Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 12 de julho de 2017
Guiné 61/74 - P17570: Os nossos seres, saberes e lazeres (221): Poço Corga, Mosteiro e o meu jardim perfumado (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 23 de Março de 2017:
Queridos amigos,
Assim como há sugestões para a culinária, para fazer uma garrafeira ou passeios de fim-de-semana, venho fazer a apologia de um jardim que pode ser campestre ou a fazer numa porção de terra à beira de casa, em meio citadino.
É uma satisfação chegar a este cantinho de Pedrógão Pequeno e ver os efeitos de devotadas aplicações, de telefonemas regulares a um residente que aceitou o mister de cortar a relva e de regar nos tempos de quentura.
Chegar em Março e ver este colorido é como se estivesse a ser tocado num piano uma sonata à Primavera, ao renascimento da terra depois dos silêncios invernais.
Um abraço do
Mário
Poço Corga, Mosteiro e o meu jardim perfumado
Beja Santos
Depois de visitar a mais bela magnólia do mundo em Castanheira de Pera, foi até um arrabalde, a praia fluvial de Poço Corga, quando vivia em Casal de Matos trazia sempre aqui os amigos, mesmo com água fria no verão, as crianças exultam, a vegetação envolvente é acolhedora. Daqui segui para outra praia fluvial, já no concelho de Pedrógão Grande, Mosteiro, a Benedita está à espera do Verão para aqui bracejar. Mosteiro goza do caudal límpido da Ribeira de Pera, os passeios pedestres são encantadores outrora houve moinhos, lagares, hortas, levadas, ficaram os vestígios, quem gosta de um pouco de aventura e descoberta da natureza tem aqui imensas possibilidades.
Quando cheguei a Pedrógão Pequeno a casa era uma ruína e o jardim estava em estado caótico, o abandono da natureza paga-se caro. A casa foi refeita, manteve-se toda a traça original, escrupulosamente, reteve-se que o velho bairro da EDP (hoje bairro do Cabril) é uma pequena jóia arquitetónica, por aqui andou a mão de um dos maiores arquitetos modernistas, Jorge Segurado.
Falemos do jardim. O casario assenta em toneladas de granito, a terra era rala ou até inexistente. Ao tempo da fundação do bairro (inícios da década de 1950) houve o cuidado de trazer boa terra preta, fizeram-se aviários, preparam-se as videiras, plantaram-se árvores de fruto. Encontrei terra, o escombro do aviário, algumas curiosidades de vinha, a tangerineira e três laranjeiras a precisarem de cuidados. Arrancaram-se as ervas, muitas, escolheu-se o sítio certo para o chorão, guardaram-se algumas videiras, começou a saga experimental para flores e algumas árvores de fruto. As túlipas não se dão mal, os chorões andam felizes, tal como os catos, planta-se com sucesso bons dias, lilases, dálias, frísias, sardinheiras de várias cores, fúcsia, rododendro, japónica, glicínia, lírios roxos, brancos e violetas, às vezes despontam rosas, e os red hot poker crescem fluorescentes. Vamos ver o produto final, imagens de Março.
Coitada da túlipa amarela, com pintalgado tão bonito, está a dar as últimas, já não tem forças para fechar.
Gosto muito deste lírio roxo, parece que tem olhinhos penetrantes, está cercado de alfazema e de catos, dura pouco mas enquanto dura faz muita figura.
Temos sido muito bem-sucedidos com o osteospermo, os malmequeres, as azálias, a tibouchina, são manchas penetrantes de cor, andasse por aí um Van Gogh e não desdenharia de pôr o cavalete em frente de coloridos tão ardentes.
Uma boa parte o jardim está coberta com esta planta australiana cujo nome desconheço, expande-se, precisa regularmente de controlo. Dá uma flor estranhíssima, parece a cabeça de um abutre. Haja as reticências que houver, enche de verde largas manchas do jardim. Que continue a cumprir o seu dever.
Um jardim assente numa falda de colina, de onde se desfruta quilómetros de panorama à volta, quer mil cuidados, um desvelo perpétuo: endireitar as videiras, cuidar da japónica, ver como evoluem os dióspiros e a ameixoeira, e o muito mais que se sabe. Descanso a arrancar as ervas daninhas, a cortar, a regar e sempre a varrer. É uma atividade física que recomendo a qualquer septuagenário: ter um jardim perfumado lembra as linhas da vida, permite consolos e constantes dissabores, suspiros, gastos e a alegria impagável de ver crescer o que se pôs em semente. Desejo a todos um jardim perfumado como este. Por detrás, está o entusiasmo e a devoção e à frente a ciência certa de que não há jardins imóveis, o cuidado é constante.
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Nota de rodapé:
Felizmente que as áreas aqui retratadas não foram atingidas pelo fogo que devastou Pedrógão Grande e arredores
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Nota do editor
Último poste da série de 5 de julho de 2017 > Guiné 61/74 - P17547: Os nossos seres, saberes e lazeres (220): São Miguel: vai para cinquenta anos, deu-se-me o achamento (9) (Mário Beja Santos)
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