quarta-feira, 3 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25331: S(C)em Comentários (31): Os reordenamentos no desenvolvimento socioecnómico das populações (Luís Graça)


Guiné > Zona Leste > Região de  Bafatá  > Setor L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (1969/71) > Destacamento de Nhabijões   > O 1º  cabo António Mateus, no  espaldão da bazuca 8.9. Um grupo de combate, constituído por "inválidos de guerra", de várias subunidades, defendia o reordenamento de Nhabijões que era tão grande (mais de 300 casas) que era praticamente impossíve garantir a sua efetiva defesa e sobretudo impedir que a população continuasse a manter contactos com os seus "parentes no mato"...

Foto do álbum do 1º cabo aut inf, CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, António Mateus, que  foi gravemente ferido na Op Pato Rufia, em 7 de setembro de 1969, e evacuado para o HM 241. Eu estava a escassos metros dele. 

Depois de ter estado emigrado em França. fixou-se em Guifões, Matosinhos onde é vizinho do Albano Costa, e tem hoje o seu negócio próprio.

Depois de regressar do hospital, em data que já não posso precisar (talvez finais de 1969, princípios de 1970), o António Mateus foi integrado na força que defendia o destacamento do reordenamento de Nhabijões, composto por militares (em geral, com algum "handicap" físico, resultante de ferimentos em combate ou acidente) da CCAÇ 12, da CCS / BCAÇ 2852 (e depois do BART 2917) e outros (como o Pel Caç Nat 52). Creio que ficou lá o resto da comissão. Também eu passei por lá, por Nhabijões...  E na Op Pato Rufia estava a seu lado. (LG)


Foto: © António Mateus (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]




Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Nhabijões > 1970 > CCS/BART 2917 (1970//2) >

"Trocando a espada pelo arado", ou melhor, a G3 pela pá, a pica e a enxada... Pessoal da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) nos trabalhos do reordenamento de Nhabijões, um conjunto de aldeias sob duplo controlo, junto ao Geba Estreito, pertencente ao posto administrativo de Bambadinca, sede do Sector L1, Zona Leste. 

Foto de finais de 1970 gentilmente cedida pelo Luís Moreira, ex-alf mil sapador da CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72). O Moreira será vítima de mina A/C em 13 de Janeiro de 1971. Fazia parte da equipa do reordenamento de Nhabijões. A CCAÇ 12 também deu meia dúzia de elementos, que foram receber formação específica em Bissau, no BENG 447.
 
Foto: © Luís Moreira (2005)Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]




Guiné > Zona Leste > Região de  Bafatá  > Setor L1 (Bambadinca) >  Destacamento e reordenamento de  Nhabijões > CCAÇ 12 (1969/71) /BART 29187 /1979/72)  >1970 > Luta balanta, presenciada por militares destacados para protecção do reordenamento (à esquerda, o fur mil  Henriques, da CCAÇ 12, de calções, tronco nu e óculos escuros... Ao fundo, a nova tabanca, reordenada).

Foto do arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-fur mil at inf, op esp,  CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]



1. Em geral, todos os reordenamentos implicavam sempre algum tipo de violência e conflitualidade, de parte a parte, das NT, das populações "reordenadas" e do PAIGC a quem a população era subtraída...

A minha única experiência foi o reordenamento de Nhabijões, um dos maiores, senão o maior do CTIG, no setor L1 (Bambadinca)...Nunca fiz parte da equipa do reordemanento, mas estive lá destacado com um Gr Comb, pelo menos uns tempos... E apanhámos lá com duas minas A/C...em 13/1/1971... Mas já antes, a partir do final de  1969, no início do estudo do reordenamento, ao tempo do BCAÇ 2852 (1968/70), fazíamos patrulhamentos deste vasto núcleo populacional disperso. 

Hoje gostava de ter tido informação detalhada sobre a concepção, planeamento e implementação do reordenamento de 6 núcleos populacionais de Nhabijões (um mandinga e cinco  balantas)...

Tenho dúvidas sobre a "metodologia" usada pelas NT e a administração civil para levar a bom termo o reordenamento...Mas é altura de recordar aqui os princípios definidos na brochura "Os reordenamentos no desenvolvimento sócio-económico das populações". Província da Guiné, Bissau: QG/CCFAG [Quartel General do Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné]. Repartição AC/AP [Assuntos Civis e Acção Psicológica]. s/d.

(...) "Não devendo em princípio existir um carácter de obrigatoriedade quanto à deslocação das populações das suas tabancas para um aldeamento, a não ser que o interesse comunitário superiormente o determine, há que empregar meios persuasivos quando se encontre alguma resistência."

(...) Esquematicamente vemos, assim:

(i) Antes da construção:

- Auscultação das populações (indirecta, directa);
- Auscultação e elucidação do Chefe da Tabanca;
- Auscultação e elucidação do Guarda de "Irã";
- Auscultação e elucidação das autoridades religiosas islâmicas.

(ii) Durante a construção;

- Garantir a autoridade constituída;
- Garantir, tanto quanto possível, os interesses da localização dos aglomerados correspondentes às antigas tabancas, dentro do plano urbanístico;
- Respeitar os usos e costumes das populações:
- Colaborar no transporte de todos os haveres das populações deslocadas;
- Interessar as populações na construção das casas, escolas, postos sanitários, etc., permitindo e desenvolvendo o sentimento de posse." (...)



2. Veja-se o que o Carlos Fortunato aqui (*) escreveu sobre o reordenamento de Nhamate, que começou a ser construido por volta de 1970:

(...) "A nossa missão junto da população foi calma, em geral mostrou-se afável e colaborante, embora fosse clara a tristeza por abandonarem a sua antiga casa. Notou-se alguma influência da guerrilha, pois dois elementos da população (guerrilheiros?) chegaram a desafiar abertamente a nossa autoridade, um acabou por ser preso e o outro por ser morto, depois destes incidentes, as relações com a população foram sempre excelentes.

(...) Este reordenamento tinha não só o objectivo de retirar a população do controlo do PAIGC, mas também de reforçar a defesa nesta zona, dado que com os novos foguetões 122mm, seria fácil à guerrilha atingir Bissau a partir daqui.

(...) Esta acção obrigou o PAIGC a retirar da zona, o que fez de má vontade ... e com muita saudade, a julgar pelas visitas a Nhamate, cuja defesa estava a cargo do alferes Pimenta, outro dos rangers que integravam a companhia." (...)


___________


(**) Último poste da série > 3 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25330: S(C)em Comentários (30): Os reordenamentos no desenvolvimento socioeconómico das populações (Cherno Baldé, Bissau)

9 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Pobre Mateus, levaste um tiro na rótula, na Op Pato Rufia... Onde tivemos o nosso primeiro morto, a CCAC 12, estava a teu lado...

Sempre tive sorte com os tiros do PAIGC... E até com a mina A/C em Nhabijoes em 13 de janeiro de 1971...

Sempre tive muita sorte debaixo de fogo...

Não sei o que pode acontecer na próxima guerra. LG

Cherno Baldé disse...

Caros amigos,

Na zona Nordeste, a partir de 1969, conheci alguns casos de reordenamentos, mas que nao tinham implicado o deslocamento da populacao, simplesmente tratava-se de novas habitacoes de modelos rectangulares, com paredes de blocos de terra e coberturas de zinco em substituicao das palhotas. E, ao mesmo tempo, as autoridades aproveitavam para proceder ao ordenamento das residencias segundo o modelo urbanistico europeu de arruamentos. Foi o que aconteceu com algumas aldeias que tinham sido vitimas de ataques brutais em que as palhotas tinham sido incendiadas sem piedade.

Este tipo de ajuda em forma de reordenamentos no Nordeste, aconteceu sempre de forma pacifica e sem grandes transtornos e que se, por um lado, parecia ter melhorado as condicoes de habitacao as populacoes beneficiarias, logicamente, tambem tinha criado situacoes novas que exigiam diferentes formas de abordagens das autoridades locais a fim de gerir os conflitos e o mal estar dai resultantes. Sobretudo, foi mais complicado para quem estava habituado a viver isolado na sua propria tabanca e/ou era criador de animais (gado bovino).

Mas, as populacoes da zona, maioritariamente fulas e mandingas, souberam conformar-se, adaptando-se e improvisando formas de fugir a promiscuidade do viver em conjunto de forma aberta e ao calor insuportavel das chapas de zinco.

E, suponho que seria completamente diferente nos casos em que os reordenamentos eram feitos com a obrigacao de fazer deslocar as populacoes e, independentemente das origens e de pertenca etnica, as mudancas de local de residencia sao sempre problematicas e mexe com tudo na vida de uma familia, da estrutura a superestrutura social e cultural do individuo ou da familia.

No caso em concreto referido no texto, acho que, atendendo as circunstancias do acontecimento, foi tudo reduzido ao simples facto de potencialmente pertencerem a guerrilha, julgamento que, na minha opiniao, teria sido muito simplista e redutora, para nao dizer preconceituosa. Ė sabido que os Balantas, pelos seus habitos e cultura detestam a imposicao vinda de cima, pois tratava-se de um grupo pouco inclinado a receber ordens d’outrem fora da estrutura familiar, isto porque na sua propria etnia nao havia uma autoridade central que ditava as regras e, depois podia tratar-se de individuos que faziam questao de manter sua vida privada e suas actividades em segredo. Estes individuos nunca aceitariam de boa fe as ordens vindas de terceiros e que iriam complicar a sua vida e seus habitos. E isto nao tinha que ser visto so do ponto de vista da guerra e das suas diferentes trincheiras como se pensava na altura.

Com um abraco amigo,

Cherno AB

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Os balantas foram a "carne para canhão" do Partido do Amilcar Cabral, quer como combatentes quer como civis (fornecedores de trabalho forçado, carregadores, produtores de arroz, etc.).

Só tardiamente, no tempo do Spinola,, se reconheceu (e procurou corrigir) a violência e os abusos de que eles foram vítimas no passado, por parte das autoridades (militares e civis) bem como dos comerciantes.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O PAIGC usou também o ódio tribal (contra os fulas) para "arregimentar" os balantas para a sua causa...

Para o Amílcar Cabral, o balanta era o "bom selvagem"... E como não tinha lideres, foi fácil enquadrá-lo. Fala-se pouco destas questões "delicadas"...


Tabanca Grande Luís Graça disse...

O Cherno tem razão, a chapa de zinco tinha o efeito de estufa... Ainda no meu tempo assisti a rápida transformação das casas de Nhabijoes: portas e janelas foram tapadas... Possiveis razões: luta contra o mosquito e controlo da temperatura...Mas Cherno deve ter outras explicações.

As primitivas casas, junto ao rio, cada tinham so uma pequena entrada.... E o interior era completamente escuro...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Na Argélia e no Vietname houve uma política brutal de deslocamento e reagrupamento de populações. Na Guiné foi tudo mais "soft".

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Conhecendo como conheci o comando dos dois batalhões a que estive "adido", o BCAC 2852 e o BART 2917, tenho dúvidas sobre o processo de consulta, negociação e decisão sobre o reordenamento do núcleo populacional de Nhabijoes...

Julgo que se seguiu a metodologia do "eu quero, posso e mando"...

Tenho pena que a equipa que lá esteve nunca tenha escrito nada sobre a sua experiência...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

É evidente que as duas A/C colocadas à saída do reordenamento de Nhabijoes, na estrada para Bambadinca, foram colocadas com a convivência da população....

Quando o Unimog 411 accionou a primeira, por volta das 11h do dia 13 de Janeiro de 1971 (ia buscar o almoço, como de costume), não ia nenhum civil à boleia com a tropa...

Era assim, brincava-se ao gato e ao rato...

Valdemar Silva disse...

Sempre me fez confusão a utilidade da bazuca na guerra contra o PAIGC.
A bazuca foi concebida para ser utilizada contra tanques ou outras viaturas e construções do IN.
O PAIGC não tinha viaturas nem construções fixas para ser utilizada a bazuca.
Saíamos para uma operação/emboscada e qualquer pelotão tinha a secção da bazuca com o apontador e os outros elementos carregavam as granadas. Muitas granadas eram esquecidas no terreno e quando passávamos por algum quartel, no caso a minha CART11 por Piche, havia sempre gamanço de granadas de bazuca.
Mesmo que utilizando a bazuca contra o IN a granada tinha de ser apontada a uma árvore p.ex. para provocar explosão com estilhaços. Já o RPG-7 do IN utilizava para atingir viaturas e construções dos nossos quarteis.
O caso da nossa bazuca, do IN sem tanques ou construções, faz-me lembrar os de Operações Especiais na Guiné, sem pontes ou instalações militares do IN para dinamitar.

Valdemar Queiroz