005, na Madalena, Vuila Nova de Gaia. É um homem afável e bem disposto. Mandou-me depois umas tantas fotos, para eu matar saudades de Bambadinca e do meu Rio Geba... Aliás, em quinze dias ele e os seus camaradas foram a quase todo o lado e ainda apanharam um golpe de Estado pelo meio, o do Ansumane Mané!...  [Neste vídeo, vemos apenas a sua passagem pelo Xime, por Bissau - antigo hospital militar, HM 241 - e Cofeu e Guidaje; há, nomeadamente, em Bissau, vestígios ainda recentes da guerra civil de 1998/99; a visita às ruínas do antigo HM 241 é uma verdadeira dor de alma...].

As primeiras fotos chegaram-me com a seguinte nota que eu achei uma delícia: "Estou a enviar nove fotos tiradas em cima da ponte sobre o rio Geba, à entrada para Bambadinca... As legendas, bem, até nem é preciso, podem ficar no imaginário de cada um....Mas,  se quiseres,  ilustrar com texto de tua autoria, estás à vontade, para apróxima eu envio-te mais, vai aos poucos"...

Ao longo dos anos temos publicado muitas fotos dele e do filho (que voltou à Guiné-Bissau em 2006, numa expedição organizadas pelo Xico Allen)(**). Ao vê-las, eu tive a estranha sensação de que o tempo nada mudara: e no entanto, a Guiné-Bissau é hoje um país independente... [Eu próprio voltaria lá, em 2008]... Pelo menos, a terra continua vermelha, o Rio Geba corre limpo para o mar, as crianças parecem ser felizes e têm sonhos como todas as crianças do mundo, o peixe sai dos rios e entra nas bolanhas, há velhas pirogas abandonadas nas margens e os toca-toca andam cheios de gente viva e alegre pelas estradas esburacadas da Guiné profunda, longe do bidonville que é hoje Bissau...

Deixem-me dizer-vos quanto adorei ver este vídeo de 9 minutos. O Albano é um pai babado e tem razões para isso. O Hugo é um rapaz de grande sensibilidade e talento e dá aqui, mais uma vez, mostras do grande amor que tem pelo seu velhote.

Parabéns, Albano, Parabéns, Hugo. Temos arranjar maneira de divulgar, através do blogue, as outras 6 horas de vídeo que o Hugo fez em 2000 (e de que presente vídeo é apenas uma amostra, se bem que mais profissional)... A grande maioria dos nossos camaradas nunca irão poder voltar à Guiné para fazer a catarse ou simplesmente para matar saudades como tu, Albano, meu bom amigo e camarada...

Façam, entretanto,  o favor de consultar a página no Facebook do Hugo Costa:

(i) Designer de Imagem
(ii) Vive em Porto
(iii) Nasceu a 1 de Setembro de 1978
(iv) Sabe língua portuguesa, língua inglesa, língua castelhana e 3 outros
(v) 2012 : Concluiu os estudos na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto
(vi) 2006:  Concluiu os estudos na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto;
(vii) 2005: Concluiu os estudos na École Régionale des Beaux Arts de Saint Etienne, França;
(viii) 1999: Concluiu os estudos em ESAP - Escola Superior Artística do Porto

O Albano Costa também tem página no Facebook. (LG)

Guiné 63/74 - P11168: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (2): O meu diário (José Teixeira, ex-1º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Buba e Empada, 1968/70) (Parte II): Buba-Aldeia Formosa, 39 horas dolorosas para fazer uma picada, de 35 km, em 24/25 de julho de 1968

1. Mensagem de 25 do corrente, do Zé Teixeira, que vive em Matosinhos, gerente bancário, reformado, e cidadão ativissimo em prol dos outros e das causas solidárias [, foto à esquerda, Farosadjuma, Cantanhez, Região de Tombali, Guiné-Bissau, 2011]


Grande Régulo Luís.

Apanhaste-me na curva. tens insistido comigo para repor “O meu Diário” (*).  Resisti à tentação porque não sinto que tenha o valor que lhe dás e sobretudo porque há vivências de tantos camaradas que merecem muito mais que eu serem valorizadas... Mas já que insistes, vamos lá...

Com tempo pude vasculhar a correspondência com a minha ex-namorada e atual companheira de vida, bem como da minha família, o que me despertou para outras situações vividas e que não foram passadas para o “Diário”, talvez por perguicite, medos, etc.

Assim, tomo a liberdade de reenviar “O meu Diário” acrescido com letra em itálico para não se confundir com o que escrevi em cima dos acontecimentos em que procurava falar para mim mesmo, de partes de aerogramas e recordações que o tempo não consegue apagar. Se vires que tem interesse podes publicar.

Junto algumas fotos para enriquecer toda esta “tramoia”que me pregaste.

Abraço fraterno do Zé Teixeira

Comentário de L.G.:

Grande Zé: Just in time!... Vou reformular os postes... Assim há um motivo acrescido para ler ou reler o teu diário (que é, sem favor, um notável documento)... Tu mereces esta pequena gentileza e muito mais!... Um xicoração. Luis



2. 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (2): O meu diário (José Teixeira, ex-1º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Os Maioriais, Buba e Empada, 1968/70) (Parte II):  Picada Buba/Aldeia Formosa, 24/26 de julho de 1968

Fotos: © José Teixeira (2005): Todos os direitos reservados


Continuação da publicação do "diário" do José Texeira (ex-1º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381 (Buba e Empada, 1968/70), agora aumentado com correspondência:

Aldeia Formosa,  24/26 de julho de 1968

Comecei a guerra. Saí de Buba dia vinte e quatro às seis da manhã e cheguei a Aldeia Formosa dia vinte e cinco às vinte e uma, depois de durante dois dias batalhar com o IN, com o tempo e ultrapassar outras dificuldades.

A estrada (picada) está num estado lastimoso: buracos de minas, pontes destruídas e outros obstáculos que a muito custo se venceram. Os primeiros sete quilómetros, foram percorridos em oito horas e meia.

O primeiro ataque foi de abelhas. Eram tantas que mais pareciam uma pequena nuvem e era ver quem mais corria a fugir da sua picada. Eu fiquei quedo como um penedo,  sentado na berma, entre os arbustos, a conselho de um africano que estava a meu lado e não sofri uma picada. Assustado e perturbado pelo zumbido à minha volta e pela cor que o meu corpo foi tomando na medida em que se fixavam à minha roupa, na cara e na cabeça. Neste estado pude apreciar a confusão de uma fuga precipitada um tanto hilariante. Se o IN tivesse atacado nesse momento era um desastre total, tal foi a desorganização gerada

Depois... Veio aquela mina roubar mais uma vida e pôr duas em perigo... Inimigo cobarde!... frente a frente não consegue atingir os seus objectivos e ataca à traição, num pequeno descuido dos picadores.

Que culpa terá aquele jovem que me morreu nas mãos, que os homens não se amem? Que culpa tenho eu?

A noite começou mais cedo neste negro dia de vinte e quatro de Julho! Esta vida salvava-se, mas um mal nunca vem só. A viatura atingida era o carro do rádio e consequentemente desde aquela hora (16 h) ficamos completamente isolados do resto do mundo. O ferido mais grave e que veio a falecer era o radiotelegrafista. Isto é guerra...

Quando nos dispúnhamos a montar acampamento o RT morreu. Com o impacte do rebentamento tinha ido ao ar e caiu de peito, rebentando por dentro. Eu e o Catarino [, o outro 1º cabo aux enf, ] nada pudemos fazer.

Esperávamos que o IN atacasse de noite pois tinha sido detectado pela aviação durante o dia. Felizmente durante a noite não houve surpresas e eu entregue totalmente ao ferido que sobrou para mim, o condutor da viatura sinistrada, um pouco mais conformado recomecei, melhor recomeçamos a marcha com toda a cautela, pois no dia anterior, além da mina que rebentou, foram localizadas mais três.

Para alimentação deste dia não tínhamos nada. A ração de combate, mal chegou para o primeiro dia. À frente havia elementos do IN,  "manga dele", havia buracos, pontes interrompidas; havia minas, só não havia comida.

Ainda não tínhamos percorrido três quilómetros, quando caímos na primeira emboscada. Dois bi-grupos esperavam-nos. Felizmente a Milícia do Candé (Aliu Candé) que protegia os flancos descobriu-os e sem compaixão, todas as máquinas de guerra funcionaram. O meio e a retaguarda da coluna embrenhados no mato aguardavam prontos a intervir o que não foi necessário. Quinhentos metros à frente é a vez da retaguarda ser flagelada e obrigar o soldado português a mostrar as suas capacidades de luta. Deste segundo encontro há registar dois feridos.

A coluna recompôs-se e continuou a sua marcha de 30 viaturas carregadas de mantimentos e armamento (três obuses de 140 mm, entre outro material). A meio da manhã chegaram os Fiat. Com a aviação sentimo-nos mais seguros e confiantes. Os feridos foram evacuados de Hélio. Uma coluna que normalmente se faz em oito horas, demorou dois dias.

Agora que sinto o barulho do matraquear das armas, que sinto o sibilar das balas assassinas sobre a minha cabeça, começo a sentir um tremendo ódio a tudo o que seja guerra. Sim. Odeio os homens que em vez de se amarem se guerreiam. Que culpa tenho eu que os homens não vivam o amor?

Quando abriu a emboscada escondi-me debaixo de uma viatura e senti bem perto as balas a assobiarem, pois um IN. estava em cima de uma palmeira à minha frente a fazer fogo. Ainda tentei usar a arma que tinha comigo, mas esta encravou à primeira tentativa e ainda bem. Fui apenas um espectador.

Senhor!, que eu jamais faça guerra!... Que eu ame sempre!

Hoje, 26, recebi uma carta, a que tanto precisava para acordar o meu espírito... Dou-te graças, Senhor,  porque me deste um anjo, porque me deste um amor que está sempre comigo, até nos momentos mais difíceis.

Aldeia Formosa, o meu novo poiso, também foi atacada ao anoitecer . O IN teve fraca pontaria e não meteu uma dentro do Quartel. A mesma sorte não foi para Gandembel,  há cerca de quinze dias, quando atacaram aquele Destacamento com 11 canhões sem recuo, mataram um Alferes e feriram vários militares.

[Foto à esquerda: O Zé Teixeira, em Empada, junto ao pau da bandeira, em 1970, a escrever o seu diário]

Extrato do bate estradas que escrevi à minha namorada

A lição que a G3 me deu, ao recusar disparar e,  ao mesmo tempo, não rebentar o cano em tiras, o que possivelmente me mataria, levou-me a pensar no pedido que minha mãe me tinha feito na minha despedida e ao compromisso que assumi perante mim mesmo de não dar um tiro, nesta guerra. Ser enfermeiro curador de feridas e nunca causa de dor ou morte. Quero ser só e apenas enfermeiro durante o resto da comissão. Afinal é a minha missão.

Entreguei a arma ao quarteleiro e nunca mais quero ter uma G3 na mão. Senti que Deus esteve comigo naquele momento.

Mas aquela vida. Aquele olhar a apagar-se e nós sem lhe poder valer. A sede que o fazia agonizar. Os gritos de desespero de quem sente a vida a fugir-lhe. Depois o adormecer suavemente para sempre.

Meu Deus, que jamais eu faça guerra, nesta missão ingrata de viver em guerra, quando apenas quero viver em paz. Construir a paz.



MATARAM O FUTURO

O destino, no tempo o marcou.
Aquela hora!
A mina escondida!
Aquela viatura!
Quando a quinta passava, deflagrou,
Uma vida cheia de vida,
A morte a levou.
Destino cruel.
Demasiado duro.
Deixou de ser a esperança, no futuro.
Para sempre partiu,
Aquele jovem.

Cheio de saudades de um tempo,
De quem nem sequer se despediu.
Um tempo, para com garra viver,
Mas. . .
Ficou sem tempo, para o conhecer.
Já não vejo!
Já não vejo!
Vou morrer!
Com ténue voz.
Balbuciou.
Tremendo grito.
Eu quero viver!
E . . .
Ali se ficou.
Até morrer.
Sede.
Muita sede.
Aquela vontade danada de viver,
E um corpo a arrefecer!
Vida.
Quase sem vida.
E eu. . .
Sem lhe poder valer.
Tremendo momento.
Num mundo mais pobre,
Um futuro em sofrimento.


(Continua)
_____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste anterior da série > 25 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11150: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (1): O meu diário (José Teixeira, ex-1º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Buba e Empada, 1968/70) (Parte I): Buba, julho de 1968

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11167: In memoriam (141): Nuno Felício (1974-2013), jornalista da Antena 1, filho do nosso camarada Rui Felício (ex-alf mil, CCAÇ 2405, Mansoa, Galomaro, Dulombi, 1968/70)

1. Morre aos 38 anos, Nuno Felício, natural de Coimbra, jornalista, filho do Rui Felício, membro da nossa Tabanca Grande desde a primeira hora:

O jornalista Nuno Felício, de 38 anos, natural de Coimbra, subeditor do turno da tarde da Antena 1, terá morrido no domingo, durante o sono, mas o seu corpo apenas foi descoberto hoje, soube o Expresso.

Nuno Felício, que no passado jogara basquete continuava a praticar desporto, desta feita corrida, e estava a preparara-se para ir fazer uma minimaratona. No sábado de manhã foi correr com uns amigos, voltou para casa e partir daí já ninguém mais o viu.

A falta de resposta aos telefonemas efetuados, ao longo de domingo, pela namorada e pela família levaram-nas a desconfiar de que algo se passava. Hoje, acabariam por descobrir o cadáver, dando a ideia de que Nuno Felício terá perdido a vida enquanto dormia.
Nuno Felício fazia parte da equipa da RDP há seis anos, a última vez que se fez ouvir aos microfones foi na síntese de notícias das 18h30 de sexta-feira.

Licenciado em Jornalismo pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, apesar de ser da rádio, o jornalista gostava de escrever e por isso alimentava alguns blogues.

Anabela Natário

Fonte: Expresso, 18/2/2013 (Reproduzido com a devida vénia....)


[O jornal universitário de Coimbra, A Cabra.net, fez-lhe, em 20 do corrente, um justíssima homenagem]


2. Texto do inconsolável pai, Rui Felício, na sua página no Facebook [, foto atual à esquerda]:

Domingo, 24 de fevereiro de 2013, perto de Lisboa

INJUSTIÇA E DOR

Sentado à lareira, contemplo as brasas incandescentes, o crepitar dos troncos, as labaredas a lamber as paredes de tijolo.

Discorro sobre a justiça. Não sobre aquela que os humanos desenharam e construiram que é composta pela dialética, pelas provas e contraprovas, pelos argumentos e pelos formalismos em que, queremos acreditar, na nossa presunção e na nossa ignorância, hão-de conduzir ao apuramento da verdade. E ao consequente castigo dos culpados.

Não, não é sobre essa que me questiono! Porque sabemos que essa justiça, na sua génese, padece do pecado original da imperfeição humana. A justiça em que penso é outra, é a ideal, é aquela em que a infalibilidade deveria imperar, indicando-nos as causas e as razões das coisas.

É um raciocinio feito ao contrário, aquele que desenvolvo. Em que parto do castigo já aplicao para perceber a sua razão de ser, para conhecer os factos que a ele conduziram. Sem respostas, pergunto, choro, grito revoltado, olho retrospectivamente os acontecimentos, procuro neles um fio condutor, uma lógica. Mas nada!

Sinto-me impotente para entender o que me sucedeu. Disponho-me a assumir as minhas culpas se as houve. Sujeito-me à punição mais severa, em troca desta que me foi dada sem qualquer explicação, sem nenhuma acusação sequer. Abdico até da minha defesa se necessário for.
Mas imploro a misericórdia da substituição da minha pena! Que impiedoso universo é este que pune sem julgar? Que deplorável justiça é esta que, sem a menor explicação, me levou o meu filho na idade dos sonhos?

Rui Felicio

3. Comentário do editor Luis Graça, em nome de toda a Tabanca Grande:

Rui, só hoje soube da trágica notícia da morte do teu filho. É devastador para um pai e para uma mãe. É uma dor tão grande que tem de ser partilhada por todos os teus amigos. ATabanca Grande e os teus camaradas da Guiné estão contigo e com a tua família neste momento duríssimo das vossas vidas. Permite-me que faça este singelo poste In Memoriam ao teu Nuno. Não o conhecia. Mas os filhos dos nossos camaradas nossos filhos são. Um grande Alfa Bravo. Luís Graça


4. Mensagem do Rui Felício a todos os amigos que estiveram com ele neste momento de grande dor e solidão:

AGRADECIMENTO

Na impossibilidade prática de o fazermos pessoal e individualmente como desejariamos, a minha familia e eu vimos manifestar por este meio a todos aqueles que nos acompanharam na dor imensa que sobre nós se abateu, a nossa eterna gratidão pela solidariedade, conforto e apoio recebidos e que nos ajudaram a suavizar o atroz sofrimento que nos aperta o coração.

Familiares e amigos nossos percorreram, alguns deles, longas distâncias para estarem presentes na despedida do Nuno. Desde África. Desde vários países da Europa. Desde muitas terras do nosso País. Desde Coimbra, onde o Nuno estudou e tinha as suas raízes familiares. E, claro, desde Lisboa onde muitos residem.

As lágrimas contínuas da sua namorada inconsolável, as lágrimas que rolavam dos olhos dos seus colegas e dos seus amigos, a maioria dos quais nós nem sequer conheciamos, faziam soltar as nossas de forma incontrolável, pela genuina verdade de uma amizade que ignorávamos ou cuja pujança e plenitude desconheciamos, e impressionaram-nos profundamente.

Ficámos a saber, porque tal era visível e evidente, que não estavam ali presentes por mero circunstancialismo mas sim pela profunda amizade e consideração que por ele nutriam. A disponibilidade de todos os seus colegas e quadros da RDP para nos ajudarem no que fosse preciso foi uma atitude espontânea que muito nos sensibilizou e que jamais esqueceremos.

Finalmente, que nos seja permitida uma referência especial ao brilhante improviso do elogio fúnebre pronunciado por Daniel Belo que a todos comoveu e que a nós calou fundo nos nossos corações. Em si mesmo, traduziu e demonstrou de forma eloquente e cabal, a verdadeira família que é o conjunto dos profissionais da rádio e televisão públicas.

Já nos orgulhávamos da personalidade do Nuno caracterizada pela sua simplicidade e aversão a protagonismos.A sua perda não nos sobreleva a dor que será eterna, mas esse orgulho, por vossa causa, é agora ainda maior.

Um forte abraço aos colegas e amigos no nosso querido Nuno cujos testemunhos nos confortaram e confirmaram as qualidades intrinsecas da sua simples e dedicada vivência, forjada e moldada pelo amor, pelos sãos critérios e pelo bom senso.

Obrigado a todos!

Rui Felicio
com,
Rosantina Felicio
e com,
Alina Lagoas



Montemor-o-Novo > Ameira > Herdade da Ameira > Restaurante Café do Monte > 14 de Outubro de 2006 > I Encontro Nacional da Tabanca Grande > Da esquerda para a direita: Rui Felício, Maria Alice Carneiro (esposa do Luís Graça), António Pimentel (que veio propositadamente do norte, com o Hernâni Figueiredo), o Victor David e a esposa e, por detrás, o Paulo Raposo, o nosso amável anfitrião. O Rui, o Victor e o Paulo foram alf mil at inf da CCAÇ 2405 (Mansoa, Galomaro e Dulombi, 1968/70).... O "reencontro de uma geração valorosa", escreveu o Rui...

Foto: © Luís Graça (2005). Todos os direitos reservados.

__________

Nota do editor:

Útimo poste da série > 19 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11116: In Memoriam (140): Major General Jaime Neves, falecido no Hospital Militar Principal de Lisboa em 27 de Janeiro de 2013 (José Martins)

Guiné 63/74 - P11166: Para que a memória não se perca (3): Histórias da dobragem do século XIX para o século XX (José Martins)



1. Terceira parte do trabalho de pesquisa e compilação do nosso camarada José Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), sobre a História da Guiné na dobragem do Século XIX para o Século XX, que se irá prolongar por quatro postes. Este trabalho foi enviado ao nosso Blogue em mensagem de 13 de Fevereiro de 2013.




Para que a memória se não perca…

Histórias da dobragem do século XIX para o século XX (3)

Brasão da Guiné Portuguesa 
Foto: Portal UTW

Campanha da Guiné, de 21 de Novembro de 1907 a 15 de Maio de1908 
Notava-se, no final do ano de 1907, em vários pontos da Guiné, um clima de sublevação latente, o que levou o Governador da Guiné, 1º Tenente da Armada Real João Augusto de Oliveira Muzanty, a requisitar reforços à metrópole, para fazer face a prováveis alterações na ordem pública na província.
Povos da margem esquerda do rio Geba revoltam-se, não acatando as ordens das autoridades e cometem ataques ás populações fiéis, que rapidamente se alastram até à região do Corbal [Corobal?].
Tendo em conta que a demora de tomada de posição, contra a rebelião, podia ser tomada como incentivo a outros focos de instabilidade, levou a que, de imediato o governador tomasse o comando de uma força que, em 27 de Novembro, constituída pelas forças disponíveis do Exército, da Marinha de Guerra e de auxiliares, e marchasse para a região revoltada do Cuhor onde o régulo beafada Infaly-Socó, incitou à revolta e ao ataque do nosso aliado Abdulay. A coluna atacou e destruiu as tabancas de Campampi, Furacunda e Sanhá.

© Imagem retirada de http://coisasdaguine.blogspot.pt/2011/05/150-campanhas-para-dominar-o-gentio-da.html [A. Marques Lopes]

Comando e forças utilizadas nesta operação: 
• Comandante: 1º Tenente da Armada João Augusto de Oliveira Muzanty;
• Chefe do Estado-maior: Capitão José Xavier Teixeira de Barros:
• Duas forças de desembarque da canhoneira “D. Luiz”, sob o comando dos 2ºs Tenentes da Armada José Francisco Monteiro e David Albuquerque Rocha;
• Força da guarnição dos Postos de Xime, Bambadinca e auxiliares, sob o comando do Alferes de Cavalaria Raul Carlos Ferreira da Costa;
• Serviços Marítimos de Comunicação sob a direcção dos 2ºs Tenentes da Armada José Estêvão de Campos França, Frederico Pinheiro Chagas e Carlos Prima Guimarães Marques.
Em consequência das acções de rebelião, muitas linhas telegráficas encontravam-se destruídas, pelo que em Janeiro de 1908, foi necessária a constituição de uma força para castigar os rebeldes e com a missão de restabelecer as ligações destruídas.

Destacamento para reparação de linhas telegráficas:
• Comandante: Capitão de Infantaria e Estado-maior Ilídio Marinho Falcão de Castro Nazaré:
• 20 Praças da Armada sob o comando do 2º Tenente da Armada David Albuquerque Rocha, da canhoneira “D. Luiz”:
• Elementos do Exército sob o comando do Capitão de Artilharia Viriato da Fonseca, tendo como subalterno o Alferes Raul Carlos Ferreira da Costa:
o 24 Praças do Depósito de Adidos,
o 2 Praças de Cavalaria, o 8 Praças de Artilharia com uma peça de 7 c.
o 30 Auxiliares indígenas.
Uma outra forma de rebelião, era o não pagamento do “imposto de palhota” ou impedirem a passagem de brancos pelas suas terras. Desta feita foram os Felupes, de Varela, a revoltarem-se. A coluna conseguiu os objectivos a que se tinha proposto, não só castigando os revoltosos mas provocando muitas baixas.

Destacamento destinado a bater os Felupes de Varela: 
• Comandante: Capitão de Infantaria José Carlos Botelho Moniz:
• 40 Praças da Armada sob o comando do 2º Tenente da Armada José Francisco Monteiro, da canhoneira “D. Luiz”:
• Elementos do Exército:
o 23 Praças do Depósito de Adidos, comandadas pelo Tenente Rodrigo Anastácio Teixeira de Lemos;
o 52 Praças da Companhia Indígena de Atiradores, comandadas pelo Tenente José Caldeira Marques. Mesmo após os castigos infligidos aos fulas da margem esquerda do rio Geba, e aos Felupes de Varela, não evita que o clima de instabilidade esmoreça pelo que, o governador, dispondo já de mais meios e forças, decide formar nova coluna e tomar a iniciativa, a fim de não ser surpreendido.
O Governador Muzanty, a frente da coluna, derrota os rebeldes de Gan Turé, Sambel Iantá, Gan Sapateiro e ocupa a região de Cohor, libertando a navegação do rio Geba, e destrói, também, as povoações de Intim, Bandim e Contumbe.
Com a aproximação da época das chuvas, a coluna regressa à praça de Bissau em 12 de Maio de 1908.  

Coluna de operações contra Balantas, Papeis, Fulas e outros em Abril de 1908: 
Comando:
• 1º Tenente da Armada João Augusto Oliveira Muzanty;
Estado-maior:
• Capitão de Infantaria Ilídio Marinho Falcão Nazaré, Tenente de Cavalaria D. José de Serpa Pimentel de Sousa Coutinho, 2º Tenente da Armada António Emídio Taborda de Azevedo e Costa, Tenente Belmiro Ernesto Duarte Silva, Capitão de Administração Militar Joaquim Simões da Costa;
Armada Real - Oficiais da guarnição das canhoneiras “D. Luiz” e “Zambeze”:
• Capitães Tenente Alberto da Silva Moreno e Júlio Galis;
• 1ºs Tenentes Francisco Freitas da Silva, Jorge Parry Pereira, Alberto Carlos Aprá e Luiz Bernardo da Silveira Estrela;
• 2ºs Tenentes Eduardo Cândido Lopes Vilarinho, Jerónimo Weinholtz de Bívar, Alfredo de Sousa Birne, João Gonçalves da Costa, Carlos Primo de Guimarães Marques, Sebastião José de Carvalho Dias, José Estêvão de Campos França, José Proença Fortes, José Francisco Monteiro, Frederico da Silva Pinheiro Chagas e David de Albuquerque Rocha;
• Guardas Marinha: António José Martins e Sebastião José da Costa;
• Maquinistas: Pedro Mário Pacheco Consiglieri, Henrique Guilherme Fernandes, e Francisco Rodrigues Pinto;
• Médicos Navais: Alberto Goulard de Medeiros, João Antunes Leite e José António Andrade Sequeira;
• Comissários: António M. de Azevedo Machado Santos e José da Cunha Santos;
• Aspirantes da Administração Naval: Armando Heitor Aranha, Orlando A. de C. Braga, António de Campos Andrada e António Pereira da Silva Teixeira.

Desembarque de tropas expedicionárias da metrópole 
© Foto: Postal de colecção / Autor desconhecido 

Exército de Terra:
Secção de Engenharia:
• 3 Sargentos e 9 Soldados;
Bateria de artilharia de guarnição da província:
• 69 Praças sob o comando do Capitão de Artilharia Viriato Gomes da Fonseca e dos oficiais: Tenente Luiz Monteiro Nunes da Ponte; Alferes António Carlos Cortêz e António dos Santos (quadro auxiliar de artilharia).
Infantaria 13, do Reino (Vila Real):
• Capitães Jorge Perestrelo de Pestana Veloso Camacho e Adelino Augusto de Sousa Ripado; Tenentes: Francisco de Almeida, José Dias Veloso, António José Ferreira, Lino Marçal Sant’Ana de Saldanha e Rodrigo Anastácio Teixeira de Lemos; Alferes: António Luiz Alves, Jaime Raul Sepúlveda Rodrigues, Jaime Vítor Duque (morto) e Alfredo Augusto Xavier Perestrelo da Conceição.
Companhia Mista Europeia:
• Capitão José Carlos Botelho Moniz; Tenentes: João Caldeira Marques e Afonso Henriques Alves Xavier. Serviço de Saúde:
• Capitão Médico Francisco Augusto Regala, Tenente Médico Manuel de Jesus Suzano; Tenente do quadro colonial: António Maria Marques Perdigão, Eduardo Pereira do Vale, António de Freitas Ferraz e José de Pinho Cruz Júnior e Tenente Veterinário Francisco Gervásio Flores.
Serviços Administrativos:
• Tenente da Administração Militar Frederico Xavier da Silveira Machado.
Voluntário civil:
• João Baptista Fortes.
Para completar o esforço desenvolvido nas operações 1907-1908, em 17 de Novembro de 1908, uma força de marinha e auxiliares leva a efeito uma operação contra os balantas em Conó-Cumba, Chumbel, Blassi, Assagre e Nhafó, que tinham perpetrado vários roubos de gado, pelo que foram severamente castigados com bastantes baixas e recuperando grande parte do gado roubado.

Grupo de Oficiais em Bissau 
© Foto: José Henrique de Mello 

Foram louvados os seguintes oficiais e praças: Comandante da Campanha:
• Governador-geral e 1º Tenente da Armada João Augusto de Oliveira Muzanty;
Armada Real:
• Capitães Tenentes Alberto da Silva Moreno e Júlio Galis;
• 1ºs Tenentes Francisco Freitas da Silva, Jorge Parry Pereira e Luiz Bernardo da Silveira Estrela;
• 2º Tenentes da Armada António Emídio Taborda de Azevedo e Costa, Eduardo Cândido Lopes Vilarinho, Jerónimo Weinholtz de Bívar, João Gonçalves da Costa, Carlos Primo de Guimarães Marques, Sebastião José de Carvalho Dias e Frederico da Silva Pinheiro Chagas;
• Aspirante da Administração Naval António Pereira da Silva Teixeira,
• 2ºs Sargento: João Duarte, João da Silva, Júlio Simplício Teles de Sousa, Adelino José das Neves Coelho e António Rodrigues da Costa,
• Cabos: António Moreira, Cocufate Joaquim Torres, Filipe de Barros e Manuel das Dores;
• 1ºs Marinheiros: António Joaquim da Cruz, Luiz da Silva, Joaquim Bento António Cândido Russo, Roberto Montero e Joaquim da Silva;
• 2ºs Marinheiros: António Augusto Barbosa, Joaquim dos Santos (Chegador) e José Dias (1º Artilheiro):
• 1º Grumete: José Martins.
Exército de Terra:
• Capitães José Carlos Botelho Moniz; Jorge Perestrelo de Pestana Veloso Camacho e Adelino Augusto de Sousa Ripado; Viriato da Fonseca, Ilídio Marinho Falcão Nazaré e Joaquim Simões da Costa;
• Tenentes Francisco de Almeida, José Dias Veloso, Lino Marçal Sant’Ana de Saldanha, Alfredo Augusto Xavier Perestrelo da Conceição, D. José de Serpa Pimentel de Sousa Coutinho e Belmiro Ernesto Duarte Silva;
• Tenentes Médicos Manuel de Jesus Suzano e Eduardo Pereira do Vale;
• Tenente Veterinário Francisco Gervásio Flores;
• Alferes Raul Carlos Ferreira da Costa;

Grupo de Sargentos em Bissau 
© Foto: José Henrique de Mello 

• 1ºs Sargentos: Manuel Pinto da Fonseca, Augusto Maria da Silva Flores, João José, João Machado Toledo, Manuel Tomé e António Monteiro;
• 2ºs Sargentos: João Maria dos Santos, Eduardo Augusto de Morais e Silva, Alfredo Alves da Silva, Manuel Azevedo, Abel Andrade Largo, José Paulino Rodrigues, Alexandre Francisco Ferreira Sarmento, Luiz de Carvalho Villaura, Estêvão Dias da Cruz, Jaime Garcia de Lemos, Alfredo Acácio Afonso, Salomão António Soares, Sabino da Conceição de Carvalho Ventura, José Afonso Lonha, José Pinto de Sousa Júnior, João José Cardoso, Manuel Joaquim Gonçalves Júnior, Alberto Augusto de Araújo (Serralheiro Ferreiro) e José Francisco Alhandra (Carpinteiro);
• 1ºs Cabos: Francisco Rodrigues Calçona, Virgílio Vieira de Vasconcelos, Manuel Monteiro, João Ferreira da Costa Júnior, Domingos dos Santos, Josué Alves Pinto Pinheiro, António Francisco da Encarnação Martins, Manuel Martinho (Ferrador) e António Gomes (Corneteiro);
• Soldados: Joaquim Maria, Raul de Jesus, José Dias, Manuel Luiz, Manuel dos Santos e Augusto Alves;


Operações Militares contra os balantas na região de Goli em 1909
No início do ano de 1909, o Governo Provincial decide instalar, na região de Goli, um posto militar, mas esta decisão não foi bem aceite pela população balanta que, a 21 de Fevereiro de 1909, atacam o referido posto. Esta acção foi repelida com violência, deixando, os revoltosos, muitos mortos no terreno.
Apesar dos factos registados, as populações continuaram a movimentar-se e notava-se no ar algo de preocupante: preparavam-se para um ataque de maior envergadura.
Foi então decidido que a guarnição do posto fosse aumentada com tropas de infantaria e de artilharia, assumindo o comando do posto o Capitão do Estado-maior Ilídio Marinho Falcão Nazaré.
Quando os soldados se tinham que afastar do posto, no exercício das suas funções, acentuavam-se as ameaças da população. Foi então nomeada uma coluna, para reconhecimento da zona, constituída por parte da guarnição do posto, reforçada por um destacamento da 9ª Companhia Indígena de Moçambique, comandadas pelo 2º Tenente da Armada Casal Ribeiro, com o apoio do Chefe de Guerra Abdul-Injai e das suas gentes. O reconhecimento deslocou-se até Calicunda e, encontrando o inimigo, iniciou o regresso, tendo reconstituído a passagem do Chumbal.
A 4 de Março desse ano, o mesmo oficial organiza e comanda uma nova coluna que se dirige a Nhacé, sendo atacada violentamente pelo inimigo, sendo repelido e levado de vencida até Berraam. Depois, os auxiliares, dirigiram-se ate Date, destruindo todas as povoações dos revoltosos.


Operações contra os balantas de Bissau e baiotes de Cacheu em 1912
Mais uma vez, nas áreas de Elia e Jobel, foram palco de revoltas por parte de balantas de Bissau e baiotes de Cacheu, em Fevereiro de 1912, que viriam a ser reprimidas por voluntários civis de Bissau, Cacheu, Bolama e da Liga Guineense, comandados pelo Capitão de Infantaria José Carlos Botelho Moniz.
A coluna desembarca em Inhome, a 27 de Março, derrotando os revoltosos em Binar, Gicasse, Satará e Tama, seguindo a 2 de Abril para Jobel, destruindo as povoações que, pelo caminho lhes ofereciam resistência, chegando no dia 4 a Elia, onde travou combate e venceu os revoltosos.
A coluna ainda se dirigiu a Cajegute, a 7 de Abril, onde impôs ao régulo manjaco a devolução do produto de um roubo efectuado pela sua população. Tendo sido feita a devolução do mesmo, a coluna regressa a Bissau, sendo dissolvida.


Operações no Mansoa e Oio em 1913
A índole guerreira e agressiva era exteriorizada, orgulhosa e altivamente, pelos povos das regiões de Mansoa e Geba, manifestando insubmissão e desrespeito pelas autoridades portuguesas, por se julgarem invencíveis.
A situação de desobediência, indisciplina e provocação aumentam, pelo que surge o momento de colocar um fim a estes actos, entendendo o governo da província colocar um fim nestes acontecimentos.
Foi então organizada uma coluna que, sob o comando do Capitão Teixeira Pinto com a colaboração da Marinha de Guerra, infringe forte castigo aos insurrectos, provocando-lhes pesadas baixas.
Os factos mais relevantes resultantes destas operações são a ocupação de Mansoa de 29 de Março a 22 de Abril, com o apoio da canhoneira “Flecha”, o estabelecimento de um posto militar em Porto-Mansoa, e a ocupação da região do Oio de 14 de Maio a 16 de Junho, com o apoio da canhoneira “Zagaia”, e o estabelecimento de um posto militar em Mansoa.
Tomaram parte na expedição, as seguintes forças: 
Comando:
Capitão de Infantaria João Teixeira Pinto, coadjuvado pelos Tenentes de Infantaria Henrique Alves de Ataíde Pimenta e Artur Sampaio Antas;
Artilharia: 1 Sargento, 4 cabos europeus e 4 soldados indígenas, com uma peça Krupp de 8 c.;
Auxiliares: 400 Irregulares indígenas de Abdul-Injai;
Administrador de Geba: Vasco de Sousa Calvet de Magalhães com 80 homens armados;
Canhoneira “Flecha”: 2º Tenente da Armada Raul Queimado de Sousa;
Canhoneira “Zagaia”: 2º Tenente da Armada António Raimundo Costa Santos Pedro
Serviços de transporte: vapor “Capitania”, motor “Cocine”, lanchão “Cacheu” e lanchas “ Rio Geba”, “Santa Isabel”, “Clementina”, “Coffka II”, “Simone” e “Avé Maria”.
Distinguiram-se e foram citados:
• Capitão de Infantaria João Teixeira Pinto; Tenentes de Infantaria Henrique Alves de Ataíde Pimenta e Artur Sampaio Antas;
• Tenente Augusto José de Lima Júnior, 2º Sargento António Ribeiro Vilaça, 1º Cabo António Ribeiro Möens (empregado da casa Soller Charles Magne);

Empregados de uma casa comercial estrangeira 
© Foto: José Henrique de Mello 

• Vasco de Sousa Calvet de Magalhães (Administrador de Geba), auxiliares indígenas Abdul-Injai e Bacari-Suncaro;
• Comandantes da Canhoneira “Flecha” 2º Tenente da Armada Raul Queimado de Sousa, Canhoneira “Zagaia” 2º Tenente da Armada António Raimundo Costa Santos Pedro, do vapor “Capitania” Adolfo dos Santos, da motor “Cocine” Alfredo Martins e da lanchas “ Rio Geba” Francisco Maria.

(Continua) 
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Nota do editor:

Vd. poste anterior de 25 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11153: Para que a memória não se perca (2): Histórias da dobragem do século XIX para o século XX (José Martins)

Guiné 63/74 - P11165: Convívios (495): XVI Encontro do pessoal da CCAÇ 4150 - "Os Apaches do Norte", dia 14 de Abril de 2013 em Lousada (Albano Costa)

1. Mensagem do nosso camarada Albano Costa (ex-1.º Cabo da CCAÇ 4150, Bigene e Guidaje, 1973/74), com data de 24 de Fevereiro de 2013:

Caros amigos editores
No dia 14 de Abril vai realizar-se o XVI Encontro-convívio da CCaç 4150, que este ano vai ser em Lousada, no norte do país, a 40 km do Porto, mas com acessos facilitados por auto-estrada. Quem estiver interessado em estar presente no nosso convívio é favor entrar em contacto com Luís Gonzaga (tm 919 591 111) ou Albano Costa (tm 934 257 368). O programa segue em anexo.
Desde já a comissão fica agradecida pela publicação deste evento.

Um abraço de amizade,
Albano Costa

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Nota do editor

Vd. último poste da série de 25 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11152: Convívios (494): II Almoço da Tabanca Ajuda Amiga, dia 28 de Fevereiro de 2013 na Cantina da Associação de Comandos, Laje - Oeiras (Carlos Fortunato)

Guiné 63/74 - P11164: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (6): Regresso a Bissau

Abílio Magro junto às obras da piscina de sargentos que estava a ser construída nas traseiras dos nossos quartos


1. Em mensagem do dia 4 de Fevereiro de 2013, o nosso camarada Abílio Magro (ex-Fur Mil Amanuense (CSJD/QG/CTIG, 1973/74), enviou mais uma crónica para a sua série Um amanuense em terras de Kako Baldé.


Um Amanuense em terras de Kako Baldé

(Para quem não sabe, Kako Baldé era o nome por que era conhecido, entre a tropa, o General Spínola. Kako – (caco) lente que o General metia no olho. Baldé – Nome muito comum na Guiné) 

5 - Regresso a Bissau

O sol começava a nascer e ao longe, tenuamente, já se vislumbrava a costa da Guiné e, muito lentamente, o cais do Pidjiquiti tornava-se-me mais nítido e desejado.
Tinha a sensação de estar a regressar finalmente de uma longa ausência em terras inóspitas.
Cacine tinha ficado para trás. Foram poucos dias, eu sei (pareceram-me uma eternidade!), mas deu para "cheirar" ao de leve a guerra e sentir a vida dura do mato.
Senti-me regressar a "casa".

Em terra, aproveitei a boleia de uma das Mercedes que transportavam o pessoal da CCAÇ 3520 e que me deixou perto do QG/CTIG que não ficava longe do "Apart-hotel" onde estava alojado - O "Biafra". Este, era um alojamento provisório para quem chegava à Guiné pela primeira vez, ou que estava em trânsito. Eu já contava com 3 meses de Guiné e ainda ali continuava. Talvez as baratas tenham feito alguma pressão nesse sentido.

Embora necessitado de um valente banho, as saudades de uma "bejeca" geladinha falaram mais alto e, deixada a "bagagem" e a G3 na "suite", logo me dirigi ao Bar da Messe de Sargentos que se encontrava ainda fechado, mas que o "barman", vendo o estado lastimoso em que me encontrava e sensível ao meu convincente "choradinho", logo se disponibilizou para procurar a "bejeca" mais gelada que se encontrasse nas redondezas.
Até tinha gelo lá dentro! "Ganda barman!"
Bebi-a de um trago, o que fez com que não pudesse ter "cantado o fado" durante uns dias, mas que me soube bem "comó caraças"!

Havia agora que me apresentar ao serviço e recomeçar a minha outra "guerra", a que muitos chamamavam "do ar condicionado" (aproveito para informar que o ar condicionado estava reservado para os gabinetes dos Oficiais pois abaixo disso, aguentavamos com aquelas ventoinhas "gigantolas" penduradas no tecto e que, quando avariavam ou faltava a electricidade, nos obrigava a parar de trabalhar e vir para a rua, o que nos era permitido).

Lavadinho, barbinha feita, calças verdes de terylene, camisinha de manga curta e aberta no pescoço, lá vou eu todo vaidoso apresentar-me ao Chefe do Serviço de Justiça e Disciplina - Major do SGE, Mário Lobão (julgo que, naquela época, os Oficiais do SGE eram oriundos da classe de Sargentos e que, após frequência de um Curso na Escola de Sargentos de Águeda, acediam ao Oficialato e podiam progredir na carreira até ao posto de Ten. Coronel).

Para ir do meu gabinete ao do Major, tinha de passar pelo gabinete dos Advogados - Alferes Milicianos.
E, ao passar por estes, dizem-me:
- "Não se vá apresentar assim, tem de levar gravata!"

Eram uns brincalhões e eu era ainda muito 'pira'..., estão a ver?!
Gravata numa camisa daquelas e naquele clima?! "Gandas tangas estes tipos!"
Continuei a marcha em direcção ao gabinete do Major, entro, "bato-lhe a devida pala" e, quando me apronto para lhe contar as minhas desventuras, o homem levanta-se e vocifera:

- "Isso não é assim, vá-se ataviar convenientemente e venha-se apresentar depois!"

Se fosse hoje, corria para o computador, entrava no site da CP e comprava bilhete para o primeiro comboio que rumasse a Cacine (estou a brincar, não fiquei com saudades daquilo!).
Voltei para trás e ao passar novamente pelo gabinete dos Advogados, ouvi:
- "Está a ver, nós avisamos!"

Lá me informaram de como me deveria apresentar ao homem e concluí que tinha mesmo de pôr gravata.

- "Oh c'um carago, uma gravata nesta camisa é completamente ridículo! Isto anda tudo 'cacimbado' ou foi a cerveja gelada que me baralhou os neurónios?!

Bom, lá fui ao "Biafra", procurei a farda que tinha trazido da Metrópole, vesti a camisa de manga comprida arregaçando-lhe as mangas e coloquei a gravata.
Aquela gravata no meu pescoço fazia tanto sentido como um terço nas mãos do Luis Filipe Vieira!
Resta-me a consolação de ter obrigado o homem a levantar-se para me receber (o respeitinho é muito lindo!).
Quem por lá andou sabe que havia algumas personalidades estrambólicas, mas pelo que pude constatar nos cerca de 18 meses de Guiné, muito poucos Oficiais do SGE tinham semelhantes comportamentos.


Cartão que nos foi distribuído para podermos circular no QG depois da bomba. Reparem nas datas de emissão e validade (parece que contavam comigo até ao fim da comissão).


E a minha "guerra" lá foi continuando sem grandes sobressaltos e aproveito para aqui fazer um pequeno parêntesis para vos dar uma ideia geral de como era a vida do pessoal do "ar condicionado".

Na pequena sala onde prestava serviço, com uma ventoinha "matulona" no tecto, estavam também 4 Escriturários, dos quais dois eram africanos (1 civil, ex-guerrilheiro recuperado, e outro do recrutamento local), virados para mim e o espaço que existia entre as secretárias deles e a minha, não permitia que circulassem duas pessoas a par. A seu lado, estava ainda um 1º Sargento de quem já não me recordo o nome e a quem o Major parecia ter um ódio de estimação chamando-o de "gebo" e encarregando-o das tarefas mais achincalhantes.
Dava pena vê-lo abeirar-se de mim, cheio de medo e, em surdina, pedir-me qualquer tipo de ajuda sem que o Major "topasse". Felizmente para ele faltava pouco tempo para o fim da sua comissão.

A vida dos Escriturários não era "pêra doce"!. Entravam às 8 ou 9h00 (já não me recordo), destapavam as máquinas de escrever e era um matraquear contínuo até ao fecho do serviço, apenas com intervalo para almoço. Imaginem aquelas almas dias e dias seguidos (meses, toda a comissão!), sempre a bater à máquina com um calor insuportável e sem grandes hipóteses de "baldas"! E eu a levar com aquele constante matraquedo em cima!

Mas aquela "guerra" lá se foi travando até que surgem indícios de que a "coisa" estava a ficar mesmo feia e que parecia vir a alastrar-se a Bissau, com início de alguma guerrilha urbana, com bombas a rebentar no café Ronda, no QG/CTIG, num autocarro da Base Aérea e uma pseudo-bomba na Piscina do Clube dos Oficiais.

Tendo vivido de perto estes acontecimentos, com excepção daquele que se terá passado com o autocarro da Base, proponho-me relatar a seguir o que presenciei e de como reagi nesses momentos, não assegurando ser correcta a cronologia aqui apresentada.

1º envelope emitido pelos correios da Guiné independente;

1º selo emitido pelos correios da Guiné independente;

Selos que ainda se vendiam em Bissau em Setembro de 1974


Bomba no Café Ronda

O Cafe Ronda situava-se na Av. da República, um pouco mais abaixo do cinema UDIB e do lado contrário ao deste.

Segundo me recordo, possuía uma espécie de esplanada coberta e ali se juntavam muitos militares (uns fardados, outros trajando à civil) que lá bebiam o seu cafézinho ou "bejeca", entre outras coisas. Tinha também um pequeno balcão que dava para uma rua transversal e onde também se podia beber o "cimbalino" ou a "bejeca" de pé e do lado de fora, com um atendimento muito mais célere.

Numa determinada noite do ano de 1973  [, na realidade foi a 26 de fevereiro de 1974, LG],
eu e mais dois ou três camaradas meus, tomamos o nosso cafézinho no balcão referido e seguimos de imediato para o cinema UDIB para assistir à exibição de um qualquer filme que por lá andava. Poucos minutos depois do início da exibição do filme, dá-se um tremendo rebentamento lá fora e, quase de seguida se ouvem diversas viaturas com buzinadelas e sirenes, indiciando haver constante transporte de feridos.

É interrompida a exibição do filme e surge uma voz aos altifalantes do cinema, solicitando a todos os médicos que eventualmente por ali se encontrassem, o favor de se dirigirem de imediato ao Hospital Militar.

Estão mesmo a ver onde este vosso camarada se dirigiu para ver o resto do filme, né? Pois, acertaram! Direitinho às Instalações Militares de Santa Luzia, onde se encontrava implantado o seu maravilhoso "T2"!

Tinham colocado uma bomba no Café Ronda, que explodiu quando este se encontrava repleto de clientes, tendo causado alguns mortos e muitos feridos. Nesse atentado ficou gravemento ferido um "piriquito" com 2 ou 3 dias de Guiné e que eu tinha conhecido no dia anterior, pois tratava-se do "pira" que ia substituir na CSJD o meu camarada Fur Mil Costa que terminara a sua comissão e tinha já viajado para a Metrópole.

Aquele "piriquito" acabou por ser evacuado para Lisboa e soubemos mais tarde que aí falecera. Recordo-me do nome - Romão.

Como é sabido, tratando-se de pessoal de 'rendição individual', tinha de haver um período mínimo de 10 dias de trabalho em conjunto, em que o substituído transmitia ao "pira" todas as informações relacionadas com as tarefas que este iria passar a executar e só depois isso, era autorizado o regresso a casa do "velhote".

Mas o camarada Costa, de Estarreja, era de "olho vivo e pé ligeiro" e teve artes de obter a lista oficial do pessoal que vinha no avião que estaria para chegar e onde constava o nome do seu substituto (Fur Mil Romão) e, junto do Ten Cor (nessa altura o Major já tinha sido substituído), teve artes ainda maiores de o convencer que a substituição estava assegurada e que a transmissão de serviço se faria sem problemas de maior, com a colaboração dos Advogados a quem tinha solicitado previamente essa ajuda, obtendo, assim, o tão almejado papel.

E lá conseguiu embarcar e viajar para a Metrópole no mesmo avião em que o seu "pira" tinha viajado para Bssau.

Entretanto, deram-se os acontecimentos do Café Ronda, acima relatados, e a substuição não se deu, sobrecarregando durante algum tempo os Advogados (Alferes Milicianos).


Bomba no QG/CTIG

Um dia de Jan/Fev de 1974, encontrando-me eu a convalescer de uma operação às varizes a que tinha sido submetido no HMBIS e bebendo uma "cervejola",  sentado na esplanada da Messe de Sargentos de Santa Luzia, num final de tarde, dá-se semelhante rebentamento por ali perto que julgo me fez levitar por breves segundos. Segue-se de imediato o buzinar constínuo e enervante da sirene de alarme do QG e a debandada geral, desordenada e atarantada do pessoal que por ali estava.

Verificam-se então cenas dignas de um qualquer filme de Charlie Chaplin. Com efeito, face ao crescente temor de que um dia a "coisa" ia chegar a Bissau, o pessoal andava algo receoso e muito nervoso. Quais baratas tontas, cada um reagiu da forma que julgou mais conneniente, vericando-se que alguns procuraram locais que se assemelhassem a valas, tipo condutas de águas pluviais, e aí se deitaram. Eu, com a valentia que me é reconhecida e como é meu apanágio nestas situações, dirigi-me de imediato para o objectivo, isto é: direitinho ao quarto!

Nessa altura já não convivia com as baratas do "Biafra" e já habitava num "T2" (4 + 2 Furrieis) que, por sinal, ficava na direcção do QG e bem mais perto deste. Quem me viu avançar decidido em direcção ao QG (leia-se quarto) terá pensado: "se este vai, vou também!".

O grupo foi engrossando e, quando passei à porta do meu "T2", não tive "lata" para entrar e lá segui com a "malta" até ao portão do QG. Aí, quem estava completamente atarantado era o meu camarada madeirense Fernandes que estava de Sargento da Guarda e não sabia para que lado se havia de virar.

Logo pensei:
- "Olha se era comigo, ia ser bonito ia! Desta vez mandavam-me para o Burkina Faso!

Resumindo: Tinham colocado no QG uma bomba de alguma potência que mandou o telhado pelo ar e deitou paredes abaixo. Vi então sair em direcão ao Hospital o mercedes do Comando com o, já Brigadeiro, Galvão de Figueiredo que apresentava um ferimento no pescoço que, soube-se depois, era de pouca gravidade.

Se o rebentamento se tivesse dado mais cedo, as consequências teriam sido bem mais graves como constatei mais tarde quando regressei ao serviço, pós-convalescença.


Bomba no autocarro da Base Aérea

Não presenciei este acontecimento, do qual apenas me chegou alguma informação difusa de que teria sido colocada uma bomba no autocarro da Base Aérea, sem grandes consequências pelo facto de aquele se encontrar completamente vazio.


"Bomba" no Clube de Oficiais do CTIG

Nas Instalações Militares de Santa Luzia existia um Clube de Oficiais, composto de acomodações, messe, piscina, bar e cinema ao ar livre (podia-se fumar enquanto se via uma "sessão" - "porreiro pá!").

A classe de Sargentos tinha acesso a esse Clube para assistir à exibição de filmes e, uma vez por semana (5ªs-Feiras julgo eu) tinha também acesso à piscina. O local era circundado por um muro formado com aqueles tijolos geométricos que permitem ver de um lado para o outro.

O cinema era montado no recinto da piscina e a tela era composta de um grande pano branco suportado por duas altas estacas. As cadeiras eram metálicas, daquelas de fechar, usadas normalmente nos parques de campismo e nas nossas praias.

Nestas circuntâncias, as sessões de cinema eram efectuadas à noite como é óbvio e, como do outro lado do muro existiam tabancas, os respectivos habitantes viam o filme do outro lado da tela com as legendas do avesso, o que nunca impedia uma razoável assistência nativa.
Quando no filme se desenrolava uma qualquer cena de pancadaria entre um branco e um negro (Sidney Poitier, por ex.) e o negro dava um murro no branco, invariavelmente se ouvia uma grande salva de palmas vinda do outro lado do muro. Compreensível, diga-se de passagem.

Alguns soldados sentavam-se nos muros e também assistiam ao espectáculo.

Naquela altura pairavam no ar receios fundados de provável início de guerrilha urbana em Bissau. Ali, no cinema ao ar livre e com as luzes apagadas por via da exibição cinematográfica, e com as tabancas do outro lado do muro, uma bombita era "canja!"
O pessoal andava nervoso.

Naquela noite o cinema estava cheio como de costume. Eu também lá estava a ver uma "sessãozita".

De repente vê-se um clarão e a debandada foi geral! Com a confusão, algumas cadeiras "ensarilharam-se" provocando tropeções e quedas e, os que caiam ao chão eram espezinhados pelos outros, como foi o meu caso.

No chão, a ser espezinhado e com as cadeiras a atrapalhar, não conseguia fugir e entrei em pânico! Ouvia o som das "Kalashnikov's"! Ia ser apanhado à mão, despedi-me da família!

Passadas longos minutos, lá me consegui erguer e, já pronto para saltar o muro, ouço risadas!
O pessoal da primeira fila tinha-se safado bem das cadeiras e, junto à tela, deliciava-se com o espectáculo. Extremamente nervoso e com o coração a bater a 200 r.p.m., mandei umas "bocas foleiras" aos de "tacha arreganhada" e dirigi-me ao chuveiro da piscina para lavar os arranhões (face, braços e pernas) e tive a companhia do Brig. Galvão de Figueiredo que lá foi fazer o mesmo às mãos e que vociferou:
- "cambada de cretinos!"

Entretanto:
- "de quem são estas chaves?!"
- "ó Magro, olha aqui o teu cartão!"
Os meus "bens pessoais" lá foram aparecendo aos poucos.

Resumindo:
- a bomba tinha sido uma caixa de fósforos que se incendiara a um soldado, enquanto acendia um cigarro em cima do muro e que se terá desiquilibrado. Na queda, terá arrastado consigo mais dois ou três camaradas;
- os longos minutos no chão a ser espezinhado, ter-se-ão resumido a meia dúzia de segundos;
- o tiros de Klashnikov seriam, afinal, a cadeiras metálicas a bater umas nas outras.

Mais um filme ficou a meio e eu, novamente, fui direitinho ao quarto!
Acreditem que foi o maior susto que apanhei em 18 meses de Guiné.
Acreditem que, em pânico, a ser pisado, sem me poder levantar, nem ver o que se passava ao redor, nem que fosse feijão fradinho entrava no "uropígio"!

No dia seguinte, quando entro na CSJD vejo o cabo condutor-motorista do Ten. Cor. com a mão esquerda ligada.
- "Então que foi isso?"
- "Queimei-me ontem à noite no cinema."

Ali estava o autor do "crime"!

(Próximo episódio - O meu 25 de Abril)
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Nota do editor

Vd. último poste da série de 20 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11125: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (5): Curtas férias em Cacine, CCAÇ 3520 (2)