Sexagésimo oitavo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGRU 16, Mansoa, 1964/66.
Da Florida ao Alaska, nono dia
Já há algum tempo que tínhamos passado o Paralelo 48 N,
onde dizem que são mais ou menos 48 graus a norte do
plano equatorial terrestre e, a esta latitude o sol nos
aquece e ilumina por muitas horas ao dia, pelo menos no
verão, tudo isto era verdade, pois na viajem pelo
“Klondike Loop”, que é como chamam ao desvio de
estrada de terra, com algum alcatrão, pedra e lama, pois
dizem que o pavimento é “seal coat & gravel”, que está
aberta todo o ano, mas no inverno, quando o tempo é de
tempestade, algumas partes do trajecto fecham. Tem uma
distância mais ou menos de 500 milhas, é uma estrada
“deserta”, vêem-se alguns animais selvagens, sobretudo
“coiotes”, começa pouco depois da cidade de
Whitehorse, portanto no “Alaska Highway”, na província
de Yukon, no Canadá, e termina já no estado do Alaska,
na povoação de Tok, também no “Alaska Highway”.
Explicando um pouco melhor, interrompemos o nosso
trajecto que ia directo ao território do Alaska,
seguindo agora mais para norte, onde íamos cruzar a
fronteira com o Alaska em diferente local, mas
regressaríamos à mesma cidade, já dentro do território do
Alaska, tal como se continuássemos directos pelo Alaska
Highway, em outras palavras, fizemos o “Klondike
Loop”, que é o mesmo que estar em Aveiro, querer ir de
carro para a cidade de Salamanca, em Espanha, e no
lugar de ir directo, atravessando a fronteira em Vilar
Formoso, tomar a direcção do norte, atravessar a
fronteira em Vigo, regressando depois a Salamanca.
Este trajecto é muito popular entre quem viaja
no “Alaska Highway”, pois passado mais ou menos 520
quilómetros, chegam à cidade de Dawson City.
Esta cidade está situada na província do Yukon,
cuja população anda à volta de 2000 habitantes,
recebendo mais ou menos cerca de 60.000 turistas por
ano. Os habitantes locais referem-se à localidade como
"Dawson", mas a indústria turística prefere chamar-lhe
"Dawson City", para a diferenciar de Dawson Creek, na
província de Colúmbia Britânica, que se situa no “Historic
Milepost 0”, do “Alaska Highway”, pelo menos foi isto
que uma simpática senhora, vestida tal como os
habitantes de Dawson City usavam no século passado,
nos explicou no Centro de Turismo, convidando-nos a
passar um dia ou dois na cidade.
A povoação foi fundada no ano de 1897 e baptizada em
homenagem a um geólogo do Canadá chamado George
Mercer Dawson, que tinha explorado e realizado um mapa
da região em 1887. Foi a capital da província do Yukon
desde a fundação do território, em 1898, até 1952,
quando a sede foi trasladada para a cidade de
Whitehorse, de onde tínhamos saído no dia anterior.
A corrida ao ouro de “Klondike”, começou em 1896 e
produziu uma grande mudança no que era então um
acampamento indígena de Verão, orientado para a pesca,
transformando-o numa cidade próspera de cerca de
40.000 habitantes por volta de 1898. No ano seguinte a febre do
ouro tinha chegado ao seu fim, fazendo com que a
população se reduzisse para 8000 pessoas. Quando
Dawson se tornou cidade em 1902, tinha cerca de 5000
habitantes.
A maior parte dos edifícios da área junto ao rio Yukon, da
cidade de Dawson City, parecem antigos, em madeira. Todos os novos edifícios têm que seguir esta regra, a
população manteve-se bastante estável até à década de
1930, decaindo após a Segunda Guerra Mundial, quando
a capital territorial passou a ser a cidade de Whitehorse.
No início da década de 1950 uma rota unia Dawson City
ao Alasca e, no outono de 1955 a Whitehorse, pela
estrada que faz parte da rota de “Klondike”.
Percorremos a cidade, as ruas estão tal e qual como no
século passado, o seu piso é de terra, com algumas
poças de lama, existem passadeiras em madeira junto
das casas, onde antes de entrar tem uma grande
“escova”, pregada ao chão, tipo vassoura, para as
pessoas limparem o calçado. Visitámos um bar
local, o chão era cimento, já um pouco deteriorado, coberto
de serrim, onde as pessoas bebiam cerveja à
temperatura ambiente, atirando as cascas de
amendoim, e não só, para o chão. Os preços de comida,
hotéis, gasolina ou daquelas pequenas coisas a que
chamamos “lembranças”, que se compram de momento,
como se compreendia, eram um pouco acima da média.
É uma cidade pequenina, muito linda, que fica no
pensamento e, vista do cais do rio, onde, depois de mais
ou menos 2 horas, na linha de espera pelo “ferry”, que é
da graça e atraca na margem do rio Yukon, onde se
encontra em ambas as margens uma máquina, tipo
“caterpilar”, para ajeitar o “cais” em areia, e que varia
de superfície conforme a corrente do rio, atravessámos o
rio Yukon, subindo uma pequena montanha, onde tem um miradouro, onde se pode apreciar a cidade perdida de
Dawson City, que ficou para trás, do outro lado do rio,
mas que, como antes dizíamos, se leva no pensamento.
Continuámos andando mais ou menos 130 quilómetros,
sempre subindo as montanhas, por uma estrada de terra
com algumas pedra miúda, a que chamam “Top of the
World Highway”, passando por zonas com gelo, que se
derretia suavemente, onde alguns animais vinham beber
a sua água, desfiladeiros, cordilheiras, com
algum vento frio, mesmo muito frio, vindo cruzar a
fronteira internacional no posto fronteiriço de Poker
Creek, que tem neste momento 3 habitantes, sendo a
porta de fronteira terrestre situada mais a norte de todo o
território dos USA, e está aberta das 9 da manhã até às 9
da noite, e fechada durante o inverno que é mais ou
menos de Outubro a Abril, mas informaram-nos que a
fronteira abre somente em Maio.
Estávamos finalmente no território do Alaska, parámos,
tirámos as primeiras fotos junto da placa que diz Alaska,
os guardas do posto fronteiriço riram-se, dizendo: “long
way from Florida”, (longo caminho desde a Florida).
A partir daqui era território do Alaska, era sempre em
frente, não havia que enganar, mas, aquilo a que chamam
o “Taylor Highway”, já no estado do Alaska, que tem
uma distância de aproximadamente 100 milhas, pois no
Alaska a contagem já é feita no sistema de milhas, que
são quase sempre a descer. Na altura, a estrada estava
em reparação, com um piso de pedras muito grandes, o
que danificava muito as viaturas, pois eram
frequentes Vê-las paradas, com pneus rotos, molas
partidas, desvios pela berma, algumas quase a tombar. Nós
fomos seguindo, devagar, mas seguindo, também se viam
em pequenos ribeiros, já onde a zona era mais plana,
muitas pessoas pesquisando ouro, enterrados na água e
na lama.
Passámos, entre outras, pela povoação de Chicken, uma
povoação mineira onde comprámos alguma gasolina,
seguindo sempre, devagar e sem qualquer acidente até à
tal povoação de Tok, onde chegámos por voltas das 11
horas da noite, mas ainda de dia, pois continuámos a
viajem até à cidade de Delta Junction, onde dormimos,
com o carro e a Caravana, coberta de lama e cimento.
Neste dia percorremos 567 milhas, com o preço da
gasolina variando entre $1.89 e $1.98 o litro.
Tony Borie, Agosto de 2014
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Nota do editor
Último poste da série de 27 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13658: Bom ou mau tempo na bolanha (67): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (8) (Tony Borié)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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2 comentários:
Olá! Boa tarde...
Passei hoje por aqui e permita-me fazer o seguinte comentário:
Excelente viagem, gostei imenso.
Prometo voltar brevemente.
Um abraço de:
Um Raio de Luz e fez-se Luz - Algarve
E que tal Tony se editasse um livro com um pouco do teu passado e adicionando essa e outras viagens históricas.
Um abraço
Colaço.
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