sexta-feira, 24 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16232: Inquérito 'on line' (55): A nossas queridas lavadeiras... (Foto: Jorge Pinto / Comentários: Henrique Cerqueira / José Diniz de Sousa Faro / Vasco Pires / António J. Pereira da Costa)




Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Lavadeiras na Fonte antiga.

"Todos os soldados tinham a sua lavadeira. A lavagem da roupa era feita na tabanca com água retirada através do único furo, feito por uma companhia de caçadores estacionada em Fulacunda em 68/69 [ou melhor, 69/70], e que penso chamar-se “Boinas Negras” [ CCAV 2482, "Boinas Negras", subunidade que esteve em Fulacunda entre 30 de Junho de 1969 e 14 de Dezembro de 1970, data em que foi rendida e partiu para Bissau]. 

" Contudo, quando havia muita roupa para lavar, as lavadeiras deslocavam-se à fonte antiga, que se localizava na parte exterior do aquartelamento e portanto sujeita a “surpresas” [, acções do IN]."

Foto (e legenda): © Jorge Pinto (2014). Todos os direitos reservados.[Edição: Blogue Luís GRaça & Camaradas da Guiné]


A. Quatro  comentários aos poste P16229 (*)

Henrique Cerqueira  > 
"As lavadeiras também marcaram 
a nossa passagem pela Guiné"

Já tive aqui a oportunidade de escrever sobre as Lavadeiras na Guiné.

Tenho muito gratas recordações de todas as lavadeiras que encontrei. No entanto a que mais me marcou foi a lavadeira que tive em Bissorã.

Seu nome era Amélia. Era uma linda mulher, muito sensata e sempre bem disposta. Mais tarde quando a minha mulher (Ni) e meu filho Miguel se juntaram a mim em Bissorã,  a Amélia continuou a ser a nossa lavadeira e tornou-se grande amiga e até confidente da minha mulher. Pois que a Amélia era uma mulher muito educada e bastante esclarecida.

Não deixa de ser uma classe muito marcante durante a nossa comissão,pois que era um momento sempre esperado pelos militares a "hora das lavadeiras" quando iam aos aquartelamentos recolher as roupas para lavar.

Fosse qual fosse a intenção da malta, o que é certo é que eram momentos quase sempre de alguma alegria e de grande converseio com todas aquelas senhoras que, à hora certa,  lá apareciam em bandos e se espalhavam pelo aquartelamento.

Não haverá dúvidas que foram pessoas que também marcaram a nossa passagem pela Guiné.


José Diniz Carneiro de Sousa e Faro > 
"O preço da lavadeira era conforme o posto"


Em Cameconde onde estive um ano (de abril de 1968 a junho de 1969). , tive uma Lavadeira, esposa de um milícia de Cacine. 

O resto de tempo eram as esposas do meu pessoal que era de incorporação da Guiné. 

Em Bissau no QG eram aquelas que apareciam na messe dos Sargentos. As esposas dos meus camaradas do pelotão eram cuidadosas, nunca faltou um botão;  já em Bissau faltavam sempre os botões. 

O preço era consoante o pré: para o soldado mais barato, para  cabo mais caro; e depois sargento e oficial... Pelo menos em Cacine, Guiné 68/70


Vasco Pires > 
"No pelotão de artilharia, em Gadamael, 
herdei o ordenança e a lavadeira"


A rendição individual na Artilharia, muitas vezes era complicada (a minha inclusive); "a linha de montagem de Artilheiros" de Vendas Novas,por vezes não dava conta.

Foi o caso do meu antecessor em Gadamael,quando cheguei, estava desesperado para ir para casa.
Deveria me passar o Pelotão (material, estoque de granadas...etc.),a pressa era tanta, que só me apresentou os Furriéis e me passou o ordenança e a lavadeira.

Daí, dá para avaliar a importância da lavadeira naquele contexto. 


António J. Pereira da Costa > 
"Numa terra com tantas dificuldades, 
lavadeira era uma profissão 
que permitia aumentar o peculium familiar... 
Espero que o PAIGC não as tenha tratado 
como colaboracionistas""

Olá Camaradas

Para o irmão Kó-kósha um abraço especial.

Era realmente assim, em Cacine/Cameconde o preço a pagar era função do posto. Muito democrático e socialmente justo, portanto.

Partilhei a lavadeira com o capitão  da companhia. Era uma empresa familiar: às vezes vinha a Matilde que se queixava do Alfero Comprido que lhe dizia: Àbó é runho! Bó suma trutruga, À bó futucêro. À bó quer come mim

Vendeu-me um colar de conchas por 10 pesos. Quando lho pedi começou a desconversar, mas depois vendeu-mo e a Isabel ainda o tem.

Outras vezes vinha uma caboverdeana velhota que fazia um pitch-pach verdadeiramente espectacular.

Outra vezes a mulher do alfaiate que o PIDE prendeu e interrogou. A caboverdeana baixinha e velhota, cujo nome não recordo, era avó da Ami Silá, uma menina que tinha medo de mim e com quem nunca cheguei nem à fala.

No Xime,  era a Maria, viúva de um furriel dos Cmds Africanos e mãe do Balantazinho que jogava ori contra mim.

Em Mansabá,  era a Mariama, a quem eu dizia: dia ku muir cá tacompanhau interra. Nunca me faltaram os botões e a roupa da Isabel também foi bem tratada.

Espero que nenhuma tenha sido tratada como "colaboracionista" pelos guerrilheiros do PAIGC.

Numa terra com tantas dificuldades, lavadeira era uma profissão que permitia aumentar o peculium familiar...
____________

Nota do editor:

3 comentários:

José Botelho Colaço disse...

No dia 3 de Novembro de 1963 Quando desembarquei no cais de Pijiguiti em Bissau as primeiras frases que ouvi das nativas foram (jubi a bó mist labandeira) como era de esperar não percebi patavina, mas um dos velhinhos que nos recebeu traduziu é se tu queres lavandeira, a seguir fiz o contrato verbal com a lavandeira que se chamava Sábado e a ajuda do camarada 30 pesos por mês por ser praça se fosse sargento era 40 e oficial 50.

Um alfa bravo
Colaço.

José Botelho Colaço disse...

Deve-se ler lavadeira.

Antº Rosinha disse...

«Lanvanderra» para todo o serviço.
Havia colonos que chegavam a perfilhar todos os filhos da «sua lavadeira», que nasciam no seu quintal.
Nem todos saiam mulatos, mas ficavam todos no quintal onde nasceram.
Os livros que mais me entusiasmam e divertem, hoje, (com tanta confusão política hodierna), são aqueles que debatem, negam, renegam ou aplaudem o chamado colonialismo à portuguesa, e o luso-tropicalismo e a respectiva mestiçagem.
O último livro que me tem feito perder algum tempo é de uma jovem, Joana Gorjão Henriques por encomenda da Fundação Manuel dos Santos.
A Jovem deve ter ficado completamente baralhada com tanta informação contraditória que lhe forneceram.
Mas até agora ainda não vislumbrei este pormenor das lavadeiras para todo o serviço, que durante 500 anos foi uma "figura nacional" nos trópicos.
Deixemo-nos de complexos!
Pioneirismos são pioneirismos.
Cumprimentos