Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 17 de fevereiro de 2007
Guiné 63/74 - P1533: De regresso a Bissorã: Uma viagem fantástica (Carlos Fortunato)
Guiné-Bissau > Bissau > 18 de Novembro de 2006 > Restaurante Bate Papo > Pepito, fundador e director executivo da AD, à esquerda, e Carlos Fortunato, à direita de óculos escuros. O restaurante Bate Papo, da Maria José, fica no centro de Bissau, junto aos Serviços Metereológicos.
Guiné- Bissau > Bissau > 18 de Novembro de 2006 > Na Escola de Artes e Ofícios de Quelélé, da AD > Jorge Handem (Jorgito), Director da Escola, Carlos Fortunato e Carlos Schwarz (Pepito).
Guiné-Bissau > Bissau > Escola de Artes e Ofícios > 24 de Novembro de 2006 > Agradecimento e oferta de um lenço da AD ao Carlos Fortunato que aqui realizou uma acção de formação sobre desenho de sítios na Net.
Fotos: © Carlos Fortunato (2007). Direitos reservados.
1. O Carlos Fortunato, membro a nossa tertúlia desde Julho de 2005, e que trabalhou até há pouco numa multinacional de consultadoria na áera dos sistemas de informação, tem agora mais disponibilidade de tempo para se dedicar à Guiné, aos seus amigos guineenses e à sua página na Net, que foi recentemente reestruturada. O sítio, criado em Fevereiro de 2003, passa agora a chamar-se Guiné - Os Leões Negros. É apresentado nestes termos:
"Site sobre a Guiné - Bissau, relatando a guerra 1963 a 1974, nomeadamente alguns dos episódios da experiência vivida pela a Companhia de Caçadores 13, mais conhecida como CCAÇ 13, mas também designada por Leões Negros, ou ainda pela Companhia dos Balantas de Bissorã, que combateu aqui durante o período de 1969 a 1974.
"A companhia era constituída na totalidade por soldados operacionais guineenses, que eram todos da etnia balanta, e por alguns oficiais, sargentos, cabos e especialistas, vindos da metrópole.
"São igualmente incluídos ou referenciados, outros temas, através de textos, fotografias e filmes, para melhor compreensão do conflito, e deste país".
Ainda não tive tempo para saudar, aqui, o Carlos e fazer uma pequena nota de reportagem à sua viagem à Guiné-Bissau, em Novembro passado. Estive com ele uns dias antes de partir: estava entusiasmado com a perspectiva de voltar a Bissorã e ajudar os seus antigos soldados, balantas, da CCAÇ 13, os seus leões negros. Também tinha combinado, com o Pepito, fazer uma acção de formação sobre desenho de páginas na Net. O tempo passou e eu fiquei sem saber como tinham corrido as coisas por lá. Mandei-lhe então um mail, pedindo-lhe para nos fazer um pequeno relato das suas impressões.
Publico hoje, com atraso, a sua resposta.
2. Mensagem do Carlos Fortunato, de 22 de Janeiro último:
Amigo Luís: Está tudo bem comigo, apenas um pouco mais ocupado, espero que contigo tudo esteja bem também.
Já tinha pensado em enviar-te uma mensagem, falando da minha viagem à Guiné. Foi uma viagem fantástica. jáescrevi um texto sobre a mesma, está no site da CCAÇ
13 > Guiné - Os Leões Negros.
Na página Encontros, abri o tema Viagens, onde inseri um texto com fotos sobre a viagem e um pequeno vídeo.
O blogue [, Luís Graça & Camaradas da Guiné,] esteve sempre presente, nos meus contactos, fazendo sempre referência a ele, quer na entrevistaúque dei para a rádio, quer na que dei para a TV.
Fiquei com muitas duvidas em como abordar o tema no blogue, e fiquei a pensar no assunto:
- Reproduzir a página na totalidade no blogue ?
- Extrair apenas algumas partes, que sejam mais do interesse geral?
- Fazer um resumo para o blogue ?
- Produzir um texto novo?
Dá uma vista de olhos no site, e dá-me a tua opinião. Um grande abraço
Carlos Fortunato
3. Acabei por aceitar a sugestão do Carlos e fazer um resumo alargado da sua crónica. Aproveito para saudar o Pepito que está por cá, em Lisboa, nestes dias, até à próxima sexta-feira. O Carlos conheceu-o em Bissau e tive oportunidade de constatar, directamente, o excelente trabalho que a sua ONG , a AD - Acção para o Desenvolvimento, está a fazer no terreno, em prol da Guiné e do seu povo.
A minha viagem fantástica, de regresso à Guiné-Bissau (de 17 a 24 de Novembro de 2006).
por Carlos Fortunato (Subtítulos da responsalidade do editor do blogue)
(...) A chegada a Bissau no dia 17/11/2006 (6ª feira) não podia ter começado de melhor maneira, Carmona Rodrigues presidente da CML e um bispo de uma religião que não consegui identificar, iam no meu avião, pelo que dois grupos de dança, e música estavam à sua espera no aeroporto.
A minha espera no aeroporto tinha o meu contacto em Bissau, Carlos Lico, que me ajudou com as bagagens, me entregou o jipe que tinha alugado (...).
Hotel: mais de 100 euros; 1 refeição: mais de 20 euros
Fiquei instalado no excelente Palace Hotel, o preço dos quartos standard é de 70.000 CFA, e de um quarto para executivo 90.000 CFA, são semelhantes, mas o quarto de executivo tem mais espaço. Uma refeição aqui ronda os 15.000 CFA, e a cozinha é igualmente excelente (...). (2)
Guiné-Bissau > Bissau > O Hotel Palace.
Foto: © Carlos Fortunato (2007). Direitos reservados.
Visita à AD - Acção para o Desenvolvimento, fundada e dirigida pelo Pepito
No dia seguinte (sábado, dia 18), conforme planeado fui de manhã ter com o Pepito [, director executiva da AD, ] visitámos as instalações da AD no Quelélé, nomeadamente a Escola de Artes e Oficios, e a rádio Quelélé. As ONG [, Organizações Não-Governamentais,] como a AD têm hoje um papel importante no desenvolvimento do país.
Actualmente a Escola de Artes e Ofícios possui cursos na área de informática, electrónica e auxiliares de infância, mas a sua biblioteca e o seu centro de multimédia, são também espaços importantes para a população do Quelélé (...).
Alguma insegurança em Bissau, mas o mesmo calor humano e simpatia do povo guineense
Em Bissau nota-se muito mais gente, muito mais trânsito e mais comércio, destacam-se algumas melhorias como por exemplo a existência de vários bancos, o novo edifício da Assembleia Nacional Popular, o novo Palace Hotel, as casas com telhados de zinco, e até algumas vivendas de fina construção. Outras coisas pioraram como o estado das estradas em Bissau, em que nalgumas ruas os buracos são tantos, que não se consegue fugir deles. Existe igualmente mais insegurança devido aos assaltos. Outras ainda estão na mesma, como aquele calor humano e simpatia do guineense que nos cativa de imediato (...).
A caminho de Bissorã, passando por Bula e Binar
À tarde [, sábado, dia 18, ] segui para Bissorã, confiando no meu sentido de orientação (pois não existem placas indicativas), e de vez em quando parava e confirmava junto das alguém, que estava mesmo a ir pela estrada certa.
Á saída de Bissau, existe um inexplicável controlo. A estrada alcatroada de Bissau para Bissorã, estava óptima, e com a nova ponte sobre o rio Mansoa em Jolandim, foi sempre a andar.
A passagem por Bula foi um pouco confusa, pois a estrada estava ocupada pelo comércio, o que obrigou a fazer um pequeno desvio. Não parei em Bula, mas deu para perceber que algumas instalações do antigo quartel ainda estão de pé, mas agora ocupadas como residências.
Parei em Binar, fiz uma breve visita ao antigo quartel, e dei uma bola aos miúdos que por ali andavam, sem saber o que fazer, foi a alegria geral, e minutos depois já decorria um jogo de futebol.
A alegria da chegada a Bissorã
(...) Levei cerca de duas horas a chegar a Bissorã, ali tinha alguns antigos soldados da CCAÇ 13 à minha espera, o Domingos Manfande (soldado do 4º pelotão, e meu aluno), Manuel Cuna (soldado do 1º pelotão, e meu aluno), e o Braima Camará (2º pelotão), pois previamente tinha escrito uma carta ao Domingos Manfande a avisar da minha chegada, e a pedir-lhe para me arranjar alojamento em Bissorã.
Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > O Domingos Infante, antigo soldado da CCAÇ 13.
Foto: © Carlos Fortunato (2007). Direitos reservados.
O Manuel Cuna, sempre brincalhão, perguntou-se 'Quem sou eu?', mas reconheci-o logo, e dei-lhe um abraço sentido a ele, e aos outros.
Importa aqui dizer que todos nós tínhamos um especial carinho pelo Manuel Cuna, porque quando em Bolama estávamos a registar os recrutas que com que íamos formar a CCAÇ, 13, não quisemos registar o Manuel, pois calculávamos que este devia ter apenas 14 anos, mas perante a sua insistência de que tinha 20 anos (o que nos fez rir), e cativados pelo sua maneira de ser e bom humor, acabámos por aceitá-lo.
A notícia da minha chegada deve ter corrido Bissorã, pois foram muitos os que me foram visitar, para 'dar mantenha' (cumprimentar)(...).
Uma troca de impressões deu para perceber que os tempos da minha guerra já estavam esquecidos, e que não existia qualquer animosidade entre os combatentes guineenses que estiveram de lados opostos no período de 63 a 74, normalmente denominada pelos guineenses, como a guerra da independência.
Ecos de outra guerra, a de 1998, contra os senegaleses
Muitas vezes a conversa começava na guerra de independência [, a de 1963/74,], mas acaba na guerra de 98 contra as forças senegalesas.Penso que essa guerra teve o condão de unir todos os antigos combatentes, pois colocou-os a lutar lado a lado.
O meu amigo Domingos Manfande teve um papel destacado nos combates contra os senegaleses, tendo a seu cargo a defesa do flanco esquerdo, zona onde os senegaleses eram mais fortes. Segundo a suas palavras estes não sabiam combater, 'não marcavam distância, não sabiam se pôr-se em posição de disparar, matámos também 2 franceses que estavam lá a combater'.
O facto de Domingos durante o tempo em que esteve na CCAÇ 13, acompanhar os especialistas de armas pesadas, como eu, o Petronilho, etc., tornou-o especialista de armas pesadas nessa guerra, dando instrução sobre as mesmas e combatendo ao mesmo tempo.
As pequenas ofertas que fazem a diferença, como o giz para escrever no quadro preto
Distribui algumas das coisas que levava, roupas, ferramentas de poda, etc., mas o que mais suscitou interesse foi uma lanterna que funcionava sem pilhas, pois bastava agitá-la para a recarregar. Às vezes uma pequena oferta pode ter uma importância muito grande, como o caso do giz que levei para distribuir pelas escolas, pois como calculava existiam quadros para escrever, mas faltava o material.
A hospitalidade balanta e os problemas de segurança
As instalações onde fiquei em Bissorã (casa do Administrador da Região) eram muito precárias, um colchão de espuma no chão a servir de cama, e uma casa de banho comum, onde uma lata num balde com água, servia para tomar banho. Tinha contudo algumas grandes vantagens, podia guardar o jipe dentro do pátio interior, e um guarda fazia segurança todas as noites.
Os ladrões armados são um problema na Guiné, a emigração ilegal tem agravado o problema, e com tantas guerras, o acesso às armas não é difícil. Bastou uma noite o guarda não aparecer, o Administrador ter saído, e eu e o Domingos Manfande também termos saído, para os ladrões saltarem o muro, e tentarem roubar os pneus do jipe. Valeu-nos a chegada do filho do Administrador: apesar de ser um miúdo, a sua presença colocou em fuga os ladrões. As faltas do guarda acabaram por me obrigar a mim e ao Domingos, a alguns turnos de 'sentinela' durante a noite.
A Bissorã de hoje e de ontem
No dia seguinte (domingo, dia 19) de manhã dei um passeio por Bissorã. São poucas as mudanças. Improvisadas bancas de comerciantes proliferam agora no lugar do mercado e no largo principal, a igreja católica é nova (a antiga ruiu) (...)
Muitas das instalações dos antigos aquartelamentos ainda estão de pé, e os símbolos das companhias que ali estiveram, ainda lá estão, embora um pouco danificados pelo tempo e pelo PAIGC.
Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > 19 de Novembro de 2206 > "Ponte sobre o Rio Armada, agora em betão armado. Continua a pescar-se no rio, e neste local é frequente verem-se agora hipopótamos" (CF).
Fotos: © Carlos Fortunato (2007). Direitos reservados.
O aquartelamento da CCAÇ 13 estava agora a ser usado como escola e armazém. Os monumentos da CCAÇ 13 foram destruídos pelo PAIGC, após a independência, deles apenas resta parte de um monumentos em honra aos que tombaram (...).
Os monumentos das restantes unidades que passaram por Bissorã, não foram danificados pelo PAIGC, mas o tempo acabou por fazer desaparecer as suas inscrições, as suas casernas são agora armazéns.
A ponte para a outra banda que atravessa o rio Armada, foi melhorada, agora está construída em betão e tem uma protecção lateral em ferro. Continua a ser um local muito bonito, era o local onde todos tirávamos uma fotografia. Continua-se a pescar ali. Dizem-me que agora é frequente aparecerem hipopótamos naquele local.
A ponte do Rio Blassar
À tarde segui pela estrada de Barro, para um terreno que o Domingos Manfande possuí, para lá do rio Blassar, e que fica a 12 kms de Bissorã. O velho Domingos fazia a pé este caminho para poder ir trabalhar. Acabei por lhe oferecer uma bicicleta no dia da minha partida. A estrada, apesar de ser de terra batida, estava em bom estado.
A chegada à ponte do rio Blassar, destruída pelo PAIGC durante a guerra, e que ainda não foi reconstruída, lembrou-me outros tempos, os sustos que apanhei com as minas que ali coloquei, as loucuras do padre a agitar um pau no ar, colocando a patrulha em risco, mas são outras histórias que já contei nas crónicas da CCAÇ 13.
Guiné-Bissau > Região do Oio > Bissorã > Paulo Nugame (ex-soldado do exército regular do PAIGC, as FARP - Forças Armadas Revolucionárias Populares).
Foto: © Carlos Fortunato (2007). Direitos reservados.
A caminho do Morés, acompanhado de ex-combatentes dos dois lados
Segunda feira [, dia 20,]seguimos até ao Morés. Eu, Dominfos Manfande, Agostinho Manfande (seu sobrinho, e filho de Armando Manfande, um ex-soldado do meu pelotão, e também meu aluno, mas infelizmente já falecido), Clodé Duque (ex- soldado das FAL - Forças Armadas Locais, normalmente designadas por milícias do PAIGC)e Paulo Nugame (ex-soldado do exército regular do PAIGC, as FARP - Forças Armadas Revolucionárias Populares).
Clodé ingressou nas FAL em 20/12/1967, pertencia à tabanca de Iracunda, e estava integrado num Bigrupo de 60 homens, comandados por Bicafrat Nabrama.
Iracunda ficava perto de Morés. Clodé realizou nesta zona muitos combates contra as nossas tropas, e lembra-se claramente do combate que houve em 1971, nos cajueiros do Morés (Operação Safira solitária), embora não tivesse participado nesse combate. Clodé seria o nosso 'guia' principal.
Paulo Nugame pertenceu FARP, mas actuava na zona norte, pertencia à tabanca Ingoré, integrado no grupo de Quecu Tumané, que acompanhava os cubanos que usavam os foguetões de 122mm.
Tendo-me Clodé e Paulo assegurado que a estrada para o Morés era boa, apesar de ser de terra batida, e que os compradores de castanha de cajú a usavam com camionetas, fiquei descansado.
No Caminho de Bissorã para Mansoa, passamos por Nova Vizela, onde acabamos por encontrar uma criança que precisava de ir ao médico em Mansoa, pelo que lá esticámos o espaço no jipe para levar a criança e o pai até Mansoa.
Morés, sem quaisquer vestígios da guerra
A estrada Bissorã, Mansoa, Mansabá, estava alcatroada mas em mau estado, contudo a suposta boa estrada de terra batida para o Morés estava em péssimo estado.
No Morés já não existiam vestígios nenhuns, do que tinha sido o Quartel General do PAIGC na zona norte, abrigos, ou construções, fomos até aos cajueiros, onde em 1971 houve um violento combate entre o PAIGC e os Comandos Africanos, e registamos a descrição de um antigo comandante do PAIGC sobre o que se passou na altura (...).
No Morés indicaram-nos que podíamos seguir por outra estrada para regressar, era uma estrada de terra batida que ia dar directamente a Bissorã, e era boa garantiram-nos, assim fizemos (...).
A estrada que nos indicaram no Morés era péssima como a anterior, mas a partir de determinado momento começou a estreitar e desapareceu .... Com o jipe entalado entre capim, espinhos e árvores, tive que regressar em marcha atrás, até um desvio que dava para uma aldeia.
'Estrada já acabou'
Na aldeia quando perguntávamos pelas estradas que deviam existir ali, a resposta foi 'Estrada já acabou'. Na verdade, o mato e as culturas da população tinham ocupado esse espaço, e já não existiam essas estradas... Os meus 'guias' estavam tão perdidos como eu, e nem um antigo mapa que eu tinha, descrevendo detalhadamente as estradas e caminhos, servia para nada.
Guiné-Bissau > Região do Oio > Morés > 20 de Novembro de 2006 > Estrada para o Morés, a partir da estrada Mansoa-Mansabá.
Foto: © Carlos Fortunato (2007). Direitos reservados.
Foi-nos indicado uma nova estrada que seguia para o Olossato, estava boa, garantiam. Era um grande desvio mas foi por ela que fomos, realmente não estava muito má, até depararmos com pontes improvisadas, com troncos cobertos de lama, construídas pela população para poderem atravessar os canais que ligavam as várias bolanhas. Eram boas pontes para passarem pessoas e animais, mas será que conseguiam aguentar com o peso do jipe ? ... Lá as fui avaliando e passando com o máximo cuidado, concluindo que, para ali, só de burro, bicicleta ou motorizada.
Acção de formação: A poda das árvores de fruto
O Olossato ainda mantinha algumas instalações dos antigos quartéis, mas não parámos e seguimos para Maqué, onde tirámos uma foto junto ao seu belíssimo poilão.
Guiné-Bissau > Região do Óio > Maqué > 20 de Novembro de 2006 > O secular poilão, local de paragem obrigatória para tirar uma foto.
Fotos: © Carlos Fortunato (2007). Direitos reservados.
A estrada do Olossato para Bissorã, apesar de ser de terra batida, está em bom estava, pelo que pensamos que todos os problemas tinham acabado, mas foi depois do Maqué, que ficamos atolados na lama, e só com muita insistência, e com onze pessoas a empurrar lá conseguimos tirar o jipe.
Na terça feira [, dia 21,], foi o dia da palestra e aula prática na ADPP, sobre 'A poda das árvores de fruto'. Sala cheia com 20 participantes, que às 9h00 já estavam todos à minha espera, apesar do início estar marcado para as 9h30, o que demonstra bem o seu empenho, e a sua vontade de aprender.
A ADPP desenvolve a sua acção na área da agricultara, possui uma escola perto de Bissorã, onde forma os novos agricultores, e alia a teoria à prática, explorando algumas áreas agrícolas, é visível a sua dedicação e empenho, mas são muitas as suas dificuldades e carências (...).
Neste evento conheci uma jovem voluntária da Estónia, Maie Petri, de Parnu, que estava destacada no projecto da ADPP.
Maie tinha dificuldade em comunicar com os agricultores, pois apesar do seu esforço de auto-formação para aprender o português, ainda só comunicava em inglês. Como eu ia visitar algumas explorações agrícolas, para tentar melhorá-las, convidei-a a vir comigo, pois poderia ajudar-me, e eu traduziria as suas recomendações na língua local (...).
Em Bissorã encontravam-se igualmente dois médicos cubanos, que também tinham chegado há pouco tempo, mas também não consegui ter tempo de falar com eles. O preço de cada consulta era 300 CFA, cerca de 0,5 € (...).
O meu amigo e ex-soldado do 3º pelotão da CCAÇ 13, Branquinho, veio fazer-me uma visita, pois tinha vindo trazer à policia de Bissorã dois ladrões de gado que tinha capturado. Aproveitei a oportunidade para ir conhecer a sua tabanca no Encherte, visitar o antigo aquartelamento ai construído pela CCAÇ 13, e ao mesmo tempo dar-lhe uma boleia, pois sem outro meio de transporte ia regressar a pé (...).
Em Encherte oferecemos uma bola para as crianças brincarem, e improvisamos uma pequena festa, onde um grupo de dançarinos nos presenteou com uma espectacular exibição (Clicar aqui para ver o vídeo).
Branquinho é agora o chefe de 17 tabancas, continua a ter aquele carácter, e aquela energia e determinação que eu conheci ha 36 anos atrás, não é por acaso que começou por ser chefe de uma tabanca, e depois muitas outras lhe vieram pedir que fosse também o chefe delas (...).
Braia, um lugar mágico
Na quarta feira, [dia 22,], fomos buscar o pai de Alance, mulher de Domingos, que estava doente, e de caminho aproveitámos para ir ver o modo como tratavam as explorações agrícolas, e a deslumbrante paisagem de Bráia, junto à ponte junto ao rio Mansoa (lugar situado na estrada entre Bissorã e Mansoa, sensivelmente a meio caminho).
Bráia é um lugar mágico, em que o branco dos nenúfares cobre as calmas águas do rio, e numerosas garças esvoaçam sobre as águas, mas também é um lugar perigoso para quem estiver dentro de água, pois os crocodilos que ali vivem são muitos e grandes, bem como os hipopótamos, os lagartos, etc.
Despedida e regresso a Lisboa, com mais uma acção de formação
5ª feira, [dia 23,] foi o dia da visita à tabanca do Manuel Cuna, junto à velha estrada de Bissorã para Biambi (agora desactivada, face à nova estrada alcatroada), a cerca de 5 Kms de distância de Bissorã, foi também o dia das despedidas e do regresso a Bissau.
Finalmente chegou o dia da partida para Lisboa, 6ª feira, 24 de Novembro. A manhã foi dedicada à palestra 'A criação de Web Sites', na Escola de Artes e Ofícios da AD. Foi uma secção muito concorrida (28 pessoas), onde se procurou lançar as bases um novo curso sobre a criação de sites na web.
Ofereci algum software e documentação à EAO, para lhe permitir lançar um curso sobre a criação de web sites, mas ficou em falta o software da Microsoft, o Front Page 2003, dado estarmos na expectativa de que esta fizesse uma doação à escola, mas tal não se concretizou, estando em curso outras alternativas.
Entrevista à televisão da Guiné-Bissau
A televisão da Guiné Bissau esteve presente para me fazer uma breve entrevista, a qual foi transmitida no dia 25 de Novembro, às 21 horas, no Telejornal. Na entrevista tentei realçar a importância da formação de técnicos guineenses, e lembrar a amizade que une os muitos portugueses aquela terra, e aquela gente.
No final da minha palestra o meu amigo Pepito, disse algumas palavras de agradecimento, foi-me oferecido um lenço da AD e houve uma breve confraternização. Foram momentos que me emocionaram, principalmente pelas palavras de Pepito, pessoa pela qual tenho grande estima e consideração, sendo este meu sentimento partilhado por todas as pessoas a quem falei dele, das quais me limito a referir o anterior 1º ministro, e actual presidente do PAIGC, Carlos Gomes Júnior.
Balanço final: Expectativas ultrapassadas
Em balanço final, posso dizer que foi uma viagem que ultrapassou todas as minhas expectativas, e que na qual não consegui retribuir devidamente todo o calor humano, e amizade com que me receberam em todo o lado.
Esta viagem confirmou as informações que já tinha sobre a importância das ONG, embora como referi apenas visitei a AD, e a ADPP, e confesso que fiquei impressionado com a dedicação dos seus dirigentes, e o empenho dos seus alunos.
Sem dúvida entidades a apoiar e a acarinhar, por quem queira ajudar a Guiné a conseguir dar mais alguns passos no caminho do seu desenvolvimento, para toda a equipa destas organizações os meus parabéns.
Carlos Fortunato
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 5 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1250: Os amigos são mesmo para as ocasiões, Leopoldo Amado!
(2) A cotação oficial do CFA > 1 euro = 655,957. Donde:
(i) 70 mil CFA é equivalente a 106,7 €
(ii) 15 mil CFA são 22,87 €.
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