Foto: Nuno Rubim (2008).
1. Texto do Nuno Rubim, Cor Art Ref, especialista em história militar, nosso prezado amigo e camarada:
Caro Luís
Aqui há tempos foi publicado no blogue um pequeno texto meu sobre a questão de Guileje ter sido considerado, de facto, uma espécie de "colónia penal" (1). Hoje trago à liça mais uns elementos que consubstanciam essa tese.
Porque vem de longe ... Pélissier, no 2º volume da sua obra sobre as guerras na Guiné, escreve, na página 191 (2):
"Em 1916, um dos tenentes de Abdul Injai, Alfa Modi Saidou, foi convidado a instalar-se em Guileje com 300 a 400 indígenas franceses provenientes dos bandos de Abdul Injai. As mulheres seriam exclusivamente prisioneiras feitas durante a campanha de 1915." (os sublinhados são meus).
Ora isto sucede numa altura em que já tinham terminado as negociações entre Portugal e França que tinham [definido] as fronteiras na região (1906). (Vd. Mapa, acima).
Cabe aqui abrir um parêntese. Toda a região a Leste de uma diagonal traçada no eixo do rio Cacine, para NE até perto do Rio Balana, pertencia à Guinée, colónia francesa [, hoje Guiné-Conacri]. Por isso aparecem no mapa supra as designações de Poste Français [, posto francês,] em Caconda e Cacine. Aquando da delimitação de fronteiras, essa região passou para o domínio português, por troca com a zona do Casamansa no Senegal.
Pormenor do mapa (ou carta) de Guileje (escala 1:50000): no quadro das Convenções, pode ler-se que há um símbolo que representa as aldeias abandonadas, como é o caso de Sare Morsô... Só um estudioso como o Nuno Rubim é capaz de ter olho clínico para estes detalhes que escapam à vista desarmada do leigo... (LG).
Mas a anterior linha fronteiriça era praticamente inexistente, não se sabendo realmente as áreas que pertenciam a cada país. Ora constatei, com surpresa, que, segundo Pélissier / vol. II, pp 60- 69, os portugueses instalaram em Sare Morsô, em 1897, um posto militar, a que deram o nome de Posto de D. Maria Pia (como era uso na altura, em quase todas as colónias portuguesas, nomes de rainhas ou princesas ) e que só foi desguarnecido cerca de 1901.
Surge essa designação, como tabanca abandonada, na carta 1:50000 da Guiné. Quando agora passei pelo chamado cruzamento do corredor [da morte ou de Guileje] ainda tive esperanças de lá poder dar uma saltada (cerca de 2,5 km do cruzamento ), mas infelizmente não tive tempo.
Segundo algumas informações o PAIGC teria ali instalado uma base durante a guerra.
(A continuar )
Um abraço
Nuno Rubim
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Notas de L.G.:
(1) Vd. poste de 10 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1830: Guileje, uma espécie de colónia penal militar até finais de 1969... (Nuno Rubim)
(...) "Durante anos, após a minha permanência lá, ouvi referências sobre o facto de serem enviados para Guileje militares punidos ou indesejados de outras unidades do CTIG [Comando Territorial Independente da Guiné].
Apesar de ter tido uma experiência pessoal que parece ter confirmado este facto, só agora descobri, no AHM [Arquivo Histórico Militar], um documento oficial que esclarece totalmente a questão !
Mensagem Com-Chefe, Guiné, Dezembro 1969.
Retransmitido pelo Batalhão de Artilharia 2865, reponsável pelo Sector S3 (nessa altura em Catió), que englobava o sub-sector de Guileje. (AHM )
Por determinação superior “…
Considerada a situação de Guileje, cancelamento de mais transferências por motivos disciplinares para aquela guarnição” !!! (...)
(2) Vd. poste de 7 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P944: Historiografia das guerras de África: colaboradores, precisam-se (Nuno Rubim)Sobre o historiador René Pélissier, ver ainda os seguintes postes:
27 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2586: A História de Portugal em África vista pelo Prof. René Pélissier (I). (Virgínio Briote)
14 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2266: Quem conhece o Inácio Maria Góis, autor de O meu diário, CCAÇ 674 (Fajonquito, 1964/66) ? (René Pélissier)
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