1. Andam os editores a tratar de um assunto delicado, um texto enviado por um camarada que nos suscita algumas dúvidas quanto à forma e ao conteúdo.
Pedimos opiniões a alguns camaradas, entre os quais incluímos o nosso tertuliano José Brás.
Depois de alguns considerandos, explanando a sua opinião, brindou-nos com este texto, para cuja publicação pedi a devida autorização.
Eis o exemplo de palavras, que ordenadas, nos transmitem uma sensação de melodia, harmonia e beleza.
2. Mulher é ...mulher!
No meu fraco modo de ver, acho que a mulher é a mais acabada síntese da beleza que só o universo encerra.
Mulher/mãe, mulher/irmã, mulher/amante, mulher companheira desta coisa complicada e lindíssima que é o viver, não merece peças daquelas e infelizmente é o que tem tido mais em vastos lugares do mundo, por vezes ao lado da nossa porta.
Séculos correram na crença do tal sexo fraco, da ideia de uma cópia mal feita de homem, incapaz de se encarregar de muitas e, sobretudo, de grandes tarefas.
Orgulhoso de seu erecto falo, o homem levou séculos para perceber a superioridade sexual da mulher, face à fal(ácia) da sua tão precária potência.
Encurralado pelo preconceito de macho, o homem nem percebeu que estava a deitar fora o melhor da festa, na recusa do que havia trazido da barriga da mãe mas que achava mais próprio de fêmea, a ternura, a sensibilidade, a vontade de partilhar, com isso, encurtando o acto meio comprado e consumido à pressa.
Podem bater-me, se assim o entenderem, porque não me coíbo de dizer que em minha opinião, a mulher é um ser mais perfeito e mais capaz do que o homem.
Não o digo apenas porque na minha longa experiência de piloto e de instrutor de voo, as mulheres foram os melhores alunos que tive. Entendendo mais rapidamente a matéria teórica, mais corajosas na aventura do voo, com maior sensibilidade para entender ao espaço, o movimento no espaço e os gestos necessários para manobrar.
Digo-o também por ter ouvido a Sobrinho Simões quando fala disso.
Digo-o também por ter ouvido a José Júlio, um dos maiores espadas da "toureria" portuguesa, de grande nome nas praças espanholas, anos a fio no topo do "escalafon" em duelo com os grandes nomes do seu tempo, hoje dirigindo uma escola de toureio em Vila Franca . Diz ele que a mulher tem maior noção do tempo e do espaço da lide, maior plasticidade nos passes e coragem que nunca é inferior à dos homens, sendo pena que os namorados lhe acabem por impor fim a uma carreira,
Poderia dar muitos outros exemplos mas não o farei porque me parecem suficientes estes que aqui trago.
Mulher, branca, negra, amarela... é ser para partilhar vida em igualdade de direitos e deveres de cidadania, de companheirismo e de amor.
E isso nada tem a ver com falsos conceitos de recusa da "mais velha profissão do mundo".
A mulher vende o corpo por muitos e secretos motivos individuais e também por consequências sociais que a empurram para tal prática.
No fundo, porque hoje me está a apetecer gramar com muitas críticas de milhentos camarigos que não me acompanham neste pensar, eu adianto ainda que é o corpo que qualquer operário vende quando, pelo trabalho e pelo salário, cria riqueza tangível ou intangível.
E digo mais ainda. É muito mais que o corpo que o poeta vende, quando coloca no mercado o produto das suas ânsias individuais, a sua alma e a sua subjectiva interpretação da vida e do mundo.
E nunca ouvi que lhe chamassem prostituta!
E a fechar...
3. Queria
Queria falar-te amor
deste veludo interior
que me afaga
nos sentidos
destes dedos/raizes
escalavrados aéreos/elos
do corpo fugitivos
na ânsia que sentem
pelo abismo
queria falar-te eu
mas no tom
de quem espalha a confiança
como um deus antigo
ou então
com a voz rouca
de incerteza
o gesto demorado
do pudor
os olhos vadiando-te
o corpo/mar
a ti mulher
depósito grandioso
e secreto
da ternura
queria eu falar
do meu amor
mas como
se nos separa já
a distância
à estrela da manhã?
José Brás
Toronto, 1987
4. José, permite-me que transcreva no teu poste uns versos que guardei há muitos anos, de José Gomes Ferreira**
CABARET
(À infalível prostituta, a um canto)
Se eu quisesse, tornava-te humana
Fazia-te chorar
as lágrimas que trago em mim
E beijava-te na boca
a menina que ainda existe
no fundo dos teus olhos
Mas não quero
Prefiro ver no teu corpo
o desenho da minha indiferença.
E sentir-te na pele
tudo o que há de vil na minh'alma
...e já não cabe em mim
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 7 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7396: (Ex)citações (117): Transição da Soberania da Guiné, Idiotas e Ressabiados (José Brás)
Vd. último poste da série de 1 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6667: As nossas mulheres (17): Um pouco de mim (Ana Duarte)
(**) Em tempo: Informação prestada pelo nosso camarada Alberto Branquinho, porque eu desconhecia o autor dos versos que guardei durante dezenas de anos.
- Imagem retirada da Internete. As devidas vénias ao seu autor
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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20 comentários:
Conheci a minha com 8 anos Namorei, Casei e ainda hoje estou com Ela é o coisa mais do Mundo, só que muitos de nós humanos a tratam muito mal.
Rodinhas de Bajocunda.
A.V.
Conheci a minha com 8 anos, Namorei,
Casei e ainda hoje estou com ELA é a coisa mais Maravilhosa do Mundo. Só que muitos de nós humanos a tratam tão mal.
Rodinhas de Bajocunda
A.V.
SUBLIME. José Brás, lindo texto,lindo.
#No meu fraco modo de ver, acho que a mulher é a mais acabada síntese da beleza que só o universo encerra.#
Eu, no meu fraco ver, se me o permites acrescento:- respeito, que todas as mulheres me merecem, enquanto Mulher.
Podia acrescentar e de outras situações falar. Não!
Um dia e noutra situação...
Lindo, obrigado como homem que sou, de mulher vindo, de mulher amada, amante, de mulher cúmplice, de mulher(es)tudo...
Um forte abraço T
Caro José Brás
É uma verdade, que nem todos podemos ter o discernimento e a eloquência, de que tu és dotado… parabéns pelo magnífico trabalho, onde nos dás a conhecer o teu ponto de vista…
Um abraço
José Manuel Corceiro
Meu caro Zé Brás
Claro, a mulher, a outra face da nossa imperfeição.
Só não concordo com isso dos prostitutos/prostitutas.
No meu último livro, A Cor das Cerejeiras (saiu terça feira passada da tipografia!) escrevo assim:
Nua, quente,
um vestido de nuvens coloridas.
Parece saída do sol.
Os meus olhos são chuva
humedecendo os teus seios,
ao de leve.
Beber a tua ternura.
Festa serena
antes do desvairo e da loucura.
A menina nua
na coberta de brocado.
Ai, flores do verde pino!...
Entrei no teu corpo.
Tudo tão breve
e todo o tempo.
Não sei se havia estrelas
a cintilar no castanho dos teus olhos.
Não sei se havia perfumes de gladíolos rosa
a passear nas dobras do teu corpo.
Não sei se havia jade e madrepérola
a debruar a essência dos dias.
Não sei se havia água e vento
num entardecer triste
dos anos de Outono e maresia.
Mas olhei os teus olhos,
respirei o teu corpo,
toquei a tua seda,
senti o teu sangue.
Depois, adormeci contigo,
pássaro de todos os dias,
pousada no pulsar do coração.
Porque não te mereço,
deixa-me apenas deitar a teu lado
e beber a tua sombra.
Entrar no teu regaço,
morrer e renascer
no teu abraço.
Abraçado aos teus ramos,
a volúpia da festa.
Pelo orgasmo é que vamos.
Desaguo em ti
como um rio.
Tu, o mar.
Peguei na tua mão, caminhámos solitários
pelas veredas verdes do bosque.
As bocas, os prazeres,
o latejar dos corpos.
Depois, descansaste na erva,
na berma fresca do regato
e eu escrevi um poema
no teu leque de seda.
Amar o teu corpo
na mágoa da passagem dos anos.
E a tua alma, peregrina.
Mulher.
Há quantos anos
lágrimas em teu rosto?...
Coágulos do tempo.
Sejas tu quem fores,
venhas de onde venhas,
em ti jamais, senhora,
uma mulher pecadora.
Abraço,
António Graça de Abreu
Caro José Brás
Só um complemento, sabes que a mulher tem mais massa genética do que tem o homem.
No emparelhamento dos cromossomas, quando se dá a fecundação, o homem é portador de cromossomas xy, em que o cromossoma y é “pequenino” em relação ao x, e a mulher é portadora de cromossomas xx, em que os cromossomas x são iguais em dimensão. É por isso que há doenças que só afectam o homem, exemplo hemofilia. Isto é uma pequena explicação.
Um abraço
José Manuel Corceiro
MULHER! Mäe de todas as Mäes.Misteriosa garantia de continuidade humana.Infindável esperanca no futuro! Um abraco,José Brás,pelo que escreves-te,e...como escreves-te.
O Blogue no seu melhor:
Lindo o texto do Zé Brás,lindo o seu poema, lindo o poema que o Luís junta e lindo também a merecer honra de maior destaque o poema do António Graça de Abreu.
A todos Vós, ilustres camarigos, a sinceridade de um abraço apertado.
Vosso camarigo e admirador,
Vasco A. R. da Gama
Antº Graça de Abreu
Duas só:
- Deixa o M B S andar por lá...é o meu segundo pedido.
- Não sei o que é um prostituto /prostituta...o que se vende? que vende o corpo? o...a...não sei...
O que sei,isso sim, é que a TUA POESIA, ESTE TEU POEMA É UMA MARAVILHA. Porque não dizes a Editora e demais elementos sobre o livro. Assim eu, e muitos mais, líamos.
Dizes? Obrigado. Eu sabia.
Um abração do T.
Não sou especial apreciador de poesia, mas, neste caso, aos poetas em presença, agtradeço o prazer que me transmitiram.
Um grande abraço
JD
Só pelo poema que o António Graça Abreu nos deixou aqui, valeu a pena ter eu confessado o que penso sobre a mulher.
Também o que dizem os camaradas todos que aqui deixaram palavras, de facto deixaram poemas porque são um sinal claro que o mundo ainda não está perdido.
É evidente que também não concordo com o prostituta/prostituto.
Tenho uma história com uma namorada que perdi por causa desta questão. Um dia destes conto
Obrigado e abraços
José Brás
Boa-noite Sr. José Brás!
A mulher, não é um tema comum neste Blogue de Homens, onde com certa audácia participo e permaneço, certa de que estou entre amigos.
Modesta a minha participação, sou com tudo, sensível aos vossos postes, que me informam sobre um tempo, que vivênciei convosco, um tempo que não se esquece.
Porém, este tema Mulher é... mulher, despertou-me a atenção e li.
Obrigada!
Obrigada, pelo pensamento, pela análise de vários amigos, pela vossa sensibilidade.
Quanto à poesia... que bonita!
Obrigada José Brás!
Seja-me permitido referir o poema adulto, de António Graça de Abreu.
Despido de preconceitos, natural, define as sensações do amor verdadeiro, sentido e vivido, apreciado e elevado ao seu valor humano, donde provém a continuação da vida.
Obrigada e parabéns pelo trabalho de ambos.
Felismina Costa
Amigo José Brás,
Obrigada, não por mim que sou mulher, mas por todas as mulheres.
Lindo texto, bela poesia. Senti-me se não em todos, em muitos dos temas "mulher".
Com amizade
Filomena
Aos Nossos Poetas que hoje nos honraram com tão sublimes exemplos, sobre o Tema MULHER, os meus parabéns e agradecimentos por estes momentos de extase.
Seria mais próprio do dia dedicado às Mulheres, mas também estamos perto duma Quadra em que se inserem bem.
Abraços
Jorge Picado
Zé Braz
Já tanta gente disse tanto, que nada mais tenho a dizer.
Carlos Vinhal
O poema "Cabaret", que transcreveste no final do Post do José Braz, é do grande poeta nascido no Porto e falecido em Lisboa (com placa evocativa na fachada do prédio onde faleceu)- o José Gomes Ferreira. O poema está na colectânea "POESIA I, II, III, IV".
E se me dás(?) licença transcrevo aqui duas passagens das "Heróicas" (POESIA I), em XXII:
"Morri na guerra.
E numa noite de tempestade deitaram-me à terra,
ouvi cantochão
pingaram latim.
...................
acorde do abismo
o Amortalahado
antes do Clarim
do Sonho Final.
E os seus olhos vejam
rasgar-se do chão
o Ressuscitado
de espingarda às costas
a cantar em latim
a Internacional...
....................."
Alberto Branquinho
Caro Zé Brás
1. Andam os editores a tratar de um assunto delicado, ...
dizia no inicio do post!
Deste a melhor resposta.
Podem bater-me!!!!!!!
... e batem, palmas, pelo texto, pelo poema, pela mensagem
Um abraço
Belo escrito...Zé Brás...
e lembro...Mulher/Mãe,a minha, que
ainda me acarinha...Salvé Mãe
e também...Mulher/Mulher,a minha,
que pariu nossos filhos...Salvé
Teresa
e ainda...Mulher/Filha,a minha,que
me chama pai...salvé Maria
e mais...todas as Mulheres,brancas,
pretas,mulatas, as que conheci,e as
que não conheci...Salvé Mulheres
e vai...poema de Manuel Bandeira
IRENE NO CÉU
Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor
Imagino Irene entrando no céu:
-Licença,meu branco!
E São Pedro Bonacheirão:
-Entra,Irene.Você não precisa pedir
licença.
CARO ZÉ BRÁS,
SUBLIME ESTE TEU ESCRITO QUE PROPORCIONOU O APARECIMENTO DE OUTRAS PÉROLAS.
OBRIGADO TAMBÉM POR ISSO.
ABRAÇO
MANUELMAIA
AH eu adorei este escrito, esta poesia logo em dois poemas a que outros se juntaram...
Gosto dos comentários que são poesia diferente...mas entram em nós.
Gosto muito da fotografia da mulher, da lágrima e lembrei-me de Gedeão...e que imagem tão bela...foi o Vinhal que a conseguiu descobrir e ela fala por tantas mulheres...imagem a encher-nos de palavras, de vivências...
Porra e vêm figuras menores, seres que só o são porque existem, manifestar-se destilando ódio e fel putrefacto sobre ex combatentes??? Ex combatentes que em dignidade foram empurrados, mortafoseados, humilhados, amarrotados e um dia, um dia foram despejados e largados como trampa dispensável...de que vos queixais? E nós sem nada dizer...cumpristes o vosso dever...a Pátria vos contempla e a Senhora, se de volta estais, vos protegeu...a mim? eu? mas eu nada digo, eu vou adaptando-me...e a poesia, a fotografia tanto ajudaram e a mulher...sim a ou as mulheres e só elas sabem como e porquê...ou alguns de nós ou vós escrevem e mostram o belo, a vida pois esqueceram a morte e o sofrimento visto e vivido...sofrido...
Mundo cão este onde eu teclo e, ali ao lado, numa caixa tv falante, crânios destilando massa cinzenta ajudam o país a sair de uma crise...e o comando longe e o braço curto e os tipos incomodam...e eu paro com a ladainha...porque eles vivem das crises e da lama e verborreia que...
AB T
Caros camarigos
Dizer que se gosta do que o Zé Brás escreve pode parecer recorrente mas creio que ninguém, de boa fé, sem reservas mentais (ou outras, ou outras...) poderá contestar ou atribuir efeitos de 'seguidismo' se disser e escrever que este texto é oportuníssimo, correcto, justo, belo e até necessário.
E necessário porquê?
Porque coloca assim, 'preto no branco', um conjunto de verdades sobre a Mulher e como seria (será) muito mais vantajoso para o relacionamento homem-mulher que se entenda bem como as partes se devem respeitar, em lugar de se praticar e agir segundo preconceitos ultrapassados e perfeitamente desajustados da relidade.
Acho que este texto também marcará uma nova faceta deste Blogue.
Um abraço
Hélder S.
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