Cova da Piedade / Almada > Constantino Neves > Braço tatuado: "Guiné 15-11-69"
Foto: © Tino Neves (2007). Direitos reservados.
Texto do Tino Neves , ex-1º Cabo Escriturário, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego (Gabu), 1969/71:
1. Mensagem do Tino Neves:
Olá camaradas, Luís e Vinhais:
Não venho desta vez contar propriamente uma estória, mas sim lançar mais um assunto. As tatuagens (1).
Para além de actualmente estar muito na moda fazer, ter e mostrar o seu corpo tatuado, nos anos 60 e 70, também, e principalmente os ex-Combatentes, se tinha por hábito/costume, fazer tatuagens. Julgo eu que a razão principal não era só por moda. A tatuagem, para os nossos camaradas que fizeram a guerra do Ultramar, era assim como uma espécie de selo, uma marca do seu estado de espírito na altura (... mas também um sinal da sua passagem por África e pela guerra, para que mais tarde todos vissem, na Metrópole, por onde eles passaram e o que passaram).
Achei, portanto, que seria um tema interessante para o nosso blogue, não só para que comentem as minhas afirmações anteriores, se estarão correctas ou não, ou se haverá outras razões [para explicar o fenómeno], que julgo que sim.
Desde 1970 até aos nossos dias, tenho visto tatuagens lindas e bem feitas, outras não tanto (estou a referir-me somente a tatuagens feitas durante 1963 /74, relacionadas ao que normalmente se fazia na altura em comissão de serviço no Ultramar).
Daí eu fazer o desafio/pedido para que enviem as imagens das vossas tatuagens, e comentá-las se possível, pois tenho a certeza que vamos ter uma grande colecção delas e com comentários interessantes.
E, para iniciar, envio a minha, que é muito simples, e que vou comentá-la:
O meu Batalhão desembarcou em Bissau no dia 15/11/69, e só no dia 22/11/69 se iniciou a sua deslocação para Nova Lamego (Gabú). Nesses dias que fiquei em Bissau, fui visitar um amigo pára-quedista, e logo nesse dia, ao apresentar-me um seu camarada, que na altura estava a fazer uma tatuagem, eu comentei que gostaria também de fazer uma e ele de pronto ofereceu para ma fazer.
Eu só quis que apenas escrevesse GUINÉ e por baixo a data da chegada à Guiné (15-11-69), até porque na altura não tinha tempo para fazer uma mais elaborada.
Durante a Comissão não fiz mais nenhuma, em parte porque esta ficou um pouco mal feita, não só o grafismo mal desenhado e com poucas picadas de tinta da china, como duas das picadas terem infectado (Como devem lembrar, elas eram feitas com uma simples agulha de coser, molhadas num tubo de tinta da china e espetadas na pele). Não havendo muita perícia nesse manusear de agulha, por vezes entrava pela carne dentro e fazia sangrar.
Sem mais
Um abraço
Tino Neves
Almada
2. Comentário de L.G.:
Fico entusiasmado como o repto ou desafio lançado pelo Tino Neves. As tatuagens feitas no tempo da guerra colonial não têm - segundo julgo saber - a sofisticação, a técnica, a perícia, a estética, a arte das actuais tatuagens que se podem ver nos corpos dos nossos jovens. Algumas são verdadeiras obras-primas. Ontem como hoje, o seu significado sócio-antropológico é (pode ser) muito rico. Daí o reforçar o pedido do Tino Neves: descrevam as vossas tatuagens, mandem-nos fotos, digam-nos como e quem as fazia, quanto pagavam, quais as vossas motivações... Lembro-me sobretudo dos dizeres de algumas: "Guiné... Sangue, suor e lágrimas" (uma das mais populares), "Amor de mãe", "Amor de pais", "Tu & eu"... Figuras (poucas): corações com setas para simbolizar a paixão e a fidelidade...
_____________
Nota de L.G.:
(1) Páginas sobre este tópico:
Wikipédia > Tatuagem
Tattoo Br > Tatuagem no Brasil
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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2 comentários:
Luís Graça e Camaradas, boa tarde,
chamo-me Susana Azevedo e estou de momento em fase de Tese de Doutoramento em Design, pela Faculdade de Arquitectura de Lisboa. Como estou a fazer investigação sobre tatuagens tipográficas (escritas) e no preciso momento a escrever um artigo sobre as tatuagens tipográficas na Guerra do Ultramar. Ao navegar na internet, deparei-me com o seu blog, que me despertou interesse imediato. Seria possível, arranjarem-me fotografias e testemunhos de alguns "camaradas"? Esta informação será para fins meramente académicos. Fico a aguardar uma resposta sua.
Cumprimentos,
susanazevedo|designer
Sr neves já vi várias tatuagens parecidas com a sua. Acho interessante esta página no mundo das tatuagens. Normalmente os militares são bastante reservados! Também há militares dos anos 80 e 90 com tatuagens parecidas. Também informo que sou auxiliar de tatuador em Santa Maria da Feira. Por favor respeitem o sigilio deste tema. Abraço.
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