1. Comentário (*) do nosso camarada Manuel Luís R. Sousa (sargento-ajudante da GNR na situação de reforma; ex-soldado da 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4512/72, Jumbembem, 1972/74; autor do livro "Prece de um Combatente - Nos trilhos e trincheiras da guerra colonial" (2012) (**): tem 46 referências no nosso blogue, e entrou para a Tabanca Grande em 31/3/2011.
A MORTE DO ALFERES NUNO GONÇALVES DA COSTA
por Manuel Luís Rodrigues Sousa
(excerto do meu livro "Prece de um Combatente", 2012, imagem da capa à esquerda).
Em março ou abril de 1973, Jumbembém foi reforçado com um pelotão de militares nativos, para suprir a falta do 1.º pelotão acabado de ser colocado em Canjambari, um quartel a sul de Jumbembém, a cerca de doze quilómetros, juntamente com outro pelotão de Cuntima, em substituição de uma companhia que dali foi retirada.
Desse pelotão de nativos, o Pel Caç Nat 51, apenas os comandos, o alferes, Nuno Gonçalves da Costa, e um furriel, eram de origem metropolitana.
Num dia em que se realizava a habitual coluna de reabastecimentos a Jumbembém, Cuntima e Canjambari, a 16 de julho de 1973, um dos elementos deste pelotão pediu ao alferes Costa, ao seu comandante, para o deixar seguir na coluna de Jumbembém para Cuntima para visitar familiares.
Tratando-se de um militar rebelde e indisciplinado, como forma de o castigar, o alferes não autorizou a sua deslocação a Cuntima.
Perante esta recusa, o referido militar deslocou-se ao quarto do alferes, em fim de comissão e quase formado em medicina, com um futuro promissor pela frente, disparando contra ele dois ou três tiros de G3, atingindo-o na região do abdómen.
Foi-lhe prestada a assistência possível na enfermaria, enquanto se aguardava a evacuação por meios aéreos que entretanto foi pedida.
Passada pouco mais de uma hora veio a falecer, perante a impossibilidade de ser evacuado por falta desses meios aéreos, cujo uso era já particularmente restritivo, em consequência dos mísseis Strela ao dispor do PAIGC.
Este caso ilustra bem a perda do controlo aéreo na Guiné das Forças Armadas Portuguesas a que faço referência noutra parte do livro.
O referido alferes Costa era natural de Campos de Sá, S. Jorge, Arcos de Valdevez.
Após a sua morte, foi substituído pelo alferes Francisco Silva. Foi nestas circunstâncias que o alferes Silva chegou a Jumbembém.
Que descansem em paz o alferes Silva, bem como malogrado alferes Costa. (****)
30 de janeiro de 2023 às 19:24
30 de janeiro de 2023 às 19:24
(Revisão e fixação de texto: LG)
__________
Notas do editor:
(**) Vd. poste de 21 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10835: Notas de leitura (441): "Prece de um Combatente Nos Trilhos e Trincheiras da Guerra Colonial", por Manuel Luís Rodrigues Sousa (2) (Mário Beja Santos)
15 de junho de 2019 > Guiné 61/74 - P19892: 15 anos a blogar desde 23/4/2004 (9): Relembrando o cobarde assassinato em Jumbembem, em 16/7/1973, do alf mil op esp / ranger Nuno Gonçalves da Costa, natural de Arcos de Valdevez, cmdt do Pel Caç Nat 51, substituído depois pelo Francisco Justino Silva, hoje médico ortopedista (Fernando Araújo, ex-fur mil op esp / ranger, 2ª CCAÇ / BCAÇ 4512, Jumbembem, 1972/74)
5 de abril de 2010 > Guiné 63/74 – P6249: Estórias avulsas (85): Como foi assassinado o Alf Mil Op Esp Nuno Gonçalves da Costa, do Pel Caç Nat 51 (Fernando C. G. Araújo)
5 de abril de 2010 > Guiné 63/74 – P6249: Estórias avulsas (85): Como foi assassinado o Alf Mil Op Esp Nuno Gonçalves da Costa, do Pel Caç Nat 51 (Fernando C. G. Araújo)
(...) Presumo que o alferes devia estar deitado. Deve ter-se levantado e foi nessa altura que o homem pegou na G3 e, traiçoeiramente, disparou três tiros à queima-roupa sobre o oficial português.
Este último ainda foi levado para a enfermaria, onde se prestaram os primeiros socorros, ao mesmo tempo que foi pedido, com a maior urgência, a sua evacuação aérea. Como estava a perder muito sangue, foi pedido sangue e, voltou a ser pedido insistentemente, o máximo de urgência na sua evacuação, que tardava em aparecer.
E tanto tardou que o alferes não resistiu aos ferimentos e faleceu, sem que aparecesse qualquer meio aéreo para o socorrer. Esta situação indignou todo o pessoal da companhia, desde o soldado até ao comandante.
O nativo foi preso com arames nos pulsos, atrás das costas, enquanto os próprios elementos do Pel Caç Nat 51, bem como a milícia queriam fazer justiça pelas próprias mãos (linchá-lo). Valeu-lhe o nosso comandante, que ordenou:
- Não lhe toquem!
Mas, mal ele virava as costas, alguns militares mais revoltados descarregavam a sua ira em cima do assassino, que foi depois colocado na casa do motor (gerador), que se situava ao lado do tanque da água.
Ali permaneceu o prisioneiro até meio da tarde, altura em que o nosso comandante, penso que por causa da evacuação não se ter efectuado e achando que o comandante em Farim teve alguma culpa nesta falta, resolveu ir a Farim levar o corpo do alferes em sinal de protesto.
Deslocamo-nos então numa coluna motorizada (já não sei quantos nem quais pelotões), com o corpo do defunto numa viatura “Berliet” e uma bandeira nacional a cobri-lo, até Farim (sede do Batalhão 4512).
A coluna fez-se sem fazer a habitual picagem, tal era a revolta, desagrado e excitação que grassava em todo o pessoal da Companhia. Um risco acrescido, mas justificado pela hora tardia para o fazer.
Viam-se aqui e ali soldados e graduados com as lágrimas nos olhos, chocados com um desfecho fatídico que o alferes assassinado não merecia, porque todos eram conhecedores e concordantes de que ele era boa pessoa e bom para os nativos do Pel Caç Nat 51. Talvez bom demais, ainda hoje o penso e digo! Segundo ouvi dizer na altura, ele, quando isso lhe era solicitado, inclusive emprestava dinheiro aos militares do seu pelotão.
A coluna chegou à entrada de Farim, abrandou mais um pouco e continuou a sua marcha, enquanto os militares que a compunham saltaram para o chão e acompanharam as viaturas a pé. Ao passar defronte ao edifício de comando, estava em posição de sentido e continência um graduado (ou era o comandante - Ten Cor Vaz Antunes -, ou o 2º comandante Major Menezes, já não me lembro bem).
Este é o relato com que fiquei gravado no pensamento desse dia.
Também trouxemos o nativo assassino que, pelo caminho fora na viatura onde seguia, alguns soldados, em certas alturas do percurso, continuaram a dar-lhe o “tratamento especial”, tendo o mesmo chegado a Farim num estado físico muito debilitado.
Disseram-me posteriormente que ficou preso em Farim e depois seria enviado para a “Ilha das Cobras”.
Para substituir o comando do Pel Caç Nat 51, foi destacado o alf mil at inf Francisco Silva (madeirense), que apareceu na 2ª Companhia do BCAÇ 4512 logo após esta tragédia. (...)
1 comentário:
Assisti a casos que devido ao stress nem dão para comentar, certo dia uma vez um soldado metropolitano deu-lhe na mona sem motivo aparente a não ser a fraqueza e também o alcoól, porque ele só o que dizia era que queria matar o capitão, quero matar o capitão e então era um entre os vários amigos dele que o guardavam para ele não fazer disparate. Dizia com a calma que o caracterisava eu já lhe disse para ele guardar isso para amanhã mas ele não quer! Passado momentos que embora não muito longos mas para quem o guardava pareciam ser um pesadelo eterno sem solução. O soldado adormeceu e quando acordou passado umas horas felizmente já estava calmo. Colaço.
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