Binta
, 1964/66), enviou-nos hoje a seguinte mensagem:
Camaradas,
No rescaldo de mais um Natal mando-vos mais uma história da "minha guerra", num dia que nos marcou a todos: o primeiro morto em combate na C.Caç. 675.
Faz hoje, dia 28 de Dezembro, 46 anos. Era o meu melhor amigo e fui então incumbido de reunir todos os seus bens pessoais (livros, cartas, rádio, gravador e roupas) para os mandar para os seus pais. Assim fiz e troquei cartas bastantes emotivas com o seu Pai, Rebelo Mesquita, que era ao tempo Director do Jornal de Famalicão. Nos dias de hoje colaboro com esse jornal. Os acasos da vida.
Camaradas,
No rescaldo de mais um Natal mando-vos mais uma história da "minha guerra", num dia que nos marcou a todos: o primeiro morto em combate na C.Caç. 675.
Faz hoje, dia 28 de Dezembro, 46 anos. Era o meu melhor amigo e fui então incumbido de reunir todos os seus bens pessoais (livros, cartas, rádio, gravador e roupas) para os mandar para os seus pais. Assim fiz e troquei cartas bastantes emotivas com o seu Pai, Rebelo Mesquita, que era ao tempo Director do Jornal de Famalicão. Nos dias de hoje colaboro com esse jornal. Os acasos da vida.
MORTE A VINTE E OITO…
Correndo o risco do “lugar comum” poder-se-á dizer que todos nós temos na vida datas marcantes.
A data em que escrevemos este apontamento – 28 de Dezembro de 2010 – é para nós particularmente marcante por neste mesmo dia – passados que estão 46 anos – ter morrido um grande amigo: o Furriel Miliciano Álvaro Vilhena Mesquita.
Aconteceu no Norte da Guiné em 28 de Dezembro de 1964. Entre Udasse e Binta.
No “Diário da C.Caç. 675” esse trágico dia era assim descrito:
«…Meio-dia e trinta.
Um estoiro medonho, um rebentamento de violência extraordinária, faz parar a coluna. A segunda viatura, um Unimog, estava envolta numa fumarada espessa e começava a arder.
Simultaneamente de um dos lados da estrada, emboscado no mato, o inimigo começava a disparar.
Embora paralisados momentaneamente pela surpresa os nossos homens têm uma reacção fortíssima que faz calar em poucos momentos o inimigo. Há uma pausa. Os oficiais disciplinaram o fogo e todos procuram saber o que se passa lá à frente. A viatura sinistrada incendiara-se e há feridos que gemem e que correm perigo junto das chamas que podem provocar uma explosão no depósito do “Unimog” e incendiar o capim das bermas do caminho. A mata fechada, a fumarada da viatura incendiada, a estrada multo estreita, mais complicam a situação e há dificuldades nos primeiros momentos em avaliar a extensão e gravidade da ocorrência. Sob o pneu direito da retaguarda da viatura que seguia em segundo lugar, tinha rebentado um engenho explosivo de grande potência. Uma mina anti-carro. Todos os homens que seguiam na viatura tinham sido projectados pelos ares.Com violência. O médico e os enfermeiros acorrem à frente. «Há um morto!». A notícia corre ao longo da coluna e faz estremecer aqueles que a ouvem, abalando-os mais que o violento estampido de há momentos atrás. «O furriel Mesquita está morto.» O médico e os dois enfermeiros, auxiliados por alguns soldados, multiplicam-se em esforços para socorrer os feridos. Há 8 feridos e o estado de alguns inspira sérios cuidados. O “Unimog” atingido pela mina arde completamente, transformado num autêntico braseiro donde sai um fumo espesso que atinge dezenas de metros de altura. Alguns metros à sua volta há um calor horrível, mas é mesmo ali que têm de ser tratados os feridos. É pedido um helicóptero. Aqueles momentos infernais parecem prolongar-se indefinidamente. A viatura destruída, que com o rebentamento, ficou atravessada no meio da estrada, é encostada à berma direita, seguindo a coluna para a frente, para uma região mais despida de vegetação, onde se aguarda o helicóptero pedido. As palavras não poderão dar uma ideia pálida dos momentos que se viveram no dia 28 de Dezembro. Ele ficará assinalado na existência de todos os homens da «675» como um dia trágico que não se esquecerá jamais. As nossas tropas tiveram as seguintes baixas: Furriel Mil. Álvaro Manuel Vilhena Mesquita, com lesões internas graves que lhe provocaram morte instantânea. Feridos em combate: Alferes Mil. Costa, 1.º cabo atirador n.° 2069/63, Marques, 1.º Cabo atirador n.° 2231/63, Craveiro, Soldado atirador n.° 1909, Santos, Soldado atirador n.° 2085/63, Filipe, Soldado Transmissões n.° 2978/63, Nunes e Soldado atirador n.° 6/63/U da 1.ª C. C. Nhastima Dum.» Quarenta e seis depois por um acaso da vida, que consideramos “singular”, estamos de novo ao lado Álvaro Mesquita numa das páginas do “Jornal de Famalicão”. O jornal da sua terra natal fundado pelo seu Pai.
Um estoiro medonho, um rebentamento de violência extraordinária, faz parar a coluna. A segunda viatura, um Unimog, estava envolta numa fumarada espessa e começava a arder.
Simultaneamente de um dos lados da estrada, emboscado no mato, o inimigo começava a disparar.
Embora paralisados momentaneamente pela surpresa os nossos homens têm uma reacção fortíssima que faz calar em poucos momentos o inimigo. Há uma pausa. Os oficiais disciplinaram o fogo e todos procuram saber o que se passa lá à frente. A viatura sinistrada incendiara-se e há feridos que gemem e que correm perigo junto das chamas que podem provocar uma explosão no depósito do “Unimog” e incendiar o capim das bermas do caminho. A mata fechada, a fumarada da viatura incendiada, a estrada multo estreita, mais complicam a situação e há dificuldades nos primeiros momentos em avaliar a extensão e gravidade da ocorrência. Sob o pneu direito da retaguarda da viatura que seguia em segundo lugar, tinha rebentado um engenho explosivo de grande potência. Uma mina anti-carro. Todos os homens que seguiam na viatura tinham sido projectados pelos ares.Com violência. O médico e os enfermeiros acorrem à frente. «Há um morto!». A notícia corre ao longo da coluna e faz estremecer aqueles que a ouvem, abalando-os mais que o violento estampido de há momentos atrás. «O furriel Mesquita está morto.» O médico e os dois enfermeiros, auxiliados por alguns soldados, multiplicam-se em esforços para socorrer os feridos. Há 8 feridos e o estado de alguns inspira sérios cuidados. O “Unimog” atingido pela mina arde completamente, transformado num autêntico braseiro donde sai um fumo espesso que atinge dezenas de metros de altura. Alguns metros à sua volta há um calor horrível, mas é mesmo ali que têm de ser tratados os feridos. É pedido um helicóptero. Aqueles momentos infernais parecem prolongar-se indefinidamente. A viatura destruída, que com o rebentamento, ficou atravessada no meio da estrada, é encostada à berma direita, seguindo a coluna para a frente, para uma região mais despida de vegetação, onde se aguarda o helicóptero pedido. As palavras não poderão dar uma ideia pálida dos momentos que se viveram no dia 28 de Dezembro. Ele ficará assinalado na existência de todos os homens da «675» como um dia trágico que não se esquecerá jamais. As nossas tropas tiveram as seguintes baixas: Furriel Mil. Álvaro Manuel Vilhena Mesquita, com lesões internas graves que lhe provocaram morte instantânea. Feridos em combate: Alferes Mil. Costa, 1.º cabo atirador n.° 2069/63, Marques, 1.º Cabo atirador n.° 2231/63, Craveiro, Soldado atirador n.° 1909, Santos, Soldado atirador n.° 2085/63, Filipe, Soldado Transmissões n.° 2978/63, Nunes e Soldado atirador n.° 6/63/U da 1.ª C. C. Nhastima Dum.» Quarenta e seis depois por um acaso da vida, que consideramos “singular”, estamos de novo ao lado Álvaro Mesquita numa das páginas do “Jornal de Famalicão”. O jornal da sua terra natal fundado pelo seu Pai.
Desde há alguns meses que dois antigos camaradas do Álvaro – o Belmiro Tavares, ex-Alferes Miliciano e o Oliveira, ex-Furriel Miliciano – colaboram no “Jornal de Famalicão, que é agora dirigida por sua Irmã Teresa Mesquita.
Na vida e na morte… amigos até ao fim .E fiéis ao lema do emblema da sua Companhia da Guiné.
NUNCA CEDERÁ.
Um grande abraço de Alcobaça.
JERO
Fur Mil Enf da CCAÇ 675
JERO
Fur Mil Enf da CCAÇ 675
PS: Nesta data escrevi à irmã e ao sobrinho do Álvaro Manuel Vilhena Mesquita.
“Boa noite Teresa,Recebi hoje o "nosso" jornal e confesso-lhe toda a minha emoção ao ver o meu texto lado a lado com a evocação dos 46 anos do falecimento do Álvaro.
As voltas que o mundo dá!?
Quem é que me havia de dizer que algum dia na vida eu voltaria a estar tão perto do meu querido companheiro de Binta?
Mas aconteceu e é muito bonito. Digo até que é uma das páginas mais bonitas da minha vida. Para si e para o Chico toda a minha consideração e estima.
José Eduardo Reis de Oliveira”
__________
Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
24 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 – P7028: Histórias do Jero (José Eduardo Oliveira) (34): Memórias de Angola – Uma (longa) noite a conduzir… A morte
13 comentários:
Caro Jero:
Estamos a menos de um quarto de hora do final do dia, abro o blog e dou de caras com o teu post. Conseguiste arrancar-me umas lágrimas ao ler o teu escrito. Daqui a dois dias fará 46 anos que a notícia nos chegou pela boca do seu irmão Manuel, há pouco falecido. O Varinho tinha morrido em combate. Ainda hoje ouço o seu pai envolto na sua dor:” saiu-me a lotaria negra …”.
António Brandão Ccaç 2336
CARO JERO,
HÁ DORES QUE NUNCA MAIS CICATRIZAM.
SEI BEM,POR EXPERIÊNCIA PRÓPRIA, O QUE É PERDER DOIS CAMARADAS FURRIEIS A DOIS DIAS DO REGRESSO.
NUNCA MAIS SE ESQUECE.
AS LÁGRIMAS TEIMAM EM ROLAR-NOS DA FACE SEMPRE QUE NOS LEMBRAMOS...
ABRAÇO
manuelmaia
CARO JERO,
HÁ DORES QUE NUNCA MAIS CICATRIZAM.
SEI BEM,POR EXPERIÊNCIA PRÓPRIA, O QUE É PERDER DOIS CAMARADAS FURRIEIS A DOIS DIAS DO REGRESSO.
NUNCA MAIS SE ESQUECE.
AS LÁGRIMAS TEIMAM EM ROLAR-NOS DA FACE SEMPRE QUE NOS LEMBRAMOS...
ABRAÇO
manuelmaia
Caro amigo Jero
Apenas, e só, um grande abraço!
Hélder S.
Caro Jero,
Sei bem o que significa manter correspondência com a família de um camarda morto no chão da Guiné.
Essa vivência ainda hoje me acompanha. Por isso mesmo compreendo a ta dor!
Um abraço amigo,
José Câmara
Caro Jero
As datas trazem-nos novamente a morte trágica dos nossos camaradas.
Vamos ciclicamente relembrar os rostos, os ultimos momentos, que ficaram marcados a ferro e fogo na nossa memória.
Como o Maia diz, nunca essas feridas vão cicratizar.
Honremos as suas memórias trabalhando para a Paz.
Um abraço
Juvenal Amado
Grande Jero de Alcobaça,
Os sempre tão apreciados e humanos relatos que nos vais deixando, mostram também um poudo de ti, da tua forma de ser e gostar.
Para os Camarigos que não saibam, o Jero tem obra publicada e aconselho o pessoal à leitura do seu livro: GOLPES DE MÃO's
Memórias de Guerra.
Um abraço camarigo do
Vasco A. R. da Gama
Amigo Jero
O teu testemunho, tem o condão de "tocar" a muitos de nós...
Recordando , vem-me à memória o amigo Maldonado ...
Um abraço do,
Jorge Rosales
Caro Jero
Sei, que palavras, são palavras...mas é com elas, que manifestamos os nossos sentimentos:
A notícia, apesar de transcrita, e à distância de 46 anos, tem o peso de uma notícia actual.
Deve parecer-vos estranho, o meu sentir um tempo das vossas vidas "em que não me vi envolvida directamente", mas a verdade, é que foi um tempo que me marcou profundamente e continua a marcar.
Descrições familiares, sobre outras guerras, talvez tenham tido influência na minha forma de viver o problema, e, quem pode ficar indiferente a uma guerra e à perda de valores que ela regista?
Sei que esta lembrança será sempre uma presença na sua memória.
Cordialmente
Felismina Costa
Caro Jero
Um abraço forte, apertado, amigo, camarigo.
Caro Jero
Também já senti essa maldita sensação de perder um Grande Amigo nessas circunstâncias:
Dia 26/11/71 na emboscada às NT na região de OCO MAUNDE (Perto de N.Lamego), morreu o meu amigo Fur.Mil.Cav. Armindo de Matos André (CCav.2749/BCav.2922). Tinha estado em Bambadinca a dar instrução a um GE de Milícias, e vinha em coluna para Pitche juntamente com o Pel. Mil.GE sob o seu comando. Acresce dizer que vinham todos DESARMADOS, à excepção do André.
Como é possivel não terem distribuído o armamento em Bambadinca ? Além do André ainda morreram 2 Milicias e um desapareceu em combate.
Este meu Amigo foi convidado pelo Alferes Comandante do Pel. do Esq.Rec. 3431 a vir dentro da Chaimite e a resposta dele foi que o seu lugar era junto com os seus Milicias. Soube logo da sua morte via rádio.
À tarde na distribuição do Correio, recebi um aerograma do André no qual dizia que estava ansioso de me dar um abraço.
As lágrimas caíram- me pela face em torrente.
Ainda hoje não consigo lidar com isto. Estou a escrever este comentário e as lágrimas estão a rolar face abaixo.
Abraço Camarigo
Luís Borrega
Caro Jero
O nobre contributo que dás a este blog, apouca uma ou outra nota menos positiva que, por vezes, por cá passa.És seguramente um dos nossos melhores.
Caro Jero,
Há duas altura no ano , PASCOA E NATA, em que nos lembramos com mais forte semtimanto a perda de Ante-queridos, companheiros e amigos.
Não nos conhecemos,não temos qualquer intimidade um com o outro, mas junto-me a ti e aos mais camaradas,nesta quadra de NATAL, para partilharmos em conjunto do mesmo sentimento.
Se fores ao P7444 do meu aniversário, no final dos comentários encontras o meu agradecimento aos camaradas que me anviasram os parabens. Onde escrevi:
"...podiamos ter UMA ARVORE DE NATAL mais enriquecia, mas infelizmente tivemos luzes que se apagaram entes de tempo."
Tive sorte, é certo, minha comissão foi no HM241, mas não foi fácil viver ali dentro, como ás vezes leio... os que estiveram em Bissau tinham ar condicionado, infelizmente nem a morgue tinha ventoinha.
Vin de uma Unidade que tinha mais tristezas que alegrias, infelizmente vi muitos que tão injustamente, aos 20 e poucos anos, caminharam para a altima estrada da vida, com missão cumprida.
Sou o mesmo de 68/70,não marco minha presença para que me agradeçam, faço por sentimento, é a minha maneira de ser.
Quem estiver perto das minhas possibilidades e disponibilidade pode contar comigo.
Dei minhas mãos no passado, felizmente ainda as tenho no presente.
A mim, não me poiem para o lado.
para isso tenho uma frase muito simples:
SE NÃO ME QUEREM VER...NÃO PASSEM NO MEU CAMINHO.
Um abraço~
António Paiva
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