Bilhete Postal > Guiné Portuguesa > 118 – Vista aérea de Bissau. Fotografia verdadeira – Reprodução proibida. Edição Foto Serra. C.P. 239 – Bissau… Impresso em Portugal. Sem data.
Foto: © Beja Santos (2006). Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.
1. Bilhete postal gentilmente cedido pelo nosso camarada Beja Santos (ex-Alf Mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70).
O postal foi enviado nas vésperas de Natal de 1969, pelo Beja Santos (2), a alguém das suas relações, a quem dizia o seguinte, entre outras coisas: “Bissau é melhor do que o postal diz. Os fotógrafos também se enganam!”…
Guiné > Bissau > Vista aérea > 1966 > Fotografia do álbum do ex-furriel miliciano Mecânico Auto Adrião Mateus, pertencente à CART 1525 (Bissorã, 1966/67). Reproduzido com a devida vénia. Fonte: © Companhia de Artilharia 1525 - Os Falcões (Bissorã, 1966/67). (1)
Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.
2. Pedia a outro Mário, o Mário Dias, para comentar o Postal Ilustrado de Bissau, edição Foto Serra (infelizmente não lhe pude mandar esta magnífica vista área de Bissau que só ontem encontrei no sítio dos Falcões de Bissorã).
Mário: Eis a Bissau do teu tempo, a Bissau que tu, menino e moço, viste crescer e que amavas… e sobre a qual escreveste uns magníficos textos (3)… Não queres fazer uns curtos comentários ? Eu sei que saíste em 1966… De qualquer modo, obrigado, Mário, em meu nome, do outro Mário (Beja Santos) e do resto dos tertulianos.
PS – Tu deves também ter uma rica colecção de postais da Guiné do teu tempo… Ou não ? Estamos a recuperar esse material: Postais Ilustrados… O Beja Santos tem sido incansável em fazer-me chegar alguns dos que mandou pelo correio a amigos e familiares…
3. Eis uma primeira resposta do M.D., com data de de Outubro de 2006:
Caro Luis:
Antes de mais, mea culpa pelo meu tão longo silêncio provocado por três factores:
(i) Constantes e prolongadas ausências no Portugal profundo. (Que raio de expressão!).
(ii) O emergir de novos e qualificados tertulianos com maiores e mais aprofundados conhecimentos sobre a guerra na Guiné sobretudo na sua fase de maior perigo (para as NT) e violência ou seja, a partir de 1969. Como sabes, eu saí de lá em Fevereiro de 1966. Assisti e participei nos primeiros anos dessa guerra, desde 1963, quando, embora já bastante dura e perigosa, não tinha ainda atingido as proporções de (quase) catástrofe
(iii) O principal: preguiça. Quanto a esta, à preguiça, é para mim fonte de grande prazer pois me posso dar ao luxo de a cultivar e usufrui-la em toda a sua plenitude. Não imaginas como é bom alguém poder sentir preguiça e fazer-lhe a vontade!... Porém, a solideriedade e a amizade que se gerou entre nós me leva a que, de vez em quando, me esforce e a sacuda para longe.
Vamos, então, ao que interessa. Neste mail não vem a fotografia de Bissau nele referida. Espero por ela e depois de a ver (recuso-me a utilizar neologismos estúpidos como visualizar e semelhantes) terei muito gosto em dar os esclarecimentos possíveis. Conheci muito bem o fotógrafo Serra bem como a esposa que tirava as fotografias no estúdio.
Infelizmente a minha colecção de fotografias de Bissau e de outras localidades da Guiné é muito escassa. As que tenho serão enviadas com mais alguns textos sobre a Guiné do antigamente. Para isso, conto com a tua preciosa ajuda no sentido de sacudir esta preguiça crónica. Embora sem participar directamente no Blogue nos últimos tempos, não tenho deixado de o visitar sempre que possível. Julgo que os textos recentemente publicados têm bastante interesse para o conhecimento da história da guerra na Guiné. A minha colaboração será mais um olhar ao passado dos felizes anos que antecederam o conflito, embora também tenha algo que contar sobre a guerra propriamente dita.
4. Eis por fim os comentários do Mário Dias - o ex-sargento comando Roseira Dias - ao Postal Ilustrado, enviados ontem e que se publicam a seguir. Mas antes disso quero aqui uma palavra de agradecimento (...e de incitamento)
Amigos e camaradas: É um excelente trabalho, este, que só foi possível graças à cooperação dos dois Mários: o Beja Santos (que me mandou o postalito) e o Dias (que o comentou). Já viram o que se pode fazer com um postalito ? A torrente de memórias que jorra por aí ?
De facto, espero que isto provoque reacções em cadeia... Falem-me das bugigangas (orientais...) que vocês compraram na Casa Gouveia ou no Nunes, para oferecer à namorada e à prima da namorada, às manas, à mamã... Falem-me das últimas cervejas, ostras e camarães, à beira-rio... Das últimas incursões ao Pilão (Cupelom, em crioulo)... Falem-me de amores e de amizades, que foram breves como os furacões tropicais (Tu, Virgínio Briote, que sabes falar da Bissau intimista como ninguém...)... Falem-me da nostalgia, da saudade... Se calhar não é de Bissau, mas dos nossos verdes anos que lá ficaram... para sempre. Bissau, camaradas, para o periquito que ia no mato, ou para a velhice que regressava a Bissau, era bem melhor do que dizia o fotógrafo...
Para muitos camaradas que passaram por Bissau como cão por vinha vindimada, a correr, a caminho do mato - ou no regresso, gastando o último patacão, e escrecendo o último postal ilustrado - é uma autêntica visita guiada em flash back... São comentários preciosos que nos ajudam a compor o puzzle da nossa memória da Guiné e da sua capital, Bissau... (5)...
Obrigado Mário Beja Santos, obrigado Mário Dias...
Memórias de Bissau,
por © Mário Dias (2006)
Aceitando o desafio do nosso comandante Luís, aqui estou eu para prestar alguns esclarecimentos sobre o postal ilustrado de Bissau que o Beja Santos enviou.
É da autoria do fotógrafo Serra, pessoa que muito bem conheci nos idos anos 50 e 60. Tinha o seu estúdio numa moradia, onde também residia, situada na avenida que ligava a praça do Império ao Alto do Crim. Várias vezes tirei fotografias para BI, passaporte ou simples recordação no seu estúdio. Lá, no estúdio, pontificava a sua esposa, pessoa de uma extrema simpatia e simplicidade e de notável nível profissional.
Falando ainda em fotógrafos de Bissau, conheci também o fotógrafo Macedo, natural de Cabo Verde, cujas instalações se situavam na rua que, passando pelo campo de futebol (ver fotografia colorida, no lado direito), seguia em direcção ao rio. A casa ficava do lado esquerdo da rua, um pouco abaixo da esquina do campo.
Outro fotógrafo muito conhecido era o Geraldo, com actividade principalmente ligada a reportagens, oficiais ou não, e que foi, nos anos 50, uma das poucas pessoas em todo o mundo a conseguir fotografias e filmes da circuncisão masculina e da excisão feminina [, vulgo Fanado].
Feito este breve preâmbulo, passo então a assinalar os principais pontos de interesse que podem ser identificados no postal. Como, porém, a perspectiva não é muito favorável, tomei a liberdade de incluir outra, a preto e branco, publicada no blogue pelo Paulo Raposo (3) e que, a avaliar pela posição dos barcos no rio, me parece ter sido tirada na mesma ocasião.
Postal Ilustrado > Guiné Portuguesa > Vista aérea de Bissau. Edição Foto Serra. Comentários de Mário Dias (a complementar com a consulta da nossa página sobre Bissau).
1 -Ponte-cais.
2 - Pidjiguiti. (Aproveito para esclarecer que são dois locais com designações diferentes e que, por vezes, são erradamente referidos. O porto principal de Bissau (1) nada tem a ver com o Pidjiguiti que se situa ao fundo da Avenida da República que tem início da Praça do Império.)
3 - Forte da Amura.
4 -Esplanada-cervejaria conhecida por Zé da Amura onde tantas vezes me deliciei com os excelentes camarões da Guiné e percebes de Cabo-Verde.
5 -Palácio do governador. No jardim tinham lugar em datas festivas e ocasiões especiais recepções, muito bem servidas, como era timbre daquela terra, e que, por se realizarem normalmente ao fim do dia depois de passado o calor, se apelidavam de pôr-do-sol.
6 -Hotel Portugal, mais conhecido por Espada, nome do proprietário.
7 -Residência do bispo.
8 -Casa pertencente à minha madrasta e onde residi durante algum tempo.
9 -Bairro de pequenas residências para funcionários públicos.
10 -Uma das primeiras zonas de expansão da cidade situada nas proximidades do local conhecido como Achada de Burro. Na rua de cima residiu o Fernando Fortes, um dos fundadores do PAIGC.
Guiné > Bissau > 1970 > Vista aérea da cidade, com o ilhéu do Rei, ao fundo, frente ao porto. Ao centro, a Praça do Império e o palácio do Governador.
Foto: © Paulo Raposo (2006) (4). (Julgo que esta foto, tirando a cor, é a mesma que se reproduz acima, a cores, disponibilizada pelo ex-Fur Mil Adrião Mateus, da CART 1525. Muito possivelmente tratava-se de um outro postal ilustrado, vendido nas lojas de Bissau aos nossos militares. L.G.)
Comentários de Mário Dias (a complementar com a consulta da nossa página sobre Bissau).
1- Praça do Império com o monumento Ao esforço da raça.
2 - Palácio do governo.
3 -Moradia onde residia o governador antes de concluído o palácio à qual me referi no episódio da serenata (3).
4 - Associação Comercial.
5 - Museu e biblioteca, edifício onde inicialmente funcionou o colégio-liceu de Bissau.
6 - Pastelaria Império que era também a principal padaria de Bissau.
7 - Cinema da UDIB. Encostado ao edifício pode ver-se uma casa mais baixa que era a secretaria, sala de jogos, bar e outras instalações do clube. Tinha anexo um recinto cimentado onde se fizeram grandes bailaricos. (Belos tempos)
8 - Hospital.
9 - Edifício comercial de Nunes & Irmão.
10 - Catedral.
11 -Edifício dos Serviços de Administração Civil. Nas traseiras situava-se uma escola primária.
12 - Estação dos Correios.
13 - Banco Nacional Ultramarino.
14 - Casa Gouveia. Situado à direita da seta, no limite da foto, era o barracão onde se realizava o cinema antes do novo da UDIB ter sido construído. A ele me referi numa das minhas memórias de Bissau (3).
15 - Aqui, no jardim à entrada do porto, havia, e suponho que ainda lá estejam, dois enormes poilões que tinham uma especial serventia -além da sombra como é evidente.
Era por eles que os pilotos, entrados a bordo dos navios em Caió, se orientavam para a entrada no canal navegável.
16 -Ilhéu do Rei com as instalações da Casa Gouveia: armazéns e fábrica de óleo de amendoim.
17 - Referência indispensável: aqui se situava, embora não visível, a célebre 5ª Repartição ou seja, o Café do Bento.
18 - Alfândega, armazéns e outras instalações portuária.
19 -Escola, tipo artes e ofícios ou industrial, pertencente às Missões Católicas.
20 - Edifício sede do Sport Bissau e Benfica.
21 - Grande Hotel, inicialmente propriedade do senhor Marques e mais tarde do Pireza, anterior dono do hotel existente em Varela, destruído no início da guerra e que, por tal facto, veio para Bissau.
22 - Era sensivelmente neste local que se situava o Foto Serra.
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 9 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1263: Os Falcões de Bissorã, festejando os 39 anos de regresso a casa (Rogério Freire, CART 1525)
(2) Vd. post de 3 de de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1242: Postais Ilustrados (9): Dança do compó, Bissau (Beja Santos)
(3) Vd. posts do Mário Dias sobre a Bissau do seu tempo:
9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXII: Memórias do antigamente (Mário Dias) (1): Um cabaço de leite
19 de Fevereirod e 2006 > Guiné 63/74 - LDXVI: Memórias do antigamente (Mário Dias) (2): Uma serenata ao Governador
15 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXX: Memórias do antigamente (Mário Dias) (3): O progresso chega a Bissau
Vd. também o post de 1 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCI: Domingos Ramos, meu camarada e amigo (Mário Dias)
(4) Vd. post de 3 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1022: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (16): De novo em Bissau, a caminho de... Dulombi
(5) Vd. post de 8 de Dezembro de 2005 > de Guiné 63/74 - CCCXLVIII: Cartas que nunca foram postas no correio (1): Em Bissau, longe do Vietname (Luís Graça)
"Diário de um Tuga > Bissau, far from the Vietnam. 10 de Fevereiro de 1970:
"Meu caro L.
"Gostaria de falar-te de Bissau, cidade lumpen, e da sua morna dolce vita, em termos não propriamente de desencanto mas de desmistificação, a ti que ficaste no Vietname… E com palavras que fossem como ácido sulfúrico na pele!... Receio, porém, que a minha crueldade não chegue a tanto (que a realidade, essa, é requintadamente sádica, grotesca, como as telas de Brueghel ou do Goya!) e que não passe, afinal, de azeda esta carta que daqui te envio, aproveitando o macaréu da minha neurastenia e uns fugazes dias de liberdade vigiada. Daqui, da esplanada do Pelicano, frente ao estuário do Geba, rio tragicamente belo, insubmisso como os povos que habitam as suas margens! (...)
Vd. também outros posts que evocam Bissau como, por exemplo:
20 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXVII: Estórias cabralianas (9): Má chegada, pior partida (Jorge Cabral)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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