quarta-feira, 25 de maio de 2016

Guiné 63/74 - P16131: As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte III: A vida na mina Munguanhe 2

Terceira crónica enviada a 18 do corrente;

Olá Luís, boa noite!
Aqui vai a parte 3 das memórias da Diamang. Espero que estejam do teu agrado, pelo menos revelam episódios autênticos, ainda que susceptíveis de interpretações bárbaras. É que ter feito a tropa na Guiné era muito diferente de trabalhar atrás do sol posto nas longínquas terras do leste de Angola.

Com um abraço
JD


[ O José Manuel Matos Dinis, ex-fur mil at inf, CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, nosso grã-tabanqueiro e adjunto do régulo da Magnífica Tabanca da Linha, Jorge Rosales, depois do seu regresso a casa, a Cascais, em janeiro de 1972, vindo da Guiné, rumou até Angola, em maio de 1972, para ir viver e trabalhar na Lunda, na melhor empresa angolana na época, a famosa Diamang - Companhia de Diamantes de Angola, com sede no Lundo. Aqui casou (por procuração), aqui viveu e trabalhou, aqui nasceu o seu primeiro filho... Desafiámo-lo justamente a falar da sua experiência angolana em meia dúzia de crónicas memorialísticas. Ele aceitou galhardamente o desafio.]


1. As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte III: A vida na mina Munguanhe 2
.
A mina de que me tornei responsável, e que já descrevi em pinceladas rápidas, era o Munguanhe-2, uma colina explorada sob o método clássico, com o desmonte de cascalho por padejamento, linhas para vagonetas que transportavam o cascalho para uma lavaria de "pans". Os meios mecânicos empregues eram escassos, e a rentabilidade ficava muito longe das minas mais rentáveis. Imagino que se mantinha este modelo de exploração, porque, apesar da escassa produção diamantífera, era mínimo o desperdício e não deixava de ser rentável. Agora não me ocorre o valor médio da produção diária, que talvez não excedesse os 20 quilates em pequenas gemas.

Alguns dias depois já identificava parte do pessoal pelos nomes. E uma ocasião tive uma atitude que lhes caiu muito bem. Faltou um elemento que me parecia bom trabalhador, e durante a chamada que antecedia o inicio dos trabalhos, o Muriandambo, capataz principal, referiu que aquele elemento tinha a mulher muito doente. Pedi que alguém me indicasse a aldeia onde morava, e lá fui em busca da doente. Eram pessoas humildes que aceitavam com resignação a doença, mas vi que tinha uma grande chaga na perna, e soube que teria sido vista pelo feiticeiro. Com ajuda entrou para o carro, e levei-a ao posto médico. Na ausência do Julien Martan (fonética afrancesada de Júlio Martins), ausente na ocasião, pedi a um auxiliar para ver a doente com a maior brevidade. Limpou-a, desinfectou-a, entregou-lhe alguma medicação, e recomendou que lá voltasse mais tarde. Levei a senhora de volta à aldeia, e voltei à mina para reiniciar a tarefa do diária. Lembro-me de que tive boas notícia dela.

Outra ocorrência:
no dia de pagamento de salários, pagamento que se efectuava no refeitório onde o Tomás se deslocava acompanhado de uma espécie de burra com o dinheiro, observei que alguns metros adiante, ainda na área da mina, estavam uns tipos desconhecidos. Indaguei quem eram, e logo soube que se tratava dos credores de algum pessoal, que lá iam receber o produto da venda de aguardente. Dirigi-me a eles e disse que não os queria ali, que fizessem a cobrança nas aldeias. Saíram sem ripostar, mas no fim do dia o Muriandambo demorou a contar-me que esses homens preparavam ali perto os destilados, e que alguns homens gastavam logo uma boa parte dos salários, o que gerava grandes perturbações com o pessoal, pois as mulheres, perante a escassez de dinheiro, fugiam de casa, e eles faltavam alguns dias ao trabalho para as resgatarem. Assim, constatei que os consumidores do "marufo" ficavam duplamente prejudicados, pois gastavam boa parte do salário na compra da bebida, e deixavam de receber o correspondente aos dias em falta. Isto, sem contar com as relações afectadas. Ainda me referiu que ficavam mal vistos na aldeia por causa das dificuldades resultantes do consumo da bebida. Notei, portanto, algum preconceito ou ressentimento contra os elementos socialmente menos bem comportados. 

Em outra ocasião faltaram dois elementos no dia do pagamento, e guardei os salários de cada um em envelope. O André Pihia, um rapaz ainda jovem e que mostrava competência e era capita da lavaria, assistiu a tudo, e à guarda dos envelopes numa gaveta da secretária, e teve uma tentação maldosa. Depois do serviço arrombou a janela e furtou os envelopes. No dia imediato, quando cheguei e constatei a situação, logo inquiri o Zé Manel, que me deu a informação do sucedido e ficou ao meu dispor para me indicar o caminho da aldeia. Levava comigo uma faca de mato, para alguma eventualidade. O André não ofereceu qualquer resistência, entrou no carro, e levei-o ao Cambulo, para trabalhar na administração o necessário para repor os valores roubados. A razão tinha sido a mais ingénua que possamos imaginar: comprou cerveja e deu uma festa para os vizinhos. Assim, à novo-rico.

Tomei, então, a decisão de ir ao Cambulo, que era a sede do concelho, e pedi à polícia para tomar conta dos destiladores, o que veio a acontecer, embora, agora, não possa afirmar se tudo ocorreu com bons ou maus resultados, mas houve destruição ou apreensão das destilarias. Pelo menos a cobrança à boca de cena deixou de acontecer. 



Angola, Lunda, Diamang, c. 1972/74 >  A nossa cozinheira: repare-se no penteado e nas mutilações de enfeite.

Fotos (e legenda): © José Manuel Matos Dinis (2016). Todos os direitos reservados.

No refeitório também me informava se o pessoal gostava das refeições servidas, na base da carne e do peixe seco estufados em óleo de palma, que acompanhavam batata, batata-doce, ou milho, e constatei que eram pratos do agrado geral. Também observei que alguns trabalhadores cobriam numa folha larga de um arbusto o conduto que lhes calhara em sorte, e levavam para partilha da família. Dei indicação à cozinheira para aumentar a quantidade aplicada, e ao Muriandambo para alternadamente distribuir a sobra do rancho pelos trabalhadores, de modo a que não houvesse prejudicados. Passei a requisitar mais uns quilos de alimentos, e não me levantaram problemas. Nas áreas exploradas e de terras removidas, incentivei ao plantio de batata-doce e milho para melhoria dos consumos domésticos.

A vida na mina corria-me com prazer, e por vezes ainda arranjava alguns minutos para me sentar à beira rio e observar a natureza, sobretudo a vida dos bicos-de-lacre, pássaros pretos com o bico da cor do lacre, que havia em quantidade, esvoaçavam bastante e cantavam com alegria permanente. Mas uma ou outra vez, com a ajuda do Zé Manel, o guarda nocturno, aprendi a caçar um jovem crocodilo que vivia no canal, e caía numa laçada colocada no fim de uma frágil paliçada, onde era atraído com um peixe ou um bocado de carne. Depois deixava-se ficar sem tentar deitar a baixo as canas que o "prendiam". Era muito novo, e de comprimento teria apenas cerca de um metro ou um metro e vinte. Obviamente, tirávamos o laço de corda, e o bichinho quase se habituou àquela rotina que lhe garantia alimento e repouso ao sol. Por uma ou outra vez vi a repetição da cena, o que seria impossível quando encorpasse.

O Pereira da Silva era quem me dava apoio técnico, quando necessário, mas algo raramente. Porém, houve uma ocasião em que me senti atrapalhado, quando não preparei a defesa com drenagem adequada à expansão da exploração, e as intensas chuvas fluíram para uma zona mais baixa e longínqua, junto de uma roda-de-canto, onde as vagonetas curvavam para as novas áreas de "cortes" que iam entrar em exploração. Foi problemático, e o recurso às duas bombas hidráulicas não se mostrava suficiente pelo tempo que levavam a empurrar a água lamacenta para um diferente nível de encontro com o canal. Houve voluntários para entrarem na água e manobrarem as vagonetas com água pela cintura, o que se tornava penoso e perigoso. Felizmente não aconteceu qualquer acidente, que poderia materializar-se no corte de dedos do pé, ou outra coisa mais inesperada. 

Para todos aqueles que referem a preguiça dos africanos, deixo aqui este exemplo de como era o contrário que normalmente acontecia, pois diariamente havia trabalhos de pá, pica e barra-mina para desmonte de terra, que não eram pera-doce, tanto sob o grande calor africano, como sob efeitos das magníficas tempestades locais e o peso dos volumes deslocados
.
Depois do horário de trabalho, quando chegava a Cassanguidi, onde estava a viver na Casa de Trânsito, estacionava o carro entre esta e a casa do Pessoal. Mal me apeava, chamavam-me para partilhar algum petisco e beber uma cerveja. Uma ocasião, ou porque éramos mais do que os habituais, ou porque estaríamos com mais apetite do que era habitual, o petisco estava a acabar, quando o Pereira da Silva teve uma ideia para salvar a situação. Chamou-me, para ir à sua casa buscar umas bifanas que estavam temperadas e no frigorífico. 
– Eu, porquê eu? Porque é que não vais lá buscar as bifanas? – perguntei-lhe. 
– Porque se eu lá for, a Manuela (a mulher do Pereira da Silva era a professora D. Manuela) não vai deixar-me sair, e como ela confia em ti, és a solução para prolongarmos o petisco. 

Convencido, fui a casa daquele simpático casal e, de facto, a Manuela, embora indignada e preocupada com algum excesso do marido, entregou-me as bifanas e recomendou que o marido zarpasse em meia-hora. Assim, cumpri as duas missões, sem outra responsabilidade com o cumprimento da combinação por parte dele, para além da comunicação que lhe fiz. 

Outra vez, ainda na sequência do relato de outras convivências, foi combinado sairmos à noite para caçar. Alguém trouxe um Land-Rover, um farol, e lá fomos, talvez com uma ou duas caçadeiras. abalámos por uma picada. Também farolinei, mas a única peça que avistámos foi o que nos pareceu um gato selvagem. Demos meia-volta e acabámos a comer um qualquer petisco antes do agravamento da noite. 

Um ou dois dias depois fui abordado pelo Mascarenhas, um caçador indómito e com fama justificada, que disse ter observado o meu gosto pela caça, pelo que estava a propor uma saída para o Canzar, onde pretendia caçar. Precisava de mim, para prevenir qualquer acidente e não ficar isolado nas lonjuras do mato. Para os menos lembrados, recordo que na época não havia telemóveis e não havia disponibilidade de rádios. Desculpei-me com o argumento verdadeiro de que não era caçador.

A passagem dos dias naquela área angolana fica mais ou menos documentada, pois havia hábitos repetitivos, e até dos álbuns fotográficos, dizia-se, que estavam cheios de retratos de comezainas e piqueniques. Aos domingos, a malta solteira tinha por costume encher uma mala térmica, carregar um saco de carvão, e uma quantidade sempre generosa de carnes e cervejas, para abalarmos em direcção a um local engraçado (um refeitório de mina, ou uma queda de água), onde se preparava a refeição, bebiam-se uns copos, e depois, uns sonecavam, outros jogavam cartas, e todos ouviam com mais ou menos atenção, a transmissão de um jogo de futebol do campeonato metropolitano. 

Eu faltava a estes encontros com alguma frequência, para deslocar-me ao Dundo, onde, aos sábados de tarde e à noite, havia farra entre a malta solteira. Nos domingos tomava o banho matinal, e apresentava-me em casa de quem me convidava para o almoço e jantar, e passava as tardes em cavaqueira com os donos da casa e os visitantes que recebessem.

Este ramerrame era-me agradável, e com o passar dos dias, convencia-me de que a África seria sempre a minha casa. Durante as tardes de domingo no Dundo sentia-se a normal tranquilidade de uma vida económica e social pacífica, onde eram comentadas diversas iniciativas de acordo com as potencialidades e o cada vez maior progresso que as populações experimentavam e exigiam. 

A guerra, que praticamente não se sentia, nem sequer era abordada. Era o desenvolvimento social e económico que mais interessava à comunidade de privilegiados e dirigentes, para além do nascente interesse pela actividade da Bolsa de Lisboa. Abrira uma dependência bancária em Portugália, e os funcionários percorriam os diferentes caminhos da Diamang para captação de recursos, com vista à constituição de depósitos à ordem e a prazo, bem como de outros produtos de dívida que, no conjunto, eram importantes instrumentos para o desenvolvimento da economia angolana.

Mas um dia passei por um percalço completamente inesperado. Um dia fui chamado ao grupo para receber um telefonema do Puto [Portugal]. Em minha substituição ficou um mecânico, que praticamente não saiu do escritório. Mas,  pouco depois de ter saído, o sub-chefe do grupo terá visitado a mina, e pareceu ter falado ao pessoal da exploração em modos normalíssimos para um nortenho do Puto, mas ofensivos para eles. 

Demorei duas horas desde que saí até ao meu regresso. Ainda falei durante uns cinco minutos com quem me substituíra sentado no escritório. Quando ele saiu dirigi-me à lavaria, e sofri o primeiro choque: a metragem com indicação das vagonetas ali transportadas não evoluíra praticamente desde que eu saíra. O problema era da exploração, informaram-me. Constatei que a lavaria continuava a trabalhar com material da reserva. Ao aproximar-me do declive do inicio da linha até aos cortes, reparei que não havia qualquer vagoneta no percurso. Explorava-se o corte mais próximo, e quando nele entrei, vi com grande admiração, o pessoal deitado ao sol, ou em amenas conversas, e as vagonetas fora da linha e viradas sobre o cascalho. 

Imediatamente vi o "filme"do homem do norte, e a decisão reactiva de fazerem uma greve com o desplante de ali terem ficado à espera do almoço. Num clique pensei sobre a quebra da disciplina, ou era reprimida imediatamente, ou poderia degenerar em futuras acções de protesto com o risco de se tornarem incontroláveis. Eu já sabia na época que os trabalhadores rurais eram muito ingénuos, mas que no geral aceitavam a penalização dos seus actos irreflectidos ou mauzinhos. Como também me corre o sangue nas veias, tive uma reacção que, provavelmente, ninguém esperaria, e subitamente, a xutos e pontapés, murros e pedradas, corri pelo meio deles numa acção de distribuição que deviam ter pensado que estava possuído pelo diabo.

Ao jantar, o Maia perguntou-me o que se passara na mina, pois ia lá falar-me e ficou assustado com as correrias desordenadas à frente do jipe. A título de segredo pessoal que garantiu, contei-lhe o que ocorrera, e só me restava esperar pelo dia seguinte para avaliar do efeito produzido. De manhã cedo, pela hora da chamada, e antes do horário de trabalho, o espaço sob o telheiro da lavaria estava cheio de gente para a habitual conferência de assiduidade. Chamei um por um, olhava-os, e no final não havia faltas, com excepção do Mualufuma Casaco a quem, por conselho do administrador do Cambulo, paguei 15 dias de ausência ao trabalho. Mandei-os para as tarefas sem mais palavras. 

O dia correu como normalmente, e sobre o episódio da véspera não houve mais conversas, mas devem ter intuído que não vacilava pela boa ordem na execução e desenvolvimento dos trabalhos. Quando recebi o correio com os mapas da verificação da véspera, o teor do material explorado era semelhante ao que vinha sendo registado, e não me preocupei. 

Esta narrativa podia tê-la omitido, mas acho-a importante, na medida em que na época as circunstâncias angolanas poderiam sugerir algo como prova provada da violência colonialista. O que pretendo é que se possa saber como o relacionamento poderia assemelhar-se ao de uma escola do ensino primário do nosso tempo e à assunção de responsabilidades por todos os intervenientes de um processo laboral. Alguma coisa pode ter mexido naquelas mentes, talvez com idêntica correspondência relativamente aos correctivos dados pelo professores nas escolas, de que muitos de nós reconhecemos o merecimento. Em boa verdade, não houve de nenhuma parte qualquer expressão de ressentimento, e os dias prosseguiram com canções que ritmavam o esforço que cada um, e todos em conjunto desenvolviam.

Por um desses dias o Chefe do Grupo encontrou-me no regresso a casa, e depois dos simpáticos cumprimentos próprios de um homem de bem com a vida, adiantou que o Director-Técnico tinha visitado a mina. Admirei-me, e questionei porque não mandaram chamar-me. Que o Director teria preferido assim, apesar da visão apenas parcial. Quando o interroguei sobre a impressão daquele Director-Técnico, pessoa de renome firmado na longa experiência e nas decisões técnicas que tomava, respondeu que tinha manifestado agrado com o que vira, e eu senti ter passado por um primeiro e importante exame profissional.

No próximo episódio farei uma incursão sobre algumas "estórias" de camanga, em correspondência ao desejo do estimado "cólon" Rosinha.


[Sugestões para ilustração fotográfica: Diamang: um espaço virtual dedicado à Diamang e à Lunda  >  Minas e lavarias da Companhia de Diamantes de Angola ]

_________________

Nota do editor:

Postes anteriores da série > 

6 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16055: As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte I: de Cascais até à Portugália / Dundo...

(...) Em Janeiro de 1972 tinha saído da tropa, dava passeios e namorava pelo litoral de Cascais, onde outros casais nos faziam concorrência. Os meus amigos estavam na vida militar, acabavam os cursos, ou já tinham iniciado actividades profissionais. Já não era como antes, quando a malta se reunia como seita para a paródia, ou para entusiásticas futeboladas. Namorava com envolvimentos familiares, e tinha a obrigação de procurar definição de vida. Não queria trabalhar debaixo de um tecto, e por isso, ficava excluída uma preparação profissional que tinha iniciado antes da tropa.(...)

12 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16080: As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte II: Um "estado dentro do estado"...

(...) Mas afinal, que negócio é esse dos diamantes? É um "fétiche", direi eu. De facto, os diamantes servem para muito pouca coisa, e os que servem, são os industriais, precisamente os de menor valor. Os outros, os que cintilam de brilhos e são usados como adornos, não prestam para nada. Mas valem muito dinheiro, são atributos de riqueza e de poder. Destas razões é que resulta o grande fascínio ou interesse pelos diamantes. (...)

7 comentários:

Antº Rosinha disse...

Moio JD, em quioco, o mesmo que Oi JD, em carioca.

Com que então vais explicar a quem andou por Canquelifá, Buruntuma e Xime, o que foi o paraíso na terra.

Caçadas, até o jacaré vinha à mão, rios com diamantes e água cristalina, e o preto-contratado, sem se queixar que lhe servias peixe podre e a fuba podre.

Conheci lavadeiras quiocas com a tatuagem da barriga, mais perfeita do que a da tua cozinheira.

Aqueles altos relevos estavam alinhados como as teclas da mão esquerda de um acordeão francês, uma maravilha.

A tua cozinheira teve azar com o tatuador.

JD, pelo que relatas sobre o teu relacionamento com os teus trabalhadores, podes chamar pretos, (não tenhas medo das palavras se não ainda alguem se confunde com os ratinhos da beira baixa), tenho a certeza que todos eles achavam que o JD era um "bom berranco".

Quantos quilates seriam precisos para pagar à CCN um frete do paquete UIGE, Lisboa-Bissau?

Cumprimentos

antonio graça de abreu disse...

Muito bem, Zé Dinis! Testemunho pessoal, vivido,sentido.Pós Guiné, no ocaso do Império,
retratos exuberantes, com diamantes à mistura, deste modo tão português de nos diluirmos por África.

Abraço,

António Graça de Abreu

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Zé Dinis: Saborosa e honesta, a tua crónica.

Sou, como te disse ao telefone, um apaixonado pelo traballho nas minas. Uma das minhas experiências, mais marcantes como investigador em sociologia do trabalho, foi a descida aos 700 metros das minas de cobre e estanho de Neves-Corvo, exploradas pela Somincor, em Castro Daire, Baixo Alentejo.

Na época (1989/90) era uma das maiores e melhores minas subterrâneas do mundo. A maior da Europa e uma das melhores do mundo em termos de teor de cobre. Seguramente um dos melhores do mundo, em termos de gestão ambiental, de geologia, de tecnologia, de operação, de responsabilidade social...

A Somincor era (e ainda é, embora o controle acionista já não seja nacional) uma das empresas (portuguesas, com 51% de capital público) de que nos orgulhávamos... Alguns dos melhores quadros tinham a "tarimba" de Angola e África do Sul... Foi, de resto, uma grande escolha de geologia e de engenharia de minas...

A Somincor foi um dos meus "cases studies" na área da gestão integrada da saúde e segurança do trabalho... Aprendi a respeitar profundamente o trabalho daquela gente (quadros técnicos, mineiros de superfície e de fundo, etc.).

Daí eu ser fã das tuas crónicas. Louvo o teu esforço de memória e a precisão da reconstituição das memórias dessa época. Vê este comentário apenas como um incentivo e um encorajamento. Há muitas fotos na Net sobre a Diamang (incluindo sobre o "bem-bom" que era para os quadros brancos, europeus e americanos, que lá trabalhavam e viviam...) mas existem muitos poucos testemunhos (escritos) sobre o quotidiano de traballho (e os lazeres) de jovens, solteiros como tu, "desenraizados", e com uma guerra da Guiné no "portfólio"...

Acho que te estás a sair bem... E mais: admiro a tua honestidade intelectual... Podias dar um "retoque à fotografia", mas não... Deliberadamente recusas o "politicamente correto", não diabolizas nem santificas a Diamang... Quem, de resto, passou por África, como tu, Guiné, primeiro, e Angola, depois, sabe que o mundo é da cor do arco íris, nunca poderá ser reduzido ao formato "a preto e branco"...

Muitas das nossas leituras "ideológicas" (a maneira como vemos os outros, a realidade social, a história...) resumem-se, infelizmente, ao formato "a preto e branco"... Temos tendência para ser "daltónicos"...

Obrigado, Zé Manel, pela tua "paleta de cores"...

Abraço, Luis

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Zé Dinis: Vês se me esclareces o uso do vocábulo "Puto" (diminuitivo de Portugal), usado no teu tempo em Angola e ainda hoje. Diz-me quem usava o termo: os brancos, em geral, os africanos, também ?... Tinha um sentido depreciativo ou não ?

Estranho que os nossos dicionários ainda não tenham grafado o vocábulo, ao fim destes anos todos... Ab. Luis

Anónimo disse...



Camarada e amigo José Dinis:

Depois dos diamantes em bruto que a mim me pareceram as tuas primeiras crónicas sobre esta tua experiência em Angola, finalmente mostras o diamante burilado e brilhante que faz justiça às tuas capacidades de narrador. As outras crónicas , não deixando de ser bem escritas eram muito técnicas e nem sempre compreensíveis para mim e penso eu para a maioria dos nossos camaradas. Quando entras nas relações humanas, em que tu és brilhante, entusiástico e onde revelas o teu grande poder comunicativo e a simpatia que tens por todos os teus semelhantes, pretos, amarelos, brancos, da Linha, da Galiza ou de Trás-Os-Montes, encantas-nos com as descrições que fazes das tuas relações de trabalho, com colegas, subordinados, superiores ou relações sociais fora desse âmbito. Depois existe a tua sinceridade que não te permite sequer esconder pequenos erros ou defeitos de fabrico.
"In vino veritas" diziam os latinos mas até o tal néctar do Douro, do Dão ou do Alentejo (Herdade dos G. muito bom, obrigado) só te poderá alterar o nível de açucar ou adrenalina porque tu penso eu e algum teu amigo de garoto poderá confirmar, que para além da tua rebeldia inata, o teu amor à verdade e à honestidade social e intelectual, também nasceram contigo. Penso isso de ti mesmo quando as tuas verdades não coincidem com as minhas.
Gostei muito meu amigo, vai um brinde à tua saúde e à qualidade actual e futura das tuas crónicas
Um grande abraço. Francisco Baptista

Antº Rosinha disse...

Estranho que os nossos dicionários ainda não tenham grafado o vocábulo, (Puto) ao fim destes anos todos... Ab. Luis

Conforme o JD diz, era para substituir em absoluto a palavra Metrópole, ou Portugal: o vinho do puto, o sporting do puto ...etc.

Luís está a ser esquecida intencionalmente, digo eu, retornado eterno.

Penso que este vocábulo vai morrer, desaparecer, porque políticamente não interessa a Angola nem aos anti-colonialistas do "puto".

Os Pepetelas que tanto a usaram em pequenos, agora detestam-na.

Era um símbolo, uma marca de um tempo demasiado empolgante num momento demasiado feliz numa terra farta sem fome, que arrepia.

Sobre a origem desta e doutras palavras podemos divagar mas seria comprido.

Ângelo Oliveira disse...

Puto como diz era o diminuitivo de Portugal, utilizado por toda a gente e não tinha sentido deprecaitivo. Pepetela,(um dos maiores escritores de língua portuguesa ainda vivo) utilizava mais TUGA que entre os nacionalistas e anti-colonialistas tinha esse sim sentido depreciativo. Hoje em dia em Angola continua-se a utilizar Tuga, mas já não carrega esse sentido de "inimigo tuga" (Ex: "Vou de férias na Tuga"; "o fulano de tal esta a estudra na Tuga") Puto caiu em desuso e como é óbvio metrópole.