Quinto episódio da nova série "Atlanticando-me" do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66).
Nunca é tarde - Capítulo 5
Companheiros, o tempo cura tudo, o nosso interlocutor, à
parte, disse-nos que quando era jovem, também sofreu uma
grande dor de amor, pois a sua namorada fugiu para uma
praia no México, com o seu melhor amigo, que sabia
todos os seus segredos, anos mais tarde, regressaram,
pedindo-lhe perdão e, ele já não se lembrava da cara da
namorada, mas adiante.
Lembram-se
que no último episódio o Mike deixou a política? Cá vai a
continuação.
Agora, o Nico, com o filho Mike, à frente de todos os
negócios, tinha mais tempo livre, começou por dizer ao
filho:
- Eu não preciso de te dizer nada que tu já não saibas,
gere os negócios dos teus avós, o melhor que puderes, e
se vires que eu ajudo em alguma coisa só dizes, que eu
vou acabar com os pensamentos horríveis que tenho na
cabeça.
O Mike, ao ouvir estas palavras da boca do pai, ficou um
pouco assustado, e responde:
- Que pensamentos horríveis, são esses pai?
E o Nico, diz-lhe:
- Quero ir a Portugal, ver se os teus avós, ainda estão
vivos.
O Mike, abraça-se ao pai, e diz-lhe:
- Até que enfim, ganhaste coragem, vai, se forem vivos,
podias trazê-los, aqui há muito espaço para eles.
O Nico, outra vez com coragem, vem no comboio até
Nova Iorque, compra passagem num navio com bandeira
italiana que fazia a carreira da Europa, passando por
Lisboa, e embarca.
Passados uns dias, com uma pequena
paragem no porto de Vigo, Espanha, desembarca em
Lisboa, vem um pouco nervoso, não sabia bem se era dos
nervos ou outra coisa qualquer, mas não vinha confiante. Toma o comboio para a cidade de Aveiro, toma um táxi,
viajando para o lugar onde vivia quando jovem, que o
deixa à porta da taverna, que já não era taverna mas sim
um café, com uma esplanada com algumas cadeiras.
Entra sem dizer nunca quem era, pergunta pelos
pais, se ainda eram vivos, e o dono, homem novo, não se
recordava de ninguém com esse nome. Nesse instante,
vem de lá de dentro uma mulher, que estava na cozinha, limpando as
mãos ao avental que trazia vestido, e diz:
- Devem ser aqueles que viviam naquelas terras perto do
canal de água salgada. Oh, já morreram há alguns anos,
estão no cemitério numa campa muito bonita, logo à
entrada, está sempre cheia de flores.
O Nico não pôde ouvir mais, primeiro começaram uns
suores frios, depois começou a faltar-lhe a vista, a
cambalear, sentou-se numa cadeira, os donos do café,
vendo-o assim, perguntam-lhe:
- O senhor sente-se bem? Oh homem vai buscar um
copo com água. Meu Deus, que o senhor está com uma
cara!
O Nico, bebeu a água, já com um pouco mais de força,
respondeu:
- Não é nada, deve de ser da fraqueza, pois ainda hoje
não comi nada, mas digam-me onde é o cemitério?
O Nico, depois de informado, caminha com passos
lentos até ao cemitério, vai direito à campa onde pensa
que os seus pais estão enterrados, vê uma senhora
vestida de preto, ajoelhada na frente da campa, rezando. Ele, a muito custo, pois as palavras não lhe saíam,
pergunta:
- Desculpe, é aqui que estão enterrados?...
Não acabou de terminar as palavras, pois essa senhora
era a Dina que esperou toda a sua vida pelo seu amor. Ao ouvir estas palavras, logo reconheceu o seu Nico e, tal
como fez, quando ele lhe pediu para namorar com ele, o
encheu de beijos, na frente de toda a gente. Agora se
levantou, olhou para o Nico, abraçou-se a ele, dizendo:
- Eu sabia que regressarias, tal como prometeste, eu
acreditava, sabia que falavas verdade quando me disseste
que logo virias para casar comigo, me ias levar para os
Estados Unidos, afinal, era verdade, continuo com o meu
enxoval completo, esperando por ti.
Em seguida lhe contou todos os anos de ausência,
esperando por ele, os seus pais, na altura da sua morte,
deixaram uma carta onde o perdoavam e o
compreendiam.
Casaram numa capela das Gafanhas, regressando
ambos aos Estados Unidos, onde o Mike, antigo político
de profissão, ao recebê-los, sorridente, de braços abertos,
tal como fazia nos comícios de propaganda do seu
partido, lhes disse:
- Então pai, que mãe mais bonita me arranjaste, não
deve nada à minha falecida mãe. Parabéns pai.
E o clube dos Açores fechou de novo as portas ao
público para celebrar uma festa privada, comemorando a
chegada do patrão Nico e da sua esposa.
E em breve iria fechar de novo as portas ao público,
mas desta vez para celebrar a festa de casamento do
Mike, pois andava de amores com uma rapariga cujos bisavós tinham emigrado dos Açores, que era desinibida e
sem preconceitos, tinha cabelo preto, quase castanho que lhe
tocava nos braços quando lhe falava e usava uma
saia curta, mesmo curta, um pouco abaixo do joelho, que
quando se movimentava, os deixava ver.
Fim.
Tony Borie, Julho de 2015
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Nota do editor
Último poste da série de 31 de janeiro de 2016 Guiné 63/74 - P15689: Atlanticando-me (Tony Borié) (4): Nunca é tarde (4)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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