terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Guine 63/74 - P2363: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (6): Parte V: O primeiro interrogatório da prisioneira (Mário Fitas)

Guiné > Região do Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968> Um prisioneiro do PAIGC.

Foto: © A. Marques Lopes (2005). Direitos reservados.

Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 1621 (1966/68)> Obus 14

Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 1621 (1966/68)> Canhão s/r 5,7

Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 1621 (1966/68)> Pista aviação de Cufar

Fotos: © Hugo Moura Ferreira (2007). Direitos reservados. (Com a devida vénia... Do sítio do Moura Ferreira > Fotografias Fotografais cedidas ao HMF pelo pessoal da CCAÇ 1621).


PAMI NA DONDO, A GUERRILHEIRA (1)
por Mário Vicente
Prefácio: Carlos da Costa Campos, Cor
Capa: Filipa Barradas
Edição de autor
Impressão: Cercica, Estoril, 2005
Patrocínio da Junta de Freguesia do Estoril
Nº de páginas: 112




Edição no blogue, devidamente autorizada pelo autor, Mário Vicente Fitas Ralhete (ex Fur Mil Inf Op Esp, CCAÇ 726 : Revisão do texto, resumo e subtítulos: Luís Graça.


Parte V - Pami é sujeita ao primeiro interrogatório dos Lassas e sofre com a sua separação de Malan (pp. 40-47) (1)




© Mário Fitas / 2007). Direitos reservados.

Resumo do episódio anterior (2):

Madrugada de 24 de Agosto de 1965, Pami e Malan dormiam nos braços um do outro quando a tabanca, Cobumba, sofre um golpe de mão do exército português, que tem a assinatura dos Lassas.

No grupo de prisioneiros que são levados para Cufar, estão Malan e Pami que terão destinos diferentes. Pami estão integrada num grupo de cinco mulheres e procura nunca denunciar a sua condição de professora. Em caso algum falará recusará falar em português ou em crioulo. Mas os seus olhos de águia vão observado tudo, no caminho até ao quartel dos Lassas. No rio Cadique o grupo embarca em lanchas da Marinha. O Alferes Telmo não deixa que ninguém toque nas mulheres. Fala em psico, uma palavra que Pami desconhece. O grupo é entregue à guarda ao Furriel Mamadu.

Pami mal recinhece a antiga fábrica de descasque de arroz, a Quinbta de Cufar, onse se instalaram os Lassas. Os prisioneiros são recebidos por militar dos óculos que, mais tarde Pami vem a saber tratar-se de Carlos, O Leão de Cufar, comandante do aquartelamento. Homens e mulheres são instalados em sítuios diefrentes. Malna e Pami entrecuzram o olhar, sem se denunciaram. Sabem que dizem ali adeus para sempre. Lágrimas nos olhos, Pami sente a dor da separação. )Pami e as prisioneiros ficam à guarda da milícia de João Bacar Jaló. Recusa-se a comer, bebe só água. No dia seguinte, a vida no aquartelamento retoma o seu ritmo. Pami pode agora ouvir e até ver perfeitamente, por entre as frestas das paredes de capim ao alto entrançado com lianas, tudo o que acontece por fora da palhota onde tinha passado a noite
.




(i) Os olhos de águia da prisioneira



Aos poucos, a prisioneira começa a sentir o incómodo da situação em que se encontra. Mostra o pano empapado em sangue a uma companheira, e esta, não tendo em atenção o que se passa, mas julgando tratar-se de auto agressão, grita. Imediatamente por entre o pano que servia de porta à improvisada prisão, aparece uma cara escura de G3 em punho. Troca de palavras entre as mulheres, e a situação é clarificada e explicada ao vigilante. Passados poucos minutos, aparece um militar. Pami reconhece nele, um dos que muito se tinha movimentado junto do Leão de Cufar.
- Que aconteceu Amadu? - Pergunta o branco.

O carcereiro informa em crioulo meio português o que se passa. O militar ouve, e ordena:
- Diz à tua mulher que vá com a prisioneira junto do poço para que ela se lave!
- Eh... Arferes Palmeiro, e se mulher foge? - Pergunta aflito, o guarda das prisioneiras.
- Não foge! - Responde o que Pami fica a conhecer como alferes Palmeiro.

Aparece, então, uma mulher já de certa idade, que tenta falar crioulo. Mas em vão, pois tudo se mantém mudo. Começa então, a dirigir-se em balanta, às mulheres, pelo que Pami se levanta, e segue a mulher velha. Passam pela frente da casa principal da Quinta. Observando tudo, a professora verifica tratar-se da casa onde estaria instalado todo o comando. Olhos de águia observadora, Pami vai vendo onde ficam as transmissões e a enfermaria. Passando a estrada, contornam o edifício que mais tarde fica a saber tratar-se da messe de sargentos. Por detrás deste, situa-se um poço que abastece os soldados, para tudo quanto é lavagens. Param, e a velha sorridente dirige-se a um soldado que sobre a parede do poço se abastece:
- É, pessoal, parte água, para pessoal ali lavar catota!

O soldado dá uma gargalhada e returque:
- Só tiro água, se partires catota comigo!

- Chi! Minino, a mim belho! Esse pessoal lá é pisoneiro! Não pode faze esse cumbersa! Capitão num deixa!
- Olha! Mas ela é maneta!... Mas com a mão direita ainda tocava uma punheta! Toma lá a água, e se ela quiser mais, chama pessoal ali do abrigo!

O soldado, tirando a pulso uma lata de dez litros de água, entrega-a à velha e desaparece em direcção a um abrigo que Pami verifica ser colectivo. Paredes de adobos, com dois metros de terra pela frente. Por cima, troncos de palmeira e chapas de bidões cobertos com cerca de cinquenta centímetros de terra. Uma cobertura de colmo faz a protecção da chuva e do sol..

Pami retira o pano que lhe cobria o corpo, e coloca-o no chão. Flecte-se, dobrando os joelhos, e com uma pequena concha - feita de meia cabaça -, vai tirando água da lata, fazendo a sua higiene pessoal. Após as ablações feitas, pega no pano, colocando-o sobre uma pedra, e deita-lhe por cima o resto da água. Com uma mão apenas ajudada pelo coto esquerdo vai lavando até as manchas desaparecerem. Enrola ao corpo o pano molhado, e faz sinal que está pronta à mulher do milícia. Em silêncio, regressam ao improvisado cárcere.

Ao atravessar o arruamento que dividia o Aquartelamento, Pami olha para a esquerda e vê surgir da porta de armas um grupo de nativos acompanhado de dois militares armados. Fica a saber que se trata de pessoal das tabancas a Sul, que vêm convidar os militares para estarem presentes no Choro. Tempos mais tarde analisa este acto e confirma tratar-se de técnica de efeito psicológico, feita pelos militares junto dos moradores a Sul. Seria honra convidar os militares, que se tornavam pródigos, carregando uma viatura, com rações de combate e alguns garrafões de vinho, água de Lisboa, que depois eram distribuídos pelos homens grandes e família do morto. Oportunamente, aproveitavam todos os pormenores para conquistar a confiança das populações.

Voltando ao cárcere, verifica que apenas a bajuda e outra mulher de meia-idade - a qual não lhe era desconhecida - se encontram no interior. As outras duas companheiras tinham-se ausentado. Uma hora depois, aproximadamente, as ausentes regressam. Pela troca de olhares e pelas meias palavras, pronunciadas muito baixinho, verificam que tinham começado os interrogatórios. Quem se seguiria?



(ii) O Alferes Telmo e o Furriel Mamadu interrogam Pami


Pami Na Dondo segue-se na lista. Um soldado milícia faz-lhe sinal para que o acompanhe. Pelo curto caminho até onde funcionam os interrogatórios, Pami decide-se por mentir e, mentalmente, vai gizando um estratagema para não cair em nenhuma cilada ou, de forma alguma, denunciar Malan.

Contornando pela parte de trás o edifício do comando, é introduzida num quarto onde se encontra o sujeito milícia que parecia conhecer de Catió. Os de nome Telmo e Mamadu - este último apresentava-se de farda amarela, com a boina preta, mas sem lenço e, pendia-lhe à cintura um cinturão de lona de onde caía um coldre com uma pistola de grande calibre -, também estão presentes.

Virando-se para o milícia, Telmo começa:
- Quêba! Pergunta-lhe lá o nome?

O milícia Quêba olha para Pami e pergunta-lhe o nome em crioulo. Pami já tinha delineado manter-se firme e responder só na língua balanta, fazendo-se ignorante a qualquer outra. Pelo que não responde. Quêba torna a insistir, sem resultado.

Virando-se para Telmo informa:
- Este gaja só fala balanta, arferes Telmo!
- Está bem! Então fala em balanta! Qual o nome dela?

Quêba volta à carga, agora em Balanta. Pami hesita um pouco, olha o milícia e responde:
- Sanhá Na Cunhema.

O ora identificado alferes Telmo continua, fazendo perguntas e escrevendo:
- Idade?
- Num sabe! Mas deve ter vinte anos!
- Onde nasceu?
- Num sabe! Pai e mãe morreu quando rebentou guerra!
- Onde?
- Na Ilha do Como.
- O que é que ela fazia em Cobumba?
- Nada!

O da boina preta, mete a mão no punho da pistola, e retirando-a diz:
- Pergunta-lhe lá se sabe o que é isto, e para que serve?
- Diz que é coisa com que militar mata!

Quêba suava por todos os poros, e irritado, disse para o da boina preta:
- Furriel Mamadu este gaja está a enganar pessoal!

Pami confirmou assim a identificação do boina preta, mas não devia ser este o seu verdadeiro nome. Deveria ser nome de guerra. Não havia branco com nome de preto.

Telmo, desculpa lá! Deixa ver a reacção dela!

Pegou na pistola, e enfiando o cano no ouvido de Pami, ordenou ao milícia:
- Pergunta-lhe lá onde é que ficou a mão esquerda dela?

Pami sentiu o frio do aço da arma no ouvido e, com um gesto brusco, fugiu ao contacto. Estremeceu, pela primeira vez começou a ter medo. Este militar, com olhos fundos, não deve ser bom. A barba dele e o olhar faz medo. Um pouco trémula, a professora respondeu ao milícia e este traduziu:
- Não sabe! Quando era minino pequinina, cobra mordeu nela, e pai teve de cortar mão a ela!

O furriel Mamadu meteu a arma no coldre e sorriu para o alferes dizendo:
- Parecia fácil, não era? Aí está uma gaja que sabe muito e se está a armar em parva, ou então é mesmo louca.

O alferes olhou para o furriel e disse-lhe:
- Rafael, vamos utilizar outra forma, põe-na lá a rir!

Ficou desvendada a alcunha, Rafael era o verdadeiro nome de Mamadu.

Mamadu sentou-se no chão, puxou do bolso um maço de cigarros, tirou um e acendendo-o, de imediato ofereceu à prisioneira. Esta olhou e fez negação com a cabeça. Rafael olhando para ela, sorriu de uma forma aberta e descontraída e disse para Quêba:
- Diz-lhe lá que eu gosto do nome dela! Se ela quiser eu caso com ela!

O intérprete repetiu em balanta, e Pami descontraiu um pouco. Rafael voltou de novo ao ataque, enquanto o alferes começava a fumar também.
- Então a gaja não diz nada?

O intérprete insistiu.
- Diz que não, furriel. Branco não gosta de preta!
- Ah, sim? Mas diz-lhe lá, que aqui não há mulher branca! Espera!... Diz-lhe que os soldados brancos dizem que ao fim de quinze dias na Guiné as pretas começam a ficar brancas!

O à vontade do furriel e a forma engraçada como disse aquilo iam traindo a prisioneira, que quase esboçou um sorriso. O interprete como sempre voltou a repetir as palavras do furriel. Nestes momentos a mente de Pami trabalhou e pensou seguir um caminho que, embora perigoso, poderia transformar as coisas, e respondeu. O interprete começou a rir e voltando-se para o alferes disse:
-Ai! Arferes Telmo! Este gaja é mesmo maluco! Diz que não casa, mas que faz muito conversa giro!
- Queres ver que nos saiu uma puta na rifa! Estamos fodidos com esta merda! - Exclamou o furriel.
- Não! Espera! Vamos explorar esta situação!

Diz Telmo:
- Quêba, pergunta-lhe com quem é que ela faz conversa giro?
- Com homem! Diz ela!

Retorquiu Quêba.
- Certo! Então diz-lhe, que vai fazer conversa giro com os Militares todos do Quartel!

Pami viu que tinha ido longe demais, não se sentiu com capacidade para resistir. Pensou em Malan, e começou a chorar.

Telmo e Rafael olharam um para o outro e os seus olhares entenderam-se. Enquanto Quêba ria e ia dizendo:
- Gaja mesmo maluco! Cá tem cabeça!
- Quêba, leva a mulher para junto das outras, amanhã vamos explorar isto melhor. OK, Rafael?
- Certo! Se for uma puta para serviço da guerrilha, pode ser uma boa fonte!

O alferes e o furriel saíram, enquanto o milícia levava a prisioneira para junto das suas companheiras.


(iii) Pami não quer trair os ideais de seu pai e de Malan


Pami estava exausta, a cabeça fervilhante, não a deixava coordenar o pensamento. Sentia que tinha embrulhado tudo, e que os militares não tinham acreditado em nada do que dissera. Coisa horrível! Como seria com Malan? Tinha de saber, havia que fazer qualquer coisa para tentar no mínimo saber o que lhe estava acontecendo. Ouviu vozes fora da palhota prisão, e por entre as frestas do capim, verificou que vários soldados conversavam na varanda da casa da Quinta, agora Comando. A prisão distava uns quinze metros da varanda, e as conversas poderiam ser perfeitamente audíveis. Com extremo cuidado afastou um pouco mais o capim, e ficou com um ângulo visual mais alongado. Desta forma, poderia não só ouvir, como também ver os soldados. Lá estavam o Leão, os alferes Telmo e Palmeiro, e mais quatro. Dos restantes quatro, observou que dois tinham nos ombros a graduação, a qual tinha aprendido em Simbele, na República da Guiné. Um, já de idade mais avançada que os outros, tinha as divisas de sargento; o outro, pequenino, vestindo calções e camisa de farda amarela, tinha os galões de tenente.

Estes momentos de espionagem, acalmaram-na um pouco. Mas... logo voltou à preocupação por Malan. Fechou os olhos e recostou a cabeça no tronco do canto que servia de prumo e sustentação do cárcere. O pensamento voou e pensou em seu pai, e como tinha tido coragem de trocar o seu nome pelo de sua saudosa mãe. No amolecimento da dor e do calor, adormeceu naquele silêncio de meio do dia.

Antes de anoitecer, os milícias trouxeram mais arroz com carne. Já pela noite dentro, chegaram dois milícias que levaram a Bajuda. Pami receou o pior, concerteza iriam violá-la, e chorou de novo. Embrenhando-se nos pensamentos de lama desta guerra, sentiu que estava a fraquejar. Não!... Não poderia ser, tinha de criar forças, nunca poderia trair os ideais de seu pai e de Malan.

(Continua)

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Notas de L.G.:

(1) Vd. episódios anteriores:

23 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2298: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (2) - Parte I: O balanta Pan Na Ufna e a sua filha (Mário Fitas)


(...) A acção decorrer no sul da Guiné, entre os anos de 1963 e 1966, coincidindo em grande parte com a colocação da CCAÇ 763, como unidade de quadrícula, em Cufar (Março de 1965/Novembro de 1966)…

No início da guerra, em 1963 Pan Na Ufna, de etnia, balanta, trabalha na Casa Brandoa, que pertence à empresa União Fabricante [leia-se: Casa Gouveia, pertencente à CUF]. A produção de arroz, na região de Tombali, é comprada pela Casa Brandoa. Luís Ramos, caboverdiano, é o encarregado. Paga melhor do que a concorrência. Vamos ficar a saber que é um militante do PAIGC e que é através da sua influência que Pan Na Ufna saiu de Catió para se juntar à guerrilha, levando com ele a sua filha Pami Na Dono, uma jovem de 14 anos, educada das missão católica do Padre Francelino, italiano.

O missionário quer mandar Pami para um colégio de freiras em Itália mas, entretanto, é expulso pelas autoridades portugueses, por suspeita de ligações ao PAIGC (deduz-se do contexto). Luís Ramos, por sua vez, regressa a Bissau, perturbado com a notícia de que seu filho, a estudar em Lisboa, fora chamado para fazer a tropa.

É neste contexto que Pan Na Una decide passar à clandestinidade, refugiando-se no Cantanhês, região considerada já então libertada.(...)



28 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2307: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (3) - Parte II: A formação político-militar (Mário Fitas)


(...) De etnia balanta, educada na missão católica, Pami Na Dondo, aos catorze anos, torna-se guerrilheira do PAIGC. Fugiu de Catió, com a família, que se instala no Cantanhês, em Cafal Balanta. O pai, Pan Na Ufna entra na instrução da Milícia Popular. Pami parte, com um grupo de jovens, para a vizinha República da Guiné-Conacri para receber formação político-militar, na base de Sambise. O pai, agora guerrilheiro, na região sul (que é comandada por João Bernardo Vieira 'Nino') , encontra-se muito esporadicamente com a filha. Num desses encontros, o pai informa a filha de que a mãe está gravemente doente. Pami fica muito preocupada e quer levá-la clandestinamente a Catió, enquanto sonha com o dia em que se tornará companheira do pai na Guerrilha Popular.

Entretanto, o destino prega-lhe uma partida cruel: na instrução, na carreira de tiro, tem um grave acidente, a sua mão esquerda fica decepada. No hospital, conhece Malan Cassamá, companheiro de guerrilha de seu pai, que recupera de um estilhaço de morteiro, que o atingiu na perna, no decurso da Batalha do Como, em Janeiro de 1964 (Op Tridente, Janeiro-Março de 1964, levada a cabo pelas NT) . Malan fala a Pami da coragem e bravura com quem seu pai se bateu contra os tugas.

Pami é destacada para dar aulas ao pessoal do Exército Popular e da Milícia Popular, em Flaque Injã, Cantanhês. No dia da despedida, canta, emocionada, o hino do Partido, 'Esta é a Nossa Pátria Amada', escrito e composto por Amílcar Cabral. Segue para Flaque Injã, com o coração em alvoroço, apaixonda por Malan Cassamá. De regresso à guerrilha, a Cansalá, Malan fala com o pai da jovem, e de acordo com os costumes gentílicos, Pami torna-se sua mulher. (...).



5 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2328: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (4) - Parte III: O amor em tempo de guerrilha (Mário Fitas)

Na actual região de Tombali (Catió), no sul da Guiné, o PAIGC, logo no início da guerra, ganha terreno e populações (nomeadamente, de etnia balanat). A resposta das autoridades portuguesas não se fez esperar, com uma grande contra-ofensiva para reconquista a Ilha do Como (Op Tridente, Janeiro-Março de 1964). Entretanto, começam a chegar a Catió chegam reforços significativos. O Cantanhês, zona libertada, assusta o governo Português. Em contrapartida, no PAIGC, Nino, o mítico comandante da Região Sul, manda reforçar os acampamentos instalados nas matas de Cufar Nalu e Cabolol.

Em finais de 1964, Sanhá, a mãe de Pami, morre de doença na sua morança na tabanca de Cadique Iála. O guerrilheiro Pan Na Ufna, acompanhado da sua filha, faz o respectivo choro, de acordo com a tradição dos balantas.

Em Março de 1965, os homens da CCAÇ 763 - conhecidos pela guerrilha como os Lassas (abelhas) - reconquistam ao PAIGC a antiga fábrica de descasque de arroz, na Quinta de Cufar, e respectiva pista de aterragem em terra batida. Nino está preocupado com a actuação dos Lassas, agora instalados em Cufar, juntamente com o pelotão de milícias de João Bacar Jaló, antigo cipaio, agora alferes de 2ª linha.

Entretanto, Pami e Malan continuam a viver a sua bela estória de anor, em tempo de guerra, de sacrifício e de heroísmo. Ela, instalada em Flaque Injá, onde é professora. Ele, guerrilheiro, visita-a sempre que pode.

A 15 de Maio de 1965, os Lassas destroem o acampamento do PAIGC na mata de Cufar Nalu. A guerrilha sofre baixas mas, durante a noite, consegue escapar com o equipamento para Cabolol. Na semana seguinte, os militares de Cufar tentam romper a estrada para Cobumba. Embrenham-se na mata de Cabolol, destruem várias tabancas na zona.

Em princípios de Junho de 1965, os Lassas (abelhas) (3) vão mais longe, destruindo o acampamento de Cabolol. Em Cafal, o comando político-militar do PAIGC está cada vez mais preocupado. Em Julho, Pami chora de dor, raiva e revolta ao ver a sua escola destruída, em Flaque Injã. Grande quantidade de material desaparece ou fica queimado. As casas de Flaque Injã ficam reduzidas a cinzas.

Mas a luta continua... Psiquicamente recuperada, a população começa a reconstrução de Flaque Injã e Caboxanque. A guerrilha recebe mais reforços e armamento novo. Pami entra voluntariamente numa coluna de reabastecimento que a leva à República da Guiné. Segue o corredor de Guilege, e sobe de Mejo para Salancaur, daqui para o Xuguê [Chuguè, segundo a carta de Bedanda,] terra de seus avós paternos. Desce até Cansalá, onde se encontra com seu marido. Não encontra seu pai, pois este fora transferido para o Cafal, e ali integrado numa companhia do Exército Popular.

Em meados de Agosto de 1965, Pami Na Dondo desce com Malan Cassamá até Cobumba. Malan e o seu grupo levam a cabo várias acções contra a tropa e o quartel de Bedanda. O grupo regressa a Cansalá. Uma delegação da OUA visita as zonas libertadas, a convite do PAIGC.


(2) Vd. último post desta série > 10 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2340: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (5) - Parte IV: Pami e Malan são feitos prisioneiros (Mário Fitas)

Guiné 63/74 - P2362: O Movimento Nacional Feminino no filme em DVD Natal de 71, de Margarida Cardoso, que recomendo (Diana Andringa)


1. Mensagem da Diana Andringa:

A propósito de senhoras da Cruz Vermelha, cigarros, isqueiros e outras ofertas de Natal (1):

Na sessão em que vai ser lançado o DVD Guiné: As 2 faces da guerra, vai ser lançado um outro, com um documentário da Margarida Cardoso, Natal de 71, em que o tema é também a guerra colonial - mas em Moçambique - e o disco que, nesse Natal, o Movimento Nacional Feminino (e não as senhoras da Cruz Vermelha, pergunto-me se não há confusão) oferecia aos soldados (2).

O documentário é muito bom, na minha opinião - e, se não o viram (passei-o na RTP2 em 2001, penso que já terá passado outras vezes), vale a pena verem-no. Já que referiste prendas no sapatinho, acho que esse DVD é outro bom presente).

Abraço,

Diana
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Notas dos editores:

(1) Vd. post de 17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2357: O meu Natal no mato (3): Banjara, 1965 e 1966: um sítio aonde não chegavam as senhoras da Cruz Vermelha (Fernando Chapouto)

(2) Vd. post de 13 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2348: Convite (1): sessão de lançamento em DVD do filme As Duas Faces da Guerra, 4ª F, 19 Dez 07, na A25A (Diana Andringa)

Guiné 63/74 - P2361: O meu Natal no mato (4): Cachil, 1966: A morte do Condeço e do Boneca, CCAÇ 1423 (Hugo Moura Ferreira / Guimarães do Carmo )

Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 1423 > Monumento funerário, à memória dos Fur Mil Condeço e Boneca, mortos na tarde de 24 de Dezembro de 1966.

Foto: © Ex-1º Cabo Gandra / Hugo Moura Ferreira (2006). Direitos reservados.

1. Mensagem do Hugo Moura Ferreira:

Caros:

Como disse há dias ao Luís, tenho andado arredado mas não desatento. Aliás quem é que depois do que por passou se mantém desatento? Isso é uma característica que acho que acabámos todos por, de uma forma ou de outra, adquirir.
Estou de volta, mas devagarzinho. Voltei à vida dita activa e produtiva e ainda não me habituei a gerir convenientemente os tempos. Mas com a continuação e boa vontade lá chegarei! Porque no resto estou muito melhor e mais disciplinado.

Bom, mas agora o que interessa é o conteúdo da mensagem do Luís.

Quando a li, lembrei-me de uma mensagem que lhe enviei em 26 de Novembro de 2006, às 2h28, sobre algo que se enquadraria no tema agora proposto e que nunca teve qualquer tratamento ao nível da divulgação no no nosso Blogue.

O Assunto da mensagem era "Memorial" e pretendia eu associá-lo às questões que na altura andavam em tratamento relacionadas com os cemitérios e os monumentos locais efectuados pelas Companhias aos seus mortos.

Como nessa altura não teria sido a meu ver, eventualmente, achado interesse na sua referência não insisti no tema e limitei-me a inseri-lo no meu sitezinho no Spaces. Mas como agora querem estórias ou histórias (sou subscritor de uma das petições conta o acordo ortográfico Luso-Brasileiro que circulam na Net), sobre ocorrências nos Natais passados entre 1963/1974, resolvi enviar-lhes de novo aquilo que enviei há um ano.

Como poderão verificar aquilo que escrevi não estava formatado nem redigido para fazer simplesmente o copy/paste havendo a necessidade de retirar ou compor aquilo que decidirem publicar. Portanto mesmo agora vou enviar em anexo a parte que importa desse Mail de um caso que se passou no Cachil, em 24 de Dezembro de 1966, quando ali se encontrava a CCAÇ 1423, contado pelo Alf Carmo, meu amigo de infância e de Instrução Primária a quem eu, periquito, fiz uma visita, quando em Novembro de 1966 cheguei a Catió em trânsito para Cufar (cerca de um mês antes da ocorrência).

Aproveito para vos desejar um Santo Natal com muita saúde e repleto de Felicidade para vós e para toda a vossa Família. Um Abraço.

Hugo Moura Ferreira

2. Mensagem do Hugo Moura Ferreira enviada para o Blogue em 26 de Novembro de 2006, e que não foi publicada na altura:

(...) Queria, no entanto, antes disso enviar-te uma peça descrita por um amigo e camarada nosso que esteve no Cachil, em 1966, antes da minha CCAÇ 1621 ter para ali ido, quando saiu de Cufar e se relaciona com um memorial que ali se encontrava cuja foto obtive de um outro amigo, o 1º Cabo Gandra, do meu grupo de combate.

A foto em questão vai em anexo e como deverás verificar, se a aumentares, há uma inscrição que diz 'Aos Furrieis Condeço e Boneca', mas há outras inscrições, nomeadamente o número da CCAÇ que com grande dificuldade consegui descortinar: 1423.

Assim, porque me parecia que esse meu amigo de infância (vizinho e colega da primária) tinha pertencido à CCAÇ 1423, que eu visitei no Cachil quando cheguei a Catió, a caminho de Cufar, em Novembro de 1966, mandei-lhe uma mensagem a fazer perguntas sobre o referido memorial, acerca do qual o pessoal da CCAÇ 1621 desconhecia o significado.

A determinado passo da minha mensagem coloquei as seguintes questões:

A tua Companhia era a CCAÇ 1423? E pertencia ao BCAÇ 1858, que estava em Catió, quando eu cheguei à Guiné, em 1966? Penso que sim, porque verifiquei na pag. 140, da 'Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África', 3º Volume - Guiné, do Estado Maio do Exercito, que aquela Companhia esteve também, antes do Cachil, em Empada. Tudo isto, por exclusão de partes me faz pensar que era mesmo a tua CCAÇ" e ainda "...por pertencer à Tertúlia Virtual , para a qual te convido a fazeres parte, ao receber algumas fotos para digitalizar de antigos camaradas da CCAÇ 1621, a que pertenci, mas da qual saí quando fui colocado em Bedanda e ela seguiu para o Cachil, presumo que para vos render, encontrei uma que me despertou a curiosidade, que te envio em anexo que, depois de a analisar bem, verifiquei ser de um monumento no Cachil a 2 Furriéis falecidos por acidente (isto o que consta nos registos oficiais), de nomes Colaço e Boneca.

Poderias confirmar-me se assim é? Caso venhas a confirmar, poderias também dizer-me qual foi o acidente que provocou as suas mortes? E será que tens algumas fotos em que eles se encontrem? Se por acaso tiveres, eu gostaria de as digitalizar.


Assim, e porque os memoriais são para fazer recordar, aqui estou eu a contribuir para tal, transmitindo aquilo que o meu Amigo, Alf Carmo, me mandou dizer sobre o assunto que, com a devida vénia, depois de ele me ter autorizado a divulgar o que conta (" Não tenho qualquer problema em seres tu a utilizar quer a informação quer as fotos, as presentes e/ou futuras.") e a prometer que "Logo que um destes dias crie mais 'estaleca' para entrar no Blogue, assim o farei e poderei então entrar directamente", passarei a contar.

A propósito da foto e do Memorial nela representado, concordando em que 'falar nos mortos é perpetuar a sua memória e mantê-los 'vivos' no nosso espírito, sem se perderem no tempo' contou-me então o Alf Guimarães do Carmo que realmente a CCAÇ 1423 / BCAÇ 1858 (Ago 1965 a Abr 1967) era a dele e da ocorrência que originou a morte dos Furriéis Condeço e Boneca disse:

Quanto ao acidente que vitimou os Furriéis Condeço e Boneca, o mesmo ocorreu no Cachil na tarde de 24 de Dezembro de 1966, por razões de 'casmurrice' do então CComp que borrado de medo (era vulgar ocorrerem ataques nas alturas de festas) impôs por Ordem de Serviço que fossem verificadas as minas instaladas pelas NT. Era eu que estava de Oficial de Dia e já no regresso da saída 'simbólica' que decidi fazer, um dos Furriéis acidentados, disse que segundo o croquis havia uma ou duas minas muito perto e, como tal, era pena não ir verificá-las. Acedi e ao verificar a 1ª mina o Fur Boneca disse de longe que "nem um camião fazia saltar a cavilha" - provavelmente a cavilha estava oxidada e ao tentar rodá-la a mesma saltou fazendo rebentar a mina. Foram as suas últimas palavras!

O Fur Condeço, que se encontrava perto foi severamente atingido e acabaria por falecer no Heli a caminho de Bissau. Eu ainda fiquei com um estilhaço cravado na canela da perna esquerda.

Junto uma foto (Empada, Janeiro de 1966) em que o Condeço é o primeiro da esquerda. Quanto ao Fur Boneca não tenho nenhuma foto uma vez que o mesmo entrou na Companhia em rendição individual, penso que pouco tempo antes do acidente.

Desconhecia a existência do pequeno monumento documentado pela foto que me enviaste. Se ainda existe será talvez o único memorial pessoal dedicado a ambos. Um bem haja a quem o fez ou a quem decidiu mandá-lo fazer!

Como deves calcular os meus Natais são, ainda hoje, um pouco ensombrados pela lembrança deste fatídico evento


Legenda: Em Empada, da esquerda para a direita: Fur Condeço, 2º Sarg Nunes, o nosso alfero [Guimarães do Carmo] e Fur Castro. Do soldado africano à frente não me recordo o nome (*).

... E foi isto que ele [Guimarães do Carmo] me mandou como resposta!!

Esperando trazer algo de interesse para inserir no Blogue, nomeadamente relativo a ocorrências no Cachil (Ilha do Como), por agora termino, com um Abraço.

Hugo Moura Ferreira

Ex-Alf Mil,
Guiné, 1966/1968
CCAÇ 1621 -Cufar e CCAÇ 6-Bedanda

Presente nas seguintes páginas da Net:

http://bairromadredeus.hi5.com/

http://mouraferreira.spaces.live.com/

http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial_tertulia.html

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/

http://blogueforanada.blogspot.com/

________

(*) No Blogue já encontrei referências à CCAÇ 1423, no Post 913, e quem sabe se o soldado africano que o Guimarães do Carmo não se lembra é algum daqueles que estão em amena cavaqueira com o Francisco Allen na foto que ali se encontra, tomada em 2005?!...


Vd. post de 26 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P913: Empada 1969 ou as duas Guinés (Zé Teixeira, CCAÇ 2381)

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Guiné 63/74 - P2360: A CCAÇ 726, a primeira Companhia a ocupar Guileje (2): 10 mortos e mais de metade do pessoal ferido em combate (Virgínio Briote)

A CCaç 726 em terras da Guiné. Uma Companhia a escrever a sua história.

A CCaç 726 não tem ainda a história escrita da unidade. O Alberto Pires (o Teco, como é mais conhecido entre nós) e o Carlos Guedes, com mais cinco camaradas estão a escrevê-la, com recurso às histórias dos Batalhões a que a Cª esteve adstrita e às memórias de mais de 400 fotos seleccionadas, tiradas entre Novembro de 1964 e Julho de 1966.






A história da CCaç 726 em datas

Mobilizada através do RI 16, Évora, a CCaç 726, comandada pelo Capitão Martins Cavaleiro (1), embarcou em Lisboa em 6 de Outubro.

Após o desembarque em Bissau, em 14 do mesmo mês, a CCaç 726 rendeu a CArt 676 no dispositivo e manobra do BCaç 600, enquanto, sob a orientação da CCaç 508, fazia a adaptação operacional na zona de Quinhamel, perto de Bissau. O primeiro GrComb a ser destacado para Guileje marchou em 28 de Outubro e o segundo em 17 Novembro.

Em 25 de Novembro de 1964 toda a CCaç 726 já estava no sector de Guileje (2), então criado, primeiro na dependência do BCaç 513, depois na do BCaç 600 e ainda na do BCaç 1861. Anteriormente Guileje esteve ocupado por um pelotão da CArt 495.

A CCaç 726, ao longo da permanência no sector, só ou em conjunto com outras subunidades, tomou parte em diversas operações, patrulhamentos e emboscadas no chamado corredor de Guileje. E por períodos variáveis, forneceu pelotões para temporariamente reforçarem as guarnições de Gadamael e Cacine.

Em 30 de Março de 1965, na sequência da Op Arpão, ocupou a povoação de Mejo, tendo lá deixado dois pelotões.

Em 27 de Janeiro de 1966, para reforçar a CCAÇ 1424, destacou dois pelotões para o Cachil, então na zona de acção do BCAÇ 1858.

Em 2 de Julho de 1966, por rotação com a CCAÇ 1424, passou a integrar o dispositivo do BCAÇ 1858, assumindo a responsabilidade do subsector de Cachil, mantendo ainda um pelotão em Mejo.

Em 16 de Julho foi substituída pela CCAV 1484 (Cap Cav Coutinho e Lima*), seguindo para Catió, onde se manteve até à chegada da CCAÇ 1587.

E em 6 de Agosto de 1966, seguiu para Bissau, a fim de embarcar de regresso à Metrópole.

As baixas da CCaç 726

Durante a comissão na Guiné, a CCAÇ 726 sofreu 10 mortos, dos quais 9 em combate.

Mais de metade da CCAÇ 726 sofreu ferimentos em combate, tendo alguns militares sido atingidos duas e três vezes ao longo da estadia em Guileje.

No total, existe o relato de terem sido evacuados para o HMP 14 elementos da Companhia, tendo cerca de 69 feridos, continuado ao serviço, depois de recuperados.

Mortos:

  1. Furr Mil António Gonçalves da Silva, em 29 Nov de 1964, por ferimentos em combate.
  2. 1º Sarg Joaquim Balsinhas, em 28 Fev 1965, por explosão de armadilha IN.
  3. 1º Cabo Amadeu Jaló, em 28 Maio de 1965, por doença, no HMP
  4. 1º Cabo Enf Manuel Moreira Marques, em 28 Jun de 1965, por ferimentos em combate.
  5. Sold Cond Armando Gonçalves da Fonseca, em 28 Ago de 1965, por ferimentos em combate.
  6. 1º Cabo Elísio Santos Filipe, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate.
  7. Sold Mil Mussa Bela Camará, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate.
  8. Sold Cond José Luís L. Pereira, em 29 Ago 1965, por ferimentos em combate.
  9. Sold Luciano Florêncio, em 7 Set 1965, por AP, em Cutia, ao serviço do GrCmds "Vampiros".
  10. 1º Cabo João Seborro, em 7 Nov 1965, por ferimentos em combate

As primeiras acções armadas da CCAÇ 726

A 1º acção em que a CCAÇ 726 participou foi uma emboscada que montou, para os lados de Balana, junto a uma cambança do rio. Apanharam armas e tantas munições (mais de 12.000) que se viram aflitos para trazerem todo o material para o aquartelamento.

Não demorou muito a terem a resposta. Um Gr Comb viria a cair, dias depois, numa emboscada. O IN, até essa data, estava habituado a utilizar o corredor sem ser incomodado, uma vez que os efectivos de Guileje, até então, não tinham passado de um pelotão.

Extractos de Perintreps e Sitreps com referências à CCAÇ 726

Novembro de 1964

República da Guiné-Conakry

O conjunto de notícias sobre a presença de grupos IN na Rep. Da Guiné, relacionadas com instrução e reabastecimento de material, levam a admitir o recorte de:
- Elementos do PAIGC regressados da URSS, onde receberam instrução;
- Um centro de instrução em Boké, onde, em Out. de 64, receberam instrução cerca de 300 elementos IN, que se admite pertencerem ao Exército Polpular (2 secções)

Sector E

- Registou-se o final da instrução das duas primeiras unidades do E. Popular, uma das quais se destina ao Quitafine (a outra irá para Boké), supondo-se que tenha sido já uma dessas unidades que actuou na região de Guileje.
- Referida a existência de metralhadoras pesadas AA de 3 canos e viaturas blindadas na posse do IN.
- Observados vestígios de passagem de numerosos grupos, em ambos os sentidos, na área Gadamael-Guileje-Gandembel e caminhos recentemente abertos na área de Contabane.
- Observados 3 sobrevoos de helicóptero em Sangonhã, sempre na direcção E-W.

Dois ataques a Guileje no mesmo dia

Na madrugada de 29 de Novembro de 1964, a CCaç 726 levantou-se mais cedo. Acordou com fogo nutrido de armas automáticas e granadas de morteiro e de RPG. Durou até ao nascer do dia o ataque ao aquartelamento.

Depois do ataque, houve que evacuar os feridos mais graves. Guileje assistiu pela primeira vez a um movimento de helis e Dorniers, que, a partir daí, passaria a ser banal.

Dos relatórios dos ataques:

29 Nov 64 – grupo estimado em cerca de 200 IN atacou a tabanca e o quartel de Guileje, durante cerca de duas horas, com LGF, Mort 60 e 80, MP, Esp, P e GM, provocando incêndio e destruição de instalações militares e civis e causando 2 M e 11 F às NT e 4 M e 20 F à população.

Cerca das 4h00 um grupo estimado em cerca de 200 elementos atacou Guileje usando toda a gama de armas, em especial morteiros, lança-granadas-foguete, metralhadoras pesadas e espingardas automáticas. A intensidade do ataque era brutal e o uso de granadas incendiárias deu origem à destruição por incêndio da maioria das instalações militares e casas da população.

Por se tratar de um acontecimento notável e extraordinário refere-se aqui que no dia 29 de Novembro de 1964 foi Guileje atacada pela primeira unidade do chamado 'Exército Popular' IN, dotado de armamento poderoso, incluindo(…).

Todas as casas da tabanca foram incendiadas e destruídas.

Do Sitrep nº 89 P 300103 de 29 Nov 64 da CCAÇ 726

- Povoação deprimida perdas haveres (.) Boa reacção imediata aparecer pessoal comandante BC513 e oficial reabastecimentos e FAP evacuação feridos (.) Bom moral geral com desejo vingar ataque (.)
- FOX 963 transportar reabastecimentos chegaram em boa ordem (.) Chegar reforço PARAS (.) Trabalhos em melhorar defesa (.) CmdtCCaç726 ferido evacuado (.) Médico presente anima população (.)
- De Bissau arroz e farinha povoação que recebeu oferta sensibilizada (.)
- Oficial TMS encontra-se neste (.) Veio engenheiro águas e obras (.)

Nesse mesmo dia esteve em Guileje o Comandante do Batalhão a fim de tomar contacto com os estragos causados e necessidades imediatas das tropas e da população. Estabelecida uma ponte aérea de socorro em géneros, munições e roupas. Nem um só dos seus habitantes pediu para sair dali ou se deslocou por sua iniciativa para outras localidades. Mais decididos do que nunca, mostraram-se firmes na defesa da sua terra e no desejo de vingar os seus mortos.

Durante o dia fizeram-se as evacuações e foi reforçada a guarnição com um Pelotão de Pára-quedistas.

Foi tanto o movimento que até o próprio IN se convenceu que uma boa parte da CCAÇ 726 tinha abandonado Guileje.

À noite, assinalaram com vários very-lights o 2º ataque.

Os militares da CCAÇ 726, abrigados em toscos abrigos (ainda não tinha havido tempo para os construir) viram e ouviram guerrilheiros, de pé, junto à fiada do arame farpado, a incentivar a população a juntar-se-lhes. Recortados pela intensa luz, foram alvo do fogo dos militares abrigados.


Povoação e quartel de Guileje com iluminação exterior a petromaxes. Reconstituição e montagem, a partir da foto original, de J. Guedes. Com a devida vénia.

O aquartelamento foi defendido pelo 2º e 3º pelotões da CCAÇ 726 e por um pelotão da CART 495, com um efectivo total de 76 militares. Dias antes, um GrComb da CCAÇ 726 tinha sofrido 1 morto e 14 feridos numa emboscada.




A cozinha, o refeitório, a GMC e a armação de uma das tendas, na manhã a seguir ao 1º ataque.

Foto de António Pires (Teco).
A - 1º Sargento Balsinhas (morto por AP, em 28 Fev 65)
B - Furr Mil Enf. Manuel Rodrigues
C- 2º Sarg José Bebiano
D - Furr Mil Transm Carlos Cruz
E - militares da CArt 495

O 2º ataque no mesmo dia

Do Sitrep nº 93 de 30 Nov 64 da CCAÇ 726

1. 291900 a 301900 (.)
2. IN atacou esta das 2215 às 2325 (.) Utilizou Mort, Bazuca, MP, Esp aut, P, GM (.) Causou 3 feridos nativos sem gravidade (.)
3. NT reagiram bem, capturadas 2 Esp aut e vário material (.) Causou baixas avaliar poças de sangue e restos humanos.
Às 22h15 o mesmo grupo IN voltou a atacar, talvez entusiasmado com o relativo êxito que obtivera na madrugada anterior. Foram no entanto surpreendidos com a reacção das NT tendo sido postos em fuga cerca das 23h25.

Abandonou 1 Esp aut e 1 Carabina semi-aut e muito outro material havendo a destacar 1aparelho de pontaria de morteiro 60. Pelas poças de sangue, sinais de arrastamento de corpos e despojos humanos abandonados, o IN deveria ter sofrido pesadas baixas. Notícias posteriores referem que i IN sofreu 30 (?) mortos.

Amílcar Cabral em Guileje

Dezembro de 1964

República da Guiné

- Reportada a presença de Amílcar Cabral até aos primeiros dias de Dez de 64, na área fronteiriça, entre Sansalé e Simbeli, admitindo-se que a sua presença estivesse ligada às actuações do E. Popular contra Guileje e Gadamael.
- Verificou-se que a R. da Guiné incrementou o auxílio que vem prestando ao PAIGC dando-lhe facilidades de utilização dos seus aquartelamentos e de viaturas, quer para ministrar instrução, quer para efectuar reabastecimentos e transportar pessoal.

Já está reportado o apoio dado pelos aquartelamentos de Koundara (a norte) e o de Boké (a sul) no aspecto de concentração, instrução e transporte de elementos IN e ainda no aspecto de ligações rádio com o secretariado do PAIGC em Conakry.

Sector E

- Observados sobrevoos de helicóptero, de Sangonhá, na direcção W, e sobre o rio Cacine.
- O IN, sempre que pretende fazer entradas maciças de material pelo corredor de Guileje, destrói previamente os pontões na estrada, antes e depois daquela região, para o isolar.


As defesas de Guileje após os ataques



Guileje depois dos ataques. Abrigos com MP e com AA (c), espaldões do LGF (d) e do Mort 81 (e), resguardados com tapumes e trincheiras de protecção (b) e duas fiadas de arame farpado (a). Fora deste o aquartelamento estava armadilhado.
__________

Nota do co-editor vb:

Publicam-se aqui extractos da história de uma das Companhias que mais baixas sofreu na Guiné. A história escrita da CCÁÇ 726 está ainda em construção. Agradecemos ao Teco e ao Carlos Guedes o privilégio que nos quiseram dar, de sermos os primeiros a ler a história da CCAÇ 726.

(1) A CCAÇ 726 teve ainda como Comandantes o Cap Inf Arménio Teodósio e o Cap Art Nuno Rubim.

(2) Vd. ainda posts de:

Guiné 63/74 - P2358: A CCAÇ 726, a primeira unidade a ocupar Guileje: em memória do Alf Mil Comando António Vilaça (Virgínio Briote)

Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)

Guiné 63/74 - P864: Unidades aquarteladas em Guileje até 1973 (Nuno Rubim / Pepito)

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Nota de vb:

(*) O Cmdt da CCav 1484 era o Cap. Cav Rui Pessoa de Amorim e não, como está indicado acima, o Cap Coutinho e Lima). Corrigido pela mensagem do nosso Camarada Benito Neves, a quem agradecemos a informação correcta e as informações adicionais que nos enviou:

Meu caro Virginio,

Não por vício mas por mero prazer, sou um frequentador quase permanente da nossa caserna virtual. E digo quase permanente porque é a primeira coisa que faço quando me levanto e também a última do dia, antes de me deitar. Foi o que agora aconteceu e li as andanças da C. Caç. 726. Porém, no 8º parágrafo da história da C. Caç. 726, é referido que " /Em 16 de Julho foi substituída pela C. Cav. 1484 (Cap. Cav. Coutinho e Lima), seguindo para Catió onde se manteve até à chegada da C. Caç. 1587.". /

Ora bem, há aqui uma correcção a fazer no que se refere ao comandante da C.Cav. 1484 que foi sempre o Cap. Cav. Rui Manuel Soares Pessoa de Amorim. Desde a constituição da C. Cav. 1484 no RC 7, até à sua desmobilização na mesma Unidade. O Cap. Cav. Pessoa de Amorim apenas não esteve no comando da Companhia nos períodos das suas férias.

Eu estive nesta rendição no Cachil e o Cap. Pessoa de Amorim também lá esteve. Desconheço em absoluto quem terá sido o Cap. Cav. Coutinho e Lima. A rendição no Cachil da C. Cav. 1484 pela C. Caç. 1587, foi feita por fases, G. Comb. a G. Comb., iniciada em 07/07/66.

Que me seja perdoada a intervenção, mas o rigor não me deixou ficar indiferente.

(...)

Benito Neves, Fur. Mil. Cav. CCav. 1484

Guiné 63/74 - P2359: Dando a mão à palmatória (4): Afinal, não era só em Bissau que se gozava as delícias do sistema (Santos Oliveira / Editores)

Guiné > Bissau > Amura > Dezembro de 1965 > Um turista [o 2º Srgt miliciano Santos Oliveira, do Pel Ind Mort 912], "gozando as delícias do sistema"...

Fotos e legendas: © Santos Oliveira (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem do do Santos Oliveira ( 2.º Sarg Mil Armas Pesadas Inf, Como, Cufar e Tite, 1964/66):

Digníssimo Chefe da Tabanca Grande:

Saudações!

Obrigado pela referência aos Bravos do Pelotão que não existiu (1). No entanto o seu ao seu dono: o Alferes Cmdt do Pel Mort 912 não estava nas delícias de Bissau, mas pela Região de Tite, algures num dos Destacamentos que o Cmdt do BCAÇ 1860 gentilmente lhe ia destinando ao ter conhecimento do que nos estava acontecendo no desterro e pela sua própria inércia e falha de iniciativas de Comando.

Gostaria que fosse dado conhecimento, aos Tabanqueiros, deste pormenor menos exacto.

Aqui fica a rectificação. Desculpa-me.

Santos Oliveira

2. Comentário dos editores:

Santos Oliveira, herói do Como: A verdade dos factos acima de tudo. As nossas desculpas a ti e ao teu comandante (ausente, mas pelo RMD, e para todos os efeitos legais... teu superior hierárquico, que o respeitinho era muito bonito!) pela nossa frase menos exacta (e quiça infeliz), insinuando que ele teria ficado por Bissau, "gozando as delícias do sistema"... Afinal, ficou por Tite, que ficava em frente a Bissau, do outro lado do Rio Geba...

Sem queremos fazer um juízo de valor sobre o comportamento do teu alferes (coisa que evitamos fazer no nosso blogue, já que não somos tribunal, e muito menos tribunal militar), é costume recordar aqui que, na guerra e noutras acções humanas organizadas, há chefes e chefes, há líderes e líderes ... A chefia (que tem a ver com penacho, coroas, penas, galões, palanques...) uma atributo da organização, a liderança é uma relação... Não é líder quem quer, nem quem pode, mas sim quem se assume como tal e é reconhecido como tal... Etimologicamente falando, líder, no inglês antigo, quer dizer aquele que vai à frente mostrando o caminho...

E falando agora de camaradagem entre milicianos e soldados do contingente geral: a verdade é que, na Guiné, eramos todos camaradas, mas havia sempre uns mais camaradas do que outros... Sempre foi assim, em todas as guerras, em todas as sociedades: não havia só heróis, não havia só homens, não havia só camaradas, também havia vilões e filhos da mãe...

Damos a mão à palmatória, pelo erro factual: de facto, não era só em Bissau que se podia gozar as delícias do sistema... A comprová-lo, temos inúmeras fotos tuas do resort de Tite para o Carlos Vinhal publicar em tempo oportuno...

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Notas dos editores:

(1) Vd. post de 15 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2352: Ilha do Como: os bravos de um Pelotão de Morteiros, o 912, que nunca existiu... (Santos Oliveira)

(...) Ensaiei e esperei. Nessa Noite não tivemos visitas. Passados sete meses (sem sequer ter obtido qualquer resposta, ou comunicação do Cmdt do Pel Mort 912, acerca do que quer que fosse, inclusivamente dos Vencimentos e Pré dos Militares que estavam sob o meu Comando, desloquei-me a Catió, sendo recebido pelo 2.º Cmdt do BCAÇ 616 (?), confrontando-o com os três meses de Missão, com os Vencimentos, com a Disciplina (já não cortava o cabelo há 4 meses) e com a ameaça de agredir um qualquer Oficial, porque se isso resultou com o meu antecessor colocado em Bissau, no BSM (Furriel Miliciano Contente – já falecido), certamente também iria resultar comigo (...).

(...) Fizemos abrigos subterrâneos e aí colocávamos as nossas reservas. Nas rotações das Unidades as coisas ficavam um pouco feias. Continuava a reclamar o Pré e Vencimento, até que, finalmente, talvez pressionado por outro alguém, o nosso Alferes Rodrigues, dito Comandante do Pelotão, nos deu o ar da sua graça e enviou-nos os nossos bem merecidos Vencimentos, mas … em cheque.

Ficamos perplexos e até o 1.º Sargento da Companhia (?) ficou abismado e andou pelo aquartelamento com o braço erguido a mostrar o cheque. Só não conseguia ter um encontro, de amigos, com o Comandante Nino para lhe pedir o favor de descontar, o dito, lá por Conacri, onde ia regularmente. É de loucos. (...)

(...) Do meu Cmdt de Pelotão, nem sequer a dignidade duma referência, no seu Relatório Final, pelo desterro de 10 homens de quem se deveria sentir responsável. Para ele, não existimos nunca. (...).

24 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2301: Tabanca Grande (41): Santos Oliveira, 2.º Sarg Mil de Armas Pesadas Inf (Como, Cufar e Tite, 1964/66)

Guiné 63/74 - P2358: A CCAÇ 726, a primeira Companhia a ocupar Guileje (1): em memória do Alf Mil Comando António Vilaça (Virgínio Briote)



O alferes António Vilaça, ao centro, rodeado pela 1ª Equipa do Gr Cmds Vampiros, em Setembro de 1965. À sua esquerda, o Jamanca e o Justo que fizeram parte da 1ª Companhia de Comandos Africanos, tendo sido executados pelo PAIGC, já depois da independência, sendo na altura tenentes graduados (1). À direita do Vilaça, dois camaradas que sairam da secção do Fur Mil Comando João Parreira, na CART 730 e depois do 2º Curso de Comandos ficaram na 1ª equipa do Grupo Cmds Vampiros: António Paixão Ramalho (Monte Trigo) e o João Maria Leitão (2).


Foto: © Virgínio Briote (2007). Direitos rerservados.


A CCAÇ 726 em terras da Guiné. Uma Companhia ainda à procura da sua história (3). À Memória do António Vilaça, alferes da CCAÇ 726, colega e camarada, onde quer que estejas.

Colega, nos nossos tenros anos do liceu Sá de Miranda, nos cafés da Arcada, na Lusitana, na Rua do Souto em Braga.



O Vilaça (de costas), o Furr. V. Sousa, (...) o alf Gião do QG, o V. Briote, o Furr Marques e o Alf Toni Ramalho, à mesa do Hotel Portugal, em Bissau.

Foto: © Virgínio Briote (2007). Direitos reservados.


Camarada, poucos anos depois, com 20 e poucos anos, nas bolanhas e nas lalas de Iracunda e de Canquelifá, naquela Guiné que ambos odiávamos e amávamos. Nas nossas desavenças em Brá, no quarto que repartimos meses e meses, nos jantares no Hotel Portugal, em Bissau, nas brincadeiras em que nos metemos, nos castigos, punições em linguagem militar, que ambos sofremos, no solene frente a frente com o Brigadeiro Sá Carneiro, o Comandante Militar, a ler-nos nas trombas as redacções das infracções que cometemos, a vergonha que devíamos sentir, contra o espírito da psico-social, então a iniciar-se nos meados daqueles anos.

E depois da Guiné, dois ou três anos passados, os nossos encontros em Braga, as conversas que tivemos sobre a vida à nossa frente, com a Guiné para trás, como se nunca por lá tivéssemos andado. Lembras-te, António?

Não tiveste a vida que gostarias de ter tido e, no entanto, isto cá entre nós todos, pouco fizeste para teres outra. Quando te avisaram que a despedida estava próxima, ainda me telefonaste. Apanhaste-me num táxi, no Marquês, quiseste dar-me a honra de ser o primeiro a saber do mal que tinhas e dos dois ou três meses que nos restavam para pormos a conversa em dia. Não houve tempo para mais, António. E assim te foste, sem mais nada dizeres, quiseste ir só, com os teus à beira.





Curvamo-nos perante todos os que defenderam aquilo que lhes ensinaram que era Portugal. A nossa História a isso nos comprometia. Uma História feita de Albuquerques, Gamas, Egas Moniz, Magalhães e tantos e tantos outros que honraram, por feitos desmedidos, o sagrado nome de Portugal.
Tinhamos então pouco mais de 20 anos. Poucos anos antes, tinhamos trazido das escolas a ideia que a Pátria era una e indivisível. Depois, nas Mafras deste país, ensinaram-nos a usar as armas, a jurar que se o nosso precioso sangue tivesse que verter, que o fosse, que só assim seríamos realmente dignos de cá termos nascido.

Dulce et decorum est pro patria mori, doce e honroso é morrer pela Pátria. Assim mesmo jurámos, alguns com os pêlos da pele eriçados.

De pouco mais de meia dúzia de nomes ilustres faz parte a nossa lembrança escolar, mas não foi só deles que a história deste País se fez. De muitos também se fez o esquecimento e, no entanto, eles estiveram lá e outros foram mesmo decisivos nesses declinares da história.

vb

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Notas de vb:

(1) Vd. posts de:

23 Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXXIV: Lista dos comandos africanos (1ª, 2ª e 3ª CCmds) executados pelo PAIGC (João Parreira)

22 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXVII: O Justo foi fuzilado (Leopoldo Amado / João Parreira)

18 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXII: Dos comandos de Brá ao pelotão de fuzilamento (Virgínio Briote)

12 de maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLIX: O fuzilamento do Abibo Jau e do Jamanca em Madina Colhido (J.C. Bussá Biai)

(2) Vd. posts de:

8 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2037: Memórias dos Lugares (2): de Elvas a Bissorã e de Lamego a Biambe, com a CART 730 (Parte II) (João Parreira)

1 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2020: Memórias dos Lugares (1): de Elvas a Bissorã, e de Lamego a Biambe, com CART 730 (Parte I) (João Parreira)

(3) A CART 726 foi comandadq pelo ex-Cap Art Nuno Rubim, nosso muito estimado amigo, hoje coronel, e grande especialista em história da artilharia. Vd. posts de:

14 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)

11 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P864: Unidades aquarteladas em Guileje até 1973 (Nuno Rubim / Pepito)

Guiné 63/74 - P2357: O meu Natal no mato (3): Banjara, 1965 e 1966: um sítio aonde não chegavam as senhoras do MNF (Fernando Chapouto)

Lisboa > Belém > 14º Encontro Nacional de Combatentes > 10 de Junho de 2007 > O Marques Lopes e o Fernando Chapouto, dois homens que palmilharam o subsector de Geba.

Sobre o ex-Fur Mil de Op Especiais Fernando Chapouto.: (i) Partida no Niassa em Agosto de 1965; (ii) Em Outubro de 1965 está em Camamudo; (iii) Em Dezembro de 1965 passa por Banjara; (iv) Em meados de 1966 está destacado em Geba; (v) Em Março de 1967 está em Cantacunda; (vi) Em Maio de 1967 regressa à metrópole no Uíge; (vii) Recebeu uma cruz de guerra.

Foto: © Hugo Moura Ferreira (2007). Direitos rerservados.

1. Mensagem do Fernando Silvério, mais conhecido por Fernando Chapouto, ex-Fur Mil, Op Esp, CCAÇ 1426 (1965/67), Geba, Camamudo, Banjara e Cantacunda

Retribui e agradece para ti e toda a família um Natal Feliz e um Ano novo cheio de felicidades, paz e amor assim como para a TABANCA GRANDE, são os votos sinceros da família Chapouto.

Pois, infelizmente, que os dois Natais que passei na Guiné foram em Banjara, capital do Oio, como nós lhes chamavamos, assim como a passagem de Ano.

Como as senhoras da Cruz Vermelha levavam os brindes aos militares destacados, mas a Banjara nunca foram, mandaram-nos na coluna uns dias antes. Ainda me lembro que no primeiro Natal foi um isqueiro e uns aerogramas (bate-estradas).

Um abraço para a TABANCA GRANDE

F Chapouto
Fur Mil
CCAÇ 1426 Guiné 65/67

2. Comentário de L.G:

Fernando, tens de explicar melhor à gente quem eram essas senhoras da Cruz Vermelha [, digo, do Movimento Nacional Feminino, quer dizer o autor,] que, nessa época (1965/66), levavam ao tuga os isqueiros, os maços de cigarros e os bate-estradas... Presumo que fossem senhores... da Guiné (vivendo em Bissau, Bafatá...), possivelmente esposas da tropa do "ar condicionado". Nunca lhes pus a vista em cima, no meu tempo (1969/71), a essas tais senhoras da Cruz Vermelha da Guiné.

3. Pedido de correcção (e de desculpas) do F.C.:

Quero pedir desculpa às "Senhoras da Cruz Vermelha" que por Banjara não passaram no Natal, pois queria dizer as Senhoras do Movimento Nacional Feminino (MNF), mas também não passaram de Bafatá ou nem de Bissau.

Mas pelo menos ainda se lembravam de nós uma vez por ano.

Continuação de boas festas.

Um abraço

Fernando Chapouto

________

Nota dos editores:

(1) Vd. posts de:

20 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1450: Operação Jóia ou o dia mais trágico da minha comissão (Fernando Chapouto)

1 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1233: O meu cantinho na Net (Fernando Chapouto, CCAÇ 1426, Geba, Banjara, Camamudo, Cantacunda, 1965/67)

30 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXXIX: Recordando Geba, Banjara, Camamudo, Cantacunda, Bafatá (CCAÇ 1426) (Fernando Chapouto / A. Marques Lopes)

Guiné 63/74 - P2356: O meu Natal no mato (2): Bissorã, 1973: O Milagre (Henrique Cerqueira, CCAÇ 13)

1. Mensagem do nosso camarada Henrique Cerqueira, que mora na Foz do Douro (1):

Amigo Luís Graça, se vires que esta história tem algum interesse publica no nosso blogue e se achares por bem podes corrigir algo do Português.

Omito nomes para que só seja entendida a história,se achares que como historia não vale nada,não há problemas porque me fez muito bem escrever hoje fim de tarde friorento e até te digo estou aliviado e feliz, e seja o que Deus quiser.

Um abraço, um dia ainda te hei-de conhecer, isto vai lá devagarinho é que há muitos anos que não mexia na ferida.

Um bom natal para ti e para as pessoas que mais amas, assim como para todos os tertulianos e camaradas de todas as nossas Guinés.

Henrique Cerqueira


2. O meu Natal no mato (2) > Um milagre em Bissorã, 1973

por Henrique Cerqueira (CCAÇ 13)

Protagonista Principal:

Henrique Cerqueira, Fur Mil Atirador, BCAÇ 4610/72, em regime de voluntariado na CCAÇ 13 até Julho de 1974.

Protagonista secundário:

Regime de Marcelo Caetano e restantes (A BESTA)

Introdução:

Capitão, Alferes, Médico... não se sintam culpados, vocês foram vítimas da BESTA e com a vossa atitude permitiram o meu "Milagre de Natal", daí esta minha introdução que só os protagonistas entenderão.

Quanto á história tentarei que a entendam, pois que não sou escritor e só vou narrar o que está gravado na mente. Além disso prometi escrever algo para a tertúlia e sendo assim aqui vai e ao jeito do correr da pena.É que amanhã já não arrisco.

Véspera de Natal do ano de 1973. Nesse ano e contra mares e marés consegui ter a minha mulher Dulcinea (Ni para os amigos) e meu filho Miguel, de dois anitos, junto de mim. Vai daí pensei eu que atendendo a circunstâncias relacionadas com o Natal de 1972 e eu explico essas circunstâncias.

No ano de 1972, Natal e Ano Novo, cá o rapaz ficou a Patrulhar nessa noite de Natal só como Graduado e com o seu grupo de combate. Pois que aceitou (que remédio) que o seu Alferes fosse passar o Natal aos Açores e, como tinha mais um furriel no grupo, mas que por acaso era Guineense, esse também foi autorizado a ir para Bissau.

Cá o Henrique até nem se chateou pois que para levar um balázio na mona tanto faz ter mais furriéis ou mais Alferes junto e, como ainda era a noite em que a única falta era a da família e como os ditos atrás até tiveram passes e autorização,porque não???

E assim se passou o Natal de 1972. O Alferes veio dos Açores. O Furriel veio de Bissau e mais tarde até vieram, de prenda atrasada, mais dois Furriéis para o Grupo.Como vêem, até foi um Natal feliz para todos, ná é ?!...

Bom o ano de 1973 foi correndo - correndo devagarinho...devagarinho - , , mas lá chegou a outro Natal, o de 1973. Ah! esse, sim, ia ser o meu Natal Feliz na Guiné. Calma, malta, isto tem de ir devagarinho´, é que estou a abrir o ficheiro(mona,tola, massa encefálica,etc.). É que isto, malta, também é Guiné.

Bom, andemos.Dia 24/12/1973 chegou e então logo pela manhã e como sabia que o plano de protecção ao comando estava traçado e que mais uma vez o meu grupo estava escalado para Patrulha até pelo menos a meia-noite, este rapaz que acreditava que ainda havia Natal para todos, o que faz? Vai, muito alegre e contente, falar ao Aferes e pedir dispensa para a patrulha da noite e até disse que o único motivo de tal pedido era pelo simples facto de ter a mulher e filho junto dele.

Errado... Errado... O Alferes até parecia que estava à espera de tal pedido, pois que de imediato e de rajada me disse:
- Não, senhor, nem pense ,você não tem privilégios, não é mais que outros, por tal há que ir pró mato.

Ainda tentei falar ao coração do meu "camarada", depois até lhe lembrei o Natal de 1972. Qual quê?! Nem pensar, o grupo esse ano ia todinho para o mato patrulhar ou seja UM Alferes, três Furriéis e vinte e tal Soldados.

Meti o rabinho entre pernas (que é como quem diz sufoquei as lágrimas) e vim para a minha tabanca e pensei…..(ainda pesava !..):
- Parto um pé e prontos, não vou ao mato!!!

Merda, a pedra era torrão ferruginoso, desfez-se no pé e só ficou a arder... Merda, merda, assim não podia ser. Ainda pensei num tirito no pé,mas não se tornou viável, tinha muitos mirones e depois as balas eram caras, não é?? Então cá o rapaz que ainda não estava Homem feito,resolveu escrever um bilhetinho e mandou ao Capitão a dizer que estava doentinho.

Porreiro, mudou de folha e até coincide com a mudança de tudo e em especial com a minha grande mudança nesse dia e até para todo o sempre.

Passados mais menos uns trinta minutos vejo a se dirigir para a minha tabanca uma Delegação de Respeito, ou seja: Um Capitão, um Alferes e um Médico e creio ainda que mais atrás vinham alguns mirones "aramistas" e então começaram as "negociações" (hé…hé..deixa-me rir!).

1º Você não está nada doente, o que quer é se baldar;

2º Não tem privilégio nenhum só porque teve o atrevimento de trazer a família para junto de si (a palavra atrevimento eles pensaram e eu só agora escrevo, é da minha autoria neste texto)

3º Como toda aquela conversa me estava a enojar, pois que todos sabiam que eu sempre fui voluntário para tudo que não era desejável, sabiam ainda o que se tinha passado no Natal de 1972, nunca tinha contestado ordens de superiores,sempre tinha respeitado todos os camaradas Furriéis e todos os soldados do grupo ou de outros agrupamentos, assim como apesar da minha juventude eu tinha uma óptima relação com os civis e até no aspecto de Humanização e ainda após todos aqueles anos já longos de Guinè não havia nada a apontar na minha folha de serviços e como já estava farto da treta dos três e após ameaça de ficar preso no domicílio, ser despromovido, e ainda recambiado para a Fronteira, eu então tive... o MEU MILAGRE DE NATAL!

Fiquei Homem de verdade e aceitei o valor da proposta e, como tal nessa noite de Natal de 1973, em Bissorã eu fiquei preso, comi rabanadas que fritei em conjunto com a Ni ,comi arroz doce, tive muitos amigos em casa, tocámos viola, cantámos chorámos e rimos, enfim houve Natal esse ano,eu tive o Natal que queria,o Milagre aconteceu e deu-me coragem para me revoltar contra o sistema da altura e até venci a BESTA porque: Não fui para a Fronteira, não fui despromovido, não fui preso e vivi em companhia da Ni e do Miguel mais todos os intervenientes desta história o FIM GLORIOSO DA BESTA COM A CHEGADA DO 25 DE ABRIL...

Não fiquem todos contentes por ter acabado a história, é que até Julho de 1974 ainda tive de enfrentar mais algumas BESTEIRAS e assim consolidar o meu amadurecimento como Homem.

É assim que eu, a Ni e o Miguel desejamos um muito Feliz Natal a todos os Tertulianos e em especial ao Capitão e Alferes que foram pessoas marcantes na minha vida.Um bom ANO para todos e para quem mais amam na vida.

Henrique Jorge Cerqueira da Silva

Ex-Furriel Miliciano
Batalhão 4610/72
3º Companhia no Biambe
4º Grupo de Combate da CCAÇ 13, 1972/74

Dulcinea (NI: Minha Mulher e mobilizada por mim para Bissorã em 1973/74

Miguel Nuno: Meu filho de dois anos mobilizado pela NI para Bissorã em 1973/74

3. Comentário de L.G.: Henrique, grande leão, fiquei muito sensibilizado por arranjares tempo e coragem para nos contares esse belíssimo milagre de Natal, no já longínquo ano de 1973 e nesse lugar não menos distante que era Bissorã. Um homem é um homem, e um bicho é um bicho: eis a conclusão (moral) que a gente pode tirar do teu relato, onde a emoção ainda se sente à flor da pele... Um homem, armado com a poderosa arma da razão, é um homem livre e frontal, capaz de enfrentar o medo, a ameaça, a prepotência...

Como sabes, nenhum camarada, neste blogue, deve fazer julgar o comportamento (militar) de outro camarada no TO da Guiné... Não sou (nem quero ser) juiz, não vou dizer que fizeste bem ou que fizeste mal. Não tenho dúvida em concordar contigo: nunca mais esquecerás esse Natal que te ajudou a tornar-te um homem de corpo inteiro... A tua Dulcineia e o teu Nuno tiveram muito orgulho em ti nessa noite, e vejo que continuaram a admirar-te pela vida fora... Deixa-me ainda dizer-te que é uma atitude de nobreza, da tua parte, não mostrar hoje qualquer rancor ou desejo de vingância, em relação ao Capital, ao Alferes e ao Médico, também eles vítimas de um sistemas iníquo e prepotente... Aquele abraço. Luís.

_____________

Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 26 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2219: Tabanca Grande (37): Apresenta-se Henrique Cerqueira, ex-Fur Mil (BCAÇ 4610/72 e CCAÇ 13, 1972/74)

domingo, 16 de dezembro de 2007

Guiné 63/74 - P2355: O meu Natal no mato (1): Jumbembem, 1965: Os homens às vezes também choram... (Artur Conceição)

Guiné > Região do Oio > Jumbembem > CART 730 (1965/67) > Natal de 1965 > Uma imagem do presépio, construído pelo Artur Conceição e pelo Manuel Mendes...


Foto: © Artur Conceição (2007). Direitos reservados.


1. Os editores do blogue lançaram, hoje, o seguinte desafio ao pessoal da Tabanca Grande:

Amigos & camaradas:

Aproxima-se uma data que no TO da Guiné nos era muito cara...Vamos lá a puxar da caneta, ou melhor, das teclas do computador e toca a recordar o melhor ou o pior Natal das nossas vidas... Onde é que eu estava na noite de 24 para 25 de Dezembro de 196.., 197.., algures na Guiné ?... Deve haver para aí muitas estórias (natalícias) por contar...

Um Alfa Bravo. Os editores do blogue, Luís Graça, Carlos Vinal, Virgínio Briote

2. Um pouco antes o Luís Graça tinha deixado a seguinte mensagem:

Amigos e camaradas:

Eu sei que a quadra (natalícia) é esquisofrénica... Desde o regresso às aulas da criançada, que somos bombardeados (é o termo!) com a musiquinha (deliquodoce) do Natal...E com a paranóia das compras e dos preparativos da Grande Noite... Eu sei que a quadra (natalícia) não é a mais propícia para a leitura e a escrita... Mas, por favor, não percam os excelentes posts deste fim de semana... Só do Jorge Cabral - o mais famoso Cabral da Guiné, a par do do outro sósia, o Amílcar - temos 2 (duas!) estórias cabralianas... Um verdadeiro acontecimento, para os seus fãs... O Torcato (ou o José, nunca sei) também nos conta mais um estória de Mansambo (uma delícia!)...O VB, por sua vez, conta mais pormenores dos bastidores da Op Ostra Amarga, operação na qual participaram (facto inédito ?) jornalistas estrangeiros, entre eles, uma bela mulher, francesa de seu nome Geneviève Chauvel... O VB, claro, não descansou enquanto não a descobriu algures, no planeta... O Carlos Vinhal trabalhou que se fartou para vos dar o texto e as fotos do Santos Oliveira que, em 1964, apontava - ele mais os bravos do pelotão - os seus morteiros contra o Nino, na Ilha do Como...enquanto o cabrão do alferes do Pel Mort 912 gozava as delícias do sistema em Bissau... Moral da estória: na Guiné, fomos todos iguais, mas há sempre uns mais iguais do que outros...

Na sexta feira também tivemos a boa notícia de que o DVD do filme, da Diana e do Flora (um documentário de 120 minutos, estreado em 2007), vai estar disponível em DVD antes do Natal... Se querem a minha opinião, ponham o DVD no v/ sapatinho... Por fim, o Tigre de Missirá é colocado em Bambadinca, depois da terrível mina que lhe ia tirando o sebo... O livro do novo Soncó (que um dia ainda poderá vir a ser régulo do Cuor, quem sabe) será lançado a 6 de Maro de 2008, e esse podia ser um bom pretexto para a malta se encontrar, ao vivo, e partir mantenhas...

Deixem por mim referir aqui a agradáve surpresa que foi, há uma semana atrás, encontrar no Porto, no bar e espalo de convíbio Contagiarte, os nossos camaradas António Pimental, Álvaro Basto (e esposa), A. Marques Lopes, Xico Allen (e Inês, a sua filha, simpatiquíssima, amorosa)... Os mais resistentes (ou malucos) - eu, o Álvaro, o Pimentel - saímos de lá às 3 e tal da madrugada... O pretexto foi a musiquinha dos Melech Mechaya onded toca violino) o meu filho João... (Para quem não pôde lá ir, aqui fica a página oficial do grupo: há diversos vídeos/clips ao alcance de um clique.... É claro que o grupo é mais divertido ao vivo, passe a publicidade e o elogio).

Espero ainda ter tempo para vos contactar até ao Natal (como habitualmente, irei passá-lo ao Norte, e depois das festas seria bom encontarrmo-nos na Casa da Teresa, em Matosinhos... Que tal a ideia ?).

3. Uma primeira resposta, ao nosso desafio (natalício), veio do Artur Conceição, que é meu vizinho, aqui da Amadora:

Artur Conceição,
ex-soldado de trms,
CART 730 (1965/67),
Bissorã, Farim e Jumbembem (actual Região do Oio)

Meus Caros: Luís Graça, Virgínio Briote e Carlos Vinhal

Estou plenamente de acordo com o Luís Graça quando diz: Eu sei que a quadra (natalícia) é esquizofrénica... E nesse contexto envio em anexo, só para vocês, uma apresentação que contém uma mensagem que traduz mais ou menos o Natal nos nossos dias.

Quero no entanto mandar qualquer coisa sobre o Natal vivido na Guiné em tempo de Guerra.


Os homens também choram...

Muitos dos nós choraram na noite de 24 para 25 de Dezembro algures na Guiné, em Angola, ou em Moçambique e porque não em Cabo Verde, São Tomé ou mesmo Timor? Então e os que cá ficaram, que não sabiam sequer por onde andávamos ?!

Pela minha parte confesso que foram noites de Natal não muito diferentes das outras. Só que hoje quando assisto a euforias materialistas e consumistas, cai em mim uma tristeza que me leva às lágrimas, pensando exactamente nesses Natais.

Quero apenas recordar que o Natal de 1964, passado em Lisboa, terá sido bem mais marcante do que os Natais de 65 e 66 passados na Guiné. O de 65 em Jumbembem e o de 66 passado em Bissau. Isto porque fui mobilizado em Dezembro de 1964 (meados), e fui enviado para o RAL 1, onde o Cap Garcia Leandro fez o favor de me colocar de serviço na noite de Natal e Fim de Ano, como castigo por me ter recusado a trabalhar na Brigada da Pedra.

Para deixar uma ideia do Natal da CART 730 em Jumbembem, no ano de 1965, vou enviar uma foto do Presépio que ali foi construído. Obra da iniciativa do Manuel Mendes (MC) e do Artur, mas em que muitos participaram, incluindo o Cap Amaro Rodrigues Garcia.

Como se depreende, até teria sido um Natal bem divertido não fora a distância, e a ausência dos nossos familiares.

Um grande Abraço

Artur António da Conceição
Av. Gorgel do Amaral, 6 - 1º Drt
Damaia
2720-267 AMADORA
Telef: 214901772/ Telem: 919652342

4. Comentário de L.G.:

Obrigado, Artur, pelo teu contributo. Eentendi/entendemos a tua mensagem. Faremos o nosso melhor para que todos os amigos e camaradas da Guiné, que fazem parte desta Tabanca Grande, se sinta menos sós neste Natal de 2007. Sobretudo aqueles de nós que estão doentes, ou que perderam recentemenete alguém muito querido, a companheira, um amigo ou algum familiar mais próximo. Ou que por outros acontecimentos de vida (reforma, desemprego, acidente, etc.) não se sentem física, psicológica, mental e espiritualmente nas melhores condições para celebrar uma festa que é (ou deveria ser) a da paz, da solidariedade, da família, do amor, da amizade... Artur, ficas à vontade para me telefonar, aqui para Alfragide: 21 471 0736... L.G.

Guiné 63/74 - P2354: Estórias cabralianas (29): A Festa do Corpinho ou... feliz o tuga entre as bajudas, mandingas e balantas (Jorge Cabral)

Guiné >Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > Uma bela bajuda local, numa das 150 fotos de Guileje que nos deixou o saudoso Cap Zé Neto (1927-2007)... Enquanto que as feministas da Europa, do oós-Maio de 1968, queimavam os seus soutiens, símbolo da opressão sexista, na Guiné, o supremo luxo, para as bajudas, era ostentar um corpinho (soutien), como este que se vê na foto... O Jorge Cabral foi o primeiro dos régulos da Guiné a dar-se conta desta tendência comportamental da mulher guineense...

Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.


Guiné-Bissau > Abril de 2005 > O Zé Teixeira, que voltou lá em 2005, escreveu no verso desta foto: "Em 2005, tal como em 1968"... Muitos de nós, na casa dos vinte, vinte e poucos anos, oriundos de uma cultura antifeminista, patriarcal, machista, misógina, de matriz judaico-cristã, deixaram-se impressionar (ou até seduzir) pela beleza da mulher guineense e pelo orgulho com que esta assumia (e cuidava de) o seu corpo...

Foto (editada por L.G.), tirada pelo Zé Teixeira (ex-1.º Cabo Enf da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70, actualmente residente em Matosinhos, bancário, reformado, um homem bem disposto que tem por alcunha, entre os escuteiros de que é dirigente, o Esquilo Sorridente...

Foto: © Zé Teixeira / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.

Guiné >Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > Bajuda local. Foto do Cap Zé Neto (1927-2007).

Foto: © Zé Teixeira / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.

Guiné > Fá Mandinga > c. 1970 > Jorge Cabral, um felizardo tuga, bendito entre as bajudas mandingas...

Foto: © Jorge Cabral (2005). Direitos reservados.

1. Mensagem do Jorge Cabral, advogado e professor universitário, datada de Dezembro de 2005, na altura em que formalizou a sua entrada para a nossa Tabanca Grande (1):

Luís,

Muito obrigado! Através do blogue, recordo. E sinto. Vejo os rostos dos camaradas, oiço os sorrisos das crianças, e até, calcula, consigo admirar de novo os belos seios das bajudas.

Peço permissão para pertencer à Tertúlia,, oferecendo o pícaro de alguns episódios que vivi.


2. Estórias cabralianas (29) > A festa do corpinho...

Porque estamos no Natal, recordas o teu de 1969 e um ataque a Bissaque (2). Eu passei o meu em Fá, e dias antes, noite dentro, quando já o comemorava por antecipação, acorri a defender a Tabanca de Bissaque, guiado pelo Marinho (3).
Este era um velho, seco e pequenino, guardião das instalações de Fá, desde os anos 50.

Embora existisse uma estrada para Bissaque [, a norte de Fá Mandinga, na margem esquerda do Geba Estreito], o Marinho conduziu-nos por uma interminável bolanha, após a qual lá chegámos, obviamente muito depois do inimigo ter retirado. O ataque, referido nos documentos oficiais, não passou de uma breve flagelação. Fui eu que relatei a ocorrência, e porque quem conta um conto... acrescentei-lhe alguns pormenores, (essa da intervenção de brancos deve ter sido ficção cabraliana), para assustar o Comandante de Bambadinca[, sede do BCAÇ 2852, 1968/70].

Bissaque era uma aprazível aldeia balanta. Logo nessa noite, à volta de uma fogueira, reparei na beleza das raparigas, tendo passado a frequentar semanalmente a Tabanca, numa acção sócio-erótica, a qual consistia numa esfregação mamária às belíssimas bajudas. Habituado às bajudas mandingas, verifiquei experimentalmente a superioridade dos seios balantas, tendo, e disso me penitencio, contribuído para um conflito étnico-mamário.

Afim de me redimir, em Janeiro de 1970, de férias em Lisboa, comprei 35 corpinhos (soutiens) no armazém Fama, sito à Calçada do Garcia, junto ao Rossio, onde agora se reúnem os guineenses.

Coincidência? Premonição? Lembro a perplexidade do empregado do armazém, quando lhe pedi os 35 soutiens de todos os tamanhos e cores.

Regressado à Guiné, em plena Tabanca de Fá Mandinga, organizei a festa do corpinho, para a alegria das bajudas, que envergaram o seu primeiro soutien.

Tivesse esta história acontecido nos dias de hoje, e certamente sentiria dificuldades no aeroporto, até porque os soutiens constituíam a minha única bagagem. Armas secretas? Indícios de terrorismo? Não sei mesmo, se não teria ido parar a... Guantanamo.

Jorge Cabral
(ex-alferes miliciano,
comandante do Pel Caç Nat 53,
Fá Mandinga e Missirá, 1969/71) (4)
2. Comentário de L.G.:
Só tu, meu querido Jorge, consegues pôr a malta e o resto a tropa a fazer... o pino!...Tu és a subversão total, o iconoclasta, o bombista-suicida, o terrorista intelectual, o humorista-mor e outras figuras que tais, que em muito contribuiram para o fim do nosso longo, vasto e glorioso Império... O teu humor é(era) subversivo, corrosivo, demolidor... Depois de te ler, um homem, um tuga, já não é mais o mesmo... Tu devias ir a tribunal militar, porque tu tiras a tusa... a qualquer combatente... Depois de te ler, quem é o combatente (até mesmo o de Alá!) que se sentirá para combater na guerra, na próxima guerra...
_______

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 21 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXCIII: Bendito Cabral, entre as mandingas de Fá e as balantas de Bissaque

(2) Vd. post de 18 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXXVII: O meu Natal de 1969 em Bambadincazinha (Luís Graça)

(...) Nas duas semanas anteriores, o IN tinha desencadeado várias acções de intimidação contra as populações de Canxicame, Nhabijão Bedinca e Bissaque, a última das quais levada a efeito por um grupo enquadrado por brancos que retirou para a região de Bucol, cambando o RGeba [atravesando o Rio Geba de canoa, para norte]" (Excertos da História da CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71] (...).

(3) Sobre o Marinho, vd. post de 15 de Dezembro de 2007 >Guiné 63/74 - P2353: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339) (10): Devolvam o bode ao dono... e às cabras de Fá Mandinga, terra de Cabrais

(...) Íamos abandonar um óptimo aquartelamento, [Fá]. Tinha sido uma antiga Estação Agronómica de Amílcar Cabral. Hoje restavam os edifícios, o guarda Marinho (um mandinga dependente da Administração), a recordação, nos mais velhos, do Engenheiro Cabral e os restos de alguma agricultura. Deixávamos Fá com desgosto. Chegara a nossa hora de partida. Éramos o terceiro grupo a ir para a construção do novo aquartelamento e as ordens cumprem-se (...).

(4) Vd. post anterior desta série: