O Raul Albino com a ajuda do fotógrafo Maurício Esparteiro, ex-1º cabo, concebeu e realizou uma ideia original: um livro da CCAÇ 2402 onde todos e cada e um são gente... Do capitão ao soldado básico, toda a gente teve lá a sua foto, o seu espaço (**)...
Além disso, cada um dos camaradas da CCAÇ 2402 podia ter uma versão única e original do livro, com registos exclusivos sobre a sua pessoa... Com uma pontinha de orgulho, o Raul e o Maurício mostraram-me, no encontro em Pombal, em 2007, um exemplar do seu livro: cada exemplar saíu da tipografia a 8 euros, sendo vendido a 10 euros, para cobrir as quebras e as borlas ...
No II Volume, que continuou a ter a coordenação fotográfica do Maurício Esparteiro, o Raul contou ainda com a participação especial do ex-cmdt da companhia, Vargas Cardoso, e do ex-fur mil SAM, João Bonifácio (que vove hoje no Canadá).
Hoje publicamos mais uma pequena história (***) do Mário Vargas Cardoso (1935-2023), ex-cor inf ref, que há dias nos deixou, e e, que fez uma confidência: terá sico em Có que o "periquito" do brigadeiro António Spínola, inspirando-ase no exemplo dos "Lynces de Có", que se reuniam regulamente com os "homens grandes" e restante população local, decidiu criar os famosos "Congressos do Povo".
No nosso blogue, o Raul Albino também já havia publicado, no devido tempo, 18 postes com episódios da história da CCAÇ 2402 (*).
Mário Vargas Cardoso (1935-2023)
Spínola: "Ó Vargas, deste-me uma ideia: vamos lá fazer essas reuniões de Có mas a nível de toda a Guiné, e chamar-lhe Congressos do Povo"
por Vargas Cardoso
Uma das atividades dos "Lynces de Cõ" em que fomos originais, e que muito contribuiram para o êxito no cumprimento da nossa missão, foram as reuniões no domingo logo pela manhã.
(...) Pela manhã dos domingos, ao içar da Bandeira Nacional, o comandante da CCAÇ 2402 dava indicação a todos os "homens grandes", chefes da tabanca (...) para comparecerem no quartel, e, às crianças da escola primária, para virem ao quartel também, juntando-se todos próximo do mastro da bandeira.
(...) À hora indicada, formava-se o pessoal de guarda; ao lado as crianças da escola, e o Vargas com os "homens grandes" atrás da formatura.
A bandeira era içada, o corneteiro tocava, os "homens grandes" descobriam a cabeça, e os miúdos da escola, algum tempo depois, já cantavm o hino nacional.
Após a cerimónia, o comandante com os "homens grandes" iam para o refeitório, onde se servia um pequeno almoço, café e pão com marmelada, aos chefes da tabanca. Depois com os oficiais e sargentos com funções de "governar" na nossa área, decorria uma reunião, onde os chefes da tabanca colocavam os pedidos de ajuda que precisavam: transporte de mancarra ou coconte para Bissau, apoio sanitário, escola, proteção para colheitas, etc.
O nosso furriel Coelho, ou depois o Vieira (salvo erro), tinha a função da atividade psicossocial, tomavam nota dos pedidos e depois era a nossa vez de pedir a colaboração das populações. Por exemplo: tantos homens para capinar; na 3ª feira, 40 galinhas; noutro dia, outro produto que nos fizesse falta. etc.
(...) Logo em outubro de 1968, já depois do ataque a Có (*). nós estávamos numa dessas reuniões quando chegou o héli com o nosso general Spínola [na aitura ainda brigadeiro] (****), o qual convidei para assistir ao que estávamos a fazer.
Nunca vos contei o que agora resolvo tirar do segredo da História. Como sabem, quando ia Bissau, normalmente o nosso "Homem Grande", convidava-me para almoçar no palácio do Governo com outros oficiais de passagem por Bissau. (...)
Depois dessa visita o gen Spínola disse-me um dia: "Ó Vargas, deste-me uma ideia. Vamos fazer essas reuniões que tu fazes lá em Cõ, mas com toda a Guiné. Vou-lhes chamar Congressos do Povo". (...)
[Seleção / Revisão e fixação de texto / Subtítulo / Negritos / Parèntses retos: LG]___________
Notas do editor
(*) Vd. poste de 31 de julho de 2007 > Guiné 63/74 - P2016: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (6): O grande ataque a Có, em 12 de Outubro de 196823 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1105: Como escrever um livro de memórias de guerra 'à la carte' (Raul Albino, CCAÇ 2402)
4 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1246: O meu livro Memórias de Campanha da CCAÇ 2402 (Raul Albino)
4 comentários:
Era sincero, o Spinola ? Tanto se "brincou" à democracia, que ela tinha que acontecer...
O papel de Spinola como governador
da Guiné está mal conhecido e mal documentado nosso blogue. E é, de resto, uma das grandes falhas da sua principal (e única) biografia, a do Luís Vasconcelos (cito o nome do biógrafo de cor, não tenho a certeza).
Os militares valorizavam mais o seu papel como com-chefe. É um silêncio injusto. A avaliação desse papel também está "inquinada" pela ideia com que se ficou dele, como político, depois do 25 de Abril.
Spínola era "sincero"?
Como agora conheço a palavra, vou usá-la e abusá-la: Spínola era "insincero?
Luis Graça, podemos afirmar que Spínola, como todos nós que lá estivemos, usávamos a psíco como uma arma de dois gumes.
Spínola em 1968 já vinha de Angola com a política bem estudada, onde já os governadores de distrito já tinham o povo na mão virado contra os movimentos, e como Spínola também veio a pôr o povo do seu lado garantidamente, apenas que as circunstâncias geográficas na Guiné eram demasiado desfavoráveis militarmente.
E sem dúvida que essa política de cativar o povo, dividiu as hostes mesmo dentro dos próprios movimentos.
Havia uma regra defendida pela psico "colonialista" que os movimentos liderados por "intelectuais" contra a qual lutavam com unhas e dentes, dentro de uma política socialista, comunista anti tradicional.
Luis Graça, a regra era exactamente esta, uma das cinco que o Spínola mencionava:
(ii) respeito pelas nossas instituições tradicionais africanas;
Aqui estava a faca de dois gumes, por um lado era o respeito pelos velhos régulos e mantendo o status tribal com todas as regras tradicionais, o que implicava "nada de ideias avançadas".
Por outro lado, desarmava as "ideias avançadas" dos estudantes do império tipo Amílcar Cabral, que eram abertamente avessos às autoridades tradicionais africanas.
Claro que o europeu nunca usou "total" sinceridade em África.
Nem na colonização nem na descolonização.
Só que na descolonização houve mais cinismo!
Não na descolonização portuguesa, que aqui foi desistência, abandono.
Rosinha, ainda estou por descobrir que foi o "ideólogo" da "Guiné Melhor", a política que o Spínoça quis implementar durante o seu consulado e que chegou a ser uma ameaça série ao PAIGC...
Por outro lado, cponcordo contigo: princípios como o "respeito pelas nossas instituições tradicionais agfricans" era uma faca de dois gumes... Havia tradições como o patriarcado, a gerontocracia, a poligamia, o casamento precoce e forçado, o fanado feminino, etc., conytra os quais os mais jovens (rapazes e raparigas) se podiam rebelar...
Nem o Spínola nem o Amílcar Cabral alguma vez levantaram a voz, por ezxemplo,contra a crueldade e a brutalidade da "mutilação genital feminina", por exemplo!...
Por outro lado, tenho ideia que o "Congresso do Povo" foi melhor aceite por grupos étnicos com maior tradiçáqo de "cooperação" com os "tugas" (e mais avessos ao PAIGC) como os manjcos e os fulas...
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