Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, E. Magalhães.
Atendendo ao facto de terem passado 50 anos desde o início da Guerra Colonial, recordei-me hoje, duma consequência nefasta, que esse trágico acontecimento que foi a guerra, teve no acelerar a morte duma tradição na minha terra, que com tanta intensidade era vivida pelo povo da minha aldeia, Vale de Espinho - Sabugal.
Deixo ao vosso critério a publicação.
Um abraço
José Corceiro
A GUERRA COLONIAL E A EXTINÇÃO DE TRADIÇÕES PORTUGUESAS
O assalto à Prisão de Luanda ocorreu no dia 4 de Fevereiro de 1961, data que marcou o início da Guerra Colonial, ou do Ultramar, como se queira apelidar, sendo que para mim é a Guerra onde eu andei.
A Guerra Colonial tirou a vida a milhares e milhares de pessoas, deixando outras tantas estropiadas até ao fim dos seus dias. O fenómeno da Guerra foi também um factor influente que contribuiu para desvanecer algumas tradições e costumes, que estavam enraizados na cultura do povo português.
Tanto quanto me lembro desde a minha meninice, que na minha aldeia, Vale de Espinho – Sabugal, o dia da inspecção militar ou sortes era um dia festivo para toda a povoação, mas com proeminente destaque para os mancebos naturais da aldeia, que completassem nesse ano o 20.º aniversário, pois a festa era deles. Nos anos 1950 e princípios de 1960, na minha aldeia, o grupo de rapazes que iam anualmente a dar o nome para a tropa ultrapassavam sempre as duas dezenas, ou bem mais, e era raríssimo que quando chegasse o dia das sortes algum deles faltasse. O dia da inspecção revestia-se dum certo ritual, tradicional típico, que continha valor e particularidades para um estudo etnográfico.
Os preparativos para o esperado dia iniciavam-se com algum tempo de antecedência, pois era determinante que no dia da festa tudo corresse de feição. Sempre foram perceptíveis ao longo dos anos, explícitos laivos de ciúme, meio encapotado é certo, mas que levava alguns dos ex-inspeccionados a vangloriar-se ao dizer que a festa deles tinha sido a melhor. Ora, este espírito de geração competitiva, impulsionava a rapaziada a um apego de brio viril, que os empenhava em melhorar a sua festa em comparação com as dos anos anteriores.
Para muitos dos jovens, o dia da inspecção seria também a primeira vez que iriam estrear um fato novo, composto por calças, casaco e colete (terno), pois até ao presente não tinham tido a possibilidades de comprar o tecido e mandá-lo confeccionar no alfaiate da terra, visto ser escasso o suporte económico da família. Era também provável que a partir dessa data, o jovem pudesse começar a amealhar um pezinho de meia, fruto de algum trabalho que executasse com direito a remuneração, jornal ou a passar contrabando, pois até esta altura tudo o que tinha ganho reverteu a favor do agregado familiar.
Quando o esperado dia chegava, nada podia falhar.
O fato estava à espera de ser vestido…
Os foguetes já tinham sido comprados e entregues ao mestre-de-cerimónias, que os utilizava conforme a mensagem que queria anunciar, lançando-os para estoirar no ar. A primeira mensagem é logo cedinho, às 05h00, a lembrar que é preciso deixar a cama e levantar, para aqueles que nela se deitaram, nessa noite, porque alguns fizeram directa. Pois têm que se apressar, ainda há um percurso longo de 16 quilómetros que é preciso trilhar, sempre a cavalgar, até chegar ao Sabugal, concelho da freguesia, onde tem lugar a inspecção.
Foto 1 - Briosos mancebos inspeccionados em 1968, com saudosismo do passado. Foto tirada no dia da inspecção, no Sabugal, junto ao antigo edifício camarário onde teve lugar a inspecção. É também visível o edifício da antiga prisão.
O cavalo, adereçado com os seus melhores arreios estava pronto e à espera. Ricamente aparelhado. A sela, a cinta, o cabresto, as rédeas e o freio foram diligentemente limpos e engraxados, as fivelas e os estribos foram polidos até ficarem a brilhar, sem esquecer as patas do equídeo que foram aparadas, limadas e convenientemente ferradas, pois há mais de 30 quilómetros para calcorrear, ida e regresso, com o mancebo sempre montado e a espicaçar, e quiçá poderá surgir algum amigo mais íntimo que o queira apadrinhar e arrisque a boleia no lugar da garupa, e o ritmo tem que ser constantemente a trotear.
O acordeonista foi atempadamente contratado, personagem aglutinadora e imprescindível, que nunca pode faltar esperando-se sempre dele alguma novidade musical, para excitar o bailarico e a festa abrilhantar.
Os vitelos ou cabritos, cuja quantidade depende do número de mancebos e seus convidados, foram antecipadamente encomendados ao açougueiro, e já estão prontos e preparados com algum tempero à espera para se dar início ao apetecido assado, realizado sempre em local aprazível, junto à margem do rio Côa e por tradição no sítio do Freixial.
Foto 2 - Largo das Eiras, no centro da aldeia de Vale de Espinho. Nas redondezas não havia outra povoação que tivesse um largo tão grande, embora já tenha sido roubado pelas construções da estrada, escola, lar de idosos, junta de freguesia etc.
Por volta do meio-dia o povo aguardava impacientemente, no Largo das Eiras, a chegada do mensageiro, que se antecipava ao regresso dos mancebos. O arauto açoitando o seu cavalo incutia-lhe celeridade, para se adiantar e mais rápido chegar para a notícia poder dar, metia-se por atalhos e veredas para o caminho encurtar, e lá chegava ele ofegante à freguesia onde revelava, com voz de pregão, os nomes dos mancebos que ficaram livres e os que foram apurados para o serviço militar. Quando se ouvia o nome dum mancebo que ficou apurado era sempre um momento de regozijo, algazarra geral, com aplausos, acompanhados de vivas e parabenização à família, contrastando com o comportamento da multidão, que ao ouvir o nome do mancebo que ficou livre, reagia com tristeza e constrangimento, sobretudo os seus parentes.
Mais uma largada de foguetes, anunciavam que a comitiva dos heróis estava prestes a chegar. A multidão eufórica, que não tinha arredado pé do Largo das Eiras, estava curiosa e queria ver ao vivo a chegada dos briosos mancebos. Uns ostentavam com orgulho e altivez na lapela do casaco a insígnia, fita verde, que os declarava aptos para o serviço militar. Esta distinção podia ser um trampolim para uma vida melhor, com mais possibilidades para um emprego, quiçá Polícia, Guarda-Fiscal ou Republicana, ou Exército, ou alguma Repartição Estatal. A fita vermelha era colocada nos inaptos, e notava-se neles um ar de acanhamento, quase vergonha, por suportar na lapela o estigma que os remetia para a exclusão de prestar serviço militar, era como que o apontarem-lhes que eram débeis, ou tinham uma deficiência física, e isso não era tranquilizante para o seu ego.
Depois de dadas as boas-vindas, procedia-se a mais uma largada de foguetes, a convidar toda a povoação para que houvesse união e acompanhassem festivamente os mancebos, que iriam desfilar montados nos seus cavalos, ao som da concertina, pelas ruas da procissão. Findo esse percurso, duma maneira geral, toda a juventude se dirigia para o local onde os esperava o assado, já devidamente confeccionado.
Foto 3 - Tirada em 1968, no Freixial, junto ao rio Côa, durante o assado, onde estão a meia dezena de mancebos que foram nesse dia à inspecção, juntamente com juventude convidada e onde não podia faltar o meu professor da 4.ª cCasse, Zé André, que está de pé no canto direito da foto, com camisa preta.
Manjar ansiosamente esperado, a desejada carne grelhada era um pitéu divinal. A carne é seleccionada, excelentemente grelhada com apuro na brasa, bastante condimentada com um molho assaz apimentado, comida acompanhada de batata bem apaladada acabada de tirar da terra e assada na borralheira, tudo regado convenientemente com molho, iguaria que provoca no mais prudente dos mortais anseios que o incitam a deixar-se seduzir, e a exagerar no beber a boa pinga, que inebria qualquer convidado fazendo-o esquecer as amarguras do dia-a-dia, até surgir um comensal mais inspirado, que se encoraja e ousa desafiar a qualquer um para uma salutar desgarrada… e a partir daqui tudo incita a que a folia seja inflamada!
E toda a tarde era passada em farra agitada, sempre regada de boa pinga em ambiente de animado bailarico, onde não era permitido a nenhuma moça recusar dançar com qualquer que fosse o mancebo dos inspeccionados, uma recusa dessas, era interpretada como ofensa familiar.
Com o surgir da guerra nos anos 1961/1962, a juventude da minha terra abandona a aldeia, em massa, e vai a salto para o estrangeiro. O número dos mancebos que anualmente iam a dar o nome para a tropa caiu das duas ou três dezenas que eram habituais, para menos de meia dúzia.
Foto 4 - Castelo Branco, Dezembro de 1968.
O início da Guerra Colonial praticamente acabou com a tradição festiva do dia da inspecção. Provocou uma reviravolta de 180 graus no valor do conceito de apto e inapto para o serviço militar. É surpreendente, que no espaço de dois ou três anos o conceito de opinião que se tinha da selecção de apto, que era considerado o boníssimo, se tenha invertido o valor, e o apto passou a ser o maligno, pois a partir do início da guerra o que se valoriza, no querer dos familiares e mancebos, é que fiquem inaptos para o serviço militar, a condição de inapto passou a ser o óptimo! São os dinamismos sociais da adaptação dos interesses!
Continuaram-se a comprar vitelos, cabritos e até porcos inteiros, para satisfazer a gula dos falsos profetas que só anunciavam desgraça e tinham bem estudada a arte da mentira, pois aos crédulos muito prometiam, mas nada faziam. Convenciam os inocentes que lhes livravam os filhos da guerra, e alguns caíram na ratoeira, mas cedo se convenceram que nada lhes tinha sido feito. E lá vinham a terreiro os profetas com argumentações abonatórias, utilizando desculpas esfarrapadas…
PS: - Significado do termo “Sortes” aqui utilizado, que creio estar certo, pela ideia que me ficou segundo aquilo que ouvi noutros tempos:
Antigamente, devido ao grande número de jovens que se apresentavam à inspecção, eram muitos os que ficavam aptos, e para os aptos não havia lugar para todos no serviço militar. Para solucionar o excesso dos já seleccionados, procedia-se a um sorteio aleatório entre os que tinham ficado aptos, para assim se apurar aos que cabia a sorte de cumprir o serviço militar.
Um abraço e boa saúde, para todos.
José Corceiro
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Nota de CV:
(*) Vd. poste de 26 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7678: Casos de azar e sorte (1): Camarada ferido pelo impacto de granada que não explodiu (José Corceiro)
14 comentários:
Magnífico texto de inegável interesse etnológico para a compreensão da cultura da nossa geração, e dos pais e dos nossos avós...
"Ir às sortes", "tirar as sortes"... era um verdadeiro rito de passagem, um marco importante na vida de um mancebo que passava a ser homem... Talvez o equivalente ao "fanado" na Guiné...
Encontrei na Net mais relatos desse momento ansiosamente aguardado e festejado na sociedade rual do Portugal de meados do Séc. XX...
(...) "Chamava-se 'Tirar as Sortes' o estar presente na inspecção médica, para avaliar a robustez de modo a estar ou não apto para o cumprimento do serviço militar. Esta etapa sempre funcionava como passo importante na vida de todos os jovens que se sujeitavam a esta avaliação e era encarada como um verdadeiro teste de masculinidade.
"O resultado da inspecção era simbolicamente caracterizado por uma fita que era fixada por um alfinete na lapela do casaco, vermelha significava apurado, verde que tinha ficado livre e branca, adiado, porque ainda não tinham atingido a maturidade e logo teria de repetir a inspecção no próximo ano.
"No Pombalinho, por muito tempo se manteve a tradição de se deslocarem em carroça a Santarém ( onde se situava a instituição militar que fazia a inspecção) e no regresso logo que chegavam à entrada da aldeia, eram lançados foguetes como forma de aviso de que finalmente tinham voltado desse tão importante marco para suas vidas" (...).
Fonte: Blogue de Manuel Gomes > Pombalinho > 8 Fevereiro de 2007
Ir às Sortes
http://opombalinho.blogspot.com/2007/02/ir-s-sortes.html
Do blogue de Carlos Nunes > Fundo da Rua > Quarta-feira, 6 de Fevereiro de 2008 > “AS SORTES”
http://carifas.blogs.sapo.pt/4207.html
(...) "A sorte de cada um ditava-se nas 'sortes'. Boa sorte se ficasse livre, má sorte se fosse apurado.
"Naquele tempo, ir às 'sortes' era motivo, por um lado, de regozijo, porque representava transpor a fase de rapazola para o homem feito e pronto para a vida adulta e capaz de ir p’rá guerra. O percurso de vida de cada um de nós era interrompido nesta fase, por dois três e até quatro anos, período em que eramos confrontados com experiências que iam das longas deslocações para os quartéis em terras distantes onde eramos colocados até às viagens para o Ultramar e consequente participação na guerra colonial, passando pela formação nas diversas especialidades que nos calhavam em sorte.
"Dizia-se naquele tempo que quem não fosse à tropa não ficava homem inteiro. Se pensarmos na nossa interioridade, na fraca formação académica que nos era proporcionada e no obscurantismo em que vivíamos, a experiência da vida militar acabava por ser enriquecedora, abrindo novos horizontes e conhecimentos, porque eramos finalmente arrancados à inércia da vida que levavamos, (alguns de nós já tinham migrado) embora com trabalho duro, de sol a sol." (...)
(Continua)
Transcrição com a devida vénia...
Do blogue de Carlos Nunes > Fundo da Rua > Quarta-feira, 6 de Fevereiro de 2008 > “AS SORTES”
http://carifas.blogs.sapo.pt/4207.html
(...) "O dia das 'sortes' era, assim, um dia marcante nas nossas vidas em que nos aperaltávamos a preceito para comparecer na inspecção, que, em 1964, foi efectuada nas instalações do cine-teatro de Ferreira do Zêzere.
"Os da minha geração que estavam migrados, como eu, sobretudo em Lisboa, também compareciam, porque ninguém mudava a residência oficial para ter o privilégio de poder participar nesta, para nós, cerimónia de iniciação.
Escusado será dizer, que fomos todos apurados. Altos, baixos, fortes e fracos. Eramos, como se dizia então, carne para canhão. Estava-se em plena guerra colonial e tudo era mobilizável.
"Os constrangimentos que sentimos em estar em pelota numa fila, a aguardar a vez de ser observado pelos militares que ali se deslocaram para o efeito, desvaneceu-se com a almoçarada que organizámos numa pensão da vila.
"Eramos dezoito rapazes entusiasmados e alegres a viver este dia especial. Acabado o almoço, já acompanhados do acordeonista contratado para abrilhantar este dia, bem como o baile que se realizaria à noite, tirámos fotografias em grupo para perpetuar a ocasião.
"Seguimos depois em grupo para Paio Mendes, sempre com o tocador à frente, animando a marcha, para fazer a tradicional visita às casas de cada um. Não fomos a todas, por falta de tempo e porque corresponderia a beber pelo menos 18 copos de vinho e o baile aguardava-nos à noite para culminar o dia, dançando. Recordo-me que neste dia fumei pela primeira vez na presença do meu pai, com sua autorização. A emancipação completava-se.
"O baile realizou-se em Paio Mendes, à luz de um candeeiro a petróleo (ainda não havia electricidade neste tempo) no anexo da casa do sr. Capitão Pires, que tem umas ameias em pedra que lhe dá aspecto de castelo. Convidámos as raparigas solteiras para o baile, que decorreu animadíssimo, até tarde.
"Com poucas excepções, acabámos por ir quase todos prestar serviço no Ultramar, na guerra colonial, de onde, felizmente, regressámos todos, embora hoje já haja a lamentar o desaparecimento precoce de alguns colegas e amigos (...)
Do blogue de João Chamiço > Amigos da Atalaia de Gavião > Sábado, 19 de Agosto de 2006
IR ÀS SORTES, NA ATALAIA
http://rosa_dos_ventos.blogs.sapo.pt/4776.html
Cada ano, novos mancebos iam
purificar-se nas águas correntes,
onde, de velhas roupas se despiam
de adolescências puras que sumiam
num caudal de inocências transparentes.
Iam a pé, pelo caminho rude,
agreste, como o cantar da cigarra;
no fundo da ravina, a quietude
lavava dos mancebos a virtude
em mergulhos de festa e algazarra.
Numa metamorfose esperada,
brotavam homens, em corpos de putos,
como se a infância exorcizada
de demónios menores libertada
despertasse alentos resolutos.
Dos que nesse "milagre", renasciam
naquele cais de uma nova partida,
na quilha do seu velho barco iam
aqueles que do rumo decidiam
Se era de guerra ou de paz, a vida.
À noite, soubessem ou não dançar,
ao ritmo doce de um acordeão
em doces lamentos no seu trinar,
nenhuma solteira negava par
aos mancebos, apurados ou não.
Na pandeireta, talvez na lapela
fitas vermelhas eram: dispensado!
as verdes, o adeus de uma donzela
curvada sobre um caixão de Benguela
e um choro eterno de mãe de soldado.
De três pregos, caricas e madeira,
p’las ruas, pandeiretas em vaivém;
mas já não vão lavar-se na ribeira
nessas águas de cristal da “Aferreireira”
se houver mancebos, no ano que vem.
João Farinha Margarido Chamiço
(João Chamiço) (...)
Tantos e täo interessantes costumes (e tradicöes) que passavam completamente "ao lado" da Lisboa da minha juventude. Camarada e Amigo José Corceiro obrigado por uma leitura que me mostrou algo que completamente desconhecia. Um grande abraco.
Amigo José Corceiro
Ainda bem que aqui vim.
Gosto de ler o que escreves. Mais um belo naco de prosa. Acrescem ainda os comentários do L. Graça e eu conhecer a tua zona.
Desconhecia contudo essa vossa tradição e, curiosamente, o abandono dela. Era terra dura de contrabando, de tradições fortes.Gente boa!
A cor das fitas, se alguma memória me resta, está mais de acordo com as que o Luís Graça diz. Aqui nesta zona havia, se bem me lembro algo de festivo.Penso que sim. Mesmo no Alentejo havia algo. Era a festa pagã da passagem á idade adulta?= Seria? Talvez, mais festiva, com a comemoração dos dez, vinte ou vinte e cinco anos da "ida ás sortes". Isso havia por aqui. Como sabes não sou de cá. Nasci num lado, deram o meu nome para ir á inspecção noutro. Como estava em exames vim á noite e, assim que fui inspeccionado, rápido parti para os exames.Assinei um papel e o esquecimento ia-me tramando... Recordo que os mancebos eram gente conhecida, do tempo de escola e colégio. Tudo nu lá fomos, cantando e rindo, sendo interrogados,pesados e medidos...aprovado e "ala" que faz tarde.
Ainda bem que recordaste essa tradição.
Os meus parabéns por isso e pela beleza da escrita. Como sempre.
Abraço Amigo do T.
Por terem já passado tantos anos, creio que me terei enganado no significado simbólico, que era atribuído às cores das fitas que eram colocadas na lapela do casaco, no dia da inspecção, para distinguir os mancebos que ficaram esperados, livres, ou apurados para o serviço militar.
Falei com um conterrâneo da minha geração, que me lembrou: A fita vermelha que simbolizava apuramento para o serviço militar, fita verde que ficava esperado, ou seja que no ano seguinte tinha que ir novamente à inspecção, e fita branca que ficava livre do serviço militar. Penso que assim estará correcto.
Um abraço
José Corceiro
Textos como o teu, onde se aprende sempre qualquer coisa, justificam a minha vinda diária ao nosso Blogue.
Com todos eles vou aprendendo mais alguma coisa e ao aprender torno-me ou sinto-me melhor.
Obrigado Camarigo
Vasco A. R. da Gama
Caro José Couceiro,
O teu magnífico texto trouxe-me à memória um pequeno episódio que aconteceu na minha família.
Eu era uma criança, quando o meu tio Luís Silveira foi às Sortes.
Para contentamento da família, ficou livre da tropa.
Todavia, ele chorava e eu não compreendia esse seu estado de alma. Perguntei-lhe onde estava a razão do seu desalento.
Respondeu-me que eu era muito novo
para compreender certas coisas. Mas lá foi dizendo que a razão da sua tristeza era que nem para soldado sirvia e estava condenado a nunca sair da Ilha das Flores (saiu para os States aos 35 anos de idade).
Com um abraço amigo,
José Câmara
CAMARIGO José Corceiro:
Tomei nota dos teus escritos, mas falta referir que, para além do fato e gravata para ir às SORTES, havia um pormenor:
Seria talvez a PRIMEIRA VEZ que um jovem se despiria e andaria por UM qualquer corredor de um Centro de Recrutamento Militar - NU
Estou a falar de 45 anos atrás.
É bom lembrar...
CMS
Espectacular. Parece que tudo foi tirado a papel quimico. No meu caso, porque vivia na Vila, Alcanena, a minha terra, não tinhamos que nos deslocar. Já lá estávamos. Portanto não havia trote, nem galope, aliás nem havia cavalos, nem eram precisos. Mas de resto tudo era parecido. Boa descrição. Volto a dizer, espectacular. No nosso caso, mesmo em 65, mesmo assim ainda erámos quarenta e tal só da freguesia de Alcanena. A ida era até ao Alviela que Deus tem. Era um rio bonito e limpo onde dava gosto tomar banho. E nesse dia havia banho voluntário ou forçado. Comezainas também não faltavam como não faltava o foguetório. E à noite lá estava o bailarico até As tantas. Fitas brancas, dos que ficavam livres eram raras. E as encarnadas, dos esperados, também raras. As verdes dos apurados eram a esmagadora maioria. A tropa precisava de mancebos, E então era assim... Parabens pelo magnifico trabalho recordatório.
Carlos Pinheiro
Camarigo José Corceiro
Os meus parabéns pelo texto.Um bocadinho mais a sul, (Penamacor)era exactamente assim,com algumas variações, e segundo julgo saber seria idêntico em toda a Beira Interior.É um bom tema para estudo sociológico.Já agora conta aí as rivalidades entre Vale de Espinho e Quadrazais.
Um alfa bravo
C. Martins
Caro C. Martins
Não era entre Vale de Espinho e Quadrazais, mas sim entre Vale de Espinho e Fóis, eram ódios de morte, assim como o eram as relações entre o Soito e Quadrazais.
Mas caro amigo, essa história era tema para um belo e grande livro. Felizmente hoje temos boas relações de amizade. Mas não vamos incendiar o palheiro…porque os fogeiros são de tomates…eles consegiram levar à terra deles, o Presidente da República, já por duas vezes e aquilo fica no cu de judas!
Só uma pitadinha de três episódios entre milhares que lá aconteceram: muito resumido…OS valespinenses numa noite destruíram a ponte do rio para que os fogeiros não tivessem autocarro…valespinhenses vão jogar futebol aos Fois, estávamos a ganhar, junta-se o povo dos Fois e core-nos á pedrada, viemos pelos montes, para Vale de Espinho, 6km, só com calção vestido e no percurso, nós com 16, 17 aninhos, destruímos os pomares da fruta aos fogeiros…numa altura, os valespinhenses ensaiaram um assalto aos Fois, para lhes roubar um santo da igreja, S. João Tadeu, que era o santo por quem eles tinham mais devoção. Eu mesmo assim tive uma namorada nos Fois…
Penamacor, eu tenho lá família, foi lá, o local onde eu vi pela primeira vez televisão, no café central, cujo proprietário, Clementes, são da minha terra, eu ia a fazer 10 anos, foi uma das prendas por ter feito a 4ª classe.
Um abraço
José Corceiro
Caro José Corceiro:
Apreciei muito a tua história, aliás como aprecio muito as tuas outras.
Contaste uma história extraordinária de uma tradição a qual me deixou mais rico culturalmente, pois embora o país seja pequeno, quanta riqueza de valores na sociedade portuguesa nós desconhecemos por esse Portugal adentro.
Fiquei a saber e mais conhecedor dos nossos usos e costumes e o que era "ir a sortes" em Vale de Espinho - Sabugal e acho que cabe perfeitamente no Blogue pois afinal há afinidade com a nossa vida enquanto jovens na idade militar, muitos ex-combatentes na Guiné, como foi o nosso caso.
Um abraço
Rui Silva
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