Ria de Aveiro > Ílhavo > 25 de agosto de 2010 > Um velho moliceiro que morreu na praia
1. Mensagem de Francisco Gamelas,com data de 3 do corrente
[Foto à direita: Francisco Gamelas, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 3089 (Teixeira Pinto, 1971/73), adido ao BCAÇ 3863 (1971/73). Engenheiro eletrotécnico de formação quadro superior da PT Inovação reformado, vive em Aveiro, e publicou recentemente "Outro olhar - Guiné 1971-1973". Aveiro, 2016, ed. de autor, 127 pp. + ilust. Preço de capa 12,50 €].
Bom dia Luís.
Também para partilhar contigo as emoções fortes e um tanto indefinidas, após a releitura do poema que publicaste no blogue [O Relim não é um poema] (*). Poema forte, como não podia deixar de ser, como um grito de revolta, como um dedo apontado ao absurdo, ao estupor, ao poder absoluto que esquece as pessoas, usando-as como peças descartáveis nos seus jugos de poder e afirmação. Contudo, evidenciando toda a mediocridade de que eram feitos, toda a inconsequente impulsividade de quem pode e manda sem correr qualquer risco.
Estou completamente solidário com tudo o que escreves, apesar de nunca ter estado na situação que descreves, mas que compreendo, quanto mais não seja, por proximidade. O meu grito,
engrossa o teu.
Junto reenvio os dois poemas sobre Aveiro, já corrigidos. (**)
Um grande abraço e obrigado pela partilha.
FG
Dois poemas sobre Aveiro
(depois de ler Entre sono e abandono, de Luís Serrano)
por Francisco Gamelas
I
Neblina
Água
Algas
Barco
Muito lentamente
uma forma de onda a quebrar
emerge da surpresa.
Traz no mastro
o quadrilátero duma vela
bamba.
Abriu-se uma cortina
para o moliceiro passar.
Pressente-se o respirar do silêncio.
Ao rés das águas
o verde saturado das algas
desliza
pairando nos braços etéreos
da neblina.
No espelho de água
nascem riscos em vê
ondulantes
que se alongam.
E a miragem vai passando
fantasmática
com um braço a acenar
até que a neblina
a volta a engolir
repondo a quietude da madrugada.
Os pássaros ainda dormem.
Junho de 2016
II
Água
Sol
Vento
Safra
Já só moram
nas memórias dos velhos
os inúmeros alvos seios
cristalizados
oferecendo ao céu
a sua nudez
dum puro branco alucinado
que as mãos do vento
acariciavam
gemendo baixinho
na dinâmica geometria
dos espelhos
morava o mistério
do parir das águas
fecundadas pelo sol
e assistidas pelo vento
é um cada vez
mais frio manto
de neblina
que vai cobrindo
o sono senil
do abandono
do esquecimento
em que dissolveram
o génio
a vontade
a persistência
do marnoto
resta
o crocitar agudo
de ave
a rasgar o silêncio
da recordação
enamorada
magoada
esvaecente
as sombras
espreitando o desistir
da luz
vão estendendo
sobre o esquife da memória
um lençol
de penumbra
até que a noite
caia
e cubra tudo de breu.
Junho de 2016
______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 2 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16259: Manuscritos(s) (Luís Graça) (86): O Relim Não é um Poema (à memoria do médico Joaquim Vidal Saraiva 1936-2015)
(**) Último poste da série > 3 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16262: Blogpoesia (456): "Mais uma vez..." e "Nova moeda de troca geral", por J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728
engrossa o teu.
Junto reenvio os dois poemas sobre Aveiro, já corrigidos. (**)
Um grande abraço e obrigado pela partilha.
FG
Dois poemas sobre Aveiro
(depois de ler Entre sono e abandono, de Luís Serrano)
por Francisco Gamelas
I
Neblina
Água
Algas
Barco
Muito lentamente
uma forma de onda a quebrar
emerge da surpresa.
Traz no mastro
o quadrilátero duma vela
bamba.
Abriu-se uma cortina
para o moliceiro passar.
Pressente-se o respirar do silêncio.
Ao rés das águas
o verde saturado das algas
desliza
pairando nos braços etéreos
da neblina.
No espelho de água
nascem riscos em vê
ondulantes
que se alongam.
E a miragem vai passando
fantasmática
com um braço a acenar
até que a neblina
a volta a engolir
repondo a quietude da madrugada.
Os pássaros ainda dormem.
Junho de 2016
II
Água
Sol
Vento
Safra
Já só moram
nas memórias dos velhos
os inúmeros alvos seios
cristalizados
oferecendo ao céu
a sua nudez
dum puro branco alucinado
que as mãos do vento
acariciavam
gemendo baixinho
na dinâmica geometria
dos espelhos
morava o mistério
do parir das águas
fecundadas pelo sol
e assistidas pelo vento
é um cada vez
mais frio manto
de neblina
que vai cobrindo
o sono senil
do abandono
do esquecimento
em que dissolveram
o génio
a vontade
a persistência
do marnoto
resta
o crocitar agudo
de ave
a rasgar o silêncio
da recordação
enamorada
magoada
esvaecente
as sombras
espreitando o desistir
da luz
vão estendendo
sobre o esquife da memória
um lençol
de penumbra
até que a noite
caia
e cubra tudo de breu.
Junho de 2016
______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 2 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16259: Manuscritos(s) (Luís Graça) (86): O Relim Não é um Poema (à memoria do médico Joaquim Vidal Saraiva 1936-2015)
(**) Último poste da série > 3 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16262: Blogpoesia (456): "Mais uma vez..." e "Nova moeda de troca geral", por J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728
2 comentários:
Temos poeta!... Continua... A ver se a gente se encontra na Costa Nova, lá para agosto, nas férias, com o Jorge Picado, o Manuel Reis e outros camaradas da Guiné... Ab. grande.
De facto, estes poemas sobre Aveiro, lindos, direi mesmo magníficos, julgo poder adiantar ao Francisco que se dirigem, não a Aveiro cidade, mas a quase toda a região da Nossa Ria de Aveiro.
Parabéns Francisco e grande abraço
JPicado
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